Acórdão nº 07P2684 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Outubro de 2007

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA MENDES
Data da Resolução10 de Outubro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: No âmbito do processo comum com intervenção do tribunal colectivo n.º 1/06, da Vara de Competência Mista de Braga, foram condenados: AA, BB, CC e DD, com os sinais dos autos, os dois primeiros como co-autores materiais de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, os dois últimos como co-autores materiais de um crime de tráfico de estupefacientes, nas penas de 9 anos de prisão, 7 anos de prisão, 4 anos e meio de prisão e 4 anos e meio de prisão, respectivamente.

Interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães os arguidos AA, BB e CC.

Conquanto o Tribunal da Relação haja requalificado os factos no que tange aos arguidos AA e BB, desagravando o crime, só o recurso do arguido AA obteve provimento (parcial), com redução da pena para 8 anos e 6 meses de prisão.

Recorrem agora para o Supremo Tribunal de Justiça.

São do seguinte teor as conclusões que o arguido AA extraiu da motivação de recurso: A. Não existe qualquer suporte legal para a intervenção correctiva dos Exm.ºs Juízes Desembargadores no sentido do suprimento da nulidade do acórdão de 1ª instância - artigo 379º, n.º 1, alínea a), do CPP, e consequentemente o recurso à norma ínsita no CPC - artigo 715º -, que não tem aplicação ao CPP, porque aqui existem regras próprias, não existindo nenhuma lacuna a preencher nos termos do artigo 4º, do CPP.

  1. Ou seja, os Exm.ºs Desembargadores ao concluir que existia carência de fundamentação do acórdão recorrido (1ª instância) - artigo 379º, n.º 1, alínea a), do CPP, só teriam um caminho a percorrer - remetiam o processo à 1ª instância para suprir tal nulidade.

  2. Aliás, em situações algo idênticas decidiu o S.T.J. em 10 e 17 de Outubro, processos n.ºs 1416/01 e 2247/01, Sumários Acórdãos STJ n.º 54, 83 e 86.

  3. A conduta do arguido foi enquadrada no artigo 21º, do DL 15/93, de 22.01.

  4. Diz o acórdão recorrido (da 2ª instância), e nisso estamos de acordo, que o que está em causa é apenas o transporte de uma quantidade de droga que pode ser disfarçada no vestuário do "correio" e o que foi submetido a julgamento foi um "acto" de tráfico de droga e não um "negócio" à escala internacional.

  5. Assim sendo e face à ausência de antecedentes criminais, deve-se considerar como justa uma pena de prisão que se situe nos parâmetros de 6 anos e 6 meses.

  6. Foram violados os artigos 374º, n.º 2 e 379º, n.º 1, alínea a), do CPP, e 71º e ss., do CP.

    Na respectiva motivação o arguido BB formulou as seguintes conclusões: O Tribunal da Relação entendeu assistir razão ao recorrente quanto à diferente qualificação jurídica do crime que lhe vinha imputado, entendendo subsumir a sua conduta ao crime p.p. no artigo 21º, n.º 1, do DL 15/93, de 22 de Janeiro.

    Porém, entendeu não alterar a medida da pena que lhe foi aplicada.

    Refere o douto acórdão recorrido, que quanto ao arguido BB, os factos não permitem que mereça tratamento significativamente mais favorável do que o AA.

    Discordamos, uma vez que o tribunal apurou matéria diversa quanto a este arguido; na verdade, ficou apurado que era o arguido AA que possuía o número do ..., indivíduo que procedeu à entrega da droga ao CC, sendo certo que foi este arguido que procedeu ao aluguer da viatura, na qual os mesmos se transportaram até ao território nacional.

    Acresce, ainda, que na motivação constante do acórdão proferido pela 1ª instância, o tribunal considerou que o AA era o dono do negócio e o BB seu coadjuvante, quer fazendo-lhe companhia, segurança e servindo de tradutor, quer acompanhando o co-arguido CC.

    Nada disto foi alterado pelo Tribunal da Relação, pelo que não basta dizer que não se percebe o tratamento diferenciado. Ele existiu, visto que da matéria de facto dada como provada, existem factos diferenciadores na actuação de cada um deles. Ora, face a tal diferenciação, e na medida em que não se apurou a existência da agravante da alínea c) do DL 15/93, a medida da pena aplicada deveria também ter sido alterada.

    A determinação da medida da pena parte do postulado de que as finalidades de aplicação das penas são, em primeiro lugar, a tutela dos bens jurídicos e, na medida do possível, a reinserção do agente na comunidade, constituindo a medida da culpa o limite inultrapassável da medida da pena.

    Na determinação concreta da medida da pena o julgador atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele (artigo 71º do CP), ou seja, as circunstâncias do complexo integral do facto que relevam para a prevenção e para a culpa.

    Ponderada a globalidade da matéria factual provada, o Tribunal deveria ter-lhe aplicado a pena de 5 anos e 6 meses de prisão.

    Violou-se o disposto nos artigos 70º e 71º do CP.

    O arguido CC concluiu da seguinte forma a sua motivação de recurso: 1. A defesa entende que o arguido, aqui recorrente, foi erradamente acusado e condenado como co-autor do crime de tráfico de estupefacientes.

    O arguido, era consumidor de produtos estupefacientes.

    1. Se atendermos ao disposto no artigo 27º, do CP, vemos que cúmplice é aquele que presta, de modo doloso, e por qualquer forma, auxílio material ou moral à prática por outrem de um facto doloso.

    2. Ora, tendo em conta os factos que foram dados como provados no douto acórdão condenatório, vemos que o CC nenhuma intervenção a título principal teve no negócio, era totalmente dependente das ordens, das instruções dos restantes arguidos, era por eles vigiado.

    3. Limitou-se a fornecer os meios para a prática do crime, limitou-se a prestar auxílio, preparou a documentação, comprou as passagens e serviu-se de motorista em determinadas alturas, tinha conhecimento do ilícito cometido, mas o mero conhecimento não é crime.

    4. Teve uma intervenção essencial para o desígnio criminoso, mas entendemos que não passou de um mero possibilitante do ilícito, não participando nele activamente.

    5. Pelo que deveria ter sido condenado a título de cumplicidade e não de co-autoria, e em consequência, por aplicação do disposto no artigo 27º, n.º 2, do CP, deveria ter visto a sua pena reduzida no seu quantum.

    6. Não obstante tal, e caso assim não se entenda, sempre seria de lhe aplicar uma pena mais reduzida, entendendo a defesa que a pena concreta deveria ter-se situado muito próximo do mínimo legal.

    7. Por não podemos olvidar que foi dado como provado que era um mero intermediário, que se regia pelas ordens e instruções dos arguidos AA e BB, que era por eles controlado.

    8. Não se provou qual o lucro de tal "ajuda" no desígnio criminoso, se lucro haveria para o recorrente. O que se provou é que o arguido era consumidor e necessitava desses produtos para consumo próprio.

    9. Além do mais, o arguido é jovem, influenciável, tem apenas o 6º ano de escolaridade, um filho menor, à data dos factos encontrava-se desempregado, sem referências, era considerado e estimado no meio onde residia, conta com o apoio da família.

    10. Acresce que, as cadeias estão longe de funcionar como factores ressocializadores e reintegradores, funcionando como factores estigmatizantes, e que as necessidades de prevenção geral (artigo 40º, do CP), não são de tal modo prementes, que permitam a aplicação de uma pena tão elevada, tendo em conta que os cérebros do negócio eram os restantes arguidos.

    11. E que a prevenção especial de reintegração e ressocialização, aconselha uma pena mais próxima do mínimo legal.

    12. Considerando a defesa que o tribunal não tomou em devida conta o referido no artigo 71º, do CP, não sopesando devidamente os elementos acima referidos.

      Os recursos foram admitidos.

      Na contra-motivação apresentada o Ministério Público concluiu: A. Recurso do arguido AA.

    13. A fixação, entre a matéria provada, de que: "Pretendiam os arguidos AA e BB com a quantidade de produto estupefaciente importado, obter lucros" (págs. 1331), 2. Resulta de o recorrente AA, ter impugnado o correspondente ponto de facto, na redacção que lhe havia sido dada na fundamentação, pelo Tribunal Colectivo. Ao assim proceder, 3. O Tribunal da Relação, limitou-se a usar os poderes de cognição e modificabilidade da matéria de facto, que lhe são outorgados em sede de recurso impugnatório da decisão sobre ela proferida - ut CPP 431º, alínea b). Com efeito, 4. Perante o juízo de censura crítica efectuado pelo recorrente sobre tal ponto de facto, analisando o mesmo no confronto com as bases de facto indicadas, o Tribunal da Relação só podia concluir no sentido da modificabilidade da decisão, pelo que, 5. É irrelevante, «in casu» a questão se saber de ao processo penal de aplica o artigo 715º, n.º 4, do CPC, «ex vi» artigo 4º, do CPP.

    14. O recorrente foi condenado pela comissão de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21º, n.º 1, do DL n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 8 anos e 6 meses de prisão, que tem por excessiva.

    15. Não obstante, apenas invoca em tal sede, que o facto submetido a julgamento (como se diz na decisão) é apenas «um acto» de tráfico de droga e não um «negócio à escala internacional», não se adianta qualquer razão relevante para alicerçar tal reparo crítico. Ora, 8. Vista a matéria de facto assente e ponderados os critérios de determinação da pena, CP 71º, logo se vê que tal censura não pode proceder. Na verdade, 9. O dolo directo, o elevado grau de ilicitude (natureza do estupefaciente, nível organizacional e capacidade financeira), as impressivas exigências de carácter preventivo geral, a falta de preparação do arguido para pautar o seu comportamento de acordo com as norma penais (evidenciada na prática do...

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