Acórdão nº 08B4052 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Fevereiro de 2009
Magistrado Responsável | JOÃO BERNARDO |
Data da Resolução | 12 de Fevereiro de 2009 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - Na execução para pagamento de quantia certa, que pende no Tribunal de Vinhais, em que é exequente BANCO AA, S.A., e executado BB, veio este último deduzir a presente oposição.
Invocou, na parte que agora interessa, o preenchimento abusivo da livrança dada à execução, sustentando ainda que nada devia ao exequente e que, em qualquer caso, o crédito objecto de execução não era líquido.
O exequente/opoído contestou, defendendo que o preenchimento da livrança dada à execução obedeceu ao contratado entre ele e o opoente, que a execução é a única forma de ver o seu crédito satisfeito uma vez que não é possível a recuperação do veículo objecto de contrato e, por fim, que a dívida é totalmente líquida.
Após tramitação que agora não interessa, foi proferida sentença que julgou procedente a oposição e declarou extinta a execução.
II - Apelou o AA e com êxito, porquanto o Tribunal da Relação do Porto revogou a sentença recorrida, julgando improcedente a oposição.
III - Pede revista o opoente.
Conclui as alegações do seguinte modo: 1 - Salvo melhor opinião, a questão a decidir é se a apelada pode dar à execução uma livrança que serviu de garantia de bom cumprimento e agora peticiona uma indemnização pela violação do interesse contratual negativo, após ter resolvido o contrato celebrado com o apelante.
2 - Dúvidas não subsistem que existiu um pacto de preenchimento da livrança.
3 - Contudo, e salvo melhor opinião, existiu um abuso no preenchimento da livrança.
4 - Isto porque, o contrato celebrado entre exequente e executado foi resolvido por aquele - Cfr. alínea S) dos factos assentos.
5 - Na verdade, está vedado à exequente dar à execução uma livrança que serviu de garantia de bom cumprimento se o que agora se pretende é peticionar uma indemnização pela violação do interesse contratual negativo.
6 - Isto é, pretende agora a exequente ser indemnizada por aquilo que deixou de obter em virtude de se ter frustrado o negócio.
8 - Mais, não se encontra provado, pela análise da matéria de facto dada como provada, que a exequente estava autorizada a preencher a livrança com valores respeitantes à indemnização pelo interesse contratual negativo mas, tão só, à indemnização pelo interesse contratual positivo.
9 - Assim sendo, a apelada foi para além do que lhe era licito e permitido fazer no âmbito da relação contratual a partir do momento em que resolve o contrato celebrado com o exequente.
10 - Salvo melhor opinião, resta apenas à exequente intentar a competente acção judicial de condenação com vista à sua indemnização pela violação do interesse contratual negativo.
Legislação violada: artigos 433° e 801°, n° 2 do Código Civil.
Nestes termos, nos melhores de direito, e sempre com o mui douto suprimento de Vossas Excelências, deve o acórdão do Tribunal da Relação do Porto ser revogado e mantida a decisão proferida em primeira instância.
Não houve contra-alegações.
IV - Nas alegações e respectivas conclusões, o recorrente parte da ideia de que a quantia constante da livrança visa restabelecer a situação que se verificaria se a exequente não tivesse celebrado o contrato (dano negativo), quando aquela foi subscrita e entregue para garantir o cumprimento. E parte dessa ideia porque, no seu entender, em caso de resolução contratual, só este dano pode ser objecto de indemnização.
Assim, a questão que se nos depara consiste em saber se a livrança dada à execução foi preenchida abusivamente porque se destinava a garantir as prestações correspondentes ao cumprimento do contrato e a resolução contratual que a exequente levou a cabo só comporta indemnização pelo interesse contratual negativo.
V - Vem provada a seguinte matéria de facto:
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Nos autos de execução a que os presentes correm por apenso, foi dada à execução uma livrança no montante de € 18.189,92, em que consta como subscritor o oponente/executado BB - al. A) dos factos assentes.
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Do verso dessa livrança consta a menção "dou o meu aval ao subscritor", seguida de uma assinatura manuscrita com o nome de CC - al. B) dos factos assentes.
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No dia 26/10/1999, o oponente/executado acordou com "BPI Rent - Comércio e Aluguer de Bens, Lda.", com financiamento do "Banco AA, S.A", a venda a prestações, com financiamento e reserva de propriedade, tendo assinado o escrito designado de "Contrato de venda a prestações com financiamento", a que foi atribuído o n.º 000000000000, referente ao veículo automóvel de marca Citroen, modelo Xantia BK 9TD, matrícula ..-..-... - al. C) dos factos assentes.
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O veículo identificado em C) foi entregue ao oponente/executado com um primeiro pagamento, em 26.10.1999, de € 4.239,78 e mediante o pagamento de 60 prestações mensais e sucessivas de € 324,82, com início no dia 5 dos meses seguintes - al. D) dos factos assentes.
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O oponente/executado e o "avalista" constante no título dado à execução assinaram a livrança identificada em A), para garantia do pagamento- al. E) dos factos assentes.
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O veículo foi vendido pelo "BPI Rent - Comércio e Aluguer de Bens, Lda.", com reserva de propriedade a seu favor, até integral pagamento do preço - al. F) dos factos assentes.
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Os registos de aquisição a favor do oponente/exequente e a reserva de propriedade a favor do "BPI Rent, Lda.", foram averbados na Conservatória do Registo de Automóveis de Lisboa, em 25.11.1999 - al. G) dos factos assentes.
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O oponente/executado deixou de pagar as prestações, pelo menos, em Setembro de 2000 - al. H) dos factos...
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