Acórdão nº 08S1687 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Março de 2009

Magistrado ResponsávelSOUSA PEIXOTO
Data da Resolução04 de Março de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. Relatório O Sindicato dos Trabalhadores dos Transportes Colectivos do Distrito de Lisboa veio, ao abrigo do disposto no art.º 183.º e seguintes do CPT, intentar, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, a presente acção, para interpretação da Cláusula 27.ª ("Prémio de assiduidade") do Acordo de Empresa celebrado entre o Metropolitano de Lisboa, E. P., e a FESTRU - Federação dos Sindicatos de Transportes Rodoviários e Urbanos e outros, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego n.º 13, I Série, de 8 de Abril de 2002, cujo teor é o seguinte: "1 - Aos trabalhadores abrangidos por este acordo é atribuído um prémio cujo valor mensal é de € 51,50.

2 - Tem direito ao prémio referido no número anterior o trabalhador que, no decurso do mês respectivo, não exceder cinco horas de faltas.

3 - O prémio é pago juntamente com o salário do mês seguinte àquele a que respeita.

4 - Para efeitos de aplicação do disposto nos n.os 1 e 2, não integram o conceito de falta as seguintes situações:

  1. Férias; b) As necessárias para cumprimento de obrigações legais; c) As motivadas por consulta, tratamento ou exame médico, por indicação da medicina ao serviço da empresa; d) Formação profissional, interna ou externa, por indicação da empresa; e) As requeridas pelo exercício de funções de dirigente e delegado sindical, membro da comissão de trabalhadores e das subcomissões de trabalhadores; f) As dadas pelos eleitos locais ao abrigo do crédito legal de horas e dispensas destinadas ao desempenho das suas funções; g) As dadas pelos candidatos a deputados à Assembleia de República, a órgãos das autarquias locais e pelos membros das mesas eleitorais; h) Luto; i) Aniversário natalício do trabalhador; j) Doação de sangue; k) As dadas por motivo de amamentação e aleitação; l) As dadas por motivo de acidente de trabalho; m) As dadas ao abrigo do Estatuto do Trabalhador-Estudante.

    " Alegando que o Metropolitano de Lisboa, E. P., vem a entender que as ausências verificadas por motivo de adesão à greve devem ser consideradas faltas, para efeito da atribuição do prémio de assiduidade, por se tratar de uma situação não elencada no n.º 4 da cláusula em questão e que essa interpretação é errada e ilegal, o autor veio pedir que a cláusula 27.ª fosse interpretada no sentido de que as ausências dadas por motivo de greve eram irrelevantes para a atribuição do prémio de assiduidade.

    Mais concretamente, pediu que a cláusula fosse interpretada "no sentido de que a falta de menção expressa da situação de ausências dos trabalhadores por motivo de greve como uma situação geradora da perda do direito à atribuição do prémio de assiduidade significa que essas ausências não devem ser consideradas para efeitos da atribuição do prémio de assiduidade previsto nos n.ºs 1 e 2 da Cláusula e que a falta de menção expressa da situação de ausência por motivo de greve nas alíneas do n.º 4 da Cláusula deve ser interpretada no sentido de que essas ausências não estão mencionadas porque, não integrando o conceito de falta, não carecem de ser excluídas desse conceito, pelo que, para que pudessem estar incluídas, no mínimo, sempre a Cláusula teria de o dizer expressamente".

    E, em prol da sua tese, alegou, em resumo, o seguinte: - o "Metropolitano de Lisboa" só assumiu aquela interpretação relativamente à greve efectuada no dia 10 de Dezembro de 2002, já que, antes disso, e desde a entrada em vigor da aludida cláusula, em 1999, nunca tinha considerado as ausências por motivo de greve como faltas ao serviço e, como tal, nunca as tinha contabilizado para efeitos da atribuição do prémio de assiduidade, apesar de se terem realizado inúmeras greves; - tal como o "Metropolitano de Lisboa" a entendia, reconhecia e interpretava, a Cláusula 27.ª não pretende integrar a adesão à greve no conceito de faltas para efeitos da atribuição do mencionado prémio nem é esse o motivo por que a situação de greve não se encontra expressamente elencada nas alíneas do n.º 4; - com efeito, a referida Cláusula não tinha que prever expressamente a situação de greve, dado que, durante a greve, o contrato de trabalho dos trabalhadores a ela aderentes se suspende, não sendo correcto, por isso, falar-se em faltas; - e mais incorrecto seria, ainda, falar-se em absentismo, em virtude do exercício do direito de greve estar constitucionalmente consagrado; - para serem consideradas faltas, a Cláusula 27.ª teria de o dizer expressamente; - não o fazendo, não pode deixar de se entender e interpretar como estando excluídas do conceito de faltas; - a tal não obsta o facto das "férias"estarem previstas e elencadas no n.º 4 da Cláusula, como não integrando o conceito de falta, uma vez que tal menção não era necessária para que as férias não fossem consideradas faltas, pois, se assim não fosse, as ausências verificadas nos dias feriados, nos dias de descanso semanal e nos dias de descanso compensatório teriam de ser consideradas faltas para efeitos da aplicação dos n.os 1 e 2 da Cláusula 27.ª; - nem se diga que as partes outorgantes do Acordo de Empresa, ao não elencar expressamente a greve no n.º 4 da Cláusula, o fizeram por pretenderem incluir as respectivas ausências no conceito de falta, para efeitos da atribuição do prémio de assiduidade, quando, inclusivamente, excluíram desse conceito situações como as ausências requeridas para o exercício de funções de dirigente e delegado sindical, membro da Comissão de Trabalhadores e das Subcomissões de Trabalhadores e a ausência no dia de aniversário natalício do trabalhador; - na verdade, uma tal interpretação em nada se coadunaria com os objectivos que se pretenderam atingir com a instituição do prémio de assiduidade previsto na Cláusula 27.ª, dado que, com vista à diminuição da taxa de absentismo, se admitiria, por um lado, um conjunto lato de situações como não integrando o conceito de faltas e, por outro lado, se consideraria o exercício do direito à greve, constitucionalmente consagrado, como integrando tal conceito; - a ser assim, o que se visaria não seria a diminuição da taxa de absentismo, mas sim a limitação do exercício do direito de greve, o que constituiria uma violação intolerável desse direito, na medida em que consubstanciaria uma forma de pressão ilícita sobre os trabalhadores, coagindo-os a não aderirem à greve, ou restringindo esse direito apenas a cinco horas mensais, o que sempre seria ilegal por violação do disposto no art.º 10.º da Lei n.º 65/77, de 26 de Agosto, actualmente, do art.º 603.º do Código do Trabalho; - de resto, a interpretação do art.º 10.º da Lei n.º 65/77, segundo a qual não constitui coacção, prejuízo ou discriminação o não pagamento do prémio de assiduidade, com fundamento na ausência verificada por adesão à greve, sempre seria inconstitucional, por violação dos art.os 13.º, 18.º e 57.º da Constituição da República Portuguesa; - da mesma forma, por violação dos mesmos normativos constitucionais, seria inconstitucional a interpretação do art.º 10.º da Lei n.º 65/77, no sentido de integrar a ausência por motivo do exercício do direito de greve no conceito de faltas.

    Todos os outorgantes do Acordo de Empresa em questão foram citados, para alegarem e apresentarem os seus meios de prova, nos termos do art.º 184.º do CPT, mas só o Metropolitano de Lisboa, E. P., o STTM - Sindicato dos Trabalhadores de Tracção do Metropolitano e o SITRA - Sindicato dos Trabalhadores dos Transportes Rodoviários e Afins usaram dessa faculdade.

    O STTM e o SITRA aderiram à tese perfilhada pelo sindicato autor, mas o Metropolitano de Lisboa excepcionou a impropriedade do meio processual utilizado pelo autor e sustentou a improcedência da acção.

    Mais concretamente, o Metropolitano de Lisboa alegou o seguinte: - as acções previstas nos artigos 183.º a 186.º do CPT respeitam à anulação e interpretação de cláusulas de convenções colectivas de trabalho; - interpretar significa determinar o sentido com que hão-de valer as declarações contidas numa norma, se valerem; - o autor apenas pretende esclarecer se, face ao teor da Cláusula 27.ª, as ausências dos trabalhadores por motivo de greve são, ou não, uma situação geradora da perda do direito ao prémio de assiduidade nela previsto; - não é possível requerer-se a interpretação da citada cláusula pelo facto do Metropolitano de Lisboa entender que aquelas ausências são consideradas faltas para efeito da atribuição do dito prémio, pois o facto de o Metropolitano de Lisboa aplicar a referida cláusula não é motivo suficiente para requerer a sua interpretação, uma vez que não está em causa qualquer divergência sobre o conteúdo da mesma; - na verdade, o que é solicitado ao tribunal é que este decida, independentemente do disposto na cláusula, que o prémio de assiduidade seja atribuído a trabalhadores que adiram a greve, sob pena de se limitar o exercício do direito à greve; - suscitando-se dúvidas sobre a legalidade do teor da cláusula, o que se devia requerer era que o tribunal declarasse a ilicitude da mesma; - assim, o meio processual a que o autor recorreu não é o próprio (art.º 183.º, n.º 4, a contrario, do CPT), o que configura uma excepção dilatória...

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