Acórdão nº 00P2249 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2001

Magistrado ResponsávelLOURENÇO MARTINS
Data da Resolução01 de Março de 2001
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no pleno das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça: I 1 - O Exmo. Representante do Ministério Público junto do Tribunal da Relação do Porto, ao abrigo do disposto nos artigos 437.º e seguintes do Código de Processo Penal, interpôs recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, do Acórdão de 22 de Março de 2000, proferido nos autos de recurso penal n.º 41/00, 4.ª Secção, daquela Relação, pelos motivos que se seguem.

Por Acórdão de 28 de Janeiro de 1998, proferido no recurso n.º 1135/97, 4.ª Secção, a Relação do Porto decidiu que o despacho que recebe a acusação e designa dia para julgamento, proferido nos termos dos artigos 311.º a 313.º do Código de Processo Penal de 1987, «[...] é um despacho equivalente ao de pronúncia e a sua notificação ao arguido suspende e interrompe a prescrição do procedimento criminal, nos termos dos artigos 119.º, n.º 1, alínea b), e 120.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal de 1982 [...]», acórdão este que dá fundamento ao presente recurso extraordinário.

No acórdão recorrido decidiu-se que, no domínio do Código de Processo Penal de 1987, a notificação do aludido despacho ao arguido não suspende nem interrompe a prescrição do procedimento criminal.

Parece-lhe, assim, ser clara a oposição entre o que aquela Relação decidiu num e noutro dos acórdãos referidos, já que ambas as decisões foram proferidas no domínio da mesma legislação, tal como se refere no artigo 437.º, n.os 1 e 3, do Código de Processo Penal, legislação essa que é constituída, no essencial, pelos artigos 119.º, n.º 1, alínea b), e 120.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal de 1982 e artigos 311.º a 313.º do Código de Processo Penal de 1987.

O acórdão fundamento transitou em julgado e o acórdão recorrido é insusceptível de recurso ordinário.

O processo foi instruído com certidão dos acórdãos proferidos alegadamente em oposição.

2 - Tendo o Ministério Público legitimidade, estando em tempo, e verificados os restantes requisitos legais, o recurso foi considerado admissível, com efeito meramente devolutivo.

Cumprido o disposto nos artigos 439.º e 440.º do Código de Processo Penal, veio a ser reconhecido, pelo Acórdão de 15 de Novembro de 2000, de fl. 22 a fl. 27, exarado em conferência nos termos do artigo 441.º do Código de Processo Penal, que os anteditos arestos emitiram decisões opostas, no domínio da mesma legislação aplicável - artigos 311.º a 313.º do Código de Processo Penal de 1987 e artigos 119.º, n.º 1, alínea b), e 120.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal de 1982, na sua versão originária - sem que entre a prolação de ambos tivesse sido editado qualquer normativo que interferisse, directa ou indirectamente, na resolução da questão de direito controvertida.

Sobre esta mesma questão de direito - saber qual é o valor do despacho que recebe a acusação e designa dia para julgamento, nomeadamente se a sua notificação ao arguido suspende e interrompe a prescrição do procedimento criminal contra ele - foram proferidas decisões de conteúdo oposto: no acórdão fundamento, que tal acto processual suspendia e interrompia a prescrição; no acórdão recorrido, decidiu-se o contrário, que não suspendia nem interrompia a prescrição.

3 - Ordenado o prosseguimento do processo e efectuadas as notificações a que se refere o artigo 442.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, apenas o Exmo. Procurador-Geral-Adjunto apresentou alegações.

Nelas, este Exmo. Magistrado defende com proficuidade a solução por que optou o douto acórdão fundamento, propugnando que seja fixada jurisprudência no seguinte sentido: A notificação ao arguido do despacho que designa dia para julgamento, previsto nos artigos 311.º a 313.º do Código de Processo Penal de 1987, na versão originária, suspende e interrompe a prescrição do procedimento criminal, nos termos dos artigos 119.º, n.º 1, alínea b), e 120.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal de 1982, igualmente na versão originária.

Corridos os vistos, procedeu-se a julgamento, em conferência do pleno das secções criminais.

Cumpre apreciar e decidir. II Uma vez que a decisão emanada da conferência da Secção, nos termos do artigo 441.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, carece de força de caso julgado formal, atenta a diferente composição do órgão competente para a decisão final, impõe-se a reapreciação dos indispensáveis pressupostos legais da oposição de julgados - decisão da mesma questão de direito, no domínio da mesma legislação.

Vejamos. No Acórdão fundamento de 28 de Janeiro de 1998, sob recurso do Ministério Público, apreciou-se o despacho do Mmo. Juiz no Tribunal de Vila Nova de Gaia, em que: Tendo sido imputado ao arguido AA a prática de um crime de emissão de cheque sem provisão, previsto e punido pelos artigos 11.º, n.º 1, alínea c), do Decreto-Lei n.º 454/91, de 28 de Dezembro, e 313.º, n.º 1, do Código Penal de 1982; Tendo os factos ocorrido em 8 de Maio de 1992, e sido a acusação recebida e designado dia para julgamento, e procedido à notificação desse despacho ao arguido; Não tendo sido possível a realização do julgamento, considerando a data dos factos imputados ao arguido e que não existia qualquer causa suspensiva ou interruptiva da prescrição do procedimento criminal, por haverem decorridos mais de cinco anos, declarou extinto o procedimento criminal e ordenou o arquivamento dos autos; a Relação do Porto, revogando tal despacho, deliberou que «o despacho que recebe a acusação e designa dia para julgamento é um despacho 'equivalente' ao despacho de pronúncia e a sua notificação ao arguido suspende e interrompe a prescrição do procedimento criminal, nos termos dos artigos 119.º, n.º 1, alínea b), e 120.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal de 1982».

No acórdão recorrido decidiu-se o recurso interposto pelo Ministério Público junto do 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo, num processo em que o arguido BB fora acusado da prática de um crime de furto de uso de veículo, previsto e punido pelo artigo 304.º, n.º 1, do Código Penal de 1982, praticado no dia 2 de Agosto de 1992, ao qual correspondia a pena de prisão até 2 anos ou multa até 50 dias.

Lavrado despacho a designar dia para audiência de julgamento, nos termos do artigo 311.º do Código de Processo Penal, do qual o arguido foi notificado, veio o procedimento a ser declarado extinto por decurso do prazo sem interrupção ou suspensão da prescrição.

Diz-se no acórdão da Relação do Porto que «a questão fulcral que se coloca no presente recurso é [...] a de saber se no caso operou ou não a prescrição do procedimento criminal, tendo em conta o disposto no artigo 118.º, n.º 1, segundo o qual o prazo de prescrição do procedimento criminal corre desde o dia em que o facto se consumou, artigo 119.º, n.º 1, alínea b), que nos diz que a prescrição do procedimento se suspende durante o tempo em que o procedimento esteja pendente, a partir da notificação do despacho de pronúncia ou equivalente, salvo o caso de processo de ausentes, e artigo 120.º, n.º 1, alínea c), que nos diz que a prescrição do procedimento criminal se interrompe com a notificação do despacho de pronúncia ou equivalente (Código Penal de 1982)».

Citando do Acórdão de 22 de Fevereiro de 1995, Colectânea de Jurisprudência, ano XXIII, p. 219, da mesma Relação, cuja argumentação considerou manter-se válida, entendeu-se que na vigência do artigo 120.º do Código Penal (1982), nem a declaração de contumácia, nem a notificação para as primeiras declarações de arguido em inquérito assumem a dignidade de causas interruptivas da prescrição do procedimento criminal.

Pelas mesmas razões, não se pode considerar que a marcação do julgamento em processo actual tenha equivalência a 'despacho de pronúncia', para efeitos do disposto no artigo 119.º, n.º 1, alínea b), do mesmo diploma, motivo por que a esse acto processual não pode atribuir-se qualquer efeito suspensivo daquela causa extintiva desse procedimento.

(Itálico nosso.) No processo respeitante ao acórdão fundamento os factos delituosos tiveram lugar em 8 de Maio de 1992 e o acto processual da notificação para julgamento ocorreu em 15 de Junho de 1993; no processo respeitante ao acórdão recorrido, factos e notificação ocorreram, respectivamente, em 2 de Agosto de 1992 e 28 de Novembro de 1994, sendo a mesma a redacção dos artigos 311.º a 313.º do Código de Processo Penal, isto é, a que decorria da versão originária desse diploma, identicamente sucedendo com o Código Penal - artigos 119.º, n.º 1, alínea b), e 120.º, n.º 1, alínea c).

Quanto à oposição de julgados. A questão de direito suscitada no acórdão fundamento é a de saber se o despacho que recebe a acusação e designa dia para julgamento é um despacho «equivalente» ao despacho de pronúncia e se a sua notificação ao arguido suspende e interrompe a prescrição do procedimento criminal contra ele.

No acórdão recorrido, posto que tenham sido introduzidas considerações sobre o processo de ausentes e o valor da contumácia, a questão fulcral que se colocou foi a de saber se, tendo em conta o valor a atribuir ao despacho de pronúncia ou equivalente, uma vez notificado ao arguido, no caso operou ou não a suspensão e a prescrição do procedimento criminal.

Ponderando o que acaba de ser reavivado, é patente que se deve manter a anterior conclusão, obtida em conferência, de que existe oposição de julgados, no domínio da mesma legislação, sobre a mesma referida questão de direito, qual seja a de saber se com a notificação ao arguido do despacho que recebe a acusação e designa dia para julgamento se suspende e interrompe a prescrição do procedimento criminal contra ele, nos termos dos artigos 311.º a 313.º do Código de Processo Penal de 1987 (versão originária) e artigos 119.º, n.º 1, alínea b), e 120.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal de 1982, também na sua versão originária.

Determinado que está o objecto do presente recurso para fixação de jurisprudência, importa agora encontrar o sentido em que essa fixação deve ser feita.

III 1 -...

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