Acórdão nº 06S4106 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelMÁRIO PEREIRA
Data da Resolução13 de Fevereiro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I - O autor AApediu, com a presente acção ordinária, emergente de contrato individual de trabalho, que a ré Empresa-A, Lda.

fosse condenada a pagar-lhe a quantia de 15.507.163$00, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento e compelida a emitir o atestado previsto na cláusula 22.ª, alínea B), do CCTV em vigor (BTE n.º 33, de 08-09-1981, n.º 37, de 08-10-1983 e n.º 48, de 29-12-1984), conforme solicitado na carta de rescisão do seu contrato.

Alegou, para o efeito, e em síntese, que foi trabalhador da Ré desde 27 de Julho de 1973 até 3 de Abril de 1996, data em que rescindiu o contrato de trabalho com invocação de justa causa, por falta de pagamento de determinadas importâncias e inobservância dos seus direitos enquanto trabalhador, por parte daquela.

Contestou a Ré, sustentando a inexistência de justa causa de rescisão do contrato, a existência de caso julgado em relação a algumas das importâncias peticionadas e a inexistência de dívida relativamente a outras, pugnando, por isso, pela improcedência da acção; e em reconvenção pediu a condenação do Autor no pagamento duma indemnização no montante mínimo de 16.650.000$00 pela rescisão do contrato sem aviso prévio e por factos ilícitos, ofensa ao seu bom nome, dignidade e honra praticadas pelo Autor na vigência do contrato e ainda por abuso de direito.

Respondeu o Autor, reafirmando o constante da petição inicial e sustentando a improcedência do pedido reconvencional.

Foi proferido despacho saneador, que julgou procedente a excepção de caso julgado em relação a parte do pedido formulado pelo Autor, e elaborados especificação e questionário.

Após julgamento, foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, condenou a Ré a pagar ao Autor: « - Os montantes devidos por créditos de dias e horas como dirigente e delegado sindical, em montante a liquidar, se for caso disso, em sede de execução de sentença; - a quantia de 7.114$00 (sete mil cento e catorze escudos) relativa à diferença por trabalho efectuado em dias feriados; - a indemnização por antiguidade por rescisão do contrato de trabalho com justa causa no montante de 1.528.800$00 (um milhão quinhentos e vinte e oito mil e oitocentos escudos); - os montantes relativos às férias e subsídios de férias vencidos em 01 de Janeiro de 1996, no valor de 110.400$00 (cento e dez mil e quatrocentos escudos)».

Em relação ao pedido reconvencional, julgou-o improcedente, dele absolvendo o Autor.

Inconformados com a decisão, Autor e Ré dela interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, que por acórdão de fls. 962 a 1010 julgou improcedente o recurso do Autor e parcialmente procedente o recurso da Ré, absolvendo-a da indemnização de antiguidade de 1.528.800$00 em que havia sido condenada na 1.ª instância, reduzindo ainda o valor do montante relativo às férias vencidas em 1 de Janeiro de 1996, ao subsídio de férias e aos proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal desse ano para 87.423$00 - actualmente € 436,06 - em vez do valor de 110.400$00 constante da decisão recorrida.

II - De novo irresignados, Autor e Ré vieram recorrer de revista.

O Autor formulou as seguintes conclusões: 1. Considerou o Tribunal da Relação de Lisboa que não se apuraram factos nesta acção donde seja lícito concluir que a recorrida discriminava salarialmente o recorrente, entendida esta discriminação como violação do princípio constitucional de "para trabalho igual, salário igual ", constante do artigo 59°, nº 1, alínea a), da CRP.

  1. A quantidade de trabalho prestada relativamente aos outros trabalhadores da mesma categoria tem que ser aferida em termos de permanência do trabalhador na empresa e ao trabalho que lhe é atribuído.

  2. O Recorrente encontrava-se frequentemente ausente por força da sua actividade sindical.

  3. O Recorrente não executava o trabalho que lhe era vedado pela entidade empregadora.

  4. Quanto ao pedido de indemnização por violação do direito de férias, considerou o Tribunal a quo que não houve violação desse direito porque não se demonstrou que a marcação das férias resultava de necessidades escolares.

  5. Nos termos da legislação então vigente (Lei 26/81, de 21/08), "os trabalhadores-estudantes têm direito a marcar as férias de acordo com as suas necessidades escolares, bastando, para poder beneficiar de tal regalia, fazer prova, junto da entidade empregadora da condição de estudante, apresentar o horário escolar, comprovar a assiduidade às aulas, e o aproveitamento escolar. Ora, todos estes requisitos foram satisfeitos pelo recorrente, como se demonstra nos autos (cf. fls. 121 a 130; fls. 390 a 397; e fls. 639 e 640) .

  6. O facto de a recorrida ter recusado a marcação do período de férias proposto pelo recorrente, obstando com esse comportamento ao respectivo gozo, só por si, seria suficiente para que o mesmo pudesse invocar violação do seu direito de férias, com direito a receber a correspondente violação.

  7. A Recorrida descontou ao Recorrente o montante correspondente às faltas por este dadas no exercício da sua actividade sindical.

  8. O acórdão do Tribunal da Relação debruçou-se sobre a questão do "desconto por faltas injustificadas" (cf.. pág. 26 e 29), quando a questão a apreciar é sobre desconto indevido de faltas justificadas (cf.. pág. 5 das alegações do A. entregues na Relação), pelo que deve considerar-se nula a decisão (cf.. art. 668°. n° 1, al. d) e art. 721°, n° 2 do C.P.C.).

  9. Como se demonstrou nas alegações entregues naquele Tribunal da Relação (cf. alegações do A., n° 3, fls. 5), as faltas foram devidamente justificadas, pelo que foram indevidamente descontadas.

  10. A rescisão do contrato de trabalho por parte do trabalhador com justa causa dá lugar ao pagamento de indemnização.

  11. A norma que estabelece a indemnização dos delegados e dirigentes sindicais é definida nos números 1 e 2 do art. 24° e no art. 35°, ambos do DL 215-B/75, de 30/04, e não nas normas invocadas na decisão da Relação (nº 3 do art. 13.º e art. 36° da citada Lei dos despedimentos).

  12. É em dobro o montante da indemnização a pagar ao recorrente, como delegado e dirigente sindical, pela cessação do contrato de trabalho.

  13. O Recorrente enviou carta à Recorrida invocando as causas que tornou praticamente impossível a continuação do vínculo laboral e que determinaram o despedimento.

  14. Nessa carta, nos termos do art. 34°, nº 2 do DL 64-A/89, de 27/02, os factos deverão ser referidos sucintamente, tal como fez o Recorrente.

  15. O Tribunal da Relação, contrariamente ao decidido pela 1.ª Instância, considerou não existirem fundamentos suficientes para a rescisão do contrato de trabalho.

  16. Decisão com a qual não concordamos. Senão vejamos: 18. A fixação do comunicado da gerência proibindo a recepção e emissão de telefonemas destinou-se apenas ao Autor e não aos outros trabalhadores da Ré, pelo que constitui um acto discriminatório.

  17. A afixação e divulgação pública de um ofício apelidando o recorrente de desonesto assume contornos injuriosos, e é revelador de uma atitude de quebra de respeito para com o Autor, tal como reconhece o acórdão da 1.ª Instância, e violador do art. 19°, al. a), do Dec. n° 49.408, de 24.11.69.

  18. A recorrida afixou no placard das sanções da empresa uma sanção disciplinar de repreensão simples que aplicou ao Recorrente, considerando-a o Recorrente de abusiva.

  19. Essa afixação é considerada abusiva uma vez que não tendo ocorrido a prática de qualquer infracção disciplinar, é manifestamente ilegal a sanção disciplinar aplicada ao recorrente.

  20. A Relação não se pronunciou sobre questão que deveria ter apreciado (se a sanção era ou não abusiva), e, ao invés, conheceu de questões de que não deveria tomar conhecimento, pelo que também neste particular deverá considerar-se nula (cf. art. 668°, n° 1, al. d) do C.P.C.

  21. A Recorrida pagava ao Recorrente o vencimento por cheque enquanto que aos outros funcionários o fazia por transferência bancária.

  22. O salário correspondente ao mês de Março foi pago ao Recorrente mediante cheque traçado datado de 31 de Março, não podendo desconhecer a Recorrida que o dinheiro só viria a ficar disponível na conta daquele quatro a cinco dias úteis depois de depositado.

  23. Procedendo daquela forma considera-se que a Recorrida não procedeu ao pagamento pontual da retribuição.

  24. A Recorrida referenciava o Recorrente nos talões de vencimento como empregado de mesa de 2.ª, sabendo e não podendo desconhecer que sua categoria era a de empregado de mesa de 1ª.

  25. Tal procedimento revela da parte da Recorrida um tratamento desrespeitoso violador do art. 19°, al. a) da LCT.

  26. A Recorrida fornece fardamento aos seus empregados de mesa, designadamente calças e camisas.

  27. A Recorrida recusou fornecer ao Recorrente essas calças e camisas.

  28. Essa recusa constitui um acto desrespeitoso, e discriminatório para com o Recorrente relativamente a todos os outros colegas.

  29. O Recorrente foi proibido de exercer parte das suas funções (mini-bares), ocorrendo uma violação por parte da Recorrida das garantias legais ou convencionais.

  30. Tendo que ser efectuado diariamente, não foi alegado e provado que os serviços de mini-bares teriam que ser feitos sempre pela mesma pessoa.

  31. Logo, as frequentes ausências do Recorrente não podiam justificar a não atribuição de tais tarefas quando o mesmo se encontrava a trabalhar.

  32. Do exposto, entendemos resultar verificada a justa causa para a rescisão do contrato de trabalho.

  33. Ao decidir como decidiu o Tribunal da Relação violou, designadamente os artigos 340, nº 2, art. 35°, nº 1, alíneas b) e f), do DL 64-A/89; art. 24° , nºs 1 e 2, e art. 350.º, ambos do DL 215-B/75, de 30/04; art°s 1° e 3° do Decreto n° 263/76, de 08/04; art. 13.º e art. 55.º, n° 2, ambos da CRP; art. 659°, n° 2 e art. 668°, n° 1, al. d), ambos do CPC; art. 19° alíneas a), c), d) f), do Dec. 49.408, de 24.11.69; Por sua vez, a Ré apresentou as seguintes conclusões: 1. Na douta sentença do...

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