Acórdão nº 08P113 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Abril de 2008

Magistrado ResponsávelSANTOS CABRAL
Data da Resolução09 de Abril de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA e BB vieram interpor recurso da decisão que, pela prática de um crime previsto e punido nos termos do artigo 21 do DL 15/93, os condenou, cada um, na pena de cinco anos de prisão.

O arguido BB foi ainda condenado na pena de dois meses de prisão pela prática de um crime previsto e punido nos termos do artigo 275 nº 1 e 4 do Código Penal. Em cúmulo jurídico foi condenado na pena de cinco anos e quinze dias de prisão.

As razões de discordância encontram-se expressas nas conclusões das respectivas motivações de recurso. Assim, refere o arguido AA que: 1. O recorrente foi condenado na pena de cinco anos de prisão, pela prática dum crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art° 21º do DL 15/93 de 22/1 ; 2. Atenta a factualidade dada como provada pelo Tribunal" a quo ", tais factos deveriam ter sido punidos pela norma do art° 25° do mesmo diploma; 3. Militam nesse sentido os diversos factos dados como provados, a quantidade de produtos estupefacientes apreendidos e outros; 4. As escutas telefónicas juntas aos autos não têm qualquer relevância para se poderem associar ao tráfico de drogas 5. O recorrente não se dedicava de forma reiterada à venda de estupefacientes; 6. Não há nos autos, para além da apreensão de droga e das declarações do arguido, qualquer outro tipo de prova que o possa associar ao tráfico de estupefacientes; 7. O recorrente é consumidor, há vários anos, de produtos estupefacientes; 8. A ilicitude do facto considera-se fortemente diminuída, desde logo na justa medida em que o recorrente é toxicodependente, n° 21 dos factos provados, e que por via dessa sua dependência de drogas, tinha uma menor capacidade de determinação, o que lhe diminui significativamente a sua culpa; 9. A quantidade de droga - 36,721 gramas, embora já revestindo algum significado, ainda se pode considerar como uma quantidade enquadrada naquilo que se denomina de tráfico de menor gravidade, típico do pequeno traficante de rua, que não raras a as vezes trafica para sustentar o seu próprio vício; 10. O recorrente, trabalhava antes de ser detido, vivia em casa própria com companheira e dois filhos menores, é tido como boa pessoa e pai; 11. A diferença entre o art° 25° e o art° 21º do DL 15/93, deve assentar numa diferença axiológica, entre o pequeno traficante de rua, que não detém qualquer organização, e o tráfico de alguma expressão, que movimenta quantidades significativas, montantes consideráveis; 12. No caso concreto, a posse de cerca de 38 gramas de estupefacientes, não indica grande desvalor da acção, uma enorme danosidade social, sobretudo porque nem sequer se provou se o arguido teria ou não efectuado actos de tráfico, há quanto tempo, pelo que os actos concretos de tráfico consistiram na apreensão da droga, e nada mais; 13. A punição pelo art° 21 ° deve ser reservada para indivíduos que tenham uma actividade de tráfico, permanente, mais significativa, socialmente mais danosa, com obtenção de lucros significativos; 14. O art° 25 deve ser reservado para tráficos como os alegadamente assinalados ao recorrente, que não têm expressão muito significativa; 15. Se milita contra o recorrente, o facto de ter sido condenado em 2005, numa pena de 2 anos e dez meses de prisão, suspensa na sua execução, justamente por um crime de tráfico de menor gravidade, não é menos verdade que já nessa altura lhe foi reconhecida a sua dependência de drogas, e que o seu crime se compaginou numa situação, idêntica à dos presentes autos; 16. O recorrente deve ser acompanhado por entidades próprias e adequadas de forma a ajudá-lo a abandonar o famigerado mundo do consumo de drogas; 17. Num estabelecimento prisional, essa possível ajuda está fadada ao insucesso, pese toda a boa vontade das entidades responsáveis; 18. Pela factualidade considerada provada pelo Tribunal "a quo" constata-se, com alguma facilidade, que o recorrente não se enquadra no perfil tipo do traficante, mesmo aquele que se denomina de traficante de rua; 19. A circunstância de trabalhar, ter a sua família, não haver quaisquer relatos policiais de suspeitas sobre si relacionadas com o tráfico de drogas, a completa ausência de elementos fácticos que o relacionassem com tal actividade, permitem sem dúvida concluir nesse sentido; 20. A qualificação jurídica dos tactos, atento o que ficou provado em sede de audiência, remete-nos, a nosso ver, para o art° 25° do DL 15/93 de 22/01 ; 21. Uma pena de três anos de prisão, suspensa na sua execução, será decerto aquela que melhor se coaduna com todo o exposto ; 22. Justificando-se, no nosso entender, que seja decretada a suspensão da pena, uma vez que deve ser ponderado o efeito ressocia1izador que se pretende que as penas tenham, tomando inviável a reinserção social do recorrente; 23. A pena de 5 anos de prisão, que lhe foi aplicada, atenta a factualidade descrita, é desproporcional àquilo que realmente ficou provado em julgamento, sobretudo porque as diversas circunstâncias atenuantes a que se refere o art. 71 ° do CP, não foram devidamente tidas em conta.

24. Ainda que existam outras condicionantes, o Supremo Tribunal de Justiça, tem considerado que a quantidade de produtos estupefacientes apreendida ao arguido, cerca de 38 gramas, se poderá considerar como de tráfico de menor gravidade, punível, nos termos do artº 25° do DL 15/93 de 22/01 ; 25. No caso concreto deste recorrente, cremos que se lhe deve dar uma oportunidade, baixando a pena para os três anos de prisão e suspendo a sua execução, sujeito a medidas efectivas de acompanhamento, porque se verificam os requisitos do art° 50° e sgts. do CP ; 26. A qualificação jurídica dos factos, parece apontar no sentido da norma do art. 25° do DL 15/93 e a pena ajustada, cremos, será de 3 anos de prisão suspensa na sua execução; 27. O recorrente confessou os factos, de forma livre integral e sem reservas, MOSTROU UM ENORME E SINCERO ARREPENDIMENTO, PEDIU AJUDA AO TRIBUNAL; 28. Mesmo a admitir-se que os tactos deverão ser subsumidos pela norma do art. 2) o do DL 15/93 de 22/1, a pena aplicada - 5 anos, é excessiva, tanto mais que a pena tem de ser orientada em função da culpa concreta do agente e que deve ser proporcional a esta, em sentido pedagógico e ressocializador ; 29. A admitir-se uma condenação pelo art° 21º do DL 15/93 de 22/1, a pena concreta deveria situar-se junto ao limite mínimo legal, ou seja, na ordem dos 4 (quatro) anos de prisão, suspensa na sua execução atento o disposto no nº 1 do artº 50º do CP, uma vez que estão reunidos os pressupostos que poderão determinar tal suspensão; 30. Salvo melhor entendimento, o acórdão recorrido é ilegal por violação do disposto nos art°s 21º e 25º do DL 15/93 de 22/1 e art°s 50° e 71 ° do Código Penal Conclui, assim, que deve ser dado provimento ao presente recurso e revogar-se, em conformidade, o acórdão recorrido, condenando-se o recorrente numa pena de prisão, não superior a três anos, suspensa na sua execução pelo período de tempo considerado adequado, pela prática dum crime de tráfico de estupefacientes, p. c p. pelo art° 25° do DL 15/93. Mais adianta que, se não for esse o entendimento deve o recorrente ser condenado por igual crime, nos termos do disposto no art. 21 ° do mesmo diploma, numa pena de prisão de 4 (quatro) anos, suspensa na sua execução, atento o consagrado no art° 50° do CP, dado se encontrarem reunidos os pressupostos legais que poderão determinar a suspensão da pena.

Refere o arguido BB: 1. O recorrente foi condenado pela prática dum crime de tráfico de estupefacientes, unicamente porque no terraço do prédio onde reside, terem sido apreendidos, 19,918 grs. de produtos estupefacientes; 2. Nesse prédio, para além de aí residir o recorrente e sua família, vive a mãe da companheira e no r/c funciona um café, todos eles em fracções autónomas e independentes ; 3. A esse terraço têm acesso não só os moradores do prédio, como também familiares, amigos e vizinhos; 4. A escada de acesso a tal terraço, é exterior ao prédio, e é de livre acesso, na medida em que não existe qualquer entrave (porta ali outro); 5. A droga estava dissimulada num monte de areia e tijolos; 6. Não há nos autos qualquer prova, ainda que mínima, que possa associar o recorrente ao tráfico de estupefacientes; 7. Os bens apreendidos na residência do arguido (ouro, dinheiro e outros objectos) não foram declarados perdidos a favor do Estado, dado não se ter provado que a sua aquisição foi feita com a comercialização de estupefacientes; 8. Foi provado que o arguido: - trabalhava regular e legalmente; - que tem três filhos menores; - que vive com companheira e dois desses filhos; - que mensalmente contribui para o sustento da família; - que é tido como boa pessoa e pai ; - que não possui quaisquer meios de fortuna desajustados com o seu modo de vida.

9. As escutas telefónicas que foram juntas aos autos, não estão relacionadas com quaisquer actos de tráfico; 10. O Tribunal recorrido apenas se ateve na versão apresentada pela PSP ; 11. Não valorizou devidamente os depoimentos das testemunhas de defesa e demais factualidade; 12. O Tribunal recorrido interpretou o disposto no art. 127° do CPP, nesse sentido. ou seja, de apenas aceitar para formar a sua convicção, o testemunho dos agentes da PSP; 13. Impunha-se, por força da LEI, um exame crítico das demais provas, e isso ou não foi feito, ou, tendo-o sido, de forma muito pouco consistente; 14. O Tribunal recorrido deveria ter interpretado o art° 127° do CPP, doutro modo. e ao não fazê-lo, violou o disposto na CRP, nomeadamente no arte 32°, gerando uma inconstitucionalidade desse preceito, a qual expressamente se argui para todos os efeitos; 15.A alegada posse pelo recorrente de 19,918 gramas de produtos estupefacientes, a ter-se verificado, nas circunstâncias já referidas anteriormente, atenta a factualidade descrita - ausência completa de quaisquer provas, e ao facto de não haver nenhuma prova que indicie que o recorrente traficava, que não detinha meios de...

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