Acórdão nº 08A3809 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Janeiro de 2009
Magistrado Responsável | HELDER ROQUE |
Data da Resolução | 13 de Janeiro de 2009 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: AA, residente na Rua ....,.........., 1º, em Lisboa, propôs a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra BB, viúva, CC e marido, DD todos residentes na Rua ...................................,..... Costa da Caparica, pedindo que, na sua procedência, seja reconhecido o direito de propriedade do autor sobre o prédio infradiscriminado, sejam os réus condenados a entregar ao autor esse imóvel, devoluto de pessoas e bens, e sejam os réus condenados, a título de lucros cessantes, no pagamento de 14 000 000$00, vencidos até à presente data, aos quais acrescerá a indemnização de 250 000$00 mensais, até à entrega do imóvel ao autor, invocando, para tanto, e, em síntese, que comprou o aludido prédio urbano, habitado pelos réus, mas que estes se recusam a entregar-lho, não obstante não disporem de qualquer título para o ocupar, o que lhe causa um prejuízo mensal equivalente ao seu valor de rendimento, que é de 250 000$00.
A ré BB, na sua contestação, alega, em suma, que a procuração pela qual conferiu ao autor poderes para vender o prédio é anulável, por se encontrar incapacitada de entender o seu alcance, e que, subsidiariamente, o negócio é, também, anulável, por usura, dado que aquele foi vendido por preço inferior ao real, e que nada lhe foi pago, tendo, para a hipótese de não ser anulado o negócio, deduzido reconvenção, pedindo que o autor seja condenado a pagar-lhe o preço declarado na escritura, na importância de 20 000 000$00.
Os réus CC e DD contestaram, igualmente, alegando, em síntese, que o autor se encontrava a providenciar pela venda do prédio, tendo-lhes emprestado a quantia de 11 500 000$00, que deveriam pagar quando a venda se efectuasse, outorgando a favor do mesmo uma procuração, cujo alcance não entenderam, nem lhes foi lido, o que acarreta a nulidade da escritura, por falsidade do instrumento notarial que conferiu a procuração, ou, então, a nulidade do contrato de compra e venda, por usura, dado que receberam 11 500 000$00 por um prédio que valia 45 000 000$00.
Em reconvenção, estes réus solicitam que, a entender-se, diversamente, o negócio seja alterado, por forma a que o preço da venda se fixe em 224.459,005€, ou, então, subsidiariamente, que o autor seja condenado a pagar o preço que consta na escritura, isto é, de 20.000000$00, com juros de mora.
Na réplica, o autor alega que o preço combinado com os réus para a venda do imóvel foi de 11 500 000$00, integralmente, pago, tendo ficado com a procuração, por ser impossível realizar a escritura, no momento pretendido, sendo ainda que o valor declarado nesta se deveu a razões fiscais.
Na tréplica, a ré BB reafirmou que nada recebeu do autor ou de quem quer fosse pela venda do prédio.
A sentença julgou a acção improcedente, anulando o contrato de compra e venda do prédio urbano com o n°......., sito na Rua .................., na Costa da Caparica, descrito na 2a Conservatória do Registo Predial de Almada, sob o n°.........., e inscrito na respectiva matriz, sob o artigo ..........., celebrado por escritura pública de 6 de Novembro de 1996, no 2º Cartório Notarial de Lisboa e, em consequência, determinou a restituição pelos segundo e terceiro réus ao autor da quantia de 11500 contos (hoje, equivalente a 57361,75€), actualizada em função da desvalorização monetária, tendo em conta as taxas oficiais de inflação verificadas entre cada entrega e o momento em que se proceder à restituição, e, também, a anulação da inscrição G4, de 29 de Agosto de 1996, da aquisição, a favor do autor, embora, porém, esta só possa executar-se, através da comunicação à Conservatória, depois de demonstrada aquela restituição.
Desta sentença, o autor interpôs recurso, tendo a apelação sido julgada improcedente, pelo Tribunal da Relação, que confirmou, inteiramente, a decisão, para cujos fundamentos remeteu, em conformidade com o disposto pelo artigo 713º, nº 5, do Código de Processo Civil (CPC).
Do acórdão da Relação, o mesmo autor interpôs recurso de revista, terminando as alegações com o pedido da sua revogação, julgando-se procedente a acção, formulando as seguintes conclusões: 1ª - O recorrente intentou contra os recorridos a acção declarativa sob a forma de processo ordinário, alegando em síntese que por escritura pública lavrada no 2o Cartório Notarial de Lisboa, a fls.74 do Livro n°105-G, no dia seis de Novembro de mil novecentos e noventa e seis, o ora autor, adquiriu livre de ónus ou encargos o prédio urbano sito na Rua ...................................,....., na Costa da Caparica, freguesia da Costa da Caparica, concelho de Almada, pelo preço de Esc: 20.000.000$00.
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- Alegou também que apesar de ter instado, por diversas vezes, os ora recorridos a desocuparem o imóvel, aquele não logrou obter, até à presente data, a posse do imóvel que legitimamente adquiriu.
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- Alegou ainda que os ora recorridos recusam-se, voluntariamente, a entregá-lo ao recorrente e que não dispõem de qualquer título que lhes legitime a posse que vêm exercendo sobre o imóvel.
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- Por fim, pediu que os recorridos indemnizassem o recorrente na quantia de Esc: 14.000.000$00, a título de indemnização por lucros cessantes, à qual deverá acrescer ainda as quantias vincendas até à entrega do imóvel.
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- Os recorridos contestaram e vieram pedir que fosse nula e de nenhum efeito a escritura de compra e venda outorgada pelo autor no 2o Cartório Notarial de Lisboa, em 6 de Novembro de 1996, absolvendo-se os réus do pedido.
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- O recorrente foi procurado pelos recorridos CC e DD para lhe comprarem o imóvel identificado nos autos, o qual era propriedade da recorrida CC e da mãe desta, a recorrida BB.
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- O recorrente cumpriu os formalismos, pagou o preço acordado para a compra do imóvel e deixou os recorridos continuar a habitar o prédio por mais algum tempo.
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- O recorrente usou a procuração para a outorga da escritura pública de compra e venda e registou a seu favor o prédio identificado nos autos depois do ter pago integralmente aos recorridos.
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- A recorrida BB, quando assinou a procuração que serviu de suporte à escritura pública de venda, estava acompanhada da filha e do genro e comportou-se sem demonstrar qualquer incapacidade acidental.
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- A recorrida BB se não se encontrasse na posse das suas capacidades mentais não teria tido o comportamento que teve. No mínimo, é estranho que caso estivesse incapaz, naquele momento, a única filha e o genro a tivessem sujeitado a essa situação e até encobrissem essa incapacidade.
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- A filha e o genro da BB jamais invocaram essa incapacidade e só o fizeram mais de cinco anos depois da assinatura da procuração e depois de citados no âmbito da presente acção.
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- Se o recorrente se tivesse apercebido de algo de anormal não teria adquirido o prédio. A própria funcionária do Cartório Notarial leu em voz alta o teor da procuração, na presença dos interessados e não detectou qualquer incapacidade da recorrida BB.
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- Como se pode verificar pelos relatórios periciais juntos aos autos, os peritos médicos não referem que a recorrida BB estava, à data dos factos, incapaz de compreender o sentido da procuração.
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- Ninguém referiu em Tribunal que a recorrida BB, no dia em que assinou a procuração estava incapaz de entender o seu conteúdo.
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- Assim, no caso em apreço, não se pode aplicar o disposto no artigo 257° do Código Civil, pelo que o douto Tribunal de 1a instância agiu mal, decisão confirmada pelo acórdão objecto do presente recurso, agiu mal ao anular o negócio com o fundamento previsto naquela disposição legal.
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- O recorrente acordou o preço de aquisição e efectuou o...
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