Acórdão nº 08A3298 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelMOREIRA ALVES
Data da Resolução09 de Dezembro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

RelatórioNo Tribunal Judicial da Comarca de Portimão, AA e esposa, BB, intentaram a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra, CC e mulher DD, Pretendem os A.A. (sobrinhos dos R.R.) que se declare a anulabilidade da compra e venda celebrada pela escritura pública de 8/5/2002, respeitante a um apartamento sito na Praia dos Três Irmãos, freguesia do Alvor concelho de Portimão, designado por nº 505 da Torre G, nos termos da qual o 1º Réu, na qualidade de representante dos A.A., com base em procuração por estes emitida, vendeu aquele prédio a Ré mulher, por um preço irrisório.

Alegam que a procuração em causa conferia também à Ré poderes para a venda do prédio, pelo que o posicionamento desta como compradora na aludida escritura configura um negócio consigo mesmo, anulável nos termos do Art.º 261º do C.C., do qual só tiveram conhecimento em 30/4/2003.

Citados os RR. contestaram.

Alegam, em resumo, que o imóvel em questão foi anteriormente adquirido pelo R., agindo com procuração dos A.A., mas com dinheiro do R.

O negócio foi efectuado em nome dos A.A., seus sobrinhos, no contexto dos laços afectivos que os uniam e por os RR. não terem filhos (agindo os R.R. de igual modo em relação a outros sobrinhos).

Porém, o R. marido sempre actuou em relação ao prédio como se dono fosse e para prevenir essa sua relação com o imóvel, os A.A. outorgaram ao R. e à Ré esposa todos os poderes respeitantes ao imóvel, que incluíam os poderes para vender a quem e nas condições que fossem entendidas.

No uso de tais poderes o R., em representação dos A.A. vendeu à Ré esposa o referido apartamento, sendo certo que se encontram casados segundo o regime de separação de bens, o que só por si afasta a ideia de negócio consigo mesmo.

De qualquer modo, os A.A. tiveram conhecimento da dita venda, à qual não se opuseram.

Invocam, ainda, ao excepção de caducidade, respeitante ao decurso do prazo de 1 ano para a propositura da acção de anulação (Art.º 287º nº1 do C.C.), na medida em que os A.A. tiveram conhecimento da dita venda logo no dia seguinte (9/5/2002), tendo a presente acção sido proposta em 28/5/2003, portanto, mais de um ano após o conhecimento do negócio.

Replicaram os A.A.

No despacho saneador relegou-se para sentença final a apreciação da excepção peremptória (caducidade).

Estabelecidos os factos assentes e organizada a base instrutória, foi realizado o julgamento, findo o qual se proferiu sentença final que julgou improcedente a acção, absolvendo-se os R.R, do pedido.

Na fundamentação da decisão, o tribunal considerou inexistir base legal para a anulação do negócio, não se pronunciando sobre a questão da caducidade, por entender que essa questão só se colocaria no caso de haver anulabilidade.

No essencial, argumentou o tribunal que não se está perante um negócio do representante consigo mesmo, porquanto os efeitos da venda não se repercutiram na esfera patrimonial do R. marido, mas só na da Ré esposa, por estarem casadas em regime de separação de bens, e na medida em que a Ré interveio como terceira compradora em nome próprio, e não como representante dos A.A., apesar de ter poderes para tanto, sendo certo que esses poderes de representação podiam ser exercidos conjunta ou separadamente pelos R.R.

Mais sustentou o tribunal que, ainda que houvesse negócio consigo mesmo o certo é que os A.A. aceitaram a venda por qualquer preço e condições e que não houve qualquer prejuízo para os A.A., em virtude de ter ficado provado que o R. custeou a aquisição do imóvel e suportou todas as suas despesas inerentes - estariam, assim, preenchidas as excepções à anulabilidade previstas no nº2 do citado Art.º 261 do C.C.

Inconformados recorreram os A.A., recurso que foi admitido como de apelação.

Apreciando a apelação a Relação sufragou a posição assumida pela sentença recorrida no que concerne à qualificação da compra e venda como não consubstanciando um contrato consigo mesmo, pelo que logo afastou a sanção da anulabilidade.

Em consequência, julgou prejudicada a questão de facto suscitada no recurso (alteração da resposta ao quesito 6º) uma vez que só se justificaria conhecê-la se se concluísse pela anulabilidade, e todavia não fosse de aplicar a sanção legal por força de excepção prevista no nº2 do Art.º 261 do C.C. (inexistência de conflito de interesses).

Novamente inconformados, voltam a recorrer os A.A., agora de revista e para este S.T.J., repetindo no entanto, no essencial, a mesma argumentação desenvolvida na apelação.

Conclusão: Apresentadas tempestivas alegações, formularam os recorrentes as seguintes conclusões: I - Com todo o devido respeito, os recorrentes continuam a entender que o caso dos autos traduz uma situação de negócio consigo mesmo.

II - A tese pugnada no douto acórdão recorrido atende à questão formal de no negócio dos autos intervir mais do que uma pessoa, desprezando o desiderato que preside ao estipulado no art.° 261° do Civil.

Que se encontra na protecção dos interesses do representado.

III - Analisando os factos dos autos, a possibilidade do sacrifício desses interesses é patente.

IV - A venda em causa nos presentes autos, da qual se pretende a anulabilidade, foi realizada pelo recorrido enquanto representante dos recorrentes, à sua mulher, também ela representantes destes.

Não pode a recorrida ter essa qualidade de representante e afirmar que interveio no negócio como se não a tivesse.

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