Acórdão nº 08S3257 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Maio de 2009

Magistrado ResponsávelSOUSA PEIXOTO
Data da Resolução07 de Maio de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça 1. Relatório AApropôs a presente acção, no Tribunal do Trabalho do Funchal, contra BB, CC, DD e EE, respectivamente viúva e filhos do Dr. GG, e contra FF - Serviços Médicos, Sociedade Unipessoal, L.da, pedindo que os quatro primeiros réus fossem solidariamente condenados a pagar-lhe a quantia de € 19.815,74, acrescida dos respectivos juros de mora, vencidos e vincendos, contados a partir de 2.10.2006 e até efectivo e integral pagamento, atingindo os primeiros o montante de € 227,85, e que, subsidiariamente, a 5.ª ré fosse condenada a pagar-lhe aquela importância, acrescida dos juros de mora nos termos referidos.

Em resumo, a autora alegou que foi admitida ao serviço do Dr. GG, em 1.9.1975, para exercer as funções de assistente de consultório médico, a tempo inteiro e mediante remuneração, actividade essa que sempre exerceu no mesmo local até à data em que o Dr. GG morreu, em 22.7.2006; o Dr. GG sempre pagou pontualmente a remuneração da autora e, até finais de 2005, fê-lo sempre em numerário, passando depois a fazê-lo por meio de cheque emitido em nome da sociedade ré, que havia sido constituída em 5.1.2002, de que aquele era o único sócio e gerente; todavia, a autora continuou a prestar a sua actividade ao próprio Dr. GG, nos mesmos moldes em que o vinha fazendo e sempre no mesmo local, sendo que nunca houve qualquer acordo verbal ou escrito de cessação da relação laboral entre a autora e o referido Dr. GG e nunca à autora foi comunicada a razão pela qual os recibos de vencimento passaram a ser emitidos em nome da sociedade ré; o Dr. GG deixou como herdeiros os quatro primeiros réus, como tal devidamente habilitados por escritura de 15.9.2006, os quais passaram a ser representados junto da autora pelo segundo réu, o Dr. CC, por indicação de quem a autora continuou a prestar a sua actividade laboral no referido consultório, tendo-lhe sido pagos os vencimentos de Julho e de Agosto de 2006; no início de Setembro de 2006, a autora, de acordo com o que já estava previamente acordado, gozou oito dias de férias e quando se apresentou ao trabalho, na segunda semana daquele mês, o segundo réu disse-lhe que continuasse de férias enquanto decidiam da situação criada pelo falecimento de seu pai, o que autora aceitou; na terceira semana de Setembro de 2006, a autora apresentou-se novamente ao trabalho, tendo-se dedicado, tal como vinha fazendo desde o falecimento do Dr. GG e por instruções do segundo réu, a tirar e a entregar fotocópias das fichas de alguns pacientes que as solicitavam; no final do mês de Setembro de 2006, o segundo réu, em nome de todos os herdeiros, comunicou à autora a intenção de encerrar o consultório no final do mês de Setembro de 2006, entregando-lhe, para o efeito, uma carta datada de 28.9.2006, informando-a de que o seu contrato de trabalho tinha caducado com a morte do Dr. GG, dado que nenhum dos herdeiros era médico, não podendo, por isso, continuar a exercer a actividade que por aquele era levada a cabo, e o estabelecimento não foi nem seria transmitido, e de que todos os valores que lhe eram devidos pela caducidade do contrato se encontravam já na posse do segundo réu, disponíveis para pagamento, bem como o documento necessário para requerer a atribuição do subsídio de desemprego; os herdeiros do falecido computaram os ditos valores em € 19.815,74 líquidos e lançaram-nos em recibo de vencimento da sociedade ré, datado de 31.8.2006, que então foi entregue à autora, juntamente com a declaração para efeitos do subsídio de desemprego e com a declaração de quitação integral para ela assinar, logo que aquela quantia lhe fosse paga; atentas as boas relações que mantinha com o falecido e com o segundo réu e demais herdeiros, a autora nem sequer questionou os valores apurados e aceitou-os como tal, tendo continuado a prestar a sua actividade até ao dia 29.9.2006, sexta-feira, inclusive, combinando com o segundo réu passar pelo local de trabalho no dia 2.10.2006, a fim de receber a referida indemnização; na manhã desse referido dia, a autora compareceu no local de trabalho, mas o segundo réu não compareceu nem tão pouco atendeu as chamadas telefónicas feitas pela autora; dias depois, a autora conseguiu entrar em contacto telefónico com o segundo réu, com o qual se veio a encontrar, no local de trabalho, no dia 16.10.2006, a fim de este proceder ao pagamento da quantia acordada; nesse dia, porém, o segundo réu, em nome de todos os herdeiros, limitou-se a informar a autora de que não tinha dinheiro para lhe pagar, aconselhando-a a pedir a demissão, o que esta não fez; apesar das diversas insistências da autora junto dos referidos herdeiros, a quantia acordada não lhe foi paga, o mesmo acontecendo com o vencimento do mês de Setembro de 2006; os quatro primeiros réus não renunciaram à herança do falecido Dr. GG, antes a aceitaram, assumindo a sua qualidade de herdeiros, sendo que tal herança se afigurava superavitária, em montante muito superior ao agora reclamado pela autora; em 28.12.2006, os quatro primeiros réus deliberaram dissolver e extinguir a sociedade ré, tendo declarado que não havia lugar a liquidação nem a partilha, por inexistência de bens, o que não correspondia à verdade; desde 1975 até ao óbito do Dr. GG, este e a autora estiveram mutuamente vinculados por contrato individual de trabalho, como, aliás, foi reconhecido pelos quatro primeiros réus, designadamente ao invocarem a caducidade do referido contrato, por força do referido óbito; não tendo os quatro primeiros réus repudiado a herança, antes a tendo expressamente aceitado, são eles os responsáveis solidários pelo pagamento da indemnização devida à autora, sendo que os bens da dita herança excedem largamente os respectivos encargos; sem conceder e admitindo, por hipótese, que a relação laboral se tivesse de algum modo transmitido para a sociedade ré, então a actuação dos quatro primeiros réus configura, a todos os títulos, uma situação de despedimento sem justa causa, porque não sedimentada na extinção daquela sociedade, a qual, aliás, só veio a ocorrer sensivelmente três meses depois (de 28.9.2006, data da invocação da caducidade do contrato de trabalho por óbito do Dr. GG, até 28.12.2006, data da acta de dissolução da sociedade), e, nesta hipótese, a responsabilidade dos quatro primeiros réus perante a autora é igualmente solidária, uma vez que procederam à alienação do activo da sociedade ré, que era superior ao montante agora peticionado, sem assegurar o pagamento do mesmo, dando, pelo contrário, como desnecessária a liquidação subsequente à dissolução; nesta sequência, o facto de se demandar aqui a sociedade ré, já dissolvida e considerada extinta por desnecessidade de liquidação, decorre, à cautela e subsidiariamente, da hipotética invalidade da respectiva dissolução e falta de liquidação.

Frustrada a tentativa de conciliação realizada na audiência de partes, os quatro primeiros réus apresentaram a sua contestação, defendendo-se por excepção e por impugnação.

Em matéria de excepção, os referidos réus invocaram a sua ilegitimidade alegando que, em 5 de Abril de 2002, o Dr. GG, ao serviço subordinado do qual a autora se encontrava desde 1 de Setembro de 1975, constituiu uma sociedade unipessoal de responsabilidade limitada, que adoptou a firma "FF - Serviços Médicos, Sociedade Unipessoal, L.da", que teve por objecto a prestação de serviços médicos, a qual incorporou todo o material de escritório existente na altura e passou a assumir, como clientes, fornecedores ou nas relações com outros terceiros, as obrigações e responsabilidades cíveis decorrentes do exercício da actividade clínica do Dr. GG; foi neste contexto e na continuidade e dentro do processo lógico que levou à criação da sociedade em causa que o Dr. GG transferiu, com a concordância da própria autora, o vínculo laboral entre ambos existente, com todos os direitos e obrigações dele decorrentes, para a referida sociedade, tendo sido esta, por isso, até à data da sua dissolução e extinção, ocorrida em 28 de Dezembro de 2006, a última entidade patronal da autora, daí decorrendo a ilegitimidade dos réus contestantes, uma vez que não são, nem nunca foram, em circunstância alguma, entidade patronal da autora.

Em matéria de impugnação, os contestantes alegaram que na carta entregue à autora nunca confessaram que o Dr. GG tinha sido, até à data do seu falecimento, a entidade patronal da autora, até porque, em momento posterior ao da feitura daquela carta, o segundo réu, em nome da sociedade unipessoal, de que seu pai era o único sócio e gerente, emitiu e entregou à autora, que a aceitou, a "Declaração de Situação de Desemprego"; o que aconteceu foi que, após a morte do Dr. GG, a sociedade perdeu a sua única fonte de rendimentos, que era constituída pelos proventos oriundos dos serviços prestados por aquele clínico no exercício da sua profissão de médico, não tendo deixado, todavia, pelo menos até à sua dissolução, de ter de pagar as remunerações das duas trabalhadoras, a renda e os custos financeiros do investimento inicial; foi precisamente por causa dessa...

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