Acórdão nº 08S4116 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Março de 2009

Magistrado ResponsávelBRAVO SERRA
Data da Resolução12 de Março de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. No Tribunal de Trabalho de Bragança instaurou AA contra Banco BPI, S.A.

    , acção de processo comum, solicitando que fosse declarada a nulidade do despedimento de que ele, autor, foi alvo, consequentemente se condenando a ré a reintegrá-lo no seu posto de trabalho, com as categoria, antiguidade e retribuição que teria se não fosse despedido, a pagar-lhe as retribuições vencidas e vincendas, computando-se as primeiras, desde a data do despedimento e até à data da instauração da acção, em € 10.740,56, além de juros, e ainda a pagar-lhe € 50.000, a título de indemnização por danos não patrimoniais.

    Em síntese, invocou: - - que o autor, admitido em 14 de Março de 1993 ao serviço do Banco de Fomento Exterior, hoje Banco BPI, foi despedido em 24 de Novembro de 2005 com fundamento em faltas injustificadas, já que, segundo a nota de culpa e decisão de despedimento, foram falsos os motivos invocados para a justificação das ausências ao serviço; - simplesmente, os factos imputados não correspondem à realidade, já que o autor, devido ao comportamento da ré, entrou em depressão profunda, o que ocasionou que devesse entrar de «baixa médica», a qual foi devidamente atestada, consignando-se nos atestados que o seu estado psíquico não era o de impossibilidade de exercer qualquer actividade profissional, mas sim a impossibilidade de desempenhar a actividade profissional de trabalhador bancário nos termos que a ré pretendia, sendo que foi com base neste circunstancialismo que, durante os períodos de «baixa», exerceu funções docentes, as quais, aliás, segundo a opinião do seu médico, constituíam uma forma de o recuperar psiquicamente; - não obstante, a ré, que não logrou provar a inveracidade daqueles atestados, nem sequer actuou no sentido de o autor ser submetido a junta médica, veio a proferir a decisão de despedimento que, assim, é de considerar ilícito; - o comportamento da ré causou no autor abalo na sua reputação profissional e na imagem de respeito e credibilidade de que gozava no meio em que se encontrava inserido, com reflexo em enorme desgaste psicológico, vivendo com dificuldades em conciliar o sono, com dores de cabeça frequentes e insuportáveis, e num estado permanente de ansiedade, angústia e humilhação.

    Contestou a ré, sustentando, em súmula, que os motivos invocados pelo autor para a justificação das faltas dadas ao serviço de 13 de Outubro de 2003 a 27 de Julho de 2005 - com excepção do período compreendido entre 7 e 16 de Janeiro de 2004 - não correspondiam à realidade, pelo que foi adequada a sanção disciplinar imposta. Deduziu ainda a ré pedido reconvencional, peticionando a condenação do autor a pagar-lhe € 32.077,63 e juros, correspondentes ao somatório das quantias que lhe foram indevidamente pagas em Outubro a Dezembro de 2003, Janeiro a Dezembro de 2004 e Janeiro a Novembro de 2005, porquanto a mesma ré partiu do princípio de que o autor se encontrava impossibilitado de comparecer ao trabalho por motivo de doença.

    Prosseguindo os autos seus termos, veio, em 23 de Março de 2007, a ser proferida sentença, por via da qual foi: - - considerado ilícito o despedimento do autor; - consequentemente, a ré condenada a reintegrá-lo no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua antiguidade, e a pagar-lhe, a título de retribuições já vencidas, € 12.008, para além das retribuições vincendas até ao trânsito em julgado da decisão, além de juros; - absolvida a ré do pedido de indemnização por danos não patrimoniais; - absolvido o autor do pedido reconvencional.

    Apelou o autor da sentença, impugnando igualmente a matéria de facto, mas restringindo o seu inconformismo à parte em que a ré foi absolvida do pedido de indemnização por danos não patrimoniais.

    Igualmente apelou a ré, impugnando, outrossim, a matéria de facto.

    Na resposta à alegação do autor, a ré suscitou a questão de aquele, na sua alegação, ao impugnar a matéria de facto, não ter cumprido os requisitos exigidos pelo artº 690º-A do Código de Processo Civil.

    O Tribunal da Relação do Porto, por acórdão de 26 de Junho de 2008, decidiu: - - que, muito embora se não tivesse dado cumprimento ao disposto no artº 690º-A, nº 1, alínea a), do Código de Processo Civil, ouvidas integralmente as gravações dos depoimentos das testemunhas, haveria de concluir-se que a decisão da matéria de facto estava de acordo com a prova decorrente desses depoimentos, pelo que se haveria de manter a factualidade assente pela sentença impugnada; - no tocante ao recurso atinente à matéria de facto interposto pela ré, aditar um item a tal matéria; - negar a apelação do autor; - conceder parcial provimento à apelação da ré, vindo, por isso: - - a revogar a sentença recorrida na parte em que a condenou a pagar ao autor € 12.008, substituindo esse segmento decisório pela condenação da ré a pagar ao autor as retribuições que este teria auferido desde 13 de Junho de 2006 até à data do trânsito em julgado da decisão, e juros, retribuições essas relativamente às quais se haveriam que deduzir as importâncias que o autor, nesse período, houvesse recebido com a cessação do contrato, tudo a quantificar em incidente de execução; - a julgar parcialmente procedente a reconvenção, condenando o autor a restituir à ré os subsídios de doença referentes aos períodos de Outubro a Dezembro de 2003 e de 19 de Janeiro de 2004 a Novembro de 2005, no montante global de € 30.100,20, além de juros.

  2. Irresignado, vem o autor pedir revista, o mesmo fazendo a ré, esta de forma subordinada.

    Rematou o autor a alegação que produziu com o seguinte núcleo conclusivo: - "A)- No seu recurso de apelação o recorrente especificou e transcreveu, não só os factos considerados assentes (BB, CC, DD e EE) - os que considera terem sido incorrectamente julgados - bem como os meios de prova que, por referência àqueles, imporiam decisão diversa - os pontos 9 a 24.

    1. - Foram também transcritas as passagens dos depoimentos que, para o efeito, se mostraram relevantes para uma decisão diversa da que foi proferida, bem como identificados os autores dos respectivos depoimentos.

    2. - Tudo, em cumprimento do disposto no art.º 690.º-A, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil.

    3. - O recorrente assinalou os pontos da matéria de facto que julgou incorrectamente julgados, conforme descrito nas alegações supra.

    4. - Assinalou, de igual modo e como também atrás se notou, os meios probatórios que constavam da gravação e que impunham decisão diversa, F) - Nestes termos, a citada impugnação da decisão da matéria de facto deveria ter sido devidamente apreciada, nos termos e com os efeitos legalmente previstos e, consequentemente, ter sido dado provimento ao recurso nesta parte.

    5. - No que aos danos não patrimoniais diz respeito, salienta o acórdão recorrido, que, para além de entre as partes já decorrerem, ou terem decorrido, dois outros processos judiciais, os depoimentos recolhidos aludem apenas ao estado de saúde e de espírito do A. ao longo do período anterior ao despedimento.

    6. - Ora, resultou claro dos depoimentos acima mencionados que o seu estado de saúde se deteriorou ao longo do último processo disciplinar de que foi objecto e que culminou com o seu (novo) despedimento.

    7. -A alínea a), do n.º 1, do art.º 436.º do Código do Trabalho determina que, sendo o despedimento declarado ilícito, ‘o empregador é condenado a indemnizar o trabalhador por todos os danos (...) não patrimoniais causados.' J) - Os danos não patrimoniais não se desencadeiam apenas e só a partir do momento em que o trabalhador é, ou foi, despedido, tendo-se, no caso, iniciado logo a partir da instauração do procedimento disciplinar, o que constituiu o segundo despedimento ilícito de que o recorrente foi objecto.

    8. - Como resultou dos depoimentos recolhidos, o estado de saúde e de espírito do trabalhador sofreram alterações, para pior, uma vez que, para além de ter já dois processos pendentes a correr contra o Banco, veio ainda a ser arguido num processo disciplinar.

    9. - O acórdão recorrido considera apenas apreciáveis ou computáveis os danos que possam ocorrer após o despedimento, manifestamente datando-os.

    10. - A lei atribui a possibilidade de o trabalhador ser ressarcido por todos os danos não patrimoniais e não esquecendo que o despedimento foi ilícito, aqueles devem obrigatoriamente abranger todo o período antes e pós despedimento.

    11. - A lei em nada limita a valoração dos danos não patrimoniais durante todo o período que dura o processo disciplinar.

    12. - Os testemunhos do Dr. M...V... e da esposa do recorrente, pessoas que mais de perto com ele convivem dataram expressamente o agravar da sua situação clínica, a partir do período em que se iniciou o procedimento disciplinar.

    13. - Tendo ficado claramente demonstrado o nexo causal exigido pelo art.º 496.º do Código Civil quando ficou assente a dificuldade em conciliar o sono do A., o seu estado de ansiedade e isolamento e a repercussão que o processo teve na sua vida familiar, consubstanciando assim danos não patrimoniais decorrentes da actuação ilícita do Banco Recorrido, devendo, nesses termos, ser atendidos e reparados.

    14. - Pelo que, também nesta parte, deveria ser dado provimento ao recurso.

    15. - O acórdão recorrido parte do pressuposto de que as retribuições auferidas pelo A. pela sua actividade como docente não seriam por si auferidas não fosse o despedimento, o que é falso na medida em que as retribuições auferidas àquele título seriam sempre por ele recebidas independentemente de ser despedido ou não, S) - O recorrente já leccionava antes da sua situação de baixa clínica e do despedimento, sendo que o Banco conhecia tal facto, conforme resultou provado.

    16. - Pelo que às retribuições vencidas entre 13 de Junho de 2006 e a data do trânsito em julgado de decisão definitiva não deverá aquele que descontar as quantias que haja ou venha a receber no mesmo período pois já as recebia antes.

    17. - Por outro lado, não se coloca a questão da impossibilidade física do recorrente exercer as funções bancárias e de...

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