Acórdão nº 07P1498 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Maio de 2007

Magistrado ResponsávelHENRIQUES GASPAR
Data da Resolução23 de Maio de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: 1. No processo Comum Colectivo, nº 458103.6JACBR, após a realização de audiência de discussão e julgamento foi proferido acórdão que absolveu o arguido AA, da prática do crime de maus tratos, p. e p. pelo artigo 152º, n0 1 e 2, do Cód. Penal, que lhe era imputado; e condenou-o pela prática, como autor material, na forma consumada e em concurso de infracções, de um crime de detenção de arma proibida. p. e p. pelo artigo 275º, nº 1, Cód. Penal e de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131º e 132º nºs 1 e 2, als. d) e i), todos do Cód. Penal, na pena única de 17 (dezassete) anos de prisão.

Condenou-o também a pagar aos demandantes BB e mulher CC, a título de indemnização cível, cujo pedido julgou parcialmente procedente as seguintes quantias: - a de 941,39 € (novecentos e quarenta e um euros e trinta e nove cêntimos). a titulo de pagamento das despesas com o funeral de sua filha; - a de 40.000,00 € (quarenta mil euros), a titulo da perda do direito à vida da própria DD e a de; - 14.900 € (catorze mil e novecentos euros), para cada um deles, pelos danos por eles sofridos em consequência da morte de sua filha; - 2. O arguido recorreu para o tribunal da Relação, que negou provimento ao recurso.

Não se conformando com a decisão da Relação, nomeadamente por entender que este tribunal não se pronunciara sobre o recurso da decisão em matéria de facto, recorreu para o Supremo Tribunal que, no provimento da via de impugnação do recorrente, anulou, por omissão de pronúncia, o acórdão da Relação.

A Relação proferiu, em consequência, nova decisão, mantendo o acórdão da 1ª instância.

De novo discordando, o recorrente retoma em novo recurso para o Supremo Tribunal a via de impugnação no campo da omissão do conhecimento do recurso em matéria de facto nos termos definidos aos poderes de cognição do tribunal de recurso.

O Supremo Tribunal, verificando que a Relação não decidiu a impugnação sobre a matéria de facto nos termos que estavam indicados, concedeu provimento ao recurso e anulou, uma vez mais, o acórdão da Relação por omissão de pronúncia no que respeita aos termos do (não) conhecimento do recurso em matéria de facto.

A Relação pronunciou-se de novo e negou provimento do recurso.

  1. O recorrente interpõe novo recurso para o Supremo Tribunal, nos termos da motivação que apresentou e que termina com a formulação das seguintes conclusões: 1º O Tribunal da Relação e Coimbra estava obrigada a conhecer de facto e de direito, nos termos do art. 428° do C.P.P., tendo violado tal normativo, no acórdão ora recorrido.

    1. Tendo ainda violado o douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça! 3° Pois, esta, ordenou que o Tribunal da Relação, se pronunciasse "concretamente sobre as questões formuladas, no âmbito da matéria de facto e da matéria de direito, no recurso para ele interposto pelo aqui recorrente", nos termos dos arts. 379° n° 1- alínea c) e 425° nº 4 ambos do C.P.P ..

    2. Sucede que, ao contrário do imposto pela lei e do acórdão do STJ, o Tribunal da Relação, e como resulta do acórdão ora recorrido, só se limitou a analisar se o tribunal de 1ª instância, fez uma correcta integração dos factos ao direito, bem como se o acórdão padecia de algum dos vícios constantes do art. 410° nº 2 do C.P.P..

    3. Pelo que o Tribunal da Relação, ao dar a matéria de facto dada como provada na primeira instância, como assente, limitou-se a ler o acórdão recorrido, não analisando, criticamente a prova indicada, que impunha uma decisão diversa da recorrida.

    4. Enfermando, em consequência, o acórdão da Relação, de nulidade, nos termos do art. 379°, n° 1, c) do C.P.P., ao fazer tábua rasa dos argumentos expedidos aquando da impugnação da matéria de facto, não os examinando criticamente.

    5. Implicando, tal omissão, a sua anulação e a devolução dos autos a segunda instância para colmatar tal omissão.

    6. Sendo que, com tal omissão de pronúncia, foram violados os direitos de defesa do arguido, e como tal, foi violado o art. 32° nº 1 da C.R.P.. Pelo que, o acórdão recorrido padece de nulidade e de inconstitucionalidade.

    7. Enfermando, ainda, e em consequência o acórdão da Relação de Coimbra, de nulidade, nos termos do art. 374° n° 2 do C.P.P., pois, tal Tribunal pelo retro exposto, não se pronunciou sobre questões relevantes para a decisão da causa.

    8. Ora, não tendo sido assegurado pelo Tribunal da Relação de Coimbra, um efectivo grau de jurisdição em matéria ele facto, não se encontra definitivamente encerrada a questão de facto.

    9. Pelo que, deverá ser anulado o acórdão recorrido e consequentemente ser ordenada a sua devolução à segunda instância para conhecer efectivamente de facto e colmatar tal omissão.

    10. Sendo que, o arguido atacou fundadamente a força probatório dos elementos de prova que fundamentaram a sua condenação em concreto.

    11. O acórdão recorrido, enferma ainda dos vícios constantes no art. 410º, nº 2 e 3 do C.P.P..

    12. Pois, o acórdão do Tribunal Colectivo, padece de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, e existe um erro notório na apreciação da prova.

    13. Sendo, assim, o conhecimento de tais vícios, referentes à matéria de facto, da competência do Supremo Tribunal de Justiça.

    14. Que, deve in casu, conhecer de tais vícios, e anular o acórdão recorrido, ou in minime, ordenar o reenvio do acórdão recorrido para o Tribunal de 2ª instância, para este conhecer de tais vícios.

    15. Pois, como resulta da sentença do Tribunal de 1ª instância, o arguido foi tão só condenado, com fundamento na convicção íntima do julgador e em meras conjecturas, sem qualquer suporte fáctico.

    16. Tendo-se, ignorado, provas periciais que impunham uma decisão contrária.

    17. Tendo-se, cometido erro grosseiro de julgamento, ao se condenar o arguido pelo crime de detenção de arma proibida, e pelo crime de homicídio qualificado.

    18. Pois, em súmula, como resulta da prova produzira, nunca ninguém viu o arguido com a arma em causa. O arguido é dextro e não tinha vestígios de pólvora na mão direita. O arguido sofreu dois tiros desferidos junto ao mamilo esquerdo, com o sentido de cima para baixo e da esquerda para a direita. Pelo que, era impossível desferir tais tiros. Ninguém viu o arguido a disparar a arma em questão. Na mesma não foram detectadas impressões digitais do arguido. Ninguém sabe em que circunstâncias, foram disparados os tiros em causa. Não se esclareceu a que pertence o blusão preto dobrado na banheira! ....

    19. Isto sem falar nas contradições dos vários depoimentos, como exposto na motivação.

    20. Pelo que, no mínimo deveria ter operado o princípio in dubio pro reo e o arguido ter sido absolvido.

    21. Por outro lado o acordo recorrido enferma de nulidade, pois conhece de questão que estava impedido de conhecer - art. 379°, nº 1, c) do C.P.P ..

    22. Pois, o ponto 9.1 do acórdão do S.T..J., fixou que nem todo o acórdão do Tribunal da Relação foi anulado.

    23. Depois, na apreciação critica da prova para fundamentar a qualificação do crime de homicídio como qualificado, recorre a factos estranhos ao processo, para suportar o " motivo fútil" subjacente ao crime em concreto.

    24. Quando tais factos não constam sequer do processo, padecendo o acórdão mais uma vez de nulidade, ou in minime, de erro de julgamento nesta parte, 27° Depois, consta insolitamente do douto acórdão "E lendo e relendo as longuíssimas páginas por onde o recorrente se espraia em considerações de erro manifesto, erro tremendo, grosseiro, nada se encontra que não seja a conclusão de que apenas o arguido diz; a verdade e toda a verdade".

    25. Ora, tais considerações são fundadas e suportadas pelas gravações dos depoimentos, da prova documental, da prova pericial.

    26. Devia pois, o Tribunal a quo ouvir tais gravações e comprovar se assiste ou não ao arguido razão ao alegar tais erros manifestos. Aliás, como ordenado pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça.

    27. Diga-se, ainda, que o arguido a ser condenado, a pena aplicada é ilegal, excessiva e desproporcionada.

    28. Mais, ignorou o Tribunal da Relação, por completo, os argumentos elencados pelo arguido, com os quais, este arguía a redução da medida de pena.

    29. É sabido, que dentro da moldura penal abstracta e para a determinação da pena concreta, funcionam as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo do crime deponham a favor ou contra o agente.

    30. Ora, ignorou o tribunal de 1ª instância e posteriormente, o tribunal de 2ª instância, todos os depoimentos das testemunhas, ouvidas que atestam que o mesmo é uma pessoa humilde, honesto, trabalhador e boa pessoa, bom filho e pacífico.

    31. Bem como, ignorou o comportamento anterior e sobretudo posterior dos factos que lhe são imputados.

    32. Nomeadamente, o facto do arguido depois de cerca de um ano detido, ter sido restituído à liberdade, tão só sujeito à obrigação de permanecer na habitação.

    33. Onde permaneceu cerca de seis meses sem pulseira electrónica, sequer! Não tendo fugido! E sempre comparecido, sozinho, à audiência de julgamento.

    34. Que comportamento mais exemplar, mais respeitador, mais revelador de uma grande interiorização de valores sociais podia o arguido ter?!!! .,.

    35. Ora, o tribunal a quo ignorou tal bom comportamento, antes e após os factos que lhe são imputados.

    36. Tendo-se baseado no que toca à personalidade do arguido, em relatório do IRS, completamente desactualizado e descontextualizado, como exposto, 40° Entende-se que, caso se considere que o arguido cometeu os crimes por que vem condenado, que a pena deveria assim ter sido fixada no seu mínimo legal.

    37. Ao fixar-se numa pena superior, violou o tribunal a quo o disposto no art. 71º, n° 1 e nº 2, a) do Cód. Penal.

    38. Porém, o arguido, só argui tal redução em desespero de causa! 43° Pois, esá inocente! Tendo sido condenado no âmbito de um grave erro judiciário, que urge reparar.

    Termina, pedindo que seja dado provimento ao recurso com a revogação do acórdão recorrido.

    O magistrado do Ministério Público junto do Tribunal a quo respondeu à motivação, concluindo que...

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