Acórdão nº 07A2328 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Novembro de 2007

Magistrado ResponsávelRUI MAURÍCIO
Data da Resolução06 de Novembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

O Estado Francês, a "Mutuelle Assurance des Instituteurs de France" e AA intentaram, no Tribunal de Círculo de Portimão, a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, pedindo a condenação solidária das rés "Estaleiros M..., Ldª" e "Companhia de Seguros Aliança Seguradora" a pagarem as seguintes quantias: a) - Ao primeiro autor, o montante em Francos Franceses de 350.766,03, equivalente a dez milhões, cento e setenta e dois mil e duzentos e catorze escudos, b) - Ao segundo autor, o montante em Francos Franceses de 160.000,00, equivalente ao montante de quatro milhões, seiscentos e quarenta mil escudos e, c) - Ao terceiro autor, o montante de Esc. 10 000 000$0, sendo todas as quantias acrescidas dos juros legais vincendos, a contar da data de entrada da acção no Tribunal, até integral e efectivo pagamento.

Alegam para tanto, em síntese, que: - No dia 14 de Agosto de 1992, AA, cidadão francês, de 49 anos de idade e que exerce a profissão de professor efectivo de liceu, quando se encontrava na Marina de Vilamoura, sofreu um acidente que consistiu no atropelamento por uma grua propriedade da primeira ré, tendo, em consequência, sofrido danos pessoais graves que levaram, entre outras sequelas físicas, à amputação do terço da coxa esquerda, à sujeição a internamentos hospitalares prolongados e a várias operações cirúrgicas e à impossibilidade de exercer a sua actividade profissional desde o dia do acidente até ao dia 6 de Setembro de 1993, apenas tendo retomado a sua actividade profissional no dia 7 de Setembro de 1993. Em consequência do acidente sofreu dores horríveis e, de homem saudável e amante de desportos náuticos, passou a não poder praticar qualquer tipo de desporto, ficou sem a perna esquerda e vive amargurado com a desgraça que sofreu e com as consequências da mesma que padecerá ao longo da vida; - O Estado Francês, enquanto entidade patronal do sinistrado, suportou todos os encargos desse período de baixa, de mais de um ano, bem como os encargos assumidos com a actuação efectuada através dos seus serviços consulares; - A A. seguradora, em consequência do acidente, suportou despesas médicas e hospitalares com o tratamento do 3º A. que ainda não se encontram totalmente quantificadas; - A 1ª R. é responsável pelo pagamento dos prejuízos porque o acidente ocorreu nas suas instalações; e - Decorre a responsabilidade da 2ª R. do facto de ter celebrado com a primeira um contrato de seguro que cobria a actividade da grua, estando transferida a responsabilidade civil até ao montante de cem milhões de escudos.

Contestaram as RR., fazendo-o a 1ª R. por excepção, invocando a sua ilegitimidade, uma vez que à data do acidente nem as instalações lhe pertenciam, nem a grua era de sua propriedade, nem os funcionários que a operavam trabalhavam para si mas para a "L... - Sociedade Financeira de Turismo, SA", sendo a responsabilidade civil relativa à actuação desta empresa que se encontrava transferida para a ré seguradora, e bem ainda a incompetência territorial do Tribunal de Círculo de Portimão para julgar a acção uma vez que os factos ocorreram na área do concelho e comarca de Loulé.

Por seu turno, a "Aliança UAP - Companhia de Seguros, SA" - na qual foram entretanto fundidas, entre outras, a R. Companhia de Seguros Aliança, assim se substituindo à primitiva ré -, invoca a excepção da prescrição do direito de indemnização peticionado, em virtude de entre a data do sinistro e a citação da ré terem decorrido mais de três anos e, por impugnação, defende que os danos reclamados pelos autores não são indemnizáveis e que o acidente se ficou a dever a culpa da vítima.

A "Caisse Primaire d'Assurance Maladie de Paris" veio deduzir incidente de intervenção principal, pedindo a condenação solidária das rés a pagar-lhe, ao câmbio do dia, a quantia em Francos Franceses de 608.588,71, a que corresponde o montante de dezassete milhões, seiscentos e quarenta e nove mil e cinquenta e dois escudos, acrescida de juros que se vencerem à taxa legal até integral pagamento, contados desde a notificação dos réus.

Por decisão proferida a fls. 89 e vº, foi julgada procedente a excepção da incompetência do Tribunal de Círculo de Portimão, ordenando-se a remessa dos autos ao Tribunal Judicial de Loulé, por ser este o competente.

Os autores, notificados da contestação, vieram requerer a intervenção principal de "L... - Sociedade Financeira de Turismo, SA", e deduziram réplica, respondendo à excepção da prescrição do seu direito.

Por despacho de fls. 162 e segs. dos autos, foram admitidos os deduzidos incidentes de intervenção principal.

A interveniente "L... - Sociedade Financeira de Turismo, SA", contestou o pedido, por excepção, alegando que o direito de indemnização que se pretende exercer prescreveu no dia 14 de Agosto de 1995 e invocando a sua própria ilegitimidade para estar em juízo e, por impugnação, afirmando que todo o equipamento e pessoal que actuava ao tempo do acidente na Marina de Vilamoura lhe pertencia, tendo transferido a responsabilidade civil advinda de tal actividade para a segunda ré e que o acidente não ocorreu da forma descrita pelos autores, tendo o mesmo se ficado a dever a incúria do terceiro autor, o que exclui o dever de indemnizar.

Os AA. e a interveniente "Caisse Primaire d'Assurance Maladie" responderam à excepção de prescrição deduzida, defendendo que o prazo a aplicar é o do art. 118º, alínea c) do Código Penal.

Findos os articulados, foi realizada uma audiência preparatória para discussão da invocada excepção de prescrição e, no despacho saneador, as partes foram julgadas legítimas.

Os AA. "Mutuelle Assurance des Instituteurs de France" e AA requereram a ampliação do pedido efectuado, pretendendo a condenação dos RR. a pagarem àquela ainda a quantia de € 36.802,58 e ao A. AA ainda as quantias de € 137.351,04, a título de danos patrimoniais, de € 180,23, referente ao arrendamento do estacionamento e de € 49.879,79, a título de danos não patrimoniais, acrescidas todas de juros de mora desde a citação até efectivo cumprimento.

A interveniente "Caisse Primaire d'Assurance Maladie" veio pedir a alteração do valor do seu pedido, requerendo a condenação dos RR. no pagamento da quantia de € 277.092.81.

Foi realizada audiência de julgamento com observância de todas as formalidades legais, tendo no decurso da mesma sido admitida a ampliação dos pedidos efectuada pela autora "Mutuelle Assurance des Instituteurs de France" e pela interveniente "Caisse Primaire d'Assurance Maladie", e bem ainda a ampliação do pedido formulada pelo A. AA, mas esta tão-somente no que concerne à indemnização por danos não patrimoniais.

Decidida a matéria de facto, foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, condenou a "AXA Portugal - Companhia de Seguros SA" - sucessora universal da "Companhia de Seguros Aliança Seguradora", inicialmente demandada - a pagar: ao A. Estado Francês a quantia de € 47.375,98 (quarenta e sete mil, trezentos e setenta e cinco euros e noventa e oito cêntimos), conforme despacho de rectificação de fls. 1127; à A. "Mutuelle Assurance des Instituteurs de France" a quantia de € 39.318,77 (trinta e nove mil, trezentos e dezoito euros e setenta e sete cêntimos); à interveniente "Caísse Primaire d' Assurance Maladie de Paris" a quantia de € 277 092,81 (duzentos e setenta e sete mil e noventa e dois euros e oitenta e um cêntimos); ao A. AA, a quantia de € 49.879,79 (quarenta e nove mil, oitocentos e setenta e nove euros e setenta e nove cêntimos); quantias que serão acrescidas de juros legais, a contar, à taxa legal para os juros civis sucessivamente aplicável ao longo dos anos, desde a data da citação até integral pagamento; e absolvendo as demais RR. de todos os pedidos contra elas formulados.

Inconformada com tal decisão, a R. "AXA Portugal - Companhia de Seguros SA", apelou para o Tribunal da Relação de Évora, que proferiu o Acórdão de fls. 1316 a 1333, negando provimento ao recurso e confirmando a sentença recorrida.

Novamente inconformada, veio a R. interpor o presente recurso de revista formulando as seguintes conclusões: 1ª- O eventual direito dos AA. e da interveniente "Caisse Primaire de Paris" encontra-se prescrito relativamente à R. "L..."; 2ª- A recorrente seguradora apenas responde na medida em que responde a sua segurada "L..."; 3ª- Quando em 16.01.1996 foi requerida a intervenção da "L..." aos autos, já havia decorrido muito mais de 3 anos sobre a data do sinistro; 4ª- Quando a "Caisse Primaire de Paris" vem, em 05.12.1995, requerer a sua intervenção principal espontânea, ainda não tinha sido requerida a intervenção da "L..." e já havia decorrido sobre o sinistro mais de três anos; 5ª- O direito de indemnização prescreve, nos termos do art. 498º, nº 1 do Código Civil, no prazo de 3 anos a contar da data em que o lesado tem conhecimento do seu direito, o que ocorreu em 14 de Agosto de 1992; 6ª- Não se verificou a existência de crime nem os factos apurados constituem qualquer tipo legal de crime com prazo de prescrição superior ao do art. 498º, nº 1 do Código Civil; 7ª- Os factos apurados nos autos não permitem imputar qualquer culpa pela produção do acidente a não ser ao lesado; 8ª- O operador da grua e o seu vigilante não podiam prever que o A. AA, contra a informação existente na placa informativa no local e movido apenas pela sua curiosidade, iria colocar-se na frente de uma roda da grua em movimento; 9ª- O A. AA tinha obrigação de saber, e era-lhe exigível que previsse, que, ao colocar-se na frente de uma roda em movimento contra as indicações da placa existente no local, poderia por ela ser apanhado, como o foi, actuando assim com culpa nos termos do art. 487º, nº 2 do Código Civil...

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