Acórdão nº 08B4072 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Março de 2009

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução29 de Março de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I A Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Póvoa de Varzim, Vila do Conde e Esposende, CRL intentou, no dia 16 de Dezembro de 2003, contra AA e BB, CC e DD, acção executiva para pagamento de quantia certa, a fim de haver deles o pagamento de € 178 994,60 e juros à taxa anual de 12,25% desde a referida data, com base em documento dito integrante de um contrato de mútuo e de um contrato de hipoteca.

AA e BB deduziram, no dia 10 de Março de 2004, oposição à referida execução, alegando não poderem figurar como devedores por se não verificar qualquer das situações previstas no artigo 45º do Código de Processo Civil e que a hipoteca incidente sobre o seu prédio nada tem a ver com o mais recente contrato de empréstimo, de 30 de Maio de 2000, só celebrado entre a exequente e CC e DD, pelo que não poderia produzir efeitos na sua esfera jurídica.

A oponida, na contestação, afirmou serem os oponentes executados ao abrigo do artigo 56º, nº 2, do Código de Processo Civil, desconhecer a alienação do imóvel pelos executados e ser a renovação ou prorrogação do crédito utilizado com a garantia de hipoteca livremente celebrada entre a mutuante e os mutuários.

No despacho saneador, proferido no dia 15 de Julho de 2005, foi relegada para final a decisão sobre a falta ou insuficiência do título executivo e, seleccionada a matéria de facto assente e controvertida, e realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 16 de Agosto de 2007, por via da qual foi, por um lado declarada extinta da execução quanto aos oponentes AA e BB.

E, por outro, foi ordenado o levantamento da penhora sobre o prédio descrito nos factos provados III 3 e 4 e dada sem efeito a tramitação da venda do aludido prédio, incluindo a aceitação da proposta de aquisição constante do processo principal.

Apelou a oponida, e a Relação, por acórdão proferido no dia 10 de Julho de 2008, negou-lhe provimento ao recurso.

Interpôs a apelante recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - a declaração de que "para garantia do bom e integral pagamento de todas as quantias devidas por força deste contrato, foi constituída hipoteca conforme escritura" significa que tal empréstimo constitui uma renovação ou prorrogação do crédito aberto pela aludida escritura pública; - a prática abarca esta ideia, da experiência comum, pois de outra forma não se perceberia esta expressa referência à garantia e à escritura; - o contrato de abertura de crédito é aquele mediante o qual um Banco se obriga perante um seu cliente a ter à sua disposição, quando ele o exigir, durante um determinado período, uma quantia em dinheiro até um determinado montante, que pode ser sacada de uma só vez ou em várias tranches, à medida das suas necessidades; - em contrapartida, o cliente constitui-se na obrigação de reembolsar o Banco, de pagar os juros em função das utilizações efectivas do crédito utilizado e as respectivas comissões e tudo o mais que for contratado; - na decisão confunde-se o valor do contrato - a quantia que a recorrente se obrigou a disponibilizar - com as garantias a ele adstritas, bem como o contrato de abertura de crédito com o contrato de mútuo, uma vez que daquele não resulta a efectiva utilização do crédito; - por isso, na decisão recorrida, mal se entende que um documento particular através do qual se concede um financiamento no âmbito de uma abertura de crédito não é meio adequado para abarcar uma garantia real; - o contrato de abertura de crédito é, em regra, um contrato de eficácia sucessiva cuja execução se projecta no tempo através de um ou mais actos de utilização do crédito disponibilizado, podendo ser pactuada a renovação automática, sem necessidade de assentimento do Banco, desde que o cliente esgote o montante convencionado e o haja reposto ou coberto; - no caso, a dívida é sempre a mesma, tem a mesma origem e natureza, embora tivesse sido reformulada e renegociada por várias vezes a pedido dos executados, sendo que a própria abertura de crédito prevê as prorrogações dos pedidos de empréstimo; - assim, na relação banco/cliente, nada impede que aquele disponibilize quantias que vão além daquelas que resultam da abertura de crédito, sobretudo quando é necessário acautelar ou formalizar eventuais excessos que acontecem com normalidade no giro bancário; - mas tal nada tem a ver com a amplitude da garantia real hipoteca que está subjacente ao contrato, porque ela apenas salvaguarda o montante que consta da escritura, o montante da abertura do crédito levado ao registo; - não se trata de "estender" tal garantia hipotecária e muito menos a empréstimos concedidos, que não são, mas renegociações sucessivas, há reclamação de um crédito coberto com garantia hipotecária no montante máximo pelo qual foi levado ao registo predial, para conhecimento de terceiros, incluindo os oponentes; - a não ser assim, não faz sentido a afirmação feita na decisão: "isto, como é óbvio, sem prejuízo de a aludida hipoteca se manter como garantia da abertura de crédito e utilização do mesmo pelos executados CC e DD até 35 000 000$ e com exclusiva aplicação, nos termos clausulados no aludido contrato de abertura de crédito de 1989"; - sobre o imóvel incide hipoteca a favor da oponida com a finalidade constante da escritura, que, como garantia real, confere à recorrente o direito de se fazer pagar pelos respectivos bens, não obstante terem sido posteriormente transferidos; - os oponentes não alegaram nem provaram qualquer facto impeditivo ou extintivo do direito invocado pela oponida, pelo não cumpriram o ónus que lhes incumbia; - foram violados os artigos 686º e 810º do Código Civil e 362º do Código Comercial.

Responderam os recorridos, em síntese de conclusão de alegação: - nada devem à recorrente e são proprietários do prédio hipotecado mais de oito anos antes da concessão do empréstimo exequendo; - não se provou que tal empréstimo esteja abrangido pela abertura de crédito garantida pela hipoteca que pendia sobre o prédio ou com aquela relacionado; - o dinheiro envolvido pela abertura de crédito em 12 de Abril de 1989 foi disponibilizado aos executados dois dias depois e dele dispuseram; - competia à recorrente a prova de que o empréstimo estava relacionado com a abertura de crédito de 1989, nos termos do artigo 342º, nº 1, o que não conseguiu; - é despicienda a análise mais aprofundada da falta ou da insuficiência do título executivo consubstanciado em documento particular firmado apenas pela recorrente, CC e DD; - a cláusula nona do contrato de empréstimo garantido por hipoteca não pode vincular terceiros, designadamente os recorridos, e, pelo montante...

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