Acórdão nº 03S2943 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Setembro de 2004

Magistrado ResponsávelVÍTOR MESQUITA
Data da Resolução30 de Setembro de 2004
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório "A", por si e em representação de seu filho menor, B, intentou, no Tribunal do Trabalho de Lamego, acção especial emergente de acidente de trabalho contra C, pedindo a condenação desta a pagar-lhes: a) A quantia de 5.000.000$00 à viúva e de 2.500.000$00 ao seu filho a título de danos morais próprios; b) A quantia de 10.000.000$00 pelo dano morte do sinistrado D; c) A quantia de 19.000$00 a título das despesas de deslocação e alimentação a tribunal; d) A quantia de 142.606$00 a título de despesas de funeral e transladação; e) À viúva a pensão anual e vitalícia no montante de 205.352$00, a satisfazer a partir de 22.02.97, em duodécimos e no seu domicilio, acrescida em Dezembro de cada ano com uma prestação de valor igual ao montante do duodécimo da pensão a que tiver direito nesse mês, agravada até ao limite da retribuição base nos termos da Base XVII, n.º 2, da Lei n.º 2127, de 3 de Agosto de 1965; f) Ao filho a pensão anual e temporária de 136.902$00, nos termos e com o agravamento da pensão referida em e); g) Juros de mora à taxa legal.

Subsidiariamente, caso não se entenda ter existido culpa da R. ou de quem a representava no acidente objecto da acção, pedem a condenação da mesma R. nas pensões referidas em e) e f), sem agravamento.

Alegaram, para o efeito, e em síntese, que no dia 21 de Fevereiro de 1997, D, seu marido e pai, respectivamente, quando trabalhava sob as ordens, direcção e fiscalização da R., como condutor-manobrador, numa obra da A3 Porto/Valença, mediante a retribuição mensal de 84.600$00 x 14 + 9.300$00 x 11 (prémio de produtividade) + 38.500$00 x 11 (ajudas de custo) + 29.985$00 x 11 (média mensal de horas extraordinárias e ajudas de custo variáveis), foi vitima de um acidente de trabalho, que consistiu numa descarga eléctrica, o que lhe provocou, como causa directa e necessária, a morte.

O acidente ficou a dever-se a omissão no cumprimento das regras de segurança por parte da R. e de quem a representa, e, daí que lhes assista o direito às pensões agravadas - sendo certo que a R. tinha transferido a responsabilidade infortunística para a Companhia de Seguros Lusitânia, S.A., apenas pelo salário de 84.600$00 x 14, e na fase conciliatória do processo esta seguradora já aceitou o pagamento das pensões devidas com base em tal salário, o que foi homologado judicialmente -, bem como às despesas peticionadas e indemnização quer pelos danos morais próprios que sofreram em consequência da morte do sinistrado, quer pelo dano da morte sofrido por este.

Contestou a R., negando, basicamente, que tenha violado, por acção ou omissão, quaisquer regras de segurança e sustentando também que o sinistrado não auferia a retribuição alegada na petição inicial.

Invocou ainda a incompetência, em razão da matéria, do Tribunal do Trabalho, para conhecer do pedido indemnizatório cível por danos não patrimoniais, cujo valor peticionado considera excessivo, e requereu a intervenção na acção de Electro-Arco, S.A., Consumíveis para Soldadura, Materiais e Equipamento, em relação à qual considera ter direito de regresso, caso venha a ser condenada.

Responderam os AA., mantendo o alegado na petição inicial e pugnando pela improcedência das excepções deduzidas pela R. e pela procedência da acção.

Entretanto, foi proferido despacho que indeferiu o pedido de intervenção na acção de Electro-Arco, S.A., Consumíveis para Soldadura, Materiais e Equipamento.

Deste despacho recorreu a R., para o Tribunal da Relação do Porto, mas sem êxito.

Foi proferido despacho saneador que julgou improcedente a excepção de incompetência, em razão da matéria, do Tribunal do Trabalho, para apreciar o pedido indemnizatório por danos não patrimoniais, e elaboradas especificação e questionário, que foram objecto de reclamação.

A R. interpôs recurso do despacho saneador, na parte em que julgou improcedente a excepção de incompetência, em razão da matéria, do Tribunal do Trabalho, o qual foi admitido como de agravo, com subida diferida.

Iniciada a audiência de discussão e julgamento, veio no decurso da mesma a R. a requerer a suspensão da instância até que se apreciasse definitivamente em sede criminal, a existência ou não de culpa da entidade patronal no acidente de trabalho, por violação das regras de segurança, o que foi indeferido.

A R. interpôs recurso deste despacho, o qual foi admitido com efeito suspensivo.

Por acórdão do Tribunal da Relação do Porto, foi o referido recurso - do despacho que não admitiu a suspensão da instância -, julgado improcedente, assim como aquele que havia sido interposto do despacho que considerou o Tribunal do Trabalho competente, em razão da matéria, para conhecer do pedido indemnizatório por danos não patrimoniais.

Entretanto, os AA. interpuseram recurso do despacho que não admitiu o aditamento ao rol de testemunhas, recurso esse que o Tribunal da Relação do Porto também julgou improcedente.

Os autos prosseguiram os seus termos, vindo a ser proferida sentença que condenou a R. a pagar aos AA.: "4.1. à A. A uma pensão anual e vitalícia de € 2.665,88, a pagar em duodécimos, no seu domicílio, pensão cujo vencimento ocorreu em 22 de Fevereiro de 1997; 4.2. ao A. B uma pensão anual e temporária de € 2.348,90, a pagar em duodécimos, no seu domicílio, pensão cujo vencimento ocorreu em 22 de Fevereiro de 1997; 4.3. no mês de Dezembro de cada ano, uma prestação de valor igual ao duodécimo da pensão anual a que nesse mês tiver direito; 4.4. à A. A a quantia de € 660,37 para reparação das despesas de funeral e transladação; 4.5. à A. A a quantia de € 36,70 para reparação das despesas de transportes e alimentação; 4.6. à A. A a quantia de € 15.000 pelos danos morais por si sofridos ; 4.7. ao A. B a quantia de € 10.000 de indemnização pelos danos morais por si sofridos; 4.8. a ambos os AA. A quantia de € 20.000 de indemnização pelo dano da morte causada ao sinistrado; 4.9. juros de mora à taxa legal sobre as quantias devidas, contando-se tais juros desde o vencimento das prestações no que concerne às verbas dos números 4.1. a 4.3. e desde a citação da R. no que respeita às restantes verbas".

Não se conformando com a sentença, a R. dela interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto, que por douto acórdão de 03.02.10 "...concede provimento parcial à apelação e em consequência se revoga a sentença na parte em que condenou a apelante a pagar à Autora a pensão anual de € 2.665,88 e ao Autor a pensão anual de € 2.348,90 e se substitui por outra a condenar a Ré a pagar à Autora uma pensão anual e vitalícia de € 946,98 e ao Autor uma pensão anual e temporária de € 631,32.

Revoga-se ainda a sentença na parte em que condenou a apelante nas indemnizações a título de danos não patrimoniais e dano morte.

No demais mantém-se a sentença recorrida".

Inconformados, agora os AA., interpuseram recurso de revista, tendo nas alegações formulado as seguintes conclusões: 1.ª O douto acórdão recorrido padece de erro de julgamento quanto à matéria de facto na eclosão do acidente de trabalho mortal; 2.ª Com efeito, a recorrida ao não ter assegurado a utilização das instalações de distribuição de energia eléctrica de forma a que não constituíssem factor de risco para os trabalhadores, por contacto directo ou indirecto, violou o n.º 1 do art. 4.º da Portaria 101/96 de 3 de Abril com referência ao art. 8.º, n.º 1 al. a) do dec. Lei n.º 441/91; 3.ª Devia a recorrida ter previsto que com a trepidação resultante da movimentação com as frentes de trabalho e funcionamento dos diversos equipamentos o fio de terra do quadro eléctrico se podia soltar; 4.ª Sendo uma empresa de grande dimensão na construção de estradas, pontes e viadutos, e com um quadro técnico superior, o grau de exigência na prevenção de acidentes é muito maior; 5.ª Estando alegado que a culpa da entidade patronal advém da inobservância das normas de segurança, compete a esta o ónus da prova que aquelas normas não foram violadas, o que não logrou ilidir a presunção; 6.ª Não é a factualidade considerada no acórdão recorrido suficiente para afastar a presunção, pois a recorrida não demonstrou que era impossível prever o desprendimento do fio de terra nem demonstrou quando e se alguma vez o estado do fio de terra foi analisado; 7.ª O douto acórdão recorrido fez, assim, incorrecta interpretação e aplicação da Base XVII, n.º 2 da Lei n.º 2127, art. 54.º do dec. Lei n.º 360/71 de 21.08, art.s 4.º e 8.º, n.º 1 al. a) do Dec. Lei n.º 441/91 de 14.11, art. 8.º, n.º 1 al. d) do Dec. Lei n.º 155/95 de 01.06, art. 4.ª da Portaria n.º 101/96 de 03.04.

8.ª Ocorre, no mesmo aresto, errónea quantificação das pensões anuais a atribuir aos recorrentes, pelo que foram violadas as Bases XIX, n.º 1 als. A) e c) e XLIII da Lei n.º 2127.

Contra-alegou a recorrida, pugnando pela improcedência do recurso.

Neste Supremo Tribunal, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu...

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