Acórdão nº 08S3900 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelBRAVO SERRA
Data da Resolução27 de Fevereiro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I 1.

Pelo Tribunal do Trabalho de Lisboa instaurou a Licª AA contra V - Seguros, S.A.

, acção de processo comum solicitando a condenação da ré a reintegrá-la no seu posto de trabalho com todos os direitos e regalias, incluindo a antiguidade, a pagar-lhe as retribuições vencidas até final de Setembro de 2003, no montante de € 6.115,22, e as vincendas, acrescidas do prémio de incentivos a fixar para o período de Janeiro a Maio de 2003, € 10.000 a título de indemnização por danos não patrimoniais e juros sobre as retribuições devidas até à efectiva reintegração.

Aduziu, em síntese: - - que, ela autora, fora admitida em 12 de Setembro de 1994 pela Commercial Union - CGU International plc - Agência Geral em Portugal, que posteriormente se integrou, por fusão, na ré, para prestar a sua actividade profissional como Directora de Serviços, exercendo as funções de coordenação e direcção de Marketing, recebendo € 3.184,11 de ordenado base, € 143,26 de subsídio de alimentação, € 117,47 de subsídio de antiguidade, € 424,89 de «margem livre», € 942,89 e «prémio de incentivos» de valor variável, sendo o último de € 5.637,75, além de ter direito a uma viatura automóvel para uso pessoal e telemóvel, com todas as despesas pagas a eles inerentes, o que correspondia a € 1.302,71; - que a autora foi, ao abrigo de um invocado despedimento colectivo, despedida em 1 de Julho de 2003, com base numa comunicação da ré datada de 3 desses mês e ano, despedimento esse ilegal, uma vez que não só não obedeceu aos requisitos legais estabelecidos para um despedimento colectivo, como violou a Lei nº 105/97, de 13 de Setembro, já que, por um lado, no processo de despedimento colectivo, não foi apresentada qualquer real fundamentação económica, limitando-se a ré a fazer afirmações genéricas não sustentadas com dados económico-financeiros ou necessidades de despedimento para viabilizar a empresa, além de não terem sido consultados os delegados sindicais e, por outro, dos directores da ré não foi objecto de despedimento qualquer homem, mas tão só a autora, cujo lugar veio a ser preenchido por um homem.

Após ter a ré contestado, invocando a excepção de «prescrição» do direito de impugnar o despedimento colectivo, impugnando o alegado pela autora e deduzido reconvenção - quanto a esta solicitando a entrega da viatura automóvel, do telemóvel e do cartão de crédito disponibilizados pela primeira à segunda -, foi, em 10 de Maio de 2005, proferido despacho saneador que, para além de julgar improcedente a invocada excepção de caducidade, declarou terem sido cumpridas as formalidades legais para o despedimento colectivo e procederem os fundamentos invocados para esse despedimento.

Daquele despacho, na parte em que julgou inverificada a excepção de «prescrição», agravou a ré para o Tribunal da Relação de Lisboa.

Por sentença lavrada em 13 de Fevereiro de 2006, foi a acção julgada improcedente, em consequência vindo a ré a ser absolvida do pedido, o que motivou a autora a apelar para aquele Tribunal de 2ª instância, apelando também, mas subordinadamente, a ré, que arguiu a nulidade da sentença em virtude de a mesma se não ter pronunciado no tocante ao pedido reconvencional.

O Juiz do Tribunal do Trabalho de Lisboa, por despacho de 13 de Setembro de 2006, supriu a arguida nulidade, tendo julgado improcedente o pedido reconvencional.

Desse despacho apelou a ré.

  1. Tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 6 de Junho de 2007, julgado improcedentes o agravo interposto do despacho saneador e os recursos de apelação interpostos pela autora e pela ré, veio aquela pedir revista, concluindo a alegação adrede produzida com o seguinte núcleo conclusivo: "

    1. A recorrente foi despedida, pela Recorrida, no âmbito de um despedimento colectivo iniciado em Junho de 2003 envolvendo 6 trabalhadores.

    2. A Recorrida definiu como critério, para cálculo de indemnização, um mês de retribuição por cada ano de antiguidade, no decorrer do processo chegou a acordo com todos os outros trabalhadores envolvidos, pagando-lhes uma indemnização superior ao valor por si fixado inicialmente, tendo ao trabalhador do sexo masculino, Dr. AM, o qual detinha a mesma categoria e retribuição, pago 85.500,00 €, mais a viatura que lhe estava atribuída avaliada no valor de 5.031,45 € e ainda equipamento de escritório e seguros dos ramos reais e ao trabalhador FP, de categoria e retribuição inferior (Sub-Chefe de Secção), uma indemnização ilíquida de 80.000,00 € e direito a seguros.

    3. À Recorrente a Recorrida pagou o valor de 25.160,98 € d) A Recorrente, impugnou o despedimento alegando que o mesmo era discriminatório em razão do género, porque a Recorrida tinha uma política discriminatória ao nível dos directores, já que havia uma proporção de homens 70% e mulheres 30% e no cômputo global a proporção é de 51% mulheres e 49% homens e que no seu posto de trabalho foi colocado um homem Dr. AB.

    [e]) Que o ónus da prova de que não havia discriminação, em razão do género, cabia à Recorrida, por a Recorrente ter provado que no seu lugar foi colocado um homem e que a indemnização que pagou foi diferente daquela que foi paga a outros homens.

    [f]) O Tribunal ‘a quo' tinha o dever de condenar para além do pedido, por existirem factos provados documentalmente nos autos.

    [g] O Tribunal ‘a quo', fez errada interpretação do DL 392/79, de 20/9, da Lei 105/97, de 13/9, do artigo 141º do Tratado da União Europeia e Directiva 2002/73/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 23 de Setembro, que alterou a Directiva 76/207/CEE, do Conselho, bem como, dos diversos acórdãos do TJCE, a titulo de exemplo os acórdãos Seymour-Smith e Perez, já referido, C-167/97, Colect. P.I 623, nº 52)'.

    [h] Que seja feito o reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias que responda: Muito embora no texto das «conclusões» ora transcritas se não mencione o teor da pergunta que se intenta seja respondida, no «corpo» da alegação, a recorrente refere: "Que seja feito o reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias que responda: Se no presente processo existe, à luz das normas comunitárias discriminação directa em razão do género quando num despedimento colectivo uma mulher é preterida e no seu lugar é colocado um homem sem qualquer fundamento em critérios objectivos? Se existe discriminação em razão do género quando, a Recorrente, tem ao nível dos directores, uma maior proporção de homens 70% e mulheres 30% e no cômputo global a proporção é de 51% mulheres e 49% homens? Se tendo uma mulher provado que um homem teve tratamento diferenciado num despedimento por razões económicas se o ónus da prova competia à Recorrente ou à Recorrida" Nestes termos, deve ser proferido acórdão, que substitua o Acórdão proferido, que tenha em conta a existência de discriminação do género, que seja declarado nulo, por ilícito, o despedimento da Recorrente, por o mesmo não ter sido feito com justa causa e que seja feito o reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias se concluir que não existe um despedimento discriminatório em razão do género".

    Respondeu a ré à alegação da autora propugnando pela improcedência do recurso.

    A Ex.ma Representante do Ministério Público exarou douto «parecer» no qual propugna pela negação da revista e, tocantemente ao peticionado reenvio prejudicial, concluiu no sentido de uma tal solicitação se mostrar destituída de fundamento.

    Sobre o indicado «parecer», que foi notificado às partes, não vieram estas efectuar qualquer pronúncia.

    Corridos os «vistos», cumpre decidir.

    II 1.

    O acórdão ora impugnado deu por assente a seguinte factualidade, para o que agora interessa: - - a) a autora foi admitida no dia 20 de Setembro de 1994 para prestar a sua actividade na Generali Accident Fire and Life Assurance Company que, em 1 de Janeiro de 1999, foi integrada na Commercial Union CGU International Insurance plc - Agência Geral em Portugal, a qual, por sua vez, em 1 de Junho de 2003, foi integrada na ré; - b) a autora foi admitida com a categoria de Chefe de Serviços e, ultimamente, tinha a categoria de Directora de Serviços, prestando as funções de coordenação e direcção da Direcção de Marketing e colaboração na definição e elaboração das políticas e objectivos da área de que era responsável; - c) a autora, ultimamente, recebia, pela prestação de trabalho: - - € 1.699 de ordenado base; - € 7,54 de subsídio de alimentação por dia de trabalho efectivo; - € 117,47 de prémio de antiguidade; - € 424,75 a título de isenção de horário de trabalho; - € 942,89 de «margem livre»; - d) a autora auferia ainda prémios de incentivos de valor variável, sendo o último, relativo ao ano de 2003, no valor de € 5.677,75; - e) a autora tinha uma viatura atribuída pela ré, que utilizava em serviço profissional e na sua actividade particular, com as despesas de combustível, manutenção e seguros pagos pela ré, em montante não concretamente determinado; - f) a autora tinha um telemóvel atribuído pela ré, que utilizava em serviço e para seu uso particular; - g) em 30 de Dezembro de 1998 a ré fixou o montante mensal para despesas de gasolina em Esc. 35.000$00; - h) a ré é uma sociedade comercial sob a forma de sociedade anónima, que se dedica à exploração da actividade seguradora do ramo não vida; - i) em 30 de Maio de 2003 a ré...

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