Acórdão nº 07P3987 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Novembro de 2007

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA MENDES
Data da Resolução28 de Novembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça No âmbito do processo comum com intervenção do tribunal colectivo n.º 167/06, da 3ª Vara Criminal de Lisboa, AA, com os sinais dos autos, foi condenado como autor material, em concurso real, de um crime de roubo agravado e de um crime de coacção grave na pena conjunta de 4 anos de prisão - (1).

Mais foi condenado pela prática de dois crimes de detenção de arma proibida e de um crime de detenção ilegal de arma de defesa na pena conjunta de 180 dias de multa à taxa diária de € 5.

O arguido interpôs recurso.

São do seguinte teor as conclusões extraídas da respectiva motivação: 1. O Tribunal a quo fez errónea interpretação dos Arts 154 e 155, n.ºl a) do Cod. Penal, ao ter subsumido juridico-penalmente a conduta do arguido ao crime de coacção grave.

2. Importa pois saber quais os factos que a decisão sob censura considerou, para dar como provado, ter o arguido cometido o crime de coação grave: - «De seguida, o arguido apanhou um táxi conduzido por BB, encostou-lhe a arma de fogo supra descrita à cabeça, dizendo. "Siga rápido"» - «Receoso pela sua vida, o condutor de táxi obedeceu, tendo passado vários semáforos em violação do sinal vermelho, pois tal lhe era ordenado pelo arguido.» - «Durante o percurso o veiculo de táxi foi sempre seguido por alguns veículos de táxi e pela PSP, que haviam sido alertados para a situação, tendo finalmente o veiculo d táxi sido imobilizado quando se encontrava junto ao viaduto da Av. EUA e o arguido sido capturado na posse dos objectos furtados.» - «Mais obrigou BB a transportá-lo no veiculo deste último de forma a fugir às autoridades policiais que vinham no seu encalço, utilizando para tanto a ameaça de uma arma de por forma a incapacitá-lo de reagir negativamente aos seus intentos, como de resto aconteceu.» - «Agiu voluntária e conscientemente, bem sabendo que tais condutas eram proibidas por lei;» 3. O tipo objectivo deste crime consiste em constranger outra pessoa a adoptar um determinado comportamento: praticar uma acção, omitir determinada acção ou a suportar uma acção.

4. Os meios de coacção poderão ser apenas a violência ou a ameaça com mal importante.

Quanto à violência, a mesma poderá ser física ou psíquica e ter por objecto imediato a própria pessoa do coagido, ou de terceiros, ou sobre coisas, quer do coagido, quer de terceiros, desde que o mal causado nas coisas seja idóneo a afectar sensivelmente a liberdade de acção do coagido, de forma a constranger este a adoptar o comportamento visado pelo agente.

Quanto à ameaça com mal importante, a mesma tanto se poderá reportar à prática de um acto ilícito, como de um acto lícito e deve ser adequada a constranger o ameaçado a comportar-se de acordo com a exigência do ameaçante. A este respeito deverá ser a ameaça ser vista sob um critério ao mesmo tempo objectivo, por apelar ao juízo do homem comum e individual, na medida em que deve ter em consideração as circunstâncias concretas em que é proferido o anúncio, nomeadamente as subcapacidades do ameaçado.

5. Por outro lado, trata-se de um crime de resultado, ou seja, a consumação deste crime exige que a pessoa objecto da acção tenha efectivamente sido constrangida a praticar, a omitir ou a tolerar a acção de acordo com a vontade do coactor e contra a sua própria vontade, exigindo pois uma relação de efectiva causalidade.

6. Na verdade, atenta a prova produzida, que resultou até da própria confissão do arguido, ficou provado o uso de violência por parte deste, enquanto acto intimidatório, ao empunhar a arma de fogo e encostando-a à cabeça do taxista BB, limitando sem mais, a liberdade de acção e decisão daquele.

7. Mas a questão que se coloca é a de saber se os factos provados permitem dar-se por preenchido o tipo de ilícito em que o arguido foi condenado - o da coacção grave. p. e p. pelo Art. 155, n.º1 al.a) do CPP.

8. O preenchimento deste ilícito impõe que a coacção seja realizada por meio de ameaça com prática de crime punível com pena de prisão superior a 3 anos.

9. Ora da factualidade acolhida na decisão sob recurso, não resultou provado que o arguido tivesse ameaçado dar um tiro a BB, uma vez que a actuação por parte do arguido, provada em audiência de julgamento e transportada para a sentença revidenda, foi a de que este: «encostou-lhe a arma de fogo supra descrita à cabeça, dizendo. "Siga rápido"».

10. Foi esta actuação por parte do arguido, que causou naquele uma limitação da sua liberdade de acção. O facto de o arguido encostar a arma à cabeça do ofendido é adequada a causar a morte, através de um disparo, mas também é adequada a causar uma ofensa corporal através de uma coronhada.

11. Ora da factualidade provada não se pode extrair a ilação de que o recorrente representou e quis ameaçar o ofendido de que o matava, uma vez que este não verbalizou qualquer ameaça de morte, não foi proferida pelo arguido uma ameaçada prática de crime punível com pena de prisão superior a três anos.

12. Defende pois o recorrente que, os factos indicados em "2" integram apenas o crime de coacção p. e p. no Art. 154 do Cod. Penal.

13. A segunda questão que se coloca perante Vossas Excelências é a da medida da pena parcelar imposta ao recorrente pelo crime de roubo p. e p. pelo Art. 210, n.ºs 1 e 2, alínea b), com referência ao Art. 204, n.º 2, alíneas a) e f) do Cod. Penal, por que foi condenado.

14.A decisão sob recurso, partindo da moldura legal do crime de roubo qualificado (3 a 15 anos), fixou em três anos e seis meses a medida da pena pelo crime de roubo qualificado, em virtude de ter efectuado um errada aplicação dos princípios gerais de determinação da medida da pena.

15. Da leitura das considerações expendidas pela decisão revidenda no que respeita à determinação das penas a aplicar ao recorrente, resulta que não foram devidamente valorados os seguintes critérios para a escolha e determinação e medida da pena, estabelecidos nos Art 71 do CP -As consequências do crime -As exigências de prevenção especial -As circunstâncias que depunham a favor do arguido 16. A necessidade de prevenção positiva de reintegração do arguido é relativa, o que resulta do que ficou provado quanto ás suas condições pessoais.

l7. Ora, do conjunto dos factos apurados em sede de julgamento e das circunstâncias que rodearam os factos: " num contexto de desespero motivado por dificuldades de índole económica"permitem indiciar uma situação de ocasionalidade quanto aos crimes em causa, que não radicam na personalidade do arguido, sendo ainda que o crime de coacção no quadro circunstancial em que foi cometido, revelou-se acessório ao crime de roubo que o antecedeu.

18. Por sua vez, todo o percurso de vida do arguido até à data em que praticou os factos: «Ao arguido completou o 12° ano de escolaridade com 17 anos de idade. (...) Iniciou a sua vida profissional com 19 anos, como vendedor de automóveis e motos. Dois anos depois surgiu-lhe uma melhor oferta de emprego, na área do cinema e audiovisual, na qual desempenhou funções de assistente de produção em várias produtoras. Manteve esta actividade até Outubro de 2003, altura em que foi trabalhar como assistente de realização na RTP, tendo nesta estação de televisão progredido na carreira e alcançado o cargo de chefe de produção de cinema." É revelador de uma personalidade conforme com as regras de direito, o que decorre ainda da circunstância de se tratar de um arguido criminalmente primário.

19. Segundo as condições socio-económicas e pessoais do arguido, provadas: No tocante à esfera afectiva conheceu a namorada em 2004, desempenhava a função de cabeleireira na RTP, com a qual contraiu matrimónio em Março de 2006. Reside, juntamente com o cônjuge e a filha de um mês, numa habitação que comporta uma renda mensal de € 900,00 e apresenta boas condições de habitabilidade. A dinâmica intra familiar afigura-se equilibrada e a relação do casal aparentemente gratificante e envolvente do ponto de vista emocional, embora, a determinado momento, tenha sido fortemente abalada pelas dificuldades económicas, em virtude do casal ter contraído dívidas superiores aos rendimentos. A cônjuge, pouco tempo após o nascimento da filha iniciou a sua actividade profissional, onde aufere cerca de € 3000,00 mensais, assumindo o arguido os cuidados com a menor, já que esta fica em casa consigo. Actualmente o casal tem conseguido fazer face ás suas despesas,"permitem concluir que o arguido, revela-se uma pessoa familiar e socialmente inserida, com referências culturais, mostrando um modo de vida com noção dos limites sociais e convencionais.

20. Por outro lado, revela ainda o arguido uma consciência critica do desvalor da usa conduta desvalor: «O arguido mostrou-se muito arrependido em audiência de julgamento», tendo confessado "na globalidade os factos apurados e a si imputados" 21. Na consideração da situação concreta, como elementos ou factores a reflectirem-se na culpa, a gravidade da ilicitude, a intensidade do dolo, os fins que determinaram o criem, nas condições pessoais do agente e sua situação económica e de todo os demais condicionalismo mencionado, não só no corpo, como nas respectivas alíneas do n.º 2 do Art. 71 do Cod. Penal, tudo ponderado, numa moldura penal abstracta que vai de 3 a 15 anos de prisão, deverá a pena pelo crime de roubo ser reduzida, e fixada em três anos de prisão.

22. O Tribunal de 1ª Instância decidiu em cúmulo jurídico, englobando as penas parcelares de, três anos e seis meses de prisão em que condenou o arguido pela prática de um crime de roubo p. e p. pelo Art. 210, n.ºs 1 e 2, alínea b), com referência ao Art. 204, n.º 2, alíneas a) e f) do Cod. Penal, e de 1 ano e seis meses de prisão, pela prática de um crime de coacção grave, p. e p. pelos Arts. 154 e 155, n.º1, a) do Cod. Penal, condenar o arguido, na pena única de Quatro anos de prisão; (sublinhado nosso).

23. Ora, dispõe o Art. 77 do Cod. Penal que «quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT