Acórdão nº 07P4640 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Janeiro de 2008
Magistrado Responsável | SANTOS CARVALHO |
Data da Resolução | 10 de Janeiro de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.
A e B foram julgados pelas Varas de Competência Mistas de Setúbal no âmbito do processo comum n.º 878/02.3TASTB, por lhes vir imputada a prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, agravada pelo resultado, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 143.°, n.º 1, 144.°, alínea d), 145.°, n.º 1, alínea b) e 146.º, n.ºs 1 e 2, com referência ao art.º 132.°, n.º 2, al. a), todos do Código Penal. Por acórdão de 18 de Abril de 2007, foram ambos absolvidos do crime que lhes era imputado e, quanto ao arguido A foi ainda declarado extinto o procedimento criminal pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. no art.º 143.º, n.ºs 1 e 3, do CP, atento o disposto nos art.ºs 113.º e 115.º do mesmo Código e 48.º e 49.º do CPP.
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Inconformado, recorre o Ministério Público para o Supremo Tribunal de Justiça e, após motivação, conclui do seguinte modo (transcrição): 1- O presente recurso restringe-se à apreciação da matéria de direito.
2- Desde logo, se discorda da subsunção legal a um crime de natureza semi-pública (dependente de queixa), antes se configurando um crime preterintencional de natureza pública, sendo certo que, é nula a decisão, por omissão de pronúncia e, falta de fundamentação, quanto ao dolo do resultado.
3- Na verdade, a "Motivação" da matéria de facto é omissa, limitando-se o "Direito" afastar a subsunção legal em causa.
4- Na verdade, ambos os arguidos se encontravam acusados da prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, agravada pelo resultado, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 143°, n.º 1, 144°, al. d), 145° n.º 1, al. b) e 146° n.ºs 1 e 2, com referência ao art.º 132° n.º 2, al. d), todos do Código Penal.
5- Deu-se apenas como provado que o arguido A agiu com dolo relativamente ao crime de ofensas à integridade física simples.
6- Mas, decorre também do relatório de autópsia (fls. 22 e ss.) que, a causa da morte ocorreu por laceração do mesentério e resultaram de traumatismo de natureza contundente no abdómen onde se alojam órgãos vitais, sendo que as lesões produzidas são idóneas a produzir a morte.
7- Assim, face às conclusões do relatório de autópsia, o resultado/dano das agressões à vítima sempre se teriam de equacionar, em termos de dolo ou negligência, para além do dolo relativo ao crime de ofensas à integridade física simples, ou seja, sempre se teria de fundamentar em termos de dolo, o que tem sido entendido na doutrina e jurisprudência como um crime preterintencional (vide, entre outros, os Acs. do STJ, de 07/03/90- P° n.º 040612, in WWW.DGSI.PT) e do TRP, de 07/10/92- P° n.º 9240314 in WWW.DGSI.PT).
8- E, assim, mesmo a entender-se que apenas foram provadas ofensas simples à integridade física sempre se teria de fundamentar, em termos de dolo: Ou a sua subsunção ao art.º 145° n.º 1, al. a) do Código Penal - ofensas corporais simples de que resulta a morte, ou a sua subsunção ao art.º 145° n.º 2 do Código Penal - ofensas corporais simples de que resultam lesões graves (designadamente, a prevista na al. d) do art.º 144° do Código Penal - provocar perigo para a vida).
9- E, qualquer destas disposições legais têm natureza pública vide Ac. do TRP, de 16/01/02- P° n.º 0141092 in WWW.DGSI.PT).
10- Assim, não poderia o Tribunal Colectivo ter sustado a apreciação dos factos apenas como argumento de que estava só em causa um crime de que dependia de queixa! 11- Assim, ainda que se entenda que a prova se confina às ofensas corporais simples, verifica-se a nulidade da decisão recorrida, por falta de fundamentação da decisão e, por omissão de pronúncia quanto ao dolo do resultado (o que constitui motivo de recurso, nos termos dos art.ºs 379° n.ºs 1, al. c) e, 2 e, 410° n.º 3 do Código de Processo Penal).
12- Pelo que, se impõe a revogação da decisão em causa, com nova decisão em conformidade, ou repetição do julgamento para cabal apuramento dos factos omissos.
13- Foram, assim, violadas, entre o mais, as disposições previstas nos art.ºs 143°, n.º 1, 144°, al. d), 145° n.ºs 1, al. a) e 2 designadamente com referência à al. d) do art.º 144° do Código Penal.
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Os arguidos não responderam ao recurso e a Excm.ª P.G.A. neste Supremo requereu a audiência.
O relator, porém, entendeu que se verifica uma insuficiência da matéria de facto para a decisão, por não se ter apurado se há ou não nexo de causalidade entre as agressões perpetradas pelo arguido A e as lesões que causaram a morte à vítima, o que constitui o vício previsto na al. a) do n.º 2 do art.º 410.º do CPP e, assim, por não ser possível decidir da causa, há que reenviar o processo para novo julgamento parcial, relativamente a esse arguido, pois em relação ao co-arguido deve considerar-se transitada a absolvição, por não ter o recorrente impugnado a matéria de facto provada. Assim, mandou os autos à conferência.
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Colhidos os vistos e realizada a conferência com o formalismo legal, cumpre decidir.
MATÉRIA DE FACTO FACTOS PROVADOS 1- A hora não concretamente apurada, na noite de 17 para 18 de Maio de 2002, os arguidos A e B encontravam-se no Snack-Bar "Alternativa", sito na Rua ................, em Setúbal.
2- Nesse estabelecimento, para além de outros clientes, encontravam-se C acompanhado de um outro indivíduo de nacionalidade brasileira.
3- A dada altura, por razões não apuradas, verificou-se uma contenda, com agressões físicas entre vários dos clientes que se encontravam naquele estabelecimento.
4- Nessa sequência o arguido A colocou as mãos no peito do C e empurrou-o.
5- Entretanto, o C saiu do bar e dirigiu-se à sua residência, que dista poucos metros do local, sita na Rua do .........
6- O arguido A encaminhou-se na direcção de C, logrando alcançá-lo já no exterior do estabelecimento, tendo-se agarrado e agredido mutuamente, de forma não apurada, até que foram separados por D.
7- No momento em que foram separados, o C encontrava-se no chão, de joelhos, agarrado à cintura do arguido A, com as costas encostadas a uma viatura automóvel estacionada a poucos metros da porta da sua residência.
8- C deslocou-se de seguida para a sua residência, sita na Rua do ........., cerca das 00h52m do dia 18 de Maio de 2002.
9- C foi encontrado já cadáver, na sua residência na manhã do dia 19 de Maio de 2002, apresentando o seu corpo as seguintes lesões: - equimose de cor roxa ocupando a pálpebra superior do olho esquerdo; - ferida contusa situada no supracílio esquerdo medindo 4 cm; - duas escoriações situadas na face anterior do joelho esquerdo medindo, cada uma delas, 1 cm; - laceração do mesentério, infiltração hemorrágica do mesentério; - hemoperitoneu que originou hemorragia interna com derramamento de 3000 cc de sangue para a cavidade peritoneal; - peritonite; e - edema cerebral acentuado.
10- As quais foram causa directa e...
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