Acórdão nº 08A3823 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Janeiro de 2009

Magistrado ResponsávelHELDER ROQUE
Data da Resolução13 de Janeiro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: AA, residente na Rua..., nº 0, Bairro Arcanjo Lar, em Ponta Delgada, propôs a presente acção, sob a forma de processo ordinário, contra a "Companhia de Seguros BB", com sede no Largo ...., em Ponta Delgada, pedindo que, na sua procedência, a ré seja condenada a pagar ao autor a quantia de €204764,00, invocando, para o efeito, e, em síntese, que, em virtude de um embate na traseira do seu veículo automóvel, que se encontrava parado, no interior do qual se achava, ocasionado pelo condutor do veículo, de matrícula NS-00-00, CC, devido a culpa única deste, sofreu danos patrimoniais, no montante de €154764,10, e não patrimoniais, no quantitativo de €50000,00.

Na contestação, a ré "Companhia de Seguros BB", para quem o condutor CC havia transferido a responsabilidade civil proveniente de acidente de viação, aceitando os factos alusivos ao modo como ocorreu o embate, impugnou a extensão dos danos suportados pelo autor, em especial, por já ser portador de uma incapacidade provinda de anterior acidente.

Na véspera da audiência de discussão e julgamento, o autor ampliou o pedido, na vertente dos danos não patrimoniais, para o quantitativo de €150000,00, ascendendo o montante global dos danos peticionados, quer patrimoniais, quer não patrimoniais, a €304764,10, e não a €354764,10, como, por manifesto lapso, consta do aludido articulado de ampliação.

Notificada a ré deste articulado de ampliação, não se pronunciou sobre o mesmo, outrotanto acontecendo com o Tribunal de 1ª instância, devendo, porém, o mesmo considerar-se admitido, quer porque foi efectuado, até ao encerramento da discussão em 1ª instância, quer por se tratar do desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo, nos termos do disposto pelo artigo 273º, nº 2, do Código de Processo Civil (CPC).

A sentença julgou a acção, parcialmente, procedente, e, em consequência, condenou a ré a pagar ao autor a quantia de €90707,00, acrescida de juros vencidos, no montante de €17403,00, e de juros vincendos, calculados à taxa legal, até efectivo pagamento.

Desta sentença, o autor e a ré interpuseram recurso de apelação que, julgando improcedente a apelação da ré e, parcialmente procedente, o recurso interposto pelo autor, condenou aquela a pagar ao autor a quantia de €130000,00, com juros, desde a data de actualização, e, desde a citação, sobre €139,10, referente a despesas médicas e medicamentosas.

Deste acórdão, a ré interpôs recurso independente de revista e o autor recurso subordinado, terminando as respectivas alegações com as seguintes conclusões: RECURSO INDEPENDENTE DA RÉ 1ª - À data do acidente o autor já se encontrava reformada por invalidez com uma incapacidade de 75%.

  1. - Com o acidente passou a padecer de uma incapacidade de 85%.

  2. - Além de reformado tinha um negócio supermercado que vendeu ao filho após o acidente, 4ª- Na qualidade de gerente auferia uma remuneração de 420,00 euros.

  3. - Com a venda do negócio recebeu contrapartidas.

  4. - Não sofreu qualquer perda a título de lucros cessantes já que o negócio podia manter-se independentemente da nova incapacidade do lesado até contratando alguém que o substituísse.

  5. - Não se provou que do negócio aquele recebesse qualquer rendimento conforme declaração fiscal junta aos autos.

  6. - Não tem por isso direito a qualquer indemnização a título de lucros cessantes.

  7. - Mesmo que assim não fosse sempre se dirá que o montante indemnizatório arbitrado é muito elevado e viola os princípios do direito.

  8. - Na verdade, o mesmo foi fixado com base no facto do autor ter uma incapacidade de 85% quando na realidade e de acordo com a prova em consequência do acidente ficou apenas com uma incapacidade de 10%.

  9. - Pelo supra exposto a indemnização arbitrada a titulo de lucros cessantes deverá ser reduzida aos seus justos limites de acordo com a jurisprudência e o direito não ultrapassando os 20.000,00 euros.

  10. - Mesmo que assim não se pense sempre se dirá que o valor atribuído pelo douto Tribunal a quo a título de danos não patrimoniais deve ser corrigido, diminuindo-se e adequando-se o mesmo às circunstâncias do caso explanado nos autos.

  11. - Ainda, a indemnização arbitrada por compensação de danos morais de 30.000,00 euros, pelo Tribunal «a quo», face à doutrina que vem sendo produzida pelos doutos Tribunais é manifestamente exagerado, inadequado e desproporcional.

  12. - Já que o período em que o autor esteve de baixa em consequência deste acidente foi de 2 meses.

  13. - De qualquer forma aquele montante é manifestamente exagerado e deverá por isso, ser reduzido aos seus justos limites.

  14. - Ao decidir da forma atrás descrita, o Meritíssimo Juiz violou o disposto nos artigos 495º e 496° do Código Civil.

    RECURSO SUBORDINADO DO AUTOR 1ª - Atendendo à gravidade das lesões do autor, ao agravamento do seu estado clínico, às limitações de que daí resultam para o exercício de toda e qualquer profissão, à idade de vida útil do autor, à total perda de rendimentos, o montante fixado a título de danos morais não deve ser inferior a 150.000,00€.

  15. - Atendendo à incapacidade que resultou do acidente para o autor e que o incapacitou praticamente para toda e qualquer actividade, e bem assim das fortes dores que o acompanharão até ao fim dos seus dias e do facto de estar praticamente dependente de terceiros para se deslocar ou fazer face às mais básicas necessidades da vida e à inerente perda de qualidade de vida, o montante devido a título de danos não patrimoniais não pode ser ponderado em quantia inferior a 125.000,00€, acrescida igualmente de juros nos termos atrás referidos.

  16. - Provindo a obrigação de indemnizar de facto ilícito o devedor constitui-se em mora a partir da interpelação feita mediante citação para a acção judicial em que se peça a sua condenação a pagar.

  17. - Ao não o entender assim, o douto acórdão recorrido violou o disposto, entre outros, nos artigos 483°, 496° e 564°, todos do Código Civil e Assento n°4/2002 deste STJ.

    Não foram apresentadas contra-alegações.

    O Tribunal da Relação declarou demonstrados os seguintes factos, que este Supremo Tribunal de Justiça tem como aceites, nos termos das disposições combinadas dos artigos 722º, nº 2 e 729º, nº 2, do CPC, mas reproduz: No dia 5 de Outubro de 2001, pelas 14,00 horas, quando o autor se encontrava parado, ao volante da sua viatura ligeira de mercadorias, marca Wolkswagen, na Estrada Regional dos Fenais da Luz, foi embatido, por detrás, pelo veículo ligeiro de mercadorias, de caixa aberta, marca Toyota, matrícula NS-00-00, conduzido por CC - A).

    Em consequência do acidente, a viatura do autor foi empurrada para a frente, cerca de 30 metros - B).

    O local do acidente é uma recta com mais de 500 metros de visibilidade - C).

    O piso, que é de alcatrão, não apresentava covas, buracos ou quaisquer outras irregularidades de pavimento - D).

    Devendo-se o embate, única e exclusivamente, a desatenção do condutor ligeiro de mercadorias, que não reparou na viatura do autor, parada, a mais de 400 metros de distância - E).

    O veículo, de matrícula NS-00-00, encontrava-se, à data do acidente, seguro na ré, pela apólice nº 90/256257 - F).

    A ré liquidou ao autor os danos materiais sofridos por este - G).

    O autor declarou à ré que não tinha sofrido quaisquer danos pessoais ou corporais decorrentes do sinistro - H).

    Por carta, datada de 25 de Outubro de 2001, o autor reclamou ter sofrido danos corporais e solicitou à ré que lhe fossem prestados, gratuitamente, cuidados médicos - I).

    O autor tinha, à data do acidente, 48 anos, já que nascera no dia 26 de Janeiro de 1953 - J).

    Há cerca de 10 anos, o autor sofreu um acidente doméstico, que lhe provocou lesões na coluna (fractura da coluna), tendo sido, posteriormente, e, em consequência dessa lesão, submetido a intervenção cirúrgica, em Lisboa, pelo Prof. Lobo Antunes - L).

    À data do acidente, o autor já sofria de lesão vértebro-medular, tetraparésia - M).

    Sofria ainda de cifose dorsal e lordose lombar - N).

    Em virtude do embate traseiro, o autor foi projectado contra o volante e deste para trás, batendo com a cabeça e restante corpo no assento, tendo-se este partido - 1º.

    Do embate resultou para o autor traumatismo da coluna cervical (manobra de chicote), com as consequentes...

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