Acórdão nº 98S198 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Outubro de 1998

Magistrado ResponsávelALMEIDA DEVEZA
Data da Resolução28 de Outubro de 1998
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: A e B, intentaram acção com processo ordinário emergente de contrato de trabalho contra "ISPA - Instituto Superior de Psicologia Aplicada, CRL", também com os sinais dos autos, pedindo que a Ré seja condenada a pagar: a) à Autora A a quantia de 3063200 escudos; b) à Autora B a quantia de 2956240 escudos; c) pagar a ambas os juros de mora vencidos e vincendos até pagamento. Alegam, em resumo, que foram admitidas ao serviço da Ré, a quem prestaram serviço mediante contrato de trabalho, para cuja existência indicaram os factos que tiveram por pertinentes, desde 1 de Outubro de 1984, após terem acabado os respectivos cursos no ano lectivo de 1983/84; desempenharam, ao serviço da Ré actividades docentes e outras que indicaram; eram profissionais competentes e dedicadas; em 1 de Junho de 1990, a Ré remeteu às Autoras uma carta informando-as que, por alegado incumprimento de funções docentes, não lhe era possível atribuir-lhes serviço docente no ano lectivo seguinte; a Ré atribuíu às Autoras a categoria profissional de "Assistente Estagiária", desde 1 de Outubro de 1985; no ano lectivo de 1990/91, iniciado em 8 de Outubro de 1990, a Ré não considerou as Autoras para quaisquer efeitos no seu quadro de docentes, incumbindo outros docentes de leccionarem a Cadeira de Psicopatologia, pelo que elas se sentiram vítimas do mais humilhante vexame público; a inactividade profissional a que foram forçadas causou-lhes malefícios próprios de tal situação; desde 1 de Outubro de 1990, a Ré deixou de pagar às Autoras qualquer remuneração; por cartas registadas, as Autoras rescindiram, em 24 de Dezembro de 1990, os contratos de trabalho respectivos, com a invocação de justa causa, aí invocando a denegação do direito ao trabalho, os danos sofridos, bem como o não pagamento de salários desde 1 de Outubro de 1990, invocando expressamente o regime próprio da rescisão com fundamento da Lei dos Salários em Atraso; se as Autoras tivessem continuado ao serviço da Ré, teriam passado a auferir, a partir de 1 de Outubro de 1990, a remuneração mensal de 146000 escudos. A Ré contestou por excepção, invocando a incompetência material do tribunal, já que sendo a Ré uma Cooperativa de Responsabilidade Limitada, o litígio entre as partes emerge de um facto de natureza associativa e não de uma relação de trabalho subordinado. Por impugnação, alega, em resumo, que a actividade desempenhada pelas Autoras se inseria no âmbito da prestação de trabalho e serviço que toda e qualquer cooperante presta a uma Cooperativa de que seja sócio; as Autoras subscreveram, em 20 de Novembro de 1985, uma proposta de admissão como sócias da Ré, tenda a sua admissão sido aprovada em Assembleia Geral. As Autoras responderam à excepção, concluindo como na petição. No Saneador conheceu-se da excepção da incompetência, decidindo-se pela sua improcedência. Elaboraram-se a Especificação e o Questionário, os quais foram objecto de reclamação em parte atendida. Efectuado o julgamento foi proferida sentença que julgando a acção parcialmente procedente condenou a Ré a pagar à Autora A a quantia de 434687 escudos e cinquenta centavos, e à Autora B a quantia de 327727 escudos e cinquenta centavos, quantias essas acrescidas de juros de mora; absolveu-se a Ré do restante pedido. A Ré agravou do despacho sobre a competência, agravo esse desatendido pela Relação. As Autoras irresignadas com o decidido, e na parte desfavorável a elas, apelaram da sentença para a Relação de Lisboa que julgou improcedente a Apelação. De novo inconformadas, recorreram para este Supremo, tendo este Tribunal determinado a baixa do processo a fim de a Relação se pronunciar explicitamente quanto à totalidade da matéria de facto considerada provada. A Relação proferiu acórdão a anular a matéria de facto e ordenou a baixa dos autos à 1. Instância para se efectuar novo julgamento. Efectuado esse novo julgamento, foi proferida sentença que condenou e absolveu nos precisos termos da primeira sentença. As Autoras apelaram para o Tribunal da Relação de Lisboa que julgou improcedente o recurso, confirmando a sentença recorrida. II - De novo irresignadas as Autoras recorreram de Revista para este Supremo tendo concluído as suas alegações da forma seguinte: 1) Por força do disposto no artigo 333 do CCIV, "a caducidade é apreciada oficiosamente pelo tribunal e pode ser alegada em qualquer fase do processo, se for estabelecida em matéria excluída da disponibilidade das partes" (n. 1); 2) "Se for estabelecida em matéria não excluída da disponibilidade das partes, é aplicável à caducidade o disposto no artigo 303" (n. 2); 3) Por sua vez, o artigo 303 do mesmo Código refere que "o tribunal não pode suprir, de ofício, a prescrição; esta necessita, para ser eficaz, de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem aproveita..."; 4) No caso "sub judice", não se trata da caducidade referida ao exercício de quaisquer direitos de acção ou outros de natureza ou interesse público, mas apenas da caducidade de um contrato individual de trabalho de direito privado comum; 5) Não podia, pois, a Mma. Juíza ter conhecido oficiosamente a alegada caducidade do contrato de trabalho das Autoras e não podia o acórdão recorrido ter confirmado essa decisão; 6) Não havia, ademais, qualquer impossibilidade legal de a Ré continuar a receber o trabalho das Autoras após 1 de Outubro de 1990; 7) A fonte normativa da aplicação do estatuto da carreira docente pública era a mera vontade da própria Ré, que em Assembleia Geral deliberara livremente aplicá-lo, e não qualquer lei imperativa, e, por isso, não se verificava qualquer impossibilidade legal de as Autoras prestarem o seu trabalho após 1 de Outubro de 1990, mesmo continuando como assistentes-estagiárias, nem de a Ré o receber; 8) De resto, ainda que tal impossibilidade tivesse existido, jamais seria definitiva, sendo certo que o requisito da definitividade é expressamente requerido para que se verifique a caducidade dos contratos de trabalho por impossibilidade superveniente - artigo 4 alínea b) do DL 64-A/89 -; 9) Por outra via, se as Autoras se colocaram voluntária e culposamente na situação determinante da impossibilidade da prestação seriam aplicáveis as regras do incumprimento culposo, a conferirem à contraparte o direito à rescisão do contrato (artigo 801 CCIV): nenhuma caducidade haveria; 10) Se impossibilidade de manutenção das Autoras ao serviço houvesse a partir de 1 de Outubro de 1990, tal impossibilidade teria ficado a dever-se (é a tese da Ré) ao alegado incumprimento pelas Autoras das suas alegadas obrigações; 11) E, como corolário lógico, poderia a Ré instaurar contra as Autoras e fazer contra elas seguir o adequado processo disciplinar por inadimplemento dos seus deveres profissionais e poderia a Ré, com base em tal incumprimento, despedi-las com justa causa, o que não fez; 12) Nem de fundo, aliás, a Ré teria razão porque as Autoras requereram a prestação de provas públicas em Dezembro de 1987 e a Ré nenhum seguimento deu ao assunto; 13) E porque, quanto ao D.E.A ("mestrado"), só veio a merecer aprovação pela Portaria 385/91, de 6 de Maio: não existia na altura em que as Autoras o frequentaram; 14) As Autoras tiveram justa causa para rescindir, como rescindiram, o contrato de trabalho, já que a Ré lhes negou a prestação de toda e qualquer espécie de trabalho a partir do início do ano lectivo de 1990/91 e lhes deixou de pagar quaisquer remunerações a partir de 1 de Outubro de 1990 - artigos 19 da CRP; 19., alíneas a), b), c) e g) da LCT; 34. e 35. do DL 64-A/89; e artigo 3 da Lei 17/86, de 14 de Junho -; 15) Que se tratou da recusa de todo e qualquer trabalho, fica claro quer pela leitura dos diversos elementos que constam dos autos, quer pela análise da matéria de facto dada como provada quer pelos documentos juntos, designadamente o junto com a contestação sob o n. 11 (carta dirigida pela Ré à Inspecção Geral do Trabalho), nos seus parágrafos 3. e 4., quer pela análise da própria contestação; 16) A recusa de toda e qualquer actividade docente consiste na total recusa da actividade profissional das Autoras; 17) O facto de as Autoras, enquanto sócias que continuaram a ser da Cooperativa Ré, poderiam vir hipoteticamente - o que aliás nunca veio a suceder - a desempenhar após 1 de Outubro de 1990 quaisquer funções nos órgãos da sociedade Ré em nada contribui para negar a evidência de que após 1 de Outubro de 1990 a Ré lhes recusou qualquer espécie de trabalho no âmbito do contrato individual de trabalho que com a relação societária vinha coexistindo; 18) Não caducou o direito de auto-despedimento das Autoras já que tal caducidade inexiste no quadro da Lei 17/86 e já que os fundamentos da rescisão são factos continuados praticados pela Ré, sendo certo, ademais, que tal caducidade, não tendo sido alegada pela Ré na sua contestação, sempre seria insusceptível de ser conhecida pelo Tribunal; 19) A decisão recorrida violou os artigos 333, 303 e 801 do CCIV; 4. alínea b), 34. n. 2, e 35. do DL 64-A/89, 3. da Lei 17/86; 58...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT