Acórdão nº 08S3041 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelBRAVO SERRA
Data da Resolução18 de Dezembro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. Pelo Tribunal do Trabalho de Valongo instaurou AA contra C... - S... de M... e E..., S.A.

    , acção de processo comum, solicitando que fosse a ré condenada a reconhecer a ilicitude do despedimento de que, ele autor foi alvo por parte da ré, condenando-se esta a pagar-lhe € 2.528,80, a título de retribuição em dívida relativa ao período compreendido entre 25 de Julho e 24 de Outubro de 2005, € 1.809,02, a título de retribuição em dívida relativa aos proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal vencidos no ano da cessação do contrato de trabalho, todos os vencimentos, férias, subsídio de férias e de Natal vencidos desde 25 de Outubro de 2005 e até ao trânsito em julgado da sentença, e o dobro legal da indemnização, em substituição da reintegração, computada desde logo em € 41.856 e actualizável até à data da sentença.

    Aduziu, muito em síntese, que começou a trabalhar para a ré em 1 de Julho de 1990, vindo-lhe a ser diagnosticada uma doença profissional denominada epicondilite, o que levou a mesma ré a cometer-lhe novas funções; porém, a ré pretendeu impor ao autor a realização de tarefas incompatíveis com aquela doença e, porque elas não podiam ser realizadas por este, instaurou-lhe processo disciplinar, suspendendo-o do exercício de funções, vindo esse processo a culminar com a decisão de despedimento, o qual não tem qualquer justificação de facto ou de direito, sendo que o processo disciplinar padece de nulidades; que a ré não lhe pagou a retribuição correspondente ao período de 25 de Julho a 24 de Outubro de 2005 e a totalidade dos proporcionais férias, subsídio de férias e de Natal desse mesmo ano.

    Contestou a ré, sustentando, em súmula, que, após ela lhe ter cometido novas funções, mesmo assim o autor não as desempenhou, mantendo-se nos lavabos sem nada fazer e não vindo a comparecer no seu local de trabalho a partir da manhã de 2 de Agosto de 2005 e nos dias 3, 4, 5, 8, 9, 10, 11 e 12 de Agosto; que o autor não demonstrou estar afectado de qualquer grau de incapacidade; que o processo disciplinar não padece de nulidade.

    Reconveio ainda a ré invocando que, mesmo que fosse verdade estar o autor afectado da alegada doença que o incapacitasse para o exercício das funções que desempenhava - torneiro mecânico de primeira -, o que era certo era que ela não tinha qualquer outro posto de trabalho que lhe pudesse atribuir, razão pela qual deveria ser declarada a caducidade do contrato de trabalho.

    Prosseguindo os autos seus termos, veio, em 17 de Julho de 2007, a ser proferida sentença que: - - considerando ilícito o despedimento do autor, condenou a ré a pagar-lhe: - - todos os salários, férias, subsídios de férias e de Natal vencidos desde 24 de Outubro de 2005 até ao trânsito em julgado da sentença, "sem prejuízo do disposto no artigo 437º nº 2 e 3 do Código do Trabalho e a liquidar, se necessário, em execução de Sentença"; - uma indemnização correspondente a sessenta dias de remuneração por cada ano de antiguidade ou fracção até àquele trânsito, estando já vencidos, a esse título, € 29.648; - € 2.528,80 de vencimentos referentes ao período de 25 de Julho a 24 de Outubro de 2005, e € 476,25 referentes a proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal relativos ao ano da cessação do contrato; - julgou improcedente o pedido reconvencional.

    Inconformada, apelou a ré para o Tribunal da Relação do Porto, o qual, por acórdão de 14 de Abril de 2008, negou provimento à apelação.

  2. Mantendo a sua irresignação, vem agora a ré pedir revista, culminando a alegação adrede produzida com as seguintes «conclusões»: - "1ª - Não tendo o recorrido provado estar temporariamente incapacitado para o trabalho e tendo sido dado por provado que à data dos factos o CNPCRP não havia certificado qualquer incapacidade em virtude de doença profissional, nem os serviços da Segurança Social atestado a sua incapacidade para o trabalho, teria de se considerar que o recorrido estava apto para desempenhar as funções para que foi contratado.

    1. - Não existindo à data da prática dos factos qualquer elemento que provasse a incapacidade do recorrido e justificasse a sua recusa em trabalhar (não obstante as diversas solicitações da recorrente nesse sentido - cfr. alínea Q) e T) dos factos dados por provados), era absolutamente legítimo à recorrente interpretar tal recusa como uma desobediência culposa e injustificada do trabalhador às ordens e instruções do empregador.

    2. - Conforme dispõe peremptoriamente o art. 77.º n.º 3 do D.L. 248/99, de 2-7: ‘A certificação e a revisão das incapacidades é da exclusiva responsabilidade do CNPCRP', sem prejuízo do diagnóstico presuntivo pelos médicos dos serviços de saúde, para efeitos de atribuição da indemnização por incapacidade temporária' 4ª - Não existe na actual legislação qualquer disposição que imponha aos empregadores a obrigação de ocupar os trabalhadores parcialmente incapacitados para o trabalho em virtude de doença profissional, quer o disposto no art. 30.º quer no 40.º da L. 100/97, de 13-9, nunca foram objecto da regulamentação autónoma necessária (veja-se o disposto no art. 2.º n.º 2, alínea e) do D.L. 143/99, de 30-4), o que determina a sua não aplicabilidade às entidades patronais.

    3. - A partir de 02/08/2005 o recorrido optou claramente por uma situação de ausência injustificada e desobediência às ordens da apelante.

    4. - Os comportamentos descritos e dados como provados constituem uma violação dos deveres consagrados nas alíneas b), c) e d) do nº 1 do art. 121.º do Código do Trabalho, violação esta grave e que, por si só, toma impossível a manutenção da relação laboral, constituindo justa causa de despedimento, nos termos do disposto no art. 396.º n.º 1 e n.º 3 alíneas a), d) e g) do Código do Trabalho.

    5. - Tendo sido reconhecida ao recorrido uma incapacidade permanente parcial de 8% (cfr. alínea AA) dos factos dados por provados), depois de ter sido declarada pelo CNPCRP a ausência de qualquer incapacidade e depois de cessado factualmente o contrato de trabalho, e não tendo a recorrente ocupação e função compatíveis com o respectivo estado e a respectiva capacidade residual que pudesse atribuir ao recorrido, face à recusa de trabalhar por parte do mesmo, deve o contrato de trabalho ser declarado cessado por caducidade e, assim, proceder o pedido reconvencional formulado pela recorrente.

      8 - O disposto no art. 30.º da L. 100/97 é privativo do regime dos acidentes de trabalho, por só a estes dizer respeito, não devendo ser aplicável ao caso sub judice, o que, em caso de se entender que o recorrido foi ilicitamente despedido, o que não se concebe, a recorrente apenas teria de ser condenada no pagamento da indemnização de antiguidade à razão de 30 dias por cada ano ou fracção de antiguidade e não à razão de 60 como aconteceu na douta sentença ora posta em crise.

    6. - A compensação a que alude o art. 437.º do C.T. apenas é devida enquanto se mantiver o vínculo contratual, não havendo qualquer fundamento para a sua atribuição quando deixe de estar em causa, ou seja afastada, a reintegração do trabalhador.

    7. - A opção do trabalhador pelo recebimento da indemnização de antiguidade, acarreta a cessação do contrato de trabalho, ainda que de forma atípica, razão pela qual só são devidos os vencimentos intercalares até à data da opção.

    8. - A sentença posta em crise violou nomeadamente o disposto nos arts. 30.º e 40.º da Lei 100/97, de 13-9; art. 77.º do D.L. 248/99, de 2-7; art. 2.º n.º 2, alínea e) do D.L. 143/99, de 30-4); arts. 387.º alínea b), 396.º n.º 1 e n.º 3 alíneas a), d) e g), art. 437.º e 439.º todos do Código do Trabalho.

      " Respondeu o autor à alegação da ré dizendo que ela nada de novo trazia relativamente à alegação formulada na apelação, sendo que não era de censurar o aresto recorrido.

      A Ex.ma Magistrada do Ministério Público neste Supremo exarou «parecer» no qual propugnou pela improcedência da revista.

      Notificado esse «parecer» às partes, somente sobre ele se pronunciou a ré, que continuou a defender o ponto de vista já sustentado na alegação de recurso no que se refere a não dever serem pagas ao autor, no caso de declaração da ilicitude do despedimento, os salários intercalares após ter ele optado pela indemnização substitutiva da reintegração.

      Corridos os «vistos», cumpre decidir.

      II 1.

      Pelo acórdão ora em crise vem dada por assente a seguinte factualidade, a que este Supremo atenderá, visto aqui se não colocar qualquer das situações a que aludem o nº 2 do artº 722º e o nº 3 do artº 729º, ambos do Código de Processo Civil: - - 1) o autor celebrou um contrato com a ré, com início de produção de efeitos no dia 1 de Julho de 1990, em consequência do qual lhe prestou, desde então, a sua actividade profissional inerente à categoria profissional de torneiro mecânico, sob as ordens, direcção e autoridade desta, auferindo um vencimento que, em Outubro de 2005, ascendia à remuneração base de € 872,00; - 2) a fls. 89 a 96, e datada de 6 de Setembro de 2005, encontra-se junta a nota de culpa subscrita pelo instrutor do processo disciplinar, BB; - 3) no culminar desse processo disciplinar, a ré procedeu ao despedimento com invocação de justa causa, conforme decisão datada de 21 de Outubro de 2005, junta a fls. 113, na qual também decide ratificar todo o processado pelo instrutor no processo disciplinar; - 4) o autor não tinha, antes, sofrido qualquer sanção disciplinar por parte da ré; - 5) em Maio de 2004, foi-lhe diagnosticada, pela Drª. F... R..., na sequência de um exame realizado no âmbito da Medicina do Trabalho, uma doença profissional denominada epicondilite; - 6) na sequência do citado diagnóstico, o autor foi encaminhado para a competente junta de incapacidades - doenças profissionais -, a qual, por seu turno, fez dar entrada, em 29 de Outubro de 2004, no Centro Nacional de Protecção contra os Riscos Profissionais, a respectiva participação obrigatória; - 7) a ré enviou ao autor carta datada de 27 de Agosto de 2004, junta a fls. 18 dos...

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