Acórdão nº 07B1522 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Dezembro de 2007

Magistrado ResponsávelPEREIRA DA SILVA
Data da Resolução07 de Dezembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. a) A Juíza de Direito AA, interpôs, a 07-04-12, recurso contencioso do acórdão do Plenário do Conselho Superior da Magistratura, de 07-03-06, com o teor que ressuma de fls. 24 e segs., que lhe atribuiu a classificação de "Medíocre", pelo seu desempenho funcional, na 3ª Secção do 5º Juízo Criminal da Comarca de Lisboa, no lapso de tempo compreendido entre 02-12-03 e 06-03-23, nos termos e com os fundamentos seguintes: I - Objecto do recurso e pressupostos 1º O acto recorrido é, como se disse, o douto Acórdão do Plenário do Conselho Superior da Magistratura, de 6 de Março de 2007, que, em resultado da Inspecção extraordinária nº 208/2006, atribuiu à Recorrente a classificação de "Medíocre" - de que se junta fotocópia como doc. 1. 2ºA Recorrente é directamente visada e lesada pelo douto Acórdão recorrido, pelo que tem legitimidade. 3ºA Recorrente foi notificada do acto recorrido em 14.03.2007, pelo que está em tempo - art. 169º do Estatuto dos Magistrados Judicias (EMJ).4ºO Tribunal é competente, nos termos do art. 168º, nº 1, do referido EMJ. II - Enquadramento5ºA Recorrente foi objecto de Inspecção Judicial extraordinária ao serviço por si prestado na 3ª Secção do 5º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, no período compreendido entre 3 de Dezembro de 2002 a 23 de Março de 2006. 6ºO Ex.mo Inspector Judicial elaborou Relatório propondo a classificação de "Suficiente", classificação que a Recorrente aceitou, não usando da faculdade de responder, por entender que a classificação proposta não era injusta (cfr. fls. 1 do douto Acórdão recorrido, doc. nº1).7º O Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura (CSM), na sessão de 26 de Setembro de 2006, deliberou não homologar a classificação proposta e remeter o processo aos vistos para uma análise mais aprofundada (referido doc. 1). 8ºPor douto Acórdão de 6 de Março de 2007, o Plenário do CSM deliberou atribuir à ora Recorrente a classificação de "Medíocre". 9ºO douto Acórdão é, no entender da Recorrente e salvo o devido respeito, manifestamente ilegal, como de seguida se procurará mostrar: III. Da ilegalidade do douto Acórdão recorrido, por violação do direito de audiência. 10ºNão obstante o ofício de notificação do douto Acórdão recorrido referenciar que "foi homologada a classificação de "Medíocre" que lhe havia sido proposta pelo Exmo Senhor Inspector Judicial", a verdade é que, como ficou dito e resulta do Relatório da Inspecção, a classificação proposta foi de "Suficiente". 11ºTal classificação não foi homologada, tendo sido substituída pela classificação de "Medíocre". 12ºAcontece que o Plenário do CSM procedeu à substituição da classificação da ora Recorrente sem lhe dar oportunidade de ser ouvida sobre a mesma. 13ºAo fazê-lo, o Plenário do CSM violou o direito de audiência da Recorrente, violação que assume, no caso em apreço, contornos de especial gravidade. Com efeito, 14ºEm primeiro lugar, como vimos, a ora Recorrente não usou da faculdade de responder à classificação de "Suficiente" proposta pelo Exmo. Inspector, porque não a considerou injusta. 15ºOutro entendimento a Recorrente teria tido e por isso ter-se-ia pronunciado se a classificação proposta fosse a que veio a ser atribuída. 16ºCom efeito, enquanto a classificação de "Suficiente" equivale ao reconhecimento de que o juiz possui as condições indispensáveis para o exercício do cargo e que o seu desempenho funcional foi apenas satisfatório (cfr. o art. 16º, nº 1, do RIJ), a atribuição de "Medíocre" equivale ao reconhecimento de que o juiz teve um desempenho funcional aquém do satisfatório e a sua atribuição determina, além da suspensão do juiz , a abertura de inquérito para averiguar a eventual inaptidão para o respectivo cargo [art. 16º, nº 1, alínea e), e nº 5 do RIJ]. No mesmo sentido, cfr. o art. 34º, nº 2, do EMJ. 17ºFoi, por conseguinte, com manifesta e justificada surpresa que a ora Recorrente recebeu a notícia da substituição da classificação que havia sido proposta. 18ºPor outro lado, como ficou dito, além de o "Medíocre" se traduzir na classificação mais baixa que pode ser atribuída a um magistrado judicial, a atribuição desta classificação implica a suspensão do exercício de funções do magistrado. 19ºTemos assim, em segundo lugar, que a atribuição desta classificação sem a audiência do interessado, se traduz na aplicação de uma sanção administrativa de forma automática e sumária, o que é contrário aos princípios consignados na Constituição da República Portuguesa, como adiante se verá. Senão vejamos: 20º A suspensão do exercício de funções, na sequência da aplicação da classificação de "Medíocre", traduz-se na restrição do direito ao exercício da habilitada desde 1985. 21ºArgumentar-se-à tratar-se de medida provisória, de natureza cautelar, que a lei enxerta no início de um procedimento - a instauração de inquérito por inaptidão para o exercício de funções (nº 2 do art. 34º do EMJ) - durante o qual a ora Recorrente terá oportunidade de deduzir a sua defesa. 22º Acontece que, precisamente nas situações em que a medida repressiva ainda que cautelar afecte o mesmo direito, liberdade ou garantia que poderá vir a ser alcançado por sanção administrativa subsequente - antecipando, no fundo, a sanção administrativa geral - ela deve ser imposta após audiência dos interessados, sobretudo quando tal facto não implicar risco para a eficácia da medida. Neste sentido, cfr., por exemplo, MARCELO MADUREIRA PRATES, Sanção Administrativa Geral: Anatomia e Autonomia, Almedina, Coimbra, 1955 - 2005, pp. 200 e 201. 23ºAinda segundo o mesmo autor, somente assim se evitará que "a medida repressiva imposta seja confundida com uma sanção administrativa automática, sumária e de tempo indeterminado..." (cfr. a obra e local citados). 24º Ora é precisamente o que se passa no caso em apreço. 25ºNão tendo a atribuição da classificação de "Medíocre" sido precedida da audiência da Recorrente, esta viu-se de forma inopinada inibida do exercício das funções de magistrada, por força da lei, isto é, de forma automática e sumária. 26ºAinda que se trate de medida repressiva de natureza cautelar, a sua aplicação de forma automática, com dispensa da audiência da interessada, somente poderia ocorrer fundada num juízo de indispensabilidade para assegurar a eficácia da medida, o que não se verifica no caso dos autos. 27º Com efeito, verifica-se não existirem nem terem sido invocadas razões inovadoras que sejam de molde a justificar o afastamento imediato da ora Recorrente do exercício das suas funções, designadamente por estar em causa a salvaguarda do serviço ou o prestígio e dignidade da função. 28ºNa verdade, no caso dos autos, o Relatório da Inspecção não chegou a resultados muito diferentes de Relatórios anteriores. 29º Na Inspecção ao seu trabalho realizado no 5º Juízo Criminal de Lisboa no período de 6 de Junho de 1994 a 19 de Janeiro de 1998, a ora Recorrente obteve a classificação de "Suficiente". 30ºNo que se refere às eventuais repercussões para o serviço, no Relatório então produzido são assinalados os atrasos verificados no andamento dos processos em virtude das sucessivas faltas ao serviço da ora Recorrente. 31ºA fls. 8 do mencionado Relatório (doc. nº 2) pode ler-se que "As faltas ao serviço, fundamentalmente por doença, da Sra. Juíza, levaram a que a leitura oportuna da sentença tivesse deixado de ocorrer em múltiplos processos."...

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