Acórdão nº 087846 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Março de 1996

Magistrado ResponsávelMIRANDA GUSMÃO
Data da Resolução05 de Março de 1996
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I 1. No 8. Juízo Cível da Comarca de Lisboa, A intentou acção ordinária contra Companhia Geral de Crédito Predial Português, pedindo seja condenado a pagar-lhe o dobro das prestações entregues no montante de 8000000 escudos, acrescidos de juros vencidos desde a interpelação e os vincendos até integral pagamento, e na execução especifica do contrato de venda a sentença produzir os efeitos da declaração da Ré, condenando-a ainda em expurgar eventual hipoteca ou entregar-lhe o montante da mesma; e a não ser possível a execução específica, ser a Ré condenada em execução por equivalência numa indemnização a seu favor pelos danos emergentes e lucros cessantes motivados pela frustração da possibilidade de o Autor exercer o seu direito à execução específica, por uma importância necessária e suficiente para o Autor adquirir duas fracções semelhantes e na mesma zona da cidade de Faro - a liquidar em eventual execução de sentença - e sem maiores encargos para o Autor em termos de sisa e encargos, despesas com escrituras e registos, a que será deduzido o montante de 1500000 escudos, que o Autor ainda tem a pagar, importância global esta que, actualmente, se estima em 39400000 escudos (preço actual das fracções 38000000 escudos, previsão do custo de sisa 2300000 escudos, previsão de maiores custos de necessárias escrituras e registos 600000 escudos); se for entendido que esses pedidos não são cumuláveis, mas apenas alternativos, opta pelo pedido da execução específica ou na indemnização, alegando, para tanto, que: - em 15 de Julho de 1982 prometeu comprar e B e mulher prometeram vender-lhe duas fracções autónomas correspondentes ao 5. e 6. andares, direito, a constituir no prédio urbano em construção sito na avenida de ..., designado pelo lote 10, em Faro; - a Ré adquiriu este lote em 23 de Outubro de 1987, assumindo as obrigações dos anteriores promitentes vendedores; - a Ré vendeu a terceiro o referido lote em 15 de Junho de 1990; - o preço acordado foi de 5500000 escudos para ambos, tendo o Réu pago o sinal de 4000000 escudos; - o valor actual de ambas as fracções é de 38000000 escudos; - A Ré sustenta na sua contestação, a improcedência, porquanto não lhe cabe qualquer culpa quanto ao incumprimento do contrato; os pedidos são incompatíveis; e o valor dos andares para efeitos do pedido de indemnização é o que tiverem à data do incumprimento contratual, em 31 de Dezembro de 1983. - O autor respondeu, concluindo como na petição, pedindo a condenação da Ré como litigante de má fé. Em despacho saneador foi: - julgada inepta a petição na parte em que formula em cumulação os pedidos de restituição do sinal em dobro, do pagamento do valor da coisa e da execução específica, com absolvição da Ré da instância; - julgados improcedentes os pedidos de indemnização e de execução específica, optados em alternativa, com absolvição da Ré. 2. O autor apelou, a Relação de Lisboa, por acórdão de 7 de Fevereiro de 1995, negou provimento ao recurso, confirmando o douto despacho saneador sentença recorrido. 3. O autor pede revista, formulando as seguintes conclusões: 1) o recorrido assumiu, por dação em cumprimento todos os direitos e obrigações dos promitentes compradores decorrentes dos dois contratos promessa celebrados com o recorrente e constantes dos autos: 2) apesar dos promitentes-vendedores terem entrado em mora debendi incumprindo as suas obrigações contratuais, os identificados contratos promessa de compra e venda mantém-se em vigor e a produzir os seus efeitos, pois a mora debendi não determine ipso facto nem ipso lege, a resolução do contrato. 3) o recorrente cumpriu todas as suas obrigações assumidas nos identificados contratos e mantém o interesse pela prestação, tendo interpelado o recorrido, logo que tomou conhecimento de que as fracções estavam prontas para a venda, para que este cumprisse as obrigações em prazo certo. 4) Confirmou-se nos autos que o Recorrido tinha entretanto vendido a outrém o prédio onde se localizavam as fracções prometidas vender ao recorrente e sem conhecimento deste. 5) O recorrido nem devolveu o sinal em dobro, nem manifestou intenção de obter, de novo, as fracções ou outras semelhantes para cumprir a promessa. E entende-se como sinal todas as prestações entregues a título do pagamento do preço. 6) A cláusula penal e o direito à execução específica são duas realidades distintas e diferentes. 7) A violação de qualquer cláusula de contrato promessa de compra e venda preclude a cláusula penal (contratual ou legal), mas não afasta o direito/obrigação à execução específica, que é legalmente imperativa, e de que, no caso dos autos, as partes não abdicaram. 8) Quer por vontade expressa dos outorgantes dos contratos identificados nos autos, quer por decorrer da lei (e de Assento do S.T.J.) não pode ser afastado o direito à execução específica, mesmo não tendo havido "traditio". 9) Havendo incumprimento por parte do promitente-vendedor, o promitente comprador, além do direito à restituição do sinal em dobro, tem ainda direito aos juros moratórios a partir da interpelação, relativamente ao dobro das importâncias pagas a título de sinal ao seu reforço; 10) é contrário à ordem pública, por violação de norma imperativa, a conduta do promitente vendedor que frustrar a possibilidade da execução especifica, pois, para além de poder integrar ilícito criminal, não pode obter para si um enriquecimento sem causa à custa do património e dos legítimos e legais direitos do promitente comprador. 11) Teve o legislador a preocupação de acautelar o interesse dos promitentes compradores tornando imperativa a execução específica, mesmo não havendo traditio. 12) Há uma lacuna na lei, pois o legislador não previu o caso de o promitente-vendedor frustrar a possibilidade da execução específica real pela venda do bem prometido a outra pessoa. O legislador não admitiu que nem todos os vendedores fossem pessoas de bem. 13) Nos termos do artigo 10 do Código Civil e atendendo à preocupação do legislador na protecção do promitente-comprador e tendo em conta Jurisprudência deste Supremo Tribunal e a doutrina acima citadas, a solução a encontrar, dentro do espírito do sistema, é criar norma que estabeleça o direito de requerer a execução especifica do contrato ou a execução por equivalente se a execução específica for tornada impossível. 14) Assim, não sendo possível a execução específica (também chamada execução real, restauração ou reconstituição natural) tem o credor...

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