Acórdão nº 07P3749 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Dezembro de 2007

Magistrado ResponsávelSANTOS CABRAL
Data da Resolução13 de Dezembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça O arguido AA foi condenado nos autos de processo comum colectivo n.º 226/02.2 P6PRT, da 2ª Vara Criminal do Porto nas seguintes penas a) Pela prática de um crime de burla agravada p. e. p. pelo art.º 217.º e 218.º n.º 2 al. a) do C. Penal na pena de 3 anos e 6 meses de prisão; b) Pela prática de um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo art.º 256.º n.º 1 als. a), b) e c) e n.º 3° do C. Penal, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão.

c) Em cúmulo jurídico foi condenado na pena única de 4 anos de prisão.

O arguido e o Ministério Público interpuseram recurso para o Tribunal da Relação do Porto que decidiu pela improcedência daquele e parcial procedência deste considerando que tem de concluir-se que o arguido cometeu três crimes de burla qualificada, em concurso com três crimes de falsificação de documento, também agravado.

Consequentemente, condenou o recorrente AA pela forma seguinte: Factos em que é ofendido BB · Pela prática de um crime de burla qualificada, na pena de dois anos e seis meses de prisão; · Pela prática de um crime de falsificação de documento, na pena de um ano e seis meses de prisão.

Factos em que é ofendido CC · Pela prática de um crime de burla qualificada, na pena de três anos de prisão; · Pela prática de um crime de falsificação de documento, na pena de um ano de prisão.

  1. Factos em que é ofendido DD o Pela prática de um crime de burla qualificada, na pena de dois anos e seis meses de prisão; o Pela prática de um crime de falsificação de documento, na pena de um ano de prisão.

    Em termos de cúmulo jurídico o arguido foi condenado na pena unitária de seis (6) anos de prisão.

    Interpõe agora o arguido recurso para este Supremo Tribunal de Justiça invocando as seguintes razões de discordância constantes das conclusões da sua motivação de recurso: 1- Dos depoimentos das testemunhas e dos documentos existentes nos autos, não existe prova de que o arguido foi o autor da falsificação dos vários documentos e das actas das assembleia da "......, S. A."; 2- O uso de tais documentos jamais poderá constituir prova da falsidade; 3- Com excepção do conhecimento da SISA utilizado na escritura pública de compra e venda, não se poderá dizer, com segurança, que a acta e as certidões registrais foram falsificadas; 4- Uma certidão registral requisitada, apenas, para as descrições em vigor, não comporta as inscrições referentes aos encargos e outras anotações; 5- E é um documento autêntico; 6- A existirem folhas do livro de actas assinadas em branco, como consta. da prova, a acta em causa poderá ser abusiva, mas nunca falsa; 7- Não existe qualquer exame pericial, mormente grafológico, que ateste as alegadas falsificações; 8- Não se sabe se o arguido tinha ou não conhecimento das aludidas falsificações; 9- Prova disto é que nem o advogado que elaborou o contrato promessa de compra e venda do Sr. DD, nem a Sr.ª Notária que elaborou a escritura pública de compra e venda, notaram tais alegadas falsificações; 10- Estas, de tão perfeitas, não poderiam ser executadas pelo arguido; 11- Contrariamente ao que afirmado vem no, douto, acórdão recorrido, o interesse manifestado pelo arguido no uso dos documentos, não permite, nem legitima, que por ele se conclua que foi o arguido o, alegado, falsificador ou autor moral de tal; 12- Pese embora os documentos em causa fossem úteis ao arguido para a concretização dos seus, aqui, aludidos negócios, não foram o instrumento essencial para tal; 13- Os negócios em causa, com excepção da escritura pública, teriam sido realizados da mesma forma, apenas, com os argumentos do arguido; 14- Não pode, assim, ser o arguido condenado pela prática do crime de falsificação ou uso de documentos falsos, em face da prova produzida; 15- Os crimes de burla verificam-se e, por eles se penitencia o arguido; 16- Não foram cometidos de forma gratuita, mas motivados pelo seu estado de necessidade financeira, em face da falência da sua empresa-"......, S. A."- e da perca do seu salário; 17- Isto não ficou provado objectivamente, mas resulta presuntivamente do contexto dos autos e dos factos dados como comprovados; 18- O arguido não prestou declarações em audiência de julgamento, mas está arrependido dos factos que cometeu; 19- Está a diligenciar para ressarcir os lesados dos prejuízos que a sua conduta lhes causou; 20- Estes prejuízos, pese embora o contido no art. 202°, alínea b) do C. Penal, não são de valores consideravelmente elevados, em face da realidade social verificada; 21- Com a devida vénia, o Tribunal Colectivo e o Venerando Tribunal da Relação, não ajustaram a lei ao tempo e classificaram mal o factor dano ou prejuízo; 22- Ao não considerar a actualidade verificada não fizeram uma interpretação correcta da lei; 23- Com a sua conduta o arguido cometeu, apenas, um só crime continuado de burla; 24- Nos termos do, douto, acórdão da 1ª Instância, sem prescindir, apenas, cometeu um crime de falsificação e outro crime de burla; 25- Com a devida vénia, as conclusões retiradas pelo Venerando Tribunal da Relação sobre a autoria dos crimes de falsificação são precipitadas e incorrectas.

    26- Se houve qualquer crime de falsificação, este não visou causar prejuízo a quem quer que fosse, mas tão só a elaboração e outorga da escritura pública de compra e venda, bem como do contrato promessa de compra e venda; 27- Os crimes praticados pelo arguido constituem um só crime continuado; 28- Verificam-se em relação a eles os pressupostos legais da realização plúrima; da protecção fundamental do mesmo bem jurídico, da homogeneidade da execução e da existência de uma situação exterior que diminui consideravelmente a sua culpa; 29-Os crimes cometidos são da mesma natureza; o bem jurídico em causa é o mesmo, ou seja, o património dos lesados; 30- A execução da actividade criminosa é sempre a mesma e tem sempre as mesmas características, planificação e utilização de meios; 31- A estratégia é sempre a mesma e, no fundo, a resolução criminosa do arguido é só uma; 32- Há uma resolução para todos os negócios; 33- Isto prova-o os documentos, ditos, falsos existentes, que foram sempre os mesmos; 34- O arguido não forjou ou utilizou documentos diversos para cada um dos negócios, como, contrariamente, resulta do, douto, acórdão recorrido, nem da prova tal se poderá concluir; 35- Assim, na perspectiva da existência de crimes de falsificação e burla, o entendimento a perfilhar será o do, douto, Tribunal Colectivo e não o do, douto, acórdão recorrido; 36- O arguido haverá, por ele, de ser condenado pela prática de um só crime de falsificação e de um só crime de burla; 37- No nosso entender, ao não existir prova da prática do crime de falsificação haverá de ser condenado pela prática de um só crime de burla, por forma continuada; 38- De qualquer forma, quer a pena aplicada pelo Tribunal Colectivo, quer a pena aplicada, agravada, pelo Venerando Tribunal da Relação, resultam exageradas e não obedecem ao espírito, nem à letra, do art. 40°, nº 1, do C. Penal; 39- A pena ultrapassa, seguramente, a medida da culpa e briga, assim, com os direitos de personalidade do arguido, sendo inconstitucional; 40- Em vez de contribuir para a reintegração do arguido na sociedade, afasta-o dela; 41- 6 anos de prisão para a fisionomia deste crime, corresponde a - do máximo da pena prevista no nº 2 do art. 218° do C. Penal; 42- Não se provou que a pessoa prejudicada tivesse ficado em situação económica difícil, nem que o arguido faça da burla o seu modo de vida; 43- O prejuízo patrimonial, para nós, não é consideravelmente elevado, em face da evolução sócio-económica verificada; 44- Não foi considerada a atenuante contida na alínea d), do nº 2 do art. 72° do C. Penal; 45- Não foram atendidas as circunstâncias atenuantes contidas nas alíneas c); d) e e) do nº 2 do art. 71 do C. Penal; 46- As condições pessoais do arguido e a sua situação económica nem sequer foram apuradas, para apurado ser o móbil do crime; 47- O crime praticado pelo arguido foi motivado; 48- E a situação exterior que, no caso concreto, diminui consideravelmente a culpa, também, não foi apurada e deveria ter sido; 49- Tal situação corporiza o acesso fácil e permanente que o arguido tinha, quer às pessoas, quer aos documentos da empresa e dos imóveis; 50- O arguido é boa pessoa e estimado no meio social onde vive; 51- A pena não privativa da liberdade, seria suficiente para proteger os bens jurídicos e a reintegração do arguido em sociedade; 52- O arguido, contrariamente, ao que vem plasmado no, douto, acórdão recorrido, fls 47, não necessita de auxílio para evitar voltar a delinquir, mas, se necessitasse, não era com pena tão longa e efectiva que o iria conseguir, sabendo nós como são as prisões.

    53- Com a devida vénia, a Sr.ª Notária foi enganada porque quis, como enganado, porque quis, foi o advogado que lavrou o contrato promessa de compra e venda; 54- Pelo que se vê, as falsificações são grosseiras para os entendidos. Não poderiam passar se houvesse rigor de procedimentos; 55- O arguido não revela carência de socialização, por isso a pena deverá ter a função de advertência; 56- Com o devido respeito, os antecedentes criminais do arguido não são relevantes para a medida da pena; 57-Com o devido respeito, a atitude do arguido é a de mero delinquente ocasional e nele não se vê qualquer profissionalismo, como, a nosso ver, erradamente consta do, dou to, acórdão; 58- As penas parcelares aplicadas pela falsificação totalizam mais de 2/3 da pena máxima consignada na lei; 59- Considerando a letra e o espírito da norma do art. 77°, nºs 1 e 2 do C. Penal, a pena a aplicar deverá ser a de 3 (três) anos, por ser a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes; 60- Com o seu, douto, acórdão não fez, com o devido respeito, o Venerando Tribunal da Relação do Porto ou sequer o, domo, Tribunal Colectivo, quanto à medida da pena, uso e cabal interpretação das normas contidas nos art.s 217°; 218°; 256°, nºs 1, alínea a) e...

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