Acórdão nº 07P4561 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelSIMAS SANTOS
Data da Resolução13 de Fevereiro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. AA, Procurador-Adjunto, arguido no proc. n.º .../07.9YRCBR, da Relação de Coimbra, notificado de acusação contra si deduzida pelo Ministério Público, pela prática de um crime do art. 292.º, n.º 1 do C. Penal, requereu a abertura da instrução, pedindo que fosse dado sem efeito o despacho de acusação formulado, substituindo-o por outro que suspenda provisoriamente o processo, nos termos do art. 281.º, n.º 1 do CPP, uma vez obtida a concordância do Ministério Público, de acordo com o art. 307.º, n.º do mesmo diploma legal.

    Foi esse requerimento rejeitado liminarmente por se ter entendido inadmissível, no caso, a instrução.

    Inconformado recorre o arguido para esse Supremo Tribunal de Justiça dessa rejeição, sustentando que deveria ter sido o mesmo requerimento deferido e aberta a instrução.

    Respondeu o Ministério Público junto do Tribunal recorrido, pronunciando-se pela procedência do recurso e pela substituição da decisão recorrida por outra em que se admita a requerida abertura da fase de instrução.

    Distribuídos os autos neste Supremo Tribunal de Justiça, teve vista o Ministério Público que se pronunciou igualmente pela procedência do presente recurso, sem embargo de reconhecer que a solução não é isenta de algumas dúvidas, entendendo que a fase de instrução tal como foi requerida pode ter utilidade e, acima de tudo, para além de permitir ao arguido o controlo de um poder-dever por parte do Ministério Público, permite-lhe também tentar evitar ao mesmo tempo a sujeição a julgamento com os inerentes malefícios que lhe são comummente apontados e, não é expressamente proibida por lei.

    Colhidos os vistos, teve lugar a conferência, pelo que cumpre conhecer e decidir.

    2.1.

    E conhecendo.

    São os seguintes os elementos relevantes para a apreciação da questão colocada.

    O arguido, notificado da acusação, requereu a abertura de instrução, invocando o art. 287.º, n.º 1 a) e n° 2 do CPP e que o crime do art. 292.º n.º 1 do C. Penal, de que fora acusado, é punível com uma pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, pelo que, cabendo na previsão do art. 281.º, n.º 1 do CPP, lhe confere a faculdade de, em sede de instrução, reagir à decisão do Ministério Público da não promoção da suspensão provisória da processo, nos termos do art.307.º, n.º 2 do mesmo diploma. A abertura da instrução permitia-lhe o controlo judiciário dessa decisão do Ministério Público e construir no debate instrutório o diálogo entre os vários sujeitos processuais que nele podem intervir, no sentido da obtenção de um consenso que viabilize a suspensão provisória do processo, finalidade que se enquadra nos objectivos que, com o debate, a lei pretende que se atinjam.

    O arguido, não contestando a factualidade vertida na acusação, ofereceu prova, designadamente quanto à quantidade e qualidade de álcool ingerido imediatamente antes do acidente, se teria ou não consciência de que se encontrava alcoolizado e se tal circunstância era evidente e ainda relativamente ao que as mesmas terão presenciado antes e após o despiste do veículo conduzido pelo arguido e quanto ao tempo e oportunidade que teve de deixar o local.

    Esse requerimento foi objecto do seguinte despacho: «(...) 2 - De harmonia com o estatuído no art.° 286.°, n.° 1, do CPP, a instrução - fase jurisdicional do processo preliminar - visa a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento.

    Daí que, sendo requerida por arguido - como no caso -, na sequência de acusação, terá por necessária finalidade a submissão a competente magistrado judicial da indagação da admissibilidade legal do acto acusatório pela aferição da pertinente indiciação da realização pelo sujeito passivo dos elementos constitutivos da(as) imputada(as) infracção(ões) criminal(ais), ou pela verificação da existência doutras razões jurídicas - de direito material ou adjectivo, (activa, causas de exclusão da ilicitude ou culpa, prescrição, amnistia, etc.) - que o inviabilizem ou neutralizem, total ou parcialmente, (cfr. ainda arts. 308.°, n.ºs. 1 e 2, e 283.°, n.º 2, do CPP) (Vide, a propósito, entre outros, Prof. Germano Marques da Silva, in Curso de Processo Penal, III - Editorial Verbo, 1994 -, pags. 125/133; Prof. Jorge de Figueiredo Dias, Para Uma Reforma Global do Processo Penal Português, pág. 38; e Raul Soares da Veiga, O Juiz de Instrução e a Tutela dos Direitos Fundamentais, in Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais (Almedina), pags. 183/220, maxime pág. 199).

    No essencial demanda-se do juiz de instrução a comprovação da objectiva legalidade da acusação, pela verificação da reunião de material probatório bastantemente demonstrativo da existência de crime e do seu responsável (autor, co-autor, cúmplice), e pela formulação de juízo de prognose de forte probabilidade de condenação do incriminado sujeito - em sede de julgamento - a reacção penal ou medida de segurança, e não já o policiamento da soberana discricionariedade do M.° P.° quanto ao juízo de oportunidade de sujeição do agente delitivo a julgamento, em razão de ponderosos - ou ponderáveis - critérios de utilidade ou conveniência, nos limites legais, pela opção pela acusação ou pela suspensão provisória do processo - prevenida no art. 281.º do CPP - como na situação sub judice, como é de mediano entendimento.

    Por conseguinte, havendo o arguido expressamente assumido a realização do imputado acto comportamental, e, por isso, a indiciação da assacada infracção criminal, (cfr. art.° 7.° do requerimento de abertura de instrução), muito mal se compreende o impulsionamento da fase instrutória tão-só com vista ao virtual condicionamento - quiçá coactivo (!)- do Ministério Público á revisão e alteração da sua oportuna opção de acusar em detrimento do recurso ao enunciado mecanismo de suspensão provisória do processo, cuja prossecução, com o devido respeito por diversa opinião - máxime pela plasmada no aresto invocado (Ac. da RL de 16/11/2006, disponível em http://www.gde.mj.ptljtrl), que, naturalmente, não sufragamos -, roçaria o absurdo jurídico.

    3 - Como assim, apresentando-se-me como axiomática a respectiva...

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