Acórdão nº 07S2881 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Outubro de 2007
Magistrado Responsável | BRAVO SERRA |
Data da Resolução | 17 de Outubro de 2007 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I1.
No Tribunal do Trabalho de Lamego intentou AA contra o Estado Português acção de processo comum solicitando a condenação do réu a pagar-lhe, a título de trabalho extraordinário prestado em dias normais de trabalho, horas nocturnas e em dias de descanso, € 82.257,80 relativamente aos anos de 1983 a 1995, inclusive, o que se viesse a liquidar em execução de sentença relativamente aos anos de 1968 a 1982, inclusive, e juros.
Sustentou, em síntese: - - que foi «funcionária» do Instituto de Acção Social (posteriormente designado por Instituto de Apoio Sócio-Educativo e Instituto dos Assuntos Sociais da Educação) por via de um contrato de trabalho celebrado em Agosto de 1968, prestando trabalho, primeiramente, no Centro de Alojamento para Estudantes - Masculino e, a partir de 1989, na Residência para Estudantes - Feminina, ambos em Peso da Régua, Centros esses integrados na denominada rede Nacional de Residências para Estudantes, que funcionava no âmbito daquele Instituto, dependente do Ministério da Educação; - que iniciou as suas funções como auxiliar de ecónoma, prestando-as até Março de 1987, passando à categoria de assistente de acção educativa de 2ª, que manteve até à sua aposentação, ocorrida no termo do ano de 1995 e comunicada à autora em 4 de Março de 1996, sendo, por inerência ao exercício daquelas funções, obrigada a permanecer durante a noite nas Residências, prestando serviço desde as 7 horas e 30 minutos até às 23 horas de cada dia, só lhe sendo concedido um dia de descanso semanal e nunca tendo gozado os catorze feriados anuais; - que nunca lhe foram pagas horas extraordinárias, como também não foi pago o trabalho nocturno e o trabalho desempenhado em dias de descanso - quarenta e oito anuais -.
Contestou o réu, excepcionando também a prescrição dos créditos laborais e impugnando o aduzido na petição inicial.
Por despacho saneador lavrado em 27 de Setembro de 2002, foi o réu absolvido, por isso que se entendeu estarem prescritos os créditos reclamados pela autora.
Apelando esta para o Tribunal da Relação do Porto, este Tribunal de 2ª instância, por acórdão de 10 de Fevereiro de 2003, concedeu provimento à apelação, determinando o prosseguimento dos termos do processo.
Inconformado com esse aresto pediu o réu revista, vindo o Supremo Tribunal de Justiça, por seu acórdão de 28 de Janeiro de 2004, a negar provimento ao recurso.
Remetido o processo à 1ª instância, foi, em 12 de Agosto de 2006, lavrada sentença por intermédio da qual a acção foi considerada parcialmente procedente, tendo o réu sido condenado a pagar à autora a quantia de € 605,09, a título de diferenciais de retribuição de férias e subsídio de férias, e juros.
Do assim decidido apelou a autora para o Tribunal da Relação do Porto que, por aresto de 26 de Março de 2007, negou provimento à apelação.
Continuando irresignada, vem agora a autora pedir revista, rematando a alegação adrede produzida com o seguinte quadro conclusivo: - "1.
O trabalho pela A./recorrente desempenhado não pode ser considerado como revestindo a natureza de serviço doméstico, mal tendo andado o acórdão recorrido, em decalque do entendimento já fixado no Tribunal de primeira instância, ao classificar o contrato da A. como de trabalho desse tipo, sujeitando-o ao correspondente regime legal.
-
As tarefas desempenhadas pela A., primeiro como ‘auxiliar de ecónoma' e, depois, como ‘assistente de acção educativa', no seu conjunto e atento o seu conteúdo funcional normativamente definido, muitas delas eminentemente voltadas para o trabalho pedagógico e de administração/orientação, não podem, de todo, ser confundidas com as que constituem o elenco caracterizador do serviço doméstico.
-
O próprio estatuto legal da A. e regime a que estava sujeita não deixam dúvidas de não se estar na presença de um contrato de trabalho doméstico.
-
Forçoso se toma que, para a referida qualificação, se tomem em consideração todas as tarefas desempenhadas pela recorrente, normativa e funcionalmente definidas, e não apenas, restritivamente, aquelas que o acórdão recorrido, destacou de entre a sua totalidade, designadamente, funções administrativas, contabilísticas, de economato, de organização e intervenção pedagógica e educativa, de substituição do director.
-
Relativamente às pretensões da recorrente, ao dar-se como provado que o seu período de trabalho era entre as 7.45h e as 23.00h, não pode deixar de se ter como assente, antes de mais, que, entre as 20.00h e as 23.00h, de cada dia, aquela executou trabalho extraordinário em horas nocturnas.
-
Como também deve considerar-se que, tendo como pressuposto indiscutível que, para lá das 44 horas semanais, todo o trabalho prestado pela recorrente deve ser qualificado como extraordinário, descontando as duas horas para refeições, em cada semana prestou, pelo menos, 35,5 horas de trabalho extraordinário, não podendo desconsiderar-se esta situação em função de um qualquer acordo de alternância que a A., por iniciativa pessoal de ambos, tivesse feito com a colega que com ela trabalhava, que apenas a elas dizia respeito.
-
Assim sendo, afastada a hipótese de regulação por contrato de trabalho doméstico, e atenta a factualidade dada como provada relativa às horas de trabalho prestado pela A./recorrente, a esta são devidas as pretensões remuneratórias que reivindica em termos de prestação de trabalho extraordinário e trabalho extraordinário em horas nocturnas.
-
Assim não se tendo entendido e decidido, parece-nos não ter sido feita a melhor e mais correcta interpretação e aplicação ao caso das pertinentes disposições legais, nomeadamente as do art. 2º, do D.L. nº 235/92, de 24 de Outubro, dos arts. 5º, nº 1, 29º, nº 3 e 30º, do D.L. nº 409/71, de 27 de Setembro e dos arts. 2º, nº 1 e 7º, do D.L. nº 421/83 de 02 de Dezembro.
" Respondeu o réu à alegação da autora sustentando o acerto do acórdão impugnado.
Corridos os «vistos», cumpre decidir.
II1.
Não se colocando aqui qualquer situação subsumível às previstas no nº 2 do artº 722º do Código de Processo Civil, terá este Supremo que acatar a matéria de facto a seguir elencada e que foi tida por demonstrada no aresto recorrido: - - a) a autora trabalhou no Instituto de Acção Social (depois, Instituto de Apoio Sócio-Educativo e, a seguir, Instituto dos Assuntos Sociais da Educação - IASE); - b) até final de Agosto de 1989, a autora prestou trabalho no Centro de Alojamento Para Estudantes - Masculino, na Quinta do Rodo, em Peso da Régua.
- c) a partir de Setembro e até à data da sua aposentação, a autora exerceu as suas funções na Residência para Estudantes - Feminina, no Largo de Santo António, em Peso da Régua; - d) os estabelecimentos referidos em b) e c) estavam integrados na Rede...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO