Acórdão nº 05B3166 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Maio de 2006

Magistrado ResponsávelRODRIGUES DOS SANTOS
Data da Resolução18 de Maio de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: AA e mulher, BB, ambos residentes na Urbanização da Rocha Brava, lote ..., Alfanzina, Praia do Carvoeiro, Lagoa, intentaram acção declarativa de simples apreciação, com processo ordinário, contra "B..., Sociedade de Apoio e Manutenção A Rocha Brava, Lda.", com sede na Urbanização da Rocha Brava, Alfanzina, Carvoeiro, formulando (a título principal) os seguintes pedidos: 1.Declarar-se que os Autores são donos e legítimos possuidores do prédio sito em Alfanzina, freguesia do Carvoeiro, concelho de Lagoa designado por moradia ..., com a seguinte composição: no rés-do-chão tem três quartos, três casas de banho, cozinha, sala comum, hall, garagem, estendal , piscina de 60 m2 e logradouro, no primeiro andar, dois quartos, duas casas de banho, sala de jogos, zona de bar e terraço, com área coberta de 295 m2 e descoberta de 3412, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lagoa sob o número ...280488 e ali registado a seu favor pela inscrição G-6 e inscrito na matriz predial urbana respectiva sob o artigo 4133°; 2.Declarar-se que o referido prédio não se encontra nem nunca se encontrou afecto à exploração turística; 3.Declarar-se que o referido prédio não faz parte integrante do empreendimento turístico da Rocha Brava, pelo que, o título constitutivo do referido empreendimento é inoponível aos Autores, na qualidade de donos do prédio questão; 4.Mandar oficiar à Conservatória do Registo Predial de Lagoa, no sentido de ordenar-se o cancelamento do averbamento n°02 à descrição predial n°.../280488-Carvoeiro, Av.02-Ap. 13/080399 - classificado para "Fins Turísticos", como fracções imobiliárias integrantes do Empreendimento Turístico Rocha Brava, da espécie "Apartamentos Turísticos" e de todas as demais que estejam em conexão com a mesma, que dela sejam dependentes.

Subsidiariamente, formularam os pedidos supra referidos em 1 e 2 e ainda: 3.Declarar-se que, na forma de cálculo do valor convencionai da unidade dos AA. - Fracção n°17 - Moradia ... -, não deve intervir o factor "número de camas" (obtido pela fórmula n° de quartos x 2 + 1) e que a área a considerar seja apenas a área coberta do prédio dos AA., com a área de 295 m2, em singelo; 4.Declarar-se que a contribuição dos AA. para o valor das despesas comuns seja fixado em conformidade com a fórmula definida em 3., com efeitos desde a data da aprovação do título constitutivo do empreendimento turístico da Rocha Brava.

  1. Ordenar-se à Ré que altere o título constitutivo do empreendimento e respectivo regulamento, de molde a que nele passe"a constar que, em relação ao prédio dos AA. Fracção 17 -Moradia ..., a fórmula de cálculo do valor convencionai desta unidade seja em conformidade com o peticionado em 3. e 4. do presente pedido.

  2. Declarar-se que, enquanto não for alterado o título constitutivo do empreendimento e respectivo regulamento conforme o peticionado em 3, 4. e 5, não seja o mesmo oponível aos AA..

    Alegaram para tanto, em síntese, serem donos do referido prédio, que construíram num lote que adquiriram para o efeito à sociedade Rocha Brava, sem quaisquer ónus ou encargos, e que, entretanto, a Ré, porque explorasse comercialmente apartamentos para fins turísticos na Urbanização Rocha Brava onde se situa a moradia dos autores, fez aprovar um título constitutivo do empreendimento "Apartamentos Turísticos Rocha Brava" nele incluindo, entre outras, a moradia dos Autores, que não é um apartamento turístico, nem é utilizada pelos Autores para fins de exploração turística, antes sendo a sua residência permanente e habitual em Portugal, o que determinou a classificação da moradia dos Autores para fins turísticos, facto com o qual estes nunca concordaram e relativamente ao qual não lhes foi dado prévio conhecimento no acto da compra do lote e foi levado ao registo predial sem o seu conhecimento e autorização, o que, na sua perspectiva, constitui um ónus que desvaloriza a propriedade e viola o seu direito de proprietários. Invocaram ainda que, caso se deva considerar o seu prédio como parte integrante do empreendimento, deverá ser corrigido o valor da sua fracção que serve de base ao cálculo da sua contribuição nas despesas comuns, em função da área coberta do prédio e não nos termos em que foi estabelecido no título constitutivo do aludido empreendimento.

    A Ré contestou, por excepção e por impugnação.

    Defendendo-se por excepção, arguiu a incompetência absoluta do tribunal e a sua ilegitimidade passiva.

    Quanto ao mérito da causa, a Ré, embora reconhecendo o direito de propriedade dos Autores sobre o prédio em questão, impugnou alguns dos factos por estes alegados e sustentou, nomeadamente, que, desde o loteamento, o prédio dos Autores sempre esteve integrado no empreendimento turístico e como tal deve ser considerado, sendo-lhe aplicáveis as deliberações da assembleia de proprietários e o título constitutivo que determina a sua comparticipação nas despesas comuns, bem como ser mais favorável aos Autores a fórmula de cálculo constante do título constitutivo.

    Na audiência preliminar foi, desde logo, julgada improcedente a excepção de incompetência absoluta do Tribunal e relegada para final a decisão quanto à ilegitimidade da Ré.

    Organizada a Base Instrutória e discutida a causa em audiência de julgamento, veio, finalmente, a ser proferida (em 30/4/2004) sentença que julgou a acção parcialmente procedente, tendo-se limitado a acolher o pedido de que se declare sem os AA. proprietários do prédio identificado na petição inicial mas, no mais, julgou a acção improcedente e, em consequência, absolveu a Ré dos demais pedidos contra eia formulados, quer a título principal quer subsidiariamente.

    Inconformados, apelaram os AA. e com êxito já que a Relação julgou a acção totalmente procedente.

    Inconformados a Ré, pediu revista.

    Alegou e formulou as seguintes conclusões: 1.Os A.A., enquanto proprietários de um imóvel claramente integrado num empreendimento turístico, procuram subtrair-se às inerentes e legais obrigações de contribuir para as despesas comuns, ao mesmo tempo que beneficiam efectivamente das vantagens da sua integração nesse empreendimento: este o sentido da acção instaurada e isto é o que, conforme os factos provados e o Direito, justamente lhes deverá ser negado! 2.O acórdão recorrido reconheceu que a instalação dos empreendimentos turísticos está sujeita a um processo de licenciamento que actualmente decorre perante a respectiva Câmara Municipal e que anteriormente, na vigência do Decreto-Lei n° 328/86, corria termos perante a Direcção-Geral do Turismo, como foi o caso do empreendimento Rocha Brava, por esta licenciado em 1989.

  3. É certo que já o Decreto-Lei n° 328/86 previa a elaboração de um Título Constitutivo, que, nos termos e no prazo permitidos pelo artigo 77° do Decreto-Lei n° 167/ 97 veio também a ser aprovado em assembleia de proprietários do empreendimento Rocha Brava de 25 de Julho de 1998.

  4. Reconhece, pois, o acórdão recorrido que ocorreu o licenciamento do empreendimento pela Direcção-Geral do Turismo em 1989, assim como reconhece que foi elaborado e aprovado o respectivo Título Constitutivo, sendo que o licenciamento respeita ao reconhecimento da existência legal do empreendimento e o Título Constitutivo à definição das relações entre os proprietários.

  5. Mas, face à matéria de facto, não tem fundamento a ideia de que a existência ou constituição do empreendimento turístico fossem posteriores à aquisição do lote ou da moradia por parte dos recorridos; quando estes adquiriram o lote e constituíram a sua moradia, já o empreendimento existia e a sua existência deles era bem conhecida, como ficou provado, 6.Por estas razões, não colhe a questão posta na parte final de fls. 25 do douto acórdão quanto a caso em que a venda de lotes ou de prédios urbanos fosse anterior ao licenciamento do próprio empreendimento turístico: no caso do empreendimento Rocha Brava, esse licenciamento já existia quando os recorridos adquiriram o seu lote.

  6. E também não colhe a questão posta ainda a fls. 25 do douto acórdão quanto à exigência da obrigatória menção do título constitutivo nos contratos de transmissão, sob pena de nulidade dos mesmos, uma vez que, no caso presente, e embora não existisse Título à data da aquisição do lote pelos recorridos, essa situação ficou sanada, por força de o caso estar abrangido no regime transitório previsto no artigo 77° do Decreto-Lei n° 167/97.

  7. Provou-se - ponto 38 da matéria de facto - que o empreendimento turístico Rocha Brava já existia quando os A. A. adquiriram o lote de terreno em que foi construída a sua moradia e que já esse lote estava então integrado nesse empreendimento turístico, assim como se provou - ponto 39 - que isso era do conhecimento dos A.A.

  8. Mais clara não podia ser a matéria de facto, sobre a qual não é legítima, nem tem suporte nos cânones legais da interpretação, a "correcção" feita do acórdão recorrido de que com isso se pretenderia apenas situar geograficamente uma dada área territorial.

  9. Também não tem fundamento a pretensão de que a classificação do empreendimento respeitaria apenas, inicialmente, a 66 unidades de alojamento e, depois, a 157/ e que nenhuma seria a casa dos A.A.! 11.Também aqui houve uma patente deficiência na apreciação e na avaliação do caso, uma vez que, como decorre do regime legal dos empreendimentos turísticos, uma coisa é o licenciamento de um empreendimento turístico, com todas as suas partes componentes (e que não são apenas as unidades em exploração efectiva, mas também as que, não estando em exploração em dado momento, a todo o tempo podem nela entrar, assim como as demais infra-estruturas e serviços comuns) e outra as unidades em cada momento em exploração.

  10. De igual modo não pode considerar-se que deva colher a apreciação feita na matéria de facto quanto ao teor do contrato-promessa de compra e venda de fls. 46 e 47, no qual sendo clara e expressamente dito que o lote prometido comprar pelos A.A. se situa num terreno...

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