Acórdão nº 07S2901 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelSOUSA PEIXOTO
Data da Resolução27 de Fevereiro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. "AA" propôs, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, a presente acção declarativa contra a Empresa-A, pedindo que o réu fosse condenado: A - A repor-lhe todas as regalias, nomeadamente gabinete de trabalho e respectivo equipamento e a reinvesti-lo em todas as funções próprias da sua categoria profissional; B - A pagar-lhe: a) a quantia de € 1.048,19 de remunerações indevidamente descontadas e respectivos juros; b) juros sobre € 1.019,09, desde a propositura da acção até integral pagamento; c) a quantia, a liquidar em execução de sentença, correspondente aos descontos indevidos que o réu venha a efectuar-lhe, acrescida de juros de mora desde a respectiva data de vencimento; d) a quantia de € 10.000,00, a título de indemnização por violação do dever de ocupação efectiva, acrescida de juros de mora desde a citação; e) a quantia de € 15.000,00, a título de danos não patrimoniais emergentes de doença psiquiátrica de que o autor sofre, acrescida de juros de mora desde a citação; f) sanção pecuniária compulsória.

Em resumo, o autor alegou o seguinte: - em 1.8.1975, foi admitido ao serviço do réu, para exercer as funções de empregado de escritório; - em 1978 passou a exercer funções de professor de ginástica desportiva, tendo acumulado essas funções com as de assessor para a área gimnodesportiva, entre 3.7.85 e Setembro de 1986; - em Setembro de 1986, foi investido na categoria profissional de secretário-geral ou coordenador-geral, também designada de secretário-técnico, passando a reportar-se directamente à Direcção do réu; - para o desempenho destas funções, foi-lhe atribuído um lugar na sala da Direcção e, em 1994, após a construção da segunda fase do edifício sede do réu, foi-lhe atribuído um gabinete contíguo à área da Direcção, à porta do qual foi afixada uma placa com os dizeres de "Coordenador Geral"; - em 14 de Março de 2002, houve eleições para os órgãos directivos do réu e, em reunião havida com a nova Direcção, em 12.7.2002, esta informou-o de que era sua intenção extinguir o posto de trabalho do autor, por alegadas dificuldades financeiras e necessidade de reduzir os custos; - o autor opôs-se veementemente ao propósito da Direcção, por achar que a extinção do seu posto de trabalho era ilegal, injusta e inconveniente para a ré e que mais não seria do que uma desculpa para o colocarem na "prateleira"; - três dias depois, o nome do autor desapareceu do organograma do Clube, tendo o novo organograma sido exposto em local visível do Clube, dele tendo tomado conhecimento atletas, praticantes, associados e seus familiares; - além disso, a nova Direcção do réu deu conhecimento directo do novo organograma a dirigentes, concessionários e trabalhadores do réu; - após a divulgação do novo organigrama, a Direcção do réu informou as chefias da secretaria, da manutenção e do pessoal auxiliar, bem assim como o seu corpo docente, de que cessavam os seus deveres de obediência para com o autor, retirando-lhe, assim, na prática, toda a superintendência do pessoal do réu, que até aí lhe estava confiada; - e, no dia 1 de Agosto de 2002, em vésperas do autor entrar de férias, a Direcção do réu ordenou-lhe que, no dia seguinte, se apresentasse numa reunião com a Direcção e, nessa reunião, ordenou-lhe que deixasse devoluto o seu gabinete de trabalho e entregasse tudo o que aí existia; - a partir de 2 de Agosto de 2002, o autor ficou sem gabinete de trabalho onde pudesse exercer as suas funções de Secretário/Coordenador-Geral; - de 5 a 29 de Agosto de 2002, o autor esteve de férias e, quando regressou, foram-lhe atribuídas funções docentes que seriam levadas a cabo na sala de musculação, sob as ordens de um seu subordinado; - o autor recusou o exercício dessas funções, encontrando-se, por isso, inactivo, desde o início de Setembro de 2002, vendo-se obrigado a passar os seus dias de trabalho nos corredores da Empresa-A, à vista de dirigentes, associados, atletas, praticantes, concessionários, docentes e trabalhadores do réu, pelo facto do réu não lhe atribuir tarefas condizentes com a sua categoria; - em consequências das manobras do réu, para o afastar do seu cargo e lhe baixar a categoria profissional, o autor vem sofrendo profundamente, desde 12.7.2002: tornou-se uma pessoa triste, taciturna, irritável e fechada, com reduzida auto-estima, deixou de dormir de noite, passou a sofrer de insónias frequentes, perdeu o apetite e foi acometido de depressão reactiva ansiosa que o obrigou a entrar de baixa por doença, de 11 de Setembro a 22 de Outubro de 2002; - em Outubro de 2002, o réu descontou-lhe indevidamente € 394,09 na retribuição; - o réu comprometeu-se a pagar ao autor, por cheque, a quantia média mensal de € 250,00 a partir de 1.1.2002, a qual não constaria do seu recibo de vencimento, mas, a partir de 15 de Julho de 2003, deixou de lhe pagar a dita quantia.

Ainda antes da data designada para a audiência de partes, o autor veio dizer que fora despedido pelo réu em 23.12.2002 e requerer a apensação, a esta acção, da acção de impugnação de despedimento que, entretanto, havia proposto e que se encontrava a correr termos na 3.ª secção do 3.º Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa, com o n.º 391/03.

Frustrada a audiência de partes, o réu contestou, por excepção (alegando que a relação laboral havia cessado com o despedimento o que impedia o efeito jurídico pretendido na presente acção) e por impugnação (alegando que as funções de Coordenador eram funções de confiança e que foram exercidas por delegação ou mandato das sucessivas Direcções do réu, tendo o autor absoluta consciência de que se encontrava numa situação com contornos semelhantes à comissão de serviço, que poderia cessar a todo o tempo).

No despacho saneador, a defesa por excepção foi julgada improcedente e a apensação das acções foi indeferida.

Realizado o julgamento, com gravação da prova testemunhal, e dadas respostas aos quesitos que integravam a base instrutória, foi posteriormente proferida sentença, julgando a acção totalmente improcedente.

O autor recorreu, impugnando a matéria de facto e a decisão de mérito e o Tribunal da Relação de Lisboa julgou parcialmente procedente a impugnação da matéria de facto, mas, no que toca à decisão de mérito, manteve o julgado na 1.ª instância.

Mantendo o seu inconformismo, o autor interpôs recurso de revista, arguindo a nulidade do acórdão, no requerimento de interposição do recurso (arguição essa que veio a ser indeferida pela Relação - acórdão de fls. 841-842) e, posteriormente, apresentou alegações que concluiu da seguinte forma: I - O acórdão de que ora se recorre interpretou erradamente como novo pedido a conclusão LXXXVII do recurso de apelação, onde se afirma que o Tribunal a quo deveria ter reconhecido ao Recorrente a sua categoria profissional de Coordenador-Geral.

II - A razão pela qual o Recorrente só levanta a questão do reconhecimento do posto de trabalho no âmbito do recurso de apelação para o Tribunal da Relação prende-se obviamente com a indesmentível realidade de ser apenas o tribunal de 1.ª instância que realmente retira ao Recorrente essa categoria.

III - Na verdade, retira-se até de prova documental junta aos autos (v.g. documento de fls. 127) que o Recorrido, apesar de tal ter apregoado, nunca retirou ao Recorrente a sua categoria de Coordenador-Geral, Coordenador-Técnico, Secretário-Geral ou Secretário Técnico.

IV - Ao interpretar esta afirmação no sentido de que ocorria questão nova que a Relação não podia conhecer, o Tribunal a quo [inviabilizou] na prática o [conhecimento do] cerne do recurso de apelação, deixando injustificadamente de o conhecer e incorrendo, por isso, em nulidade por omissão de pronúncia relativamente à matéria das conclusões VIII a XL, XLX a LIV, LIX a LXVIII, LXXI a LXXV, LXXVII, LXXXII e LXXXVII e antecedente alegação, nulidade que preenche a previsão do art. 668°, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil.

V- Sem conceder, a perspectivação de tal questão como nova, deveria ter levado o Tribunal da Relação (e, anteriormente a 1.ª instância) a condenar extra vel ultra petitum, porque o reconhecimento da categoria sempre teria de resultar da aplicação à matéria provada de preceitos inderrogáveis como os que impõem a intangibilidade da categoria e os que definem um procedimento para a extinção de um posto de trabalho.

VI - A extinção do posto de trabalho, obedecendo à data dos factos ao disposto nos arts. 26.° a 33.° da Lei da Cessação do Contrato de Trabalho, necessitava de uma motivação (art. 26.°), de condições (art. 27.°) e de um procedimento (arts. 28.º a 30.°), que faltam de todo no caso vertente e que são direitos indisponíveis do trabalhador.

VII - As motivações legais da extinção do posto de trabalho constantes da alínea a) do art. 26.º da LCT - comprovada redução da actividade da empresa provocada pela diminuição da procura de bens ou serviços ou a impossibilidade superveniente, prática ou legal, de os colocar no mercado e alteração nas técnicas ou processos de trabalho ou encerramento definitivo da empresa ou de algum dos seus sectores - não se verificaram no caso dos autos, conforme demonstra a matéria de facto dada como provada.

VIII - A sentença recorrida faz eco de alguma doutrina (Monteiro Fernandes) e jurisprudência que ultimamente têm defendido - incorrectamente porque tem deixado perpassar a ideia de incondicionalidade de tal construção - a inexistência de direito do trabalhador ao cargo de chefia e, como tal, a atribuição de funções hierárquicas seria unilateralmente revogável à semelhança do mandato.

IX- Menezes Cordeiro, colocando-se face ao princípio da irreversibilidade da categoria, introduz a hipótese de se poder operar a exoneração quando haja previsão expressa do instrumento de regulamentação colectiva que preveja a categoria, previsão expressa essa que não existe na Portaria de Regulamentação do Trabalho para os Trabalhadores Administrativos publicada a fls. 135 e segts. do BTE, 1.ª...

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