Acórdão nº 08P 1413 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Novembro de 2008

Magistrado ResponsávelRODRIGUES DA COSTA
Data da Resolução27 de Novembro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1.

    No 3.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, no âmbito do processo comum singular n.º 78/05.0PTRLA.C1, foi julgado o arguido AA, identificado nos autos, e condenado por decisão de : a) Pela prática de um crime de homicídio negligente, p. e p. pelo artigo 137°. n° 2 do Código Penal (CP), na pena de dois anos de prisão; b) Pela prática de um crime de ofensas à integridade física negligente, p. e p. pelo artigo 148° n° 1 do CP, na pena de cinco meses de prisão; c) Pela prática de um crime de omissão de auxílio, p. e p. pelo artigo 200° n° 2 do CP, na pena de catorze meses de prisão.

    Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de três anos de prisão, que foi declarada suspensa na sua execução pelo período de 4 anos.

    1. Parte cível: a) Na procedência parcial do pedido de indemnização civil deduzido pelos demandantes BB e CC, foi condenada a demandada Companhia de Seguros Allianz Portugal, S.A. a pagar-lhes a quantia de € 139.938,10 (cento e trinta e nove mil novecentos e trinta e oito euros e dez cêntimos) acrescida de juros, à taxa legal, a contar da notificação do pedido e até integral pagamento, tendo a demandada sido absolvida da parte restante do pedido; b) Ainda na procedência parcial do pedido de indemnização civil deduzido pelos demandantes DD e EE, foi condenada a mesma demandada a pagar-lhes a quantia de € 41.411,75 (quarenta e um mil, quatrocentos e onze euros e setenta e cinco cêntimos), consignando-se que desta, a quantia de € 37.500 cabe ao lesado FF, acrescida de juros à taxa legal, a contar da notificação do pedido e até integral pagamento, tendo a demandada sido absolvida da parte restante do pedido; 3.

      Inconformados com esta decisão dela interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra a "Companhia de Seguros Allianz de Portugal, S.A.", BB e CC, tendo no final sido negado provimento aos recursos interpostos por BB e CC e concedido parcial provimento ao recurso interposto pela "Companhia de Seguros Allinaz de Portugal, S. A." e, em consequência, no que respeita ao pedido de indemnização civil deduzido por DD e mulher, fixada a indemnização pelos danos patrimoniais em € 10.000,00 (dez mil euros), mantendo a quantia indemnizatória de € 10.000,00 (dez mil euros) pelos danos correspondentes às dores físicas e morais sofridas e a quantia € 7.500,00 (sete mil e quinhentos euros) pelo dano estético (ressarcimento das cicatrizes)..

    2. Insatisfeitos com esta decisão, interpuseram recurso para este Supremo Tribunal os demandantes BB, CC, DD e EE e a demandada "Companhia Allianz Seguradora de Portugal, SA".

      1. Os demandantes BB e CC extraíram da sua motivação as seguintes conclusões: 1. O Acórdão proferido pelo Tribunal "a quo" viola o disposto na Lei Civil, bem como a Jurisprudência consolidada dos Tribunais superiores, colocando problemas jurídicos que se diriam há muito ultrapassados, inclusive pela própria Relação de que promana.

    3. O Tribunal funda a negação de provimento do recurso interposto em dois argumentos fundamentais. Um primeiro respeitante à negação da verificação do momento constitutivo de um direito indemnizatório na esfera do de "cuius" ao ressarcimento pela perda de rendimentos profissionais que auferiria durante a sua vida, não tivesse morrido pela actuação do arguido.

    4. Com base no disposto na Conclusão anterior, o Tribunal nega que tal direito se tivesse transmitido "mortis causa" do "de cuius" para os demandantes, ora recorrentes, assim justificando a improcedência do pedido de indemnização.

    5. Um segundo argumento, afirmando o Tribunal "a quo" que a indemnização por perda de rendimentos reclamada apenas se poderia alicerçar no disposto no art. 495.º, n.º 3 do Código Civil e num pedido de ressarcimento por perda do direito a alimentos que, pela morte de seu filho, os demandantes se viram subtraídos.

    6. O Tribunal recorrido afirma que não existe matéria factual no caso dos autos que permitisse alicerçar um direito dos demandantes com a natureza jurídica plasmada no citado articulado legal (495.º, n.º 3 do Código Civil), por essa razão reiterando a improcedência do recurso e do pedido.

    7. Jamais os demandantes vieram a juízo reclamando um direito indemnizatório por morte de prestador de alimentos ao abrigo do disposto no art. 495.º, n.º 3 do Código Civil, sendo esse o motivo evidente por que não foram alegados quaisquer factos nesse sentido.

    8. Os demandantes peticionaram indemnização de 371.000,00 Euros, não por apelo à sua qualidade de ascendentes e, como tal, pessoas que do de "cuius" tinham direito a receber alimentos, mas na qualidade de seus sucessores, pedindo ressarcimento por um dano próprio de GG transmitido "mortis causa" para a herança.

    9. O direito indemnizatório pelo dano patrimonial futuro que se vem de referir nasce aquando da produção da morte do lesado pela actuação culposa de outrem, altura em que ficam preenchidos todos os requisitos do art. 483° do Código Civil e 562° e ss do Código Civil, transmitindo-se "mortis causa" para os herdeiros ao abrigo do disposto no art. 2024° do mesmo diploma.

    10. Quando, à data da morte do lesado produzida pela conduta negligente de outrem, aquele não havia ainda iniciado a sua carreira profissional, existe um dano decorrente de privação de rendimentos profissionais equivalente às quantias pecuniárias que o lesado viria a auferir quando lhe fosse permitido continuar o seu curso de vida, que é indemnizável por ser previsível e quantificável (art. 564.º, n.º 2 do Código Civil).

    11. Este dano reclamado pelos recorrentes da demandada é previsível porque, atendendo a critérios de normalidade e ao que consta da matéria de facto havida por provada nos itens 55., 56., 57., 58., 59., 65., 73., 74., 75., 76., 77., 78., 79., 80., 81., 82., 83., 84., 85., 86., 87., 88., 89., 90. e 91., seria expectável que o lesado viesse a assumir uma posição activa na sociedade, reunindo os rendimentos normais da mesma decorrentes, quando não tivesse sobrevindo a sua morte, produzida pelo arguido.

    12. Este dano é quantificável porque, atendendo a critérios de normalidade e ao que consta da matéria de facto havida por provada nos itens 55., 56., 57., 58., 59., 65., 73., 74., 75., 76., 77., 78., 79., 80., 81., 82., 83., 84., 85., 86., 87., 88., 89., 90. e 91., seria expectável que o lesado auferisse, da sua actividade profissional, rendimentos pelo menos medianos quando não tivesse sobrevindo a sua morte, produzida pelo arguido.

    13. A fixação do "quantum" indemnizatório não deve ser relegada para Incidente de Liquidação de Sentença, já que do curso do tempo não sobrevirão novos elementos que apoiem a quantificação do dano que não os que já existem.

    14. A indemnização pelo dano que se refere deve ser fixada com recurso à equidade e nos termos do art. 566.º, n.º 3 do Código Civil, tendo como critérios orientativos os citados pontos da Matéria de Facto e os apontados critérios de normalidade.

    15. Atendendo aos pontos da Matéria Provada 55., 56., 57., 58., 59., 65., 73., 74., 75., 76., 77., 78., 79., 80., 81., 82., 83., 84., 85., 86., 87., 88., 89., 90. e 91. e ao que decorre de juízos de razoabilidade e normalidade, a fixação de um rendimento expectável de 500,00 Euros/mês de que se viu privado o menor pela sua morte, a pecar de alguma forma, sempre será por defeito, razão por que existe motivo para reparar a Sentença recorrida, oferecendo procedência ao pedido de 371.000,00 Euros efectuado no PIC a este título, o que se pede.

    16. Ainda que assim não se entenda no que se refere ao "quantum" ora reclamado sempre os Venerandos Desembargadores, em obediência ao disposto no art 566.º, n.º 3 do Código Civil, deverão equitativamente fixar a indemnização devida em douto suprimento, em valor nunca inferior a 160.000,00 Euros.

      Em obediência ao estatuído no art. 412° do Código de Processo Penal, cumpre indicar: - As normas jurídicas violadas Arts. 70.º, 71.º, 483.º, n.º 1, 495.ºn.º 3, 562°, 563.º, n.º 1, 563.º, n.º 2, 566.º, n.º 3, todos do Código Civil; B) Os demandantes DD e EE concluíram a sua motivação deste jeito: 1. O Acórdão proferido pelo Tribunal "a quo", ao conceder provimento ao recurso interposto pela demandada cível ALLIANZ, Portugal, SA, reduzindo a indemnização arbitrada por equidade (art. 496.º, n.º 3 do Código Civil) do lesado por dano patrimonial futuro (perda de rendimentos profissionais) de 20.000,00 Euros para 10.000,00 Euros violou o disposto na Lei Civil, bem como a Jurisprudência consolidada dos Tribunais superiores.

    17. O Tribunal da Comarca efectuou um juízo por equidade apoiando-se em elementos objectivos que enuncia, designadamente no índice de incapacidade permanente do lesado apurado em Julgamento, o período de vida activa previsível do lesado, as condições remuneratórias previsíveis do desempenho de actividade profissional e as consequências financeiras do recebimento da indemnização em uma única tranche e sem privação de capital.

    18. Considerando todos estes dados-padrão, o Tribunal da Comarca arbitrou indemnização por dano patrimonial futuro ao lesado no valor de 20.000,00 Euros, motivando devidamente o seu excurso pela equidade e sedimentando a decisão em dados concretos e objectivos.

    19. A decisão por equidade ao abrigo do disposto no art. 496.º, n.º 3 do Código Civil só pode ser sindicada e alterada pelo Tribunal superior quando se mostrem violados, de forma patente, os parâmetros de objectividade e justiça que presidem à determinação do ressarcimento por essa via.

    20. É com base nessa premissa que o Supremo Tribunal de Justiça tem recusado, infindas vezes, a revista de decisões provindas das instâncias por entender (e bem!) que lhe está vedado realizar um juízo substitutivo que apenas assentaria na diferente subjectividade de um outro julgador e não na alteração dos dados-padrão que devem ancorar a decisão que fixa o ressarcimento.

    21. O Tribunal da Relação de Coimbra alterou a decisão provinda da l.ª Instância sem se socorrer de outros elementos objectivos que não tivessem sido sopesados na...

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