Acórdão nº 086795 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Julho de 1995

Magistrado ResponsávelSOUSA INES
Data da Resolução04 de Julho de 1995
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I 1. A propôs na comarca de Lisboa acção declarativa contra B, C e C.P. - Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses, E.P., pedindo a condenação solidária destes a pagarem-lhe a quantia de 20000000 escudos, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que sofreu, em resultado no facto de ter sofrido um acidente, no qual um comboio da Ré, de que o 1. Réu era maquinista e o 2. revisor, o atropelou quando do mesmo descia e com o qual teve grandes prejuízos. - Os Réus contestaram. - Procedeu-se a julgamento, tendo sido sentença a condenar solidariamente os Réus a pagarem ao autor a quantia de 15000000 escudos além de certa verba reclamada pelo Hospital de Santa Maria. 2. Os Réus apelaram, a Relação de Lisboa, por acórdão de 29 de Setembro de 1994, deu provimento parcial ao recurso, absolvendo o Réu B do pedido contra ele formulado, mantendo no restante a decisão proferida, com o esclarecimento acima prestado. 3. Os Réus Caminhos de Ferro Portugueses, E.P. e C pedem revista devendo ser absolvidos do pedido ou a C.P. condenada pelo risco nos termos do n. 1 do artigo 503, com os limites máximos previstos no n. 1 do artigo 508 do Código Civil, ou seja, em 4000000 escudos, e, para tal, formulam as seguintes conclusões: 1) o acidente dos autos foi devido a culpa exclusiva de Terceiro, amigo do Autor, na medida em que, irregular, irreflectida e ilegalmente, accionou o manipulo de emergência da abertura da porta por onde devia descer o sinistrado, provocando que esta não fechasse com o início da marcha do comboio; 2) a actuação intempestiva daquele terceiro provocou também a avaria do sistema automático da abertura das portas; 3) o terceiro accionou o manipulo de abertura da porta sem que se estivesse perante um caso de emergência e sem que se estivesse perante uma situação de perigo que obrigasse a uma saída de emergência dos passageiros. 4) A actuação daquele terceiro é ilegal e vai contra toda a regulamentação da circulação ferroviária: designadamente violou o artigo 42 do Regulamento para a Exploração e Polícia dos Caminhos de Ferro, aprovado pelo Decreto-Lei n. 39780, de 21 de Agosto de 1954, em vigor por força do artigo 7 do Decreto-Lei n. 109/77, de 25 de Março. 5) Da mesma forma que o 1. Recorrente infringiu o n. 4 do n. 1 do indicado artigo 42 que lhe proibia sair do comboio depois de ele iniciar a marcha. 6) Ao não tomar estes em consideração que foram causais do acidente e sem os quais o mesmo não teria ocorrido, o douto acórdão de que se recorre, violou o artigo 505 do CCIV o qual levaria - como deverá levar - à absolvição dos ora recorrentes. 7) O recorrente, revisor do comboio, não teve culpa na eclosão do acidente, porquanto fez sinal ao maquinista numa altura em que todas as portas da composição ferroviária estavam abertas e deviam está-lo, porquanto só fecham depois do início da marcha. 8) O sinistrado fez um compasso de espera antes de descer e, portanto, quando o revisor fez o sinal ao maquinista ainda não o podia ver a tentar descer. 9) O revisor não é o condutor do comboio o que se lê 1. parte do n. 3 do artigo 503 do Código Civil. O condutor era o maquinista e não se pode fazer uma interpretação extensiva ou analógica daquele preceito, sob pena de se violar o artigo 11 do Código Civil. 10) O revisor recorrente não teve qualquer tipo de culpa - real ou presumida - e considerá-lo como tal foi violado o disposto nos artigos 11 e 503 n. 3 do Código Civil. 11) Para o caso de se entender - e sem conceder - que não é de aplicar o artigo 505 do Código Civil com imputação do acidente ao próprio lesado e a terceiro (seu amigo) então os recorrentes deverão ser condenados apenas nos termos do artigo 503 n. 1, com os limites máximos constantes do n. 1 do artigo 508, do Código Civil. 12) Ou seja, a responsabilidade máxima dos recorrentes tem que se conter em 4000 contos, uma vez que há um único sinistrado. 13) Aquele quantitativo deve ser rateado pelos recorridos, nos termos do artigo 335 do Código Civil. 14) Ao arbitrar indemnização e ao fazê-lo, no limite, com base na culpa, no máximo o podia ter feito através do risco e com os limites máximos legais, o acórdão violou as disposições já invocadas, artigos 335, 503, 508, e ainda os artigos 563, 566 e 496 do Código Civil. 4. O Recorrido A apresentou contra - alegações, onde salienta que: 1) Uma vez que, nos termos do disposto no n. 2 do artigo 721 e do n. 2 do artigo 722 do Código de Processo Civil o recurso de revista não pode versar sobre matéria de facto, não deverá o presente recurso ser apreciado na parte respeitante à matéria alegada sob os pontos I e II das, aliás, doutas alegações apresentadas pelos ora recorrentes. 2) Contudo, sempre se dirá que "manipulo de abertura das portas" e "manipulo de emergência" são coisas completamente diferentes, pelo que a confusão entre tais objectos efectuada nas alegações dos recorrentes não tem outra finalidade que não seja a de tentar iludir. 3) Não têm os recorrentes qualquer razão, ao quererem afastar a responsabilidade do ora 1. recorrente, pois este era, segundo a sua própria designação, 2. maquinista, Revisor - Maquinista ou "revisor condutor". 4) Por tal facto não há, ao invés do que referem os recorrentes, que fazer qualquer interpretação analógica, nem extensiva para subsumir o comportamento daquele "revisor-condutor" à norma do n. 3 do artigo 503 do Código Civil, bastando, para tanto, concluir que face aos seus poderes e competências, também este conduzia o veículo por conta de outrém aquando da eclosão do acidente. 5) Outrossim não têm os recorrentes qualquer razão na interpretação que fazem do artigo 508 pois este artigo, no seu n. 3 "in fine", limita-se a referir que quando o acidente for causado por caminho de ferro são elevados para o décuplo os limites máximos totais referidos nos números anteriores, não estabelecendo qualquer condição ou limitação à elevação dos máximos referidos nos outros números da mesma disposição, pelo que no caso vertente o limite da responsabilidade dos recorridos é de 40000000 escudos (quarenta milhões de escudos). 6) Aliás, acresce que, uma vez que estamos perante uma situação de culpa, ainda que presumida, e que o artigo 508 se aplica aos casos em que "... não haja culpa do responsável..." deve considerar-se que não é aplicável ao caso "sub judice" o artigo 508 do Código Civil, não havendo, pois, qualquer limitação à responsabilidade dos ora recorrentes. 5. O recorrido Hospital de Santa Maria apresentou contra-alegações onde salienta que 1) a "culpa" do recorrente C decorre exclusivamente da sua qualidade de comissário da C.P. e é definida pelo n. 3 do artigo 503 do Código Civil, integrada portanto na responsabilidade pelo risco; 2) a conduta do terceiro, "o amigo do Autor", é...

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