Acórdão nº 083006 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Janeiro de 1993

Magistrado ResponsávelJOSE MAGALHÃES
Data da Resolução27 de Janeiro de 1993
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: A e B instauraram a presente acção de processo ordinário, que correu termos no tribunal judicial da comarca de Sintra, contra C e marido B, alegando o que a seguir se resume: Por contrato-promessa celebrado em 18 de Agosto de 1983, os réus prometeram vender aos autores e estes prometeram comprar-lhes a eles um lote de terreno para construção, designado por lote 4, sito na freguesia de S. Martinho de Sintra, pelo preço de 1350000 escudos, de que os autores logo entregaram 200000 escudos, como sinal, ficando o resto de ser pago no acto da escritura; Apesar de o contrato-promessa só estar assinado pela ré, esta garantiu que o seu marido, ausente em França, autorizaria a transmissão; O preço estabelecido assentou no pressuposto garantido pelos réus de que o terreno estava considerado como de construção pela Câmara Municipal de Sintra, e a ele haveria que descontar a verba que os Autores gastassem com as certidões camarárias e da Conservatória a obter por si; Os autores entraram na posse imediata do terreno; A requerimento dos autores, a Câmara Municipal de Sintra certificou, em 31 de Agosto de 1983, que o loteamento se não encontrava aprovado; A novo pedido dos autores, a Câmara Municipal de Sintra certificou, em 29 de Outubro de 1985, que o lote n. 4 fazia parte do loteamento aprovado em 9 de Novembro de 1983, dependendo a concessão do alvará de licenciamento do pagamento de comparticipações no montante de 115250 escudos e da apresentação de garantia bancária no valor de 4400000 escudos e de certidão da Conservatória do Registo Predial; Para obter a certidão da Câmara Municipal de Sintra há, assim, que dispender a quantia de 115250 escudos (escreveu-se 125250 escudos) e que suportar o valor dos encargos e do risco inerente à obtenção da garantia bancária, no mínimo de 440000 escudos, que os réus se recusaram a satisfazer; Assiste-lhes, pois, o direito a pedir a redução do preço do lote para 794750 escudos (escreveu-se 784750 escudos). Ao determinarem o articulado, pediram que, por incumprimento dos demandados, se reduzisse o preço do lote para 784750 escudos ou para o valor que o tribunal achasse mais justo e que, de harmonia com o disposto no artigo 830 do Código Civil, se proferisse sentença que produzisse os efeitos da declaração negocial dos réus com as consequências legais. Os réus contestaram pela forma inserta a folhas 19 e seguintes. Depois de arguirem de falso o contrato-promessa que os autores apresentaram com a alegação de a ré não saber assinar e o documento junto conter cláusulas a que o réu jamais se obrigaria, acrescentam que o que houve foi um acordo verbal entre eles por virtude do qual os réus prometeram vender aos autores um terreno rústico que "na respectiva descrição predial ... consta de terreno para construção". Mais dizem que nunca garantiram que o loteamento do terreno estivesse aprovado, que nunca os autores entraram na posse do terreno e que, por ser nulo, por falta de forma, o contrato celebrado, só assiste aos autores o direito à restituição da importância de 200000 escudos que entregaram aos réus, que não já à redução do preço estipulado nem à execução específica do contrato. Os autores impugnaram o incidente de falsidade suscitado pelos réus, sustentando que foi a ré quem assinou o referido contrato-promessa. No prosseguimento dos autos foi proferido o despacho saneador, em que se deu andamento ao incidente de falsidade; na mesma oportunidade se procedeu à elaboração da especificação e questionário, que não sofreram qualquer reclamação. Feito o julgamento, foi proferida a sentença de folhas 139 e seguintes, a julgar improcedente a acção e a condenar os réus como litigantes de má fé. Inconformados, recorreram os autores com parcial êxito, já que o Tribunal da Relação de Lisboa, mantendo embora a sentença apelada quanto ao mais, a veio a revogar quanto ao decidido sobre o pedido conducente à execução específica, proferindo decisão a produzir os efeitos da declaração negocial aos demandados com a natural consequência de os autores terem de pagar aos réus o resto do preço contratualmente estabelecido. É do acórdão da Relação que os réus trazem agora o presente recurso de revista, formulando as seguintes conclusões: 1 - O contrato-promessa titulado pelo documento de folhas 8 é nulo nos termos do artigo 294 do Código Civil, por se tratar de um negócio jurídico relativamente a um terreno abrangido por operações de loteamento, celebrado antes de obtido o respectivo alvará, contra o disposto no artigo 27 n. 1 do Decreto-Lei n. 289/73, de 6 de Junho, vigente à data em que o mesmo contrato foi concluído; 2 - O acórdão recorrido, ao julgar procedente o pedido de execução específica, violou o mencionado artigo 27 n. 2 do Decreto-Lei n. 289/73, visto não indicar o número e a data do alvará de loteamento do terreno de que faz parte o lote a que se refere o dito contrato, sendo, por isso, também nula a transmissão decorrente da decisão proferida; 3 - E violou também o artigo 14 n. 2 do Decreto-Lei n. 448/91, de 29 de Novembro, e o artigo 297 n. 1 do Código Civil, o primeiro, por a deliberação a que se refere o documento de folhas 12, aprovando o loteamento em que se incluía o terreno que os autores prometeram comprar, haver caducado nos termos desta disposição, pelo decurso do prazo fixado em tal preceito, sem que tivesse sido requerida emissão de alvará de loteamento, e o segundo porque, não estabelecendo a lei antiga qualquer prazo para o exercício do direito, mas estabelecendo-o a lei nova, é esta a que se aplica; 4 - E violou ainda os artigos 1, 19, 24 n. 1, alínea b) e 27 do citado Decreto-Lei n. 289/73, por também a licença de loteamento haver caducado, visto o alvará respectivo não ter sido requerido dentro do prazo fixado; e 5 - Violou, finalmente, o disposto no artigo 442 n. 2 do Código Civil, na redacção que lhe deu o Decreto-Lei n. 236/80, de 18 de Julho, vigente à data do contrato "sub judice", visto a execução específica à luz deste normativo só ser possível no caso de haver tradição da coisa e, na hipótese dos autos, a não ter havido. Daí o dever conceder-se a revista, revogando-se o acórdão recorrido na parte impugnada. Não houve contra-alegação. Obtidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. 1- Antes de mais, uma observação se nos impõe, contudo, fazer desde já. É a seguinte: O Meritíssimo Senhor Juiz da primeira instância, apesar do referido na alínea a) da especificação, segundo o qual: "Por contrato-promessa de compra e venda celebrado em Agosto de 1983, os réus prometeram vender aos autores um lote de terreno para construção designado por lote 4, sito em Galamares, ...", ao descrever na sentença apelada os factos dados como provados, houve por bem corrigir o conteúdo do assim especificado, e dar como provada a seguinte matéria: "Por contrato escrito de 18 de Agosto de 1983 assinado pelos autores e pela ré, esta prometeu vender àqueles, pelo preço de 1350000 escudos, um lote de terreno para construção designado por lote 4, sito em Galamares, ...". A alteração verificada, indiciadora da falta de cuidado que houve na elaboração da especificação, pois que se só a ré, subscreveu - como é fácil de ver - o documento comprovativo do contrato-promessa como promitente-vendedora, só ela - e não os réus - prometeu efectivamente vender o lote aos autores, não foi, todavia, considerada pelo Tribunal da Relação que, ao aludir à "matéria de facto dada como provada" no tocante a este ponto, se limitou a reproduzir o conteúdo da alínea a) da especificação. Quer dizer, em vez de constar como facto provado aquele de que o documento de folhas 8 nos dá conta, conforme fez o Meritíssimo Juiz da comarca de Sintra, ou seja, o de que só a ré assinou o contrato-promessa...

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