Acórdão nº 08S2059 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Janeiro de 2009

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução21 de Janeiro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 21 de Novembro de 2006, no Tribunal do Trabalho de Aveiro, AA intentou acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra ASSOCIAÇÃO DO T..... P... (ETP) DE A... pedindo que: I) se declare que, por a ré não ser possuidora de autorização, registo ou do respectivo alvará de empresa de trabalho temporário, é (são) nulo(s) o(s) contrato(s) de trabalho que com ela firmou, ou II) se declare que o(s) contrato(s) celebrado(s) é (são) nulo(s), por incumprimento dos requisitos previstos na legislação própria; seja como for, III) se declare que, por determinação legal, o contrato existente é um contrato sem termo; IV) se declare que o seu despedimento é nulo, por não existir justa causa e por não ter sido precedido de processo disciplinar; V) a ré fosse condenada a reintegrá-lo, com a categoria de estivador, do tipo B, e as funções e remunerações inerentes, ou, caso não opte pela reintegração, a pagar indemnização correspondente à antiguidade; VI) a ré fosse condenada a pagar € 23.234, acrescidos de juros legais, contados desde a citação até integral e efectivo pagamento, a título de retribuições vencidas e vincendas, que deixou de auferir, desde 30 dias antes da propositura da acção até à data da sentença, retribuição de férias e subsídios de férias e de Natal; VII) a ré fosse condenada a pagar a quantia, que vier a ser liquidada, relativa a diferenças salariais (incluindo subsídios de férias e de Natal), diferenças de valor de remuneração horária atinente às horas extraordinárias, diuturnidades e, ainda, prémio mensal de assiduidade, subsídio de regularidade e prémio de produtividade; VIII) a ré fosse condenada a pagar juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, desde a data de vencimento de cada uma das diferenças ou prestações em falta, até integral e efectivo pagamento.

A acção, contestada pela ré, foi julgada parcialmente procedente, tendo a sentença da 1.ª instância considerado «nulos, por violação do disposto nos artigos 2.º, alínea c), e 5.º do Decreto-Lei n.º 280/93 de 13 de Agosto, e artigo 113.º, n.º 1, do Código do Trabalho, os contratos de trabalho outorgados por autor e ré, os quais, não obstante a nulidade, produziram efeitos como se fossem válidos durante o tempo em que cada um esteve em execução».

2.

Inconformado, o autor apelou para o Tribunal da Relação de Coimbra, que confirmou a sentença impugnada, negando provimento ao recurso de apelação.

É contra esta decisão que o autor se insurge, mediante recurso de revista, em que pede a revogação do acórdão recorrido ao abrigo das conclusões seguintes, que foram apresentadas após convite do relator para que as completasse, nos termos do preceituado no n.º 4 do artigo 690.º do Código de Processo Civil: «1. (I) O regime jurídico aplicável in casu deverá ser: 2. entende modestamente o ora Recorrente, o preceituado no (até agora afastado) regime jurídico do trabalho temporário (RJTT, do Decreto-Lei n.º 358/89, de 17 de Outubro), 3. (i) quer por força da remissão legal prevista no próprio regime legal do trabalho portuário (RJTP), designadamente o seu artigo 9.º, n.º 3, do próprio Decreto-Lei 280/93, de 13 de Agosto, o qual remete, em caso de omissão, para a legislação do RJTT, 4. (ii) quer por ser o que directamente versa sobre o caso material em mérito, 5. por se tratar, ao fim e ao cabo, de um caso de regime de trabalho temporário, dado inexistir tal previsão especial, de trabalho temporário, em sede de (regime jurídico do) trabalho portuário, 6. o que não aconteceu em sede de douto Acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, onde surge inibida a aplicação de tal regime (RJTT) - que perfilhou pela inibição deste, quando deveria ter postulado pela sua execução -, 7. de onde deverá ser aplicável in casu o regime de nulidade (do contrato de trabalho) especial ali previsto, i.e., e a final, a reintegração do Recorrente como trabalhador efectivo da empresa Ré por nulidade do contrato e situação fáctica em mérito, - (a) quer por inexistência, por parte da Ré, de alvará bastante (a qual possui a licença para o exercício da actividade portuária, e não para a laboração de cedência de mão-de-obra temporária), (b) quer por falta de autorização, por parte da entidade legal competente, ou, ainda, (c) quer por falta de registo em listagem própria - em sequência respectiva, arts.° 7.º, n.º 1 e 5.°, do RJTT -, - (d) ou por renovação superior a duas ocorrências, ou (e) por ultrapassar o limite temporal legal de um ano - [artigos] 20.º e 23.º do RJTT e 139.º e 141.º do Código do Trabalho - , - (f) ou por ilegalidade quanto ao motivo, ou (g) por fraude à lei -, - tudo de molde a converter os ditos contratos de trabalho, de termo certo a contratos efectivos.

8. (II) Quanto ao regime de nulidade (e respectivas consequências) cabido in casu: 9. a consequência atribuída (à nulidade contratual) deveria ter sido a da reintegração do trabalhador nos quadros da empresa Ré, e não uma nulidade civilística, - (a) quer por aplicação do princípio geral de direito da derrogação da lei geral em favor da especial, - (b) quer por aplicação do princípio laboral da presunção de uma relação laboral ou equiparada como sendo laboral e efectiva, - (c) com uma interpretação distinta da anteriormente conferida e ao disposto nos artigos 114.º, 113.º do Código do Trabalho - quando devia ser aplicado o previsto nos artigos 11.º e 12.º, presunção de existência de contrato de trabalho (a termo [sic] indeterminado) -, e d[o] art. 118.º, ao invés do[s] artigos 113.º, 130.º, n.º 2, 131.º, n.º 2, 132.º, n.º 2, 141.º e 139.º (ex vi art. 19.º, n.º 2, do RJTT, i.e., estes em consequência de, perante a nulidade contratual do trabalho temporário, dever ser o caso tratado como se a tempo indeterminado), todos do Código do Trabalho, pois tal determinará a efectividade da relação laboral entre Recorrente e Ré, - (d) bem ainda a que flui da leitura conjugada dos artigos 11.º, 217.º, n.º 1, 236.º, n.º 1, e 294.º do Código Civil, o que, em leitura conjugada e interpretando a matéria fáctica dos autos, em momento algum resulta, em sede de interpretação das vontades, inexistir a vontade de contratar na falta de uma habilitação legal (carteira profissional), i.e., o contrato seria concluído mesmo com a "parte viciada" - numa perspectiva da teoria de integração da vontade das partes, - (e) sendo ainda realçada a nulidade do motivo alegad[o] para a precariedade da contratação em mérito, [o] qual, além de vag[o] e genéric[o], repetiu-se por mais de 4 anos e meio de contratação entre Autor e Ré, - tudo de molde a desembocar na nulidade prevista em sede laboral, definida por reporte aos princípios laborais do tratamento mais favorável ao trabalhador, de sobreposição da justiça material sobre a formal ou, ainda, o da valoração positiva do valor de segurança no emprego; - ou, de outra banda, operando o disposto no art. 116.º, n.º 1, do C. Trabalho, e porque a cessação ocorre antes da declaração de nulidade do contrato, àquela deverão ser aplicadas as normas de cessação do contrato de trabalho a tempo indeterminado, de onde, e assim, 10. (III) Existe, em consequência, uma cessação ilícita do contrato de trabalho, com os demais direitos e consequências legais a final.

11. (IV) Ainda, e a jusante, o DL n.º 280/93 sofre de inconstitucionalidade orgânica (por não ter respeitado a respectiva lei de autorização) e material (por violação do art. 53.º da CRP, ou por violação do disposto nos artigos 2.º e 59.º, n.º 1, al.

a), da Constituição da República Portuguesa, atenta a manifesta e demonstrada situação laboral precária), 12. dado que o Governo desrespeitou a lei de autorização n.º 1/93, de 6 de Janeiro, ao desrespeitar quanto desvirtuou o objecto, o sentido e a extensão do diploma de autorização, ao contrário do plasmado no artigo 53.° da Constituição da República Portuguesa (que assegura a segurança no emprego e a perenidade do contrato de trabalho) e em nota dissonante quanto ao por si, legislador, dito em sede de preâmbulo (quinto parágrafo), originando a omissão e a precariedade verificada no caso em mérito.

13. Assim modestamente se procura a sã e inteira JUSTIÇA!» A recorrida não contra-alegou.

Neste Supremo Tribunal, a Ex.ma Procuradora-Geral-Adjunta pronunciou-se no sentido de que o recurso de revista devia ser negado, parecer que, notificado às partes, não suscitou qualquer resposta.

3.

No caso vertente, as questões suscitadas são as que se passam a enunciar, segundo a ordem lógica que entre as mesmas intercede: - Se o(s) contrato(s) firmado(s) entre as partes enferma(m) de nulidade, (i) por a ré não deter autorização, não estar registada, nem possuir alvará para o exercício da actividade de empresa de trabalho temporário, (ii) por a sua renovação exceder o limite legal, (iii) por ilegalidade quanto ao motivo ou fraude à lei, devendo converter-se em contrato de trabalho sem termo (conclusões 1.ª a 7.ª da alegação do recurso de revista); - Se a nulidade dos contratos celebrados determina a reintegração do autor na empresa ré (conclusões 8.ª e 9.ª da alegação do recurso de revista); - Se ocorreu a cessação ilícita do contrato de trabalho do autor (conclusão 10.ª da alegação do recurso de revista); - Se o Decreto-Lei n.º 280/93, de 13 de Agosto, que estabelece o regime jurídico do trabalho portuário, padece de inconstitucionalidade orgânica e material (conclusões 11.ª e 12.ª da alegação do recurso de revista).

No corpo da alegação do recurso de revista, o autor insiste na atribuição de compensação por caducidade dos contratos de trabalho temporários firmados, caso se entenda que esses contratos caducavam no final do termo neles previsto; todavia, o acórdão recorrido decidiu que aquela compensação, «para além de ser questão nova, não está suportada em pedido que deva ter sido considerado», sendo que o autor, apesar de vencido quanto a este ponto, não tomou a...

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