Acórdão nº 08P677 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Abril de 2008
Magistrado Responsável | PIRES DA GRAÇA |
Data da Resolução | 17 de Abril de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça_Nos autos de processo comum com o nº 884/06.9 POLSB da 1.ª Vara Criminal de Lisboa (2ª secção) o Ministério Público deduziu acusação contra o arguido AA, filho de L. da S. P. e de G. R. N. da S., nascido a 30.9.1953, natural da freguesia de São Sebastião da Pedreira, concelho de Lisboa, casado, aposentado, residente na Rua ........., lote ..., ...° D, Lisboa, actualmente detido no EP de Lisboa, imputando-lhe a prática de um crime de homicídio qualificado p. e p. pelos arts 131 e 132 nºs 1 e 2 als a), c), d) e i) do Cód. Penal.
_Realizou-se a instrução a requerimento do arguido, vindo oportunamente a ser proferida decisão instrutória a fls. 303 e segs. que o pronunciou nos termos constantes da acusação.
_O demandante BB, representado pela sua mãe CC, deduziu contra o arguido pedido de indemnização civil.
_Submetido a julgamento, o tribunal colectivo, proferiu acórdão em 29 de Junho de 2007, onde em sede de questão prévia rejeitou o pedido de arbitramento de reparação provisória requerido pelo demandante ao abrigo do artº 403º e segs do Cód. Proc. Civil, e, decidiu: "a) condenar o arguido AA pela prática de um crime de homicídio qualificado P. e P. pelos arts. 131 e 132 nºs 1 e 2 ais. a) e i) do Cód. Penal. na pena de 20 (vinte) anos de prisão.
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ordenar. ao abrigo do artº 104 n° 1 do Cód. Penal, o internamento do arguido em estabelecimento destinado a inimputáveis pelo tempo correspondente à duração da pena.
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julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil, condenando-se o arguido/demandado AA a pagar ao demandante BB a importância global de €170.000.00 (cento e setenta mil euros ); d) condenar o arguido nas custas do processo relativas à parte criminal (...) e) condenar o arguido/demandado e o demandante nas custas referentes ao pedido civil na proporção do respectivo decaimento, devendo observar-se o disposto no art. 14 al. c) do CCJ; f) declarar perdidas a favor do Estado, ao abrigo do art. 109 n° 1 do Cód. Penal, a cafeteira e a faca de cozinha apreendidas a fis. 13; g) ordenar que por ora o arguido recolha ao estabelecimento prisional na situação em que se encontra, deixando-se, desde já, consignado que, descontado o tempo de prisão preventiva sofrido ao abrigo do art. 80 n° 1 do Cód. Penal, se tem por iniciado o cumprimento da pena de prisão fixada em a) no dia 22.7.2006; h) ordenar o envio de boletim ao Registo Criminal. Notifique. "_Inconformado, recorreu o arguido para o Tribunal da Relação de Lisboa, que por seu douto acórdão de 5 de Dezembro de 2007, negou provimento ao recurso, acordando "em confirmar integralmente o Acórdão recorrido."_Ainda inconformado, recorreu o arguido para o Supremo Tribunal de Justiça, apresentando as seguintes conclusões: 1 - O recorrente foi condenado pela prática, de um Crime de Homicídio Qualificado, previsto e punível, pelos artigos 131° e 132° n.s 1 e 2 als a) e i) do Código Penal, na pena de 20 (vinte) anos de prisão.
2 - Foi ordenado, ao abrigo no artigo 104° n. 1 do Código Penal, o internamento deste num estabelecimento destinado a inimputáveis pelo tempo correspondente à duração da Pena.
3 - Foi ainda condenado no pagamento do pedido de indemnização civil, no valor de 170.000€ (cento e setenta mil euros).
4 - Não se conformando com a o acórdão da 1ª instância apresentou recurso, vindo o mesmo a ser julgado improcedente, 5 - Continua o recorrente a não se conformar com a douta decisão, uma vez que entende que deveriam de ter sido aplicados os artigos 127º e 412° do CPP e em consequência ter sido alterado o acórdão da 1ª instância na parte em que o considerou imputável.
6 - O que o recorrente contesta e que sempre contestou é a perícia realizada pelo INML, que concluiu pela sua imputabilidade, pois entende que deveria de ter sido considerado inimputável, 7 - Alegou durante o processo e a audiência de julgamento que sofria de doença bipolar e que deveria de ser considerado inimputável, pelo que juntou aos autos urna nova perícia e levou o perito à audiência de julgamento para que o Tribunal pudesse averiguar todas as questões que pretendesse.
S - O recorrente entende que a perícia por si junta aos autos, juntamente com o depoimento do perito era suficiente para que tivessem sido levantadas sérias dúvidas sobre as conclusões da perícia realizada pelo Instituto de Medicina Legal e que levasse o Tribunal a quo a solicitar urna nova perícia, ou a optar pelas conclusões dessa perícia, 9 - Corno consta do acórdão da 1ª Instância, os dois pareceres são concordantes, num aspecto importante - "o arguido AA tem perturbações de ordem psiquiátrica, padecendo de doença bipolar. Divergem, contudo, quanto à conclusão em termos de imputabilidade" 10 - O perito, Dr. DD, ouvido na qualidade de Consultor Técnico, nos termos do disposto no artigo 155º do CPP, foi questionado quanto aos seus motivos de discordância com o relatório pericial apresentado pelo Instituto de Medicina Legal, bem corno relativamente às sua conclusões, 11 - Perante tal depoimento, que entendemos ser bastante explicito e credível, estamos em crer que levantou ao homem médio, sérias dúvidas quanto ao resultado da perícia do INML, 12 - É certo que a perícia realizado pelo INML, se presume subtraída à livre apreciação do julgador, nos termos do disposto no artigo 163º n. 1 do CPP, mas também é verdade que a sua opinião pode divergir do juízo contido no parecer dos peritos, podendo este decidir de outra forma, desde que fundamente tal divergência.
13 - Também é certo que a perícia apresentada pelo recorrente não tem formalmente o mesmo valor que a perícia apresentada pelo INML, mas tal facto não implica que a livre apreciação da prova por parte do julgador, não tenha limites.
14 - O Processo Penal é baseado na certeza e quem nos garante que pelo facto de se dizer na perícia do INML que o recorrente é imputável, que na realidade ele não o é.
15 - Entendemos que a perícia apresentada pelo recorrente, juntamente com o depoimento do perito que a realizou, é suficientemente para se levantarem sérias dúvidas quanto ás conclusões existentes na primeira, 16 - O perito apresentado pelo recorrente explicou de forma clara e credível a sua discordância, referiu que os motivos apontados pelo Perito do INML, para considerar o arguido imputável, não são obstáculos este ser considerado inimputável, "O que é dito se bem me recordo, não tenho aqui presente, de cor, o que é dito é que o arguido se lembraria correctamente de todos os factos, os relataria pormenorizadamente e de acordo com a realidade, que se referia aos acontecimento com que me lembro a expressão mas penso que com frieza ou com ausência de emoção do comportamento e de pressupostos destes, chegou-se na perícia médico-legal a uma conclusão de que o arguido, seria, deveria ser considerado imputável e vá na minha opinião tais afirmações ou tais constatações, se bem que eu até concordo com elas, pelas entrevistas que fiz com o doente, ele de facto tem uma memória adequada e precisa dos acontecimentos, tem de facto aquilo que nós chamamos uma certa frieza afectiva, também nós utilizamos o termo embotamento, ou seja, uma ausência de afectos e de emocionalidade quando se refere aos acontecimentos, agora eu atribuo esse facto, este facto à determinação causada pela doença que o doente sofre e não por, enfim, por qualquer ausência de culpabilidade ou aspectos de carácter moral, ou .. , é essa a divergência, além disso ... " 17 - O perito apresentado pelo recorrente, concluiu que este deveria de ter sido considerado inimputável.
18 - Também a psiquiatra que acompanha o recorrente no Estabelecimento Prisional de Lisboa, a Dra EE, que prestou depoimento em audiência de julgamento, considera que o recorrente deveria de ter sido considerado inimputável.
19 - É certo que em termos de valoração da prova, funciona o disposto no artigo 127º do CPP, ou seja a livre apreciação da prova, 20 - E também é certo que o tribunal superior, salvo casos de excepção, deve adoptar o juízo valorativo formulado pelo Tribunal instância, mas não é obrigatório que assim seja, existindo casos de excepção.
21 - Da fundamentação da decisão de facto resulta que a convicção do tribunal não se baseou numa valoração lógica, racional e objectiva de toda a prova que apreciou em audiência de julgamento, sendo tais factos baseados exclusivamente na perícia realizada pelo INML, sem atender ao depoimento credível e isento de um psiquiatra que exerce funções no Hospital Prisional há mais de 18 anos e da psiquiatra que segue o recorrente, desde que este se encontra detido no EPL.
22 - Entendemos que o homem médio fica com dúvida séria, honesta e com força suficiente para se tomar um obstáculo intelectual à aceitação de tal perícia, havendo assim lugar á aplicação do princípio "in dubio pro reo".
23 - Foi assim violado o Princípio da Livre Apreciação da Prova, previsto no artigo 127a do CPP, o artigo 1630 e o Princípio do In dubio pro reo, previsto no artigo 32º da CRP 24 - Entendemos que perante as dúvidas que foram levantada, que o Tribunal a quo, teria que ter tomado uma de duas atitudes, ou solicitava a realização de uma nova perícia, para que com certeza decidisse da imputabilidade ou não do recorrente, ou optava pelas conclusões apresentadas pelo perito presente em Tribunal.
25 - Não temos dúvidas que a averiguação da inimputabilidade de um individuo é extremamente complicado e que são os psiquiatras que têm mais aptidão nesta matéria, uma vez que têm mais conhecimentos nesta área, razão pela qual entendemos que o Tribunal a quo deveria de ter solicitado a realização de uma nova perícia.
26 - Violou assim o Tribunal a quo os artigos 158º, 163º e 410º nº 2 al a) do CPP 27 - Há insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, quando se verifica uma lacuna no apuramento desta matéria que impede a decisão de direito ou quando se puder concluir que sem ela não é possível chegar-se à conclusão de direito encontrada.
28 - Entendemos assim que o...
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Acórdão nº 1/08.0PEFIG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Junho de 2009
...sentido o supra citado acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15.10.03 e o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.4.08, no proc. 08P677, em www.dgsi.pt....
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Acórdão nº 1/08.0PEFIG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Junho de 2009
...sentido o supra citado acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15.10.03 e o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.4.08, no proc. 08P677, em www.dgsi.pt....