Acórdão nº 09P0325 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Fevereiro de 2009

Magistrado ResponsávelPIRES DA GRAÇA
Data da Resolução04 de Fevereiro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Nos autos de inquérito (actos jurisdicionais) sob o nº 72/07.7JACBR dos serviços do Ministério Público junto do Tribunal Judicial de Viseu, veio, através do seu Exmo Mandatário, o arguido AA, com os demais sinais dos autos, preso preventivamente no Estabelecimento Prisional Regional de Viseu, à ordem dos referidos autos, intentar a presente providência de habeas corpus, nos termos do art. 31° da C.R.P. e artº 222° do C.P.Penal, por entender que se encontra preso ilegalmente, nos termos e com os fundamentos seguintes: 1. O requerente foi detido por haver suspeitas da prática de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelo artigo 21º do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro.

  1. Em consequência foi presente, em 06 de Junho de 2008, a primeiro interrogatório judicial de arguido detido, tendo aí sido ordenada a prisão preventiva do aqui requerente â ordem do processo de inquérito nº 72/07.7 JACBR do Ministério Público junto do Tribunal da Comarca de Viseu.

  2. Assim, ao aproximar-se o prazo legal de 3 meses, contado desde a data em que o requerente foi sujeito à medida coactiva de prisão preventiva, procedeu-se, em 2 de Setembro de 2008, ao reexame da subsistência dos pressupostos da aplicação dessa medida.

  3. Pelo que, o Meritíssimo Juiz de lnstrução do Tribunal de Viseu entendeu, após compulsados os autos que se mantinham todos os pressupostos de facto e de direito que conduziram à aplicação daquela medida coactiva.

  4. E o mesmo se entendeu, em 27 de Novembro de 2008, após ter decorrido mais 3 meses sobre aquela decisão, aquando do novo reexame.

  5. Assim sendo, o requerente continuou aguardar os ulteriores termos processuais em situação de prisão preventiva, 7. Acontece que, decorreram 6 meses sem que nos referidos autos tivesse sido deduzida acusação.

  6. Actualmente o requerente encontra-se há quase 8 meses sujeito aplicação da medida coactiva de prisão preventiva.

  7. O nº 2, do artº 215º do C.P.Penal consagra que: A prisão preventiva extingue-se, nos casos de criminalidade altamente organizada, quando, desde o seu início, tiverem decorrido 6 meses sem que tenha sido deduzida acusação.

  8. Assim, à semelhança dos restantes prazos máximos fixados na Lei Processual Penal para a manutenção de medidas de coacção, o prazo máximo de 6 meses de submissão a prisão preventiva visa proteger, acautelar eventuais violações e injustiças proporcionadas pela manutenção da medida de coacção mais gravosa a arguidos que beneficiam, de resto, até trânsito em julgado de decisão válida, do princípio in dubio pro reu.

  9. O art. 28" n.º 4 da lai Fundamental confere aos prazos máximos de prisão preventiva a dignidade de imperativo Constitucional.

  10. Com efeito, dúvidas não restam que a situação de requerente é coincidente com o preceito supra transcrito - o requerente encontra-se preso preventivamente sem que haja sido deduzida acusação.

  11. Mesmo que, à cautela, por mera hipótese e razões de patrocínio, 14. Se considerasse - o que se não concebe nem concede - que o caso sub judice integra a situação prescrita nos nºs 3 e 4, do art. 215º do C. P.Penal, no qual estabelece que o referido prazo de 6 meses é elevado para 1 ano quando o procedimento for por um dos crimes do n" 2 do mesmo preceito legal e - requisito cumulativo - se revelar de excepcional complexidade, sendo que apenas esta pode ser declarada durante a 1ª instância , por despacho fundamentado. oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público e - novo requisito cumulativo - ouvido o arguido (negrito e .sublinhado nosso).

  12. Ora. o requerente nunca foi notificado de qualquer despacho nesse sentido.

  13. Como também não foi o seu mandatário, apesar de este ter junto aos autos a respectiva procuração outorgada por aquele a si, em 24 de Junho de 2008.

  14. E muito menos foi o requerente ouvido para se pronunciar sobre tal decisão - quando a lei o exige.

  15. Ainda à cautela, mesmo que se entenda que a excepcional complexidade do processo tenha sido declarada, face ao exposto, só o poderia ter sido em momento anterior ao primeiro interrogatório judicial do requerente.

  16. Sucede que. o requerente nunca teve ou lhe foi dado em momento algum, qualquer conhecimento que tivesse sido declarada a excepcional complexidade do processo.

  17. Tanto pelas razões já supra invocadas como por o facto de o processo se encontrar, nos termos de art. 86º nº 3 do C.P.P., sujeito ao segredo de justiça.

  18. Até porque, apesar do mandatário do arguido ter requerido, nos termos do art. 86º', nº 4 do C.P.P., o levantamento do seu segredo de justiça, bem como, nos termos do art. 89°, n° 1 do mesmo diploma, a obtenção de cópias do interrogatório judicial, tal pretensão foi indeferida, sendo que apenas lhe foi permitida a consulta do auto de interrogatório do requerente na secretaria do Tribunal.

  19. Não obstante isso, o requerente em momento algum foi ouvido - tal como é exigido - para se pronunciar sobre a declaração judicial eventualmente proferida a considerar o procedimento de excepcional complexidade.

  20. A exigência do arguido ser ouvido sobre tal questão, consagrado no art. 215º n° 4, decorre dos direitos que a lei atribui ao arguido de os poder gozar e que se encontram plasmados no artº. 61º n° 1.

    in casu. na al. a) e b) de C.P.P., estabelece que o arguido, goza dos direitos de •• a) .estar presente aos actos processuais que directamente lhe disserem respeito; b) e ser ouvido pelo tribunal ou juiz de instrução sempre que eles devam tomar qualquer decisão que processualmente lhes afecte 24. Sendo que, tais direitos, se acentuaram ainda com maior veemência com as alterações introduzidas pela Lei nº 48/2007, de 29 de Agosto ao texto do art. 215º do C.P-P., com a exigência de se verificarem os requisitos cumulativos aí impostos para a aplicação de excepcional complexidade do procedimento.

  21. Bem como a mesma lei introduziu, com o seu art. 5º, alterações ao Decreto- Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, revogando o seu artigo 54°.

  22. Estas alterações introduzidas naqueles preceitos legais, consistiram, além do mais, em reduzir os prazos de prisão preventiva, dado o carácter de extrema ratio, desta medida coactiva e de modo a não prejudicar os seus fins cautelares.

  23. E desta forma, veio assim qualificar de ope judície a declaração de excepcional complexidade do procedimento que se encontra consagrada no art. 215, nºs 3 e 4 do C.P.P ..

  24. Na eventualidade de ter sido declarada a excepcional complexidade processual, como supra se mencionou, o arguido nunca foi ouvido sobre tal decisão, pelo que se assim for, foi violado in casu, além dos referidos preceitos legais referidos em 23° supra, o princípio do contraditório que está subjacente aos mesmos.

  25. Pelo que, face ao exposto, determina o disposto do art. 119 al. c) do C.P.P. que a ausência do requerente ou...

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