Acórdão nº 07S1802 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Novembro de 2007

Magistrado ResponsávelVASQUES DINIS
Data da Resolução14 de Novembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

"AA" instaurou, em 7 de Maio de 1999, no Tribunal do Trabalho de Sintra, contra "Empresa-A, S.A", acção com processo comum emergente de contrato de trabalho, pedindo: - Se declare que o Autor rescindiu com justa causa o contrato de trabalho que o ligava à Ré; - Se condene a Ré no pagamento ao Autor das importâncias correspondentes a: - i) diferenças salariais resultantes do acréscimo salarial constante do despacho do Director Geral da Ré, no valor de 100.000$00 mensais, até 10 de Novembro de 1998, e respectivo subsídio de refeição - Esc.: 1.680.000$00; - ii) dez dias de trabalho do mês de Novembro de 1998 e respectivo subsídio de refeição - Esc.: 49.190$00; - iii) proporcionais (10/12) de retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, correspondentes ao ano de 1999 - Esc.: 1.025.000$00; e, - iv) indemnização legal - Esc.: 3.570.000$00, no valor global de Esc.: 6.424.197$00, a que deve ser deduzida a quantia de Esc.: 766.580$00, entretanto paga pela Ré, sendo devidos juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, desde 10 de Novembro de 1998 até integral pagamento.

Alegou, em síntese, que: - Foi admitido ao serviço da Ré, em 15 de Outubro de 1991, para desempenhar sob as suas ordens e direcção, as funções actualmente correspondentes à categoria profissional de Encarregado Geral do estabelecimento fabril pertencente àquela.

- Em Setembro de 1996, o Autor passou a exercer as funções de Chefe de Departamento de Aprovisionamento e Armazém que, em Junho de 1997, passou a acumular com as funções de responsável pelo Sistema de Garantia e Qualidade; - Com a alteração da categoria, em Setembro de 1996, deixou de auferir o prémio de produtividade e apesar da acumulação das funções não recebeu o aumento na sua remuneração que foi proposto pelo seu superior hierárquico; - Em Julho de 1998, foi destituído do cargo de Chefe do Departamento de Aprovisionamento e Armazém.

- Estes factos, traduzindo a violação do direito à categoria e lesão de interesses patrimoniais sérios do Autor, integram o conceito de justa causa, o que o levou a rescindir o seu contrato de trabalho.

  1. Na contestação, a Ré, pugnando pela improcedência da acção, sustentou, em substância, a inexistência de justa causa para a rescisão do contrato pelo Autor, e, em reconvenção, pediu a condenação daquele numa indemnização, por não ter, na rescisão, respeitado o prazo de aviso prévio, no valor de Esc.: 820.000$00, bem como numa indemnização por danos resultantes da rescisão, no valor de Esc.: 1.967.500$00.

    O Autor respondeu à contestação, concluindo, entre o mais, pela improcedência do pedido reconvencional.

  2. Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença, que terminou com o seguinte dispositivo: [...] Face ao exposto julga-se: A - a acção parcialmente procedente e consequentemente: - Declara-se que o Autor rescindiu o contrato com justa causa: - Condena-se a Ré a pagar ao Autor: a) 16.360,57€ (dezasseis mil trezentos e sessenta euros e cinquenta e sete cêntimos) a titulo de indemnização, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a notificação da presente sentença, até integral pagamento; b) a quantia de 8.072,65€ (oito mil e setenta e dois euros e sessenta e cinco [cêntimos]) de créditos laborais, acrescida de juros de mora à taxa legal, [a partir de] 10 de Novembro de 1998, até integral pagamento.

    B - a reconvenção improcedente e, consequentemente, absolve-se o Autor do pedido.

    [...] O Tribunal da Relação de Lisboa concedeu provimento ao recurso de apelação interposto pela Ré, absolvendo-a do pedido.

  3. Do acórdão da Relação veio o Autor pedir revista, para ver repristinada a decisão da 1.ª instância, terminando a respectiva alegação com as seguintes conclusões: 1. As questões em apreciação no presente recurso respeitam a saber se a R., ora Recorrida, ao redefinir as funções do Autor, violou ou não o disposto no[s] art.[os] 21.º, n.º 1, al. d), 22.º e 23.º do RJCIT (saber se alterou ou não unilateralmente a categoria profissional) e bem assim, se são devidos créditos salariais; 2. Entende o A. que o comportamento da ré violou as suas garantias legais, uma vez que unilateralmente alterou a sua categoria profissional e lhe diminuiu o salário; 3. O ora Recorrente possuía a categoria de chefe do departamento de Aprovisionamento e Armazém, a qual lhe foi retirada quando lhe foi atribuída a chefia do Sistema de Garantia e Qualidade; 4. Tal situação consubstancia uma alteração unilateral da sua categoria, porquanto o essencial das funções que o trabalhador se obrigou pelo contrato (categoria-função) foi alterado; 5. As funções exercidas pelo Recorrente enquanto chefe do Departamento de Aprovisionamento e Armazém não têm conteúdo substancialmente equivalente às que o Autor exerceria enquanto Chefe do Sistema de Garantia de Qualidade, como parece resultar do acórdão em crise; 6. É certo que, também, se encontra provado que o A., desde pelo menos Julho de 1997, durante mais de um ano, por determinação da Ré, exerceu funções no Gabinete Técnico, inserido no Sistema de Garantia e Qualidade. Mas, tais funções foram exercidas cumulativamente e a título acessório, conforme resulta provado (cf. ponto 27 dos factos provados), mantendo sempre o exercício da chefia do Departamento de Aprovisionamento e Armazém, a sua actividade principal; 7. Entende o acórdão ora em crise que "esta acumulação de funções explica-se pelo facto de as mesmas serem afins das funções de Chefe do Departamento de Aprovisionamento e Armazém e insere-se no instituto da polivalência funcional (...)", tendo ainda ficado provado que "Tal acumulação era do agrado do autor na medida em que existia afinidade funcional entre as actividades efectivamente exercidas no Gabinete Técnico do Sistema da Garantia e Qualidade e no Departamento de Aprovisionamento e Armazém (ambos de carácter essencialmente técnico e ligadas ao sector da produção) e a categoria atribuída pelo exercício das funções que o autor exercia, a título principal, neste ultimo departamento. (33.)"; 8. Resulta assim que a afinidade funcional dada como provada nos autos respeitava ao exercício pelo ora Recorrente das funções no Gabinete Técnico, inserido no Sistema de Garantia e Qualidade e as funções por si exercidas no âmbito do Departamento de Aprovisionamento e Armazém. Diferentemente, as funções a exercer pelo do autor "no Sistema de Garantia de Qualidade tinham carácter predominantemente administrativo, com utilização das tecnologias de informação". (facto provado em 42); 9. Enquanto chefe do Departamento de Aprovisionamento e Armazém, o Recorrente exercia funções inerentes à compra de maquinarias, matérias-primas e outras (conf. facto provado em 5.) e, enquanto responsável pelo Sistema de Garantia e Qualidade, "exerceu funções no Gabinete Técnico" (...) "organizando a documentação técnica de suporte à parte mecânica, auxiliando por essa via, a produção da ré". Ficou ainda demonstrado que o Sistema de Garantia da Qualidade estava relacionado com as normas a seguir com as compras (conf. facto provado 28) daí que o acompanhamento que o autor deu à implementação e organização do Sistema de Garantia prendia-se com a afinidade das funções por si assumidas no cargo de chefe do Departamento de Aprovisionamento e Armazém (facto provado em 29); 10. A acumulação de funções foi do agrado do A. na medida em que perspectivava a possibilidade de chefiar tal sector e pela afinidade funcional entre as actividades exercidas - a título principal e acessório - ambas de "carácter essencialmente técnico e ligadas ao sector da produção" (cf. facto provado em 33); 11. Mais ficou provado que "as funções do autor no Sistema de Garantia da Qualidade tinham carácter predominantemente administrativo, com utilização das tecnologias de informação" - cf. facto provado em 42, provando-se ainda que o "autor não aceitou que lhe fosse retirada a chefia do Departamento de Aprovisionamento e Armazém" (facto provado em 41); 12. Conclui-se assim que a factualidade apurada aponta para que a evolução que perspectivava na carreira pressupunha a manutenção da chefia do departamento de Aprovisionamento e Armazém; 13. O acórdão ora em crise, referindo que "a acumulação de funções visava a nomeação do apelado como Chefe do Sistema de Garantia e Qualidade, logo que este entrasse em vigor" omite por completo que tal acumulação prendia-se com a afinidade existente entre as duas funções (cf. facto provado em 29 e 30).

  4. Dada a natureza da categoria, ao A. não incumbia a prova de que o exercício de funções no Gabinete Técnico do Sistema de Garantia de Qualidade estava dependente da manutenção da chefia do Departamento de Aprovisionamento e Armazém. Na verdade, uma vez demonstrada que esta era a categoria que o A. possuía, bastava demonstrar que a mesma foi alterada. Será então à R., ora Recorrida que incumbiria provar que o poder de direcção e conformação da função não viola os direitos e garantias do A; 15. Ao alterar a categoria do A., deixando de ser Chefe do Departamento de Aprovisionamento e Armazém, a Recorrida violou os direitos e garantias do Autor e, não se tratando de promoção nem progressão na carreira, a modificação substancial do contrato é ilícita porque não foi aceite pelo Recorrente; 16. Acresce que, como bem refere a sentença proferida em primeira instância, "ambas as partes perspectivavam que as funções exercidas em sede de implementação do serviço apenas assumiriam um cariz transitório na medida em que era transitória a implementação do mesmo. Depois de implementado o serviço, a colaboração do autor seria formalizada com a sua nomeação para a respectiva chefia". Ao deixar de exercer funções como Chefe do Departamento de Aprovisionamento e Armazém, o ora Recorrente, ficaria prejudicado na sua remuneração, a qual seria assim reduzida, sendo certo que havia aceite tal acumulação com vista ao seu aumento salarial (cf. ponto 25 dos factos provados); 17...

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