Acórdão nº 08B0270 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Março de 2009
Magistrado Responsável | MARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA |
Data da Resolução | 25 de Março de 2009 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. D... - Concepção e Distribuição de Moda, SA. instaurou contra S...L... - Investimentos Imobiliários, SA, uma acção pedindo a sua condenação na restituição de € 68.201,49 e de uma indemnização de € 85.000,00, com juros desde a citação.
Para o efeito, e em síntese, alegou: - ter sucedido a R... - Ribeirão, Confecções Têxteis, SA, na titularidade de "todas as relações contratuais inerentes à actividade comercial" referente à marca de artigos de vestuário D...; - que a ré construiu um centro comercial em Santarém, denominado W Shopping, com inauguração prevista para 30 de Outubro de 2003; - que A... - Construtores Imobiliários, Lda, se apresentou à R... como representante da ré, encarregada de comercializar a utilização e exploração de lojas do centro comercial e de negociar os correspondentes contratos; - que em 17 de Janeiro de 2003 subscreveu uma "proposta de contrato para ingresso" no mesmo centro comercial, com o objectivo de futuramente celebrar um contrato destinado a instalar um estabelecimento, nas lojas 38 e 39, com uma área aproximada de 171 m² e que lhe foi apresentado com o clausulado previamente impresso; - que entregou a A... a quantia de € 68.201,49, entre 17 de Janeiro e 30 de Abril de 2003; - que, em Abril de 2003, por proposta de A..., aceitou explorar ainda a loja 37, com 36 m², com o objectivo de criar um espaço comercial único com as 3 lojas, de 207 m², negociando os custos de cedência, direito de ingresso, rendas e demais condições; - que preparou a sua instalação no centro tendo em vista a ocupação dessa área; - que, no entanto, a minuta de contrato que em Maio de 2003 lhe foi remetida apenas se referia à cedência e utilização das lojas nºs ... e 39, não tendo conseguido a integração da loja 37; - que, por isso, em 22 de Julho de 2003 comunicou a sua impossibilidade de celebrar o contrato de utilização relativo às lojas 39 e 39 e solicitou que se procurasse uma solução de consenso; - que em Agosto de 2003 A... comunicou à R... que a ré cedera a outrem a exploração das lojas 38 e 39; - que, apesar de posteriores contactos com a ré e com A..., nunca lhe foram cedidas as referidas lojas 38 e 39 nem restituído o dinheiro que entregara; - que a proposta tinha sido apenas subscrita por si, não admitindo a lei "tal tipo de promessa ou negócio" unilateral (artigo 457º do Código Civil); - que, se assim se não entender, considerando-se a autora vinculada à proposta, que é nula a cláusula constante do ponto 7.7, a), que prevê a perda da totalidade das quantias entregues, nos termos da al. c) do artigo 19º do Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro, por ser excessiva; - que sofreu prejuízos com a rotura das negociações referentes à loja 37, perdendo pelo menos € 30.000,00 com a venda de bens de equipamentos e de mercadorias adquiridos para a instalação do estabelecimento na área correspondente às 3 lojas; - que deixou de ganhar € 55.000,00 por ano, como contava, esperando vender, também por ano, produtos no valor de € 550.000,00; sendo pois equitativa a fixação de uma indemnização no montante de € 85.000,00.
Na contestação, a ré, além de impugnar os factos alegados, negou que a A... tivesse autonomia para negociar contratos, sendo apenas mediadora entre ela e os interessados, o que a autora sabia, tendo aliás prática neste tipo de negócios; - que foi a autora, à qual tinha sido proposta a utilização de uma loja diferente, que se mostrou interessada nas lojas 38 e 39, o que a levou a renegociar com outra empresa a mudança dessas lojas; - que foi a autora que, após diversas vicissitudes, comunicou estar impossibilitada de assinar o contrato referente a tais lojas, aliás tão tardiamente que se realizou a abertura do centro com os correspondentes espaços desocupados; - que a autora se mostrou interessada na loja 37, mas que não foi possível chegar a acordo com a empresa que já tinha assinado o contrato de utilização respectivo; - que procedeu às alterações necessárias à unificação das lojas 38 e 39; - que o documento assinado pela autora corresponde a um contrato promessa bilateral, para o qual não é exigida nenhuma forma; - que não se trata de um contrato de adesão; - que as quantias entregues foram consideradas como sinal, e que, portanto, tem a elas direito, a título de indemnização; Deve, portanto, ser absolvida dos pedidos.
Em reconvenção, pediu que se declarasse perdido o sinal a seu favor; que, se entendesse não se tratar de sinal, a autora fosse condenada a indemnizá-la pelos prejuízos sofridos, nomeadamente com a divisão das lojas 38 e 39, que calcula em € 150.000,00, mas cuja liquidação pede seja feita "em execução de sentença".
Houve réplica.
Por sentença de fls. 399, a acção foi julgada parcialmente procedente. A ré foi condenada a devolver a quantia de 68.201,49 € com juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento. Entendeu-se que, tendo a ré tornado impossível a realização da prestação que lhe competia, a autora tinha o direito de resolver o contrato e de reaver a quantia que lhe tinha pago. Quanto ao mais, a ré foi absolvida do pedido.
A reconvenção foi julgada improcedente.
Por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de fls. 604, foi concedido provimento parcial à apelação da ré. A Relação considerou ter havido incumprimento da autora, que desistiu do negócio, havendo lugar ao funcionamento da cláusula penal acordada; mas que, no caso, se revelou uma pena excessiva, razão pela qual a reduziu em 50% e condenou a ré a restituir à autora a quantia de € 34.100,75, com juros de mora desde a citação até integral pagamento.
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Ambas as partes recorreram, agora para o Supremo Tribunal de Justiça.
A autora impugnou o acórdão da Relação "na medida em que revogou parcialmente a decisão da 1ª instância e condenou a Ré apenas na restituição de 34.100,75 € e respectivos juros".
O recurso foi admitido a fls. 649, como revista e com efeito meramente devolutivo.
Quanto à ré, interpôs recurso subordinado, admitido a fls. 654, como apelação (revista) com efeito devolutivo.
Nas alegações que apresentou, a autora formulou as seguintes conclusões: 1 ° Resulta do documento denominado "proposta de contrato para ingresso" de 17-01- 2003 que as partes nele identificadas aqui se quiseram vincular de uma forma especial - a escrita.
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Estando só aquele documento assinado pela A, não havia vinculação enquanto não estivesse assinado por ambas as partes.
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Assim não está a A vinculada a estipulação de perda de 100% das quantias entregues à Ré, nem a Ré legitimada a ficar com os 68.201,49 €.
Sem prescindir 4° A Autora não discute nestes autos o eventual relacionamento contratual da A... com a Ré no domínio da mediação imobiliária, mas sim o relacionamento havido entre a mesma A, a A... e a Ré.
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Nem os tratos havidos entre a Autora e a A... correspondem à típica mediação imobiliária prevista no nosso sistema jurídico.
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A A... comportou-se com a Autora como alguém que estava habilitado a promover por conta da Ré a celebração de contratos relativos à instalação e exploração de lojas comerciais no "wshopping", auxiliando esta na respectiva comercialização numa atitude confiável para que a Ré contribuiu decisivamente.
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Independentemente da qualificação jurídica dos factos correspondentes ao relacionamento entre Ré e A..., que pode corresponder a contrato de agência, mandato ou contrato inominado o certo é que, ocorrem os pressupostos, factuais, éticos e legais que consubstanciais a "protecção da confiança" da "representação aparente", prevista no artigo 23° do DL 178/86.
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De todo o modo, sempre a A... se comportou como auxiliar da Ré, pelo que esta é responsável pelo comportamento daquela.
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A Autora dirigiu à A... a carta de 22-07-03 onde lhe declarava se encontrar "objectivamente impossibilitada" de celebrar o contrato de utilização das lojas 38 e 39, não sem antes ter, por diversas vezes e sem êxito tentado que naquele contrato de utilização de loja fosse incluído o espaço que correspondia à loja 37.
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E com tal carta procurava ainda uma solução consensual que incluísse na negociação a loja 37.
11 ° A Ré, ao ceder definitivamente as lojas 38 e 39 a outra entidade, conforme comunicação da A... de finais de Agosto de 2003 colocou-se culposamente na situação de incumprimento das suas obrigações, violando o disposto nos artigos 406°, n° 1 e 762º do C. Civil.
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O acordo de 17-01-2003 corresponde a um quadro negocial previamente definido pela Ré, cujas contra propostas facultadas à A. se limitaram a estipulações sem significado, encontrando-se tal sujeito ao regime jurídico das c1áusulas gerais, previsto no Dec- Lei n° 446/85, de 25 de Outubro.
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A c1áusula que prevê a perda de 100% das quantias entregues à Ré pela Autora, por não ter sido comunicada previamente a esta, que se limitou a aceitá-la considera-se excluída, nos termos daquele regime jurídico - artigo 8°.
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A mesma cláusula é desproporcionada aos eventuais danos a ressarcir, efectivamente ocorridos para a Ré, pelo que é proibido, nos termos da alínea c) do artigo 19° e nula nos termos do artigo 12° do mesmo regime jurídico.
Termos em que deve revogar-se o douto acórdão depois Tribunal da Relação, proferindo-se decisão que ordene o pagamento dos 68.201,49 € e juros à autora (...)".
Quanto à ré, em contra-alegações, sustentou existir um acordo entre as partes ("Dos factos provados constata-se (...) que: a Ré efectuou uma proposta à Autora; a Autora efectuou uma contraproposta à Ré; e a Ré «acabou por ceder, e aceitar a contraproposta da A.»"), sendo que "a aceitação da proposta foi até confirmada por escrito, conforme consta do doc. 1 junto com a contestação"; que não estão preenchidos os necessários requisitos para que se possa considerar que a A... procedeu como sua representante, nomeadamente aparente, ou como sua auxiliar; que foi a autora quem não cumpriu o contrato; que a cláusula penal não é nula.
Relativamente ao recurso que interpôs, a ré formulou as seguintes conclusões, na...
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