Acórdão nº 1231/09.3TTLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Junho de 2014

Magistrado ResponsávelMELO LIMA
Data da Resolução25 de Junho de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça I 1. AA intentou ação emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, contra TAP PORTUGAL – TRANSPORTES AÉREOS PORTUGUESES, S.A.

com sede em Lisboa, pedindo que o Tribunal declare nula a sanção disciplinar de dois dias de suspensão que a ré lhe aplicou ou, se assim não o entender, que a anule.

Alegou para tanto, em síntese, que tal sanção está viciada (i) por caducidade do exercício do poder disciplinar, (ii) por ter sido proferida por pessoa que não detinha poderes para aplicar sanções disciplinares, e (iii) porque o autor não praticou factos que configurem infração disciplinar.

Realizada audiência de partes, na qual não foi possível a conciliação, apresentou a ré contestação, pugnando pela licitude da sanção disciplinar, sustentada em que: (i) não ocorreu caducidade do exercício da acção disciplinar; (ii) o autor praticou as infrações disciplinares que lhe foram imputadas; (iii) o superior hierárquico do autor com competência disciplinar é o diretor de operações de voo.

Após audiência de julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação procedente e declarou inexistente e de nenhum efeito a sanção disciplinar de dois dias de suspensão do trabalho, aplicada pela R. ao A.

2.

Inconformada, a Ré TAP PORTUGAL interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa.

A final, os Exmos. Juízes Desembargadores da Secção Social deste Tribunal da Relação acordaram: «(…) em julgar procedente o recurso, alterando a sentença no sentido de julgar improcedente a ação e absolver a R. do pedido.» 3.

Irresignado, o A.: 3.1 Com observância do formalismo legal, ínsito no artigo 77º do CPT – dizer, de forma expressa e separada -, arguiu a nulidade do Acórdão, por omissão de pronúncia; 3.2 Interpôs o presente recurso de Revista para este Supremo Tribunal de Justiça, concluindo a respetiva motivação do seguinte modo: A) O Acórdão recorrido julgou contra a matéria de facto provada no processo e com violação das regras imperativas de prova constantes do Arts 432º, nº 1º e nº 3º, do Código Civil, não considerando que a Ré não demonstrou, como lhe cabia, que o Diretor de Operações de Voo da empresa tinha poder delegado do Vice-Presidente do Conselho de Administração Executivo da empresa, de acordo com o ponto 1.3.3 do Manual das Operações de Voo para aplicar a sanção disciplinar; B) Não considerou que a Ordem de Serviço nº ... tinha caducado com o desaparecimento do antigo Conselho de Administração da Ré e a sua substituição, a partir de 2006, por um novo órgão o conselho de administração executivo, previsto nos novos Estatutos, que estavam em vigor na empresa Ré quando foi instruído o processo disciplinar e aplicada a sanção, em março de 2009; C) Violou os Estatutos atuais da empresa, em vigor desde 2006, nomeadamente os seus Artigos 5º alínea b), 11º nºs 1 e 2, e 12º nºs 1º alíneas a), e) e g), desconsiderando que só o conselho de administração executivo é o detentor originário do direito potestativo de exercer o poder disciplinar na empresa e no caso vertente não foi ele que o aplicou, nem emitiu qualquer ato de delegação; D) Desrespeitou o disposto no Ponto 1.3.3. do Manual das Operações de Voo, aprovado pelo Conselho de Administração Executivo da empresa em 2008, que exige expressamente um ato de delegação de poderes, do Vice-Presidente do conselho executivo, ao tempo o Senhor BB, em conformidade com o estabelecido no Manual, para atribuir competência disciplinar ao Diretor de Operações de Voo, ato de delegação que não se provou que existisse; E) Considerou suficiente como ato de delegação o Manual de Operações de Voo, quando este Regulamento nos seus próprios termos exige um ato distinto do Vice-Presidente da Comissão Executiva a atribuir esses poderes disciplinares, assim desrespeitando o exigido no próprio ponto 1.3.3 do Manual e o disposto no Artº 365º nº 2º do Código do Trabalho, que impõe que na atribuição da delegação de poderes a entidade patronal respeite as regras que instituiu e que, neste caso, se encontram no Manual de Operações de Voo e exigem um ato de delegação do Vice-Presidente Executivo para o Diretor das Operações de voo; F) Desrespeitou também o disposto no Artº 365º nº 2º do Código do Trabalho que exige uma delegação de poderes no trabalhador delegado, quando não é a entidade empregadora a exercer diretamente o poder disciplinar, o que no caso vertente exigia o respeito pelo ponto 1.3.3 do Manual das Operações de Voo e um ato expresso de delegação entre Vice-Presidente Executivo e o Diretor das Operações de voo; G) Errou ainda quando considerou que não estava provado nos autos que existia um Vice-Presidente Executivo da Ré, nomeado pelo menos desde 2006, o Senhor BB, como está documentalmente provado por documento autêntico da própria Ré, junto aos Autos, em 29 de outubro de 2011, pelo Autor.

Em conclusão, não tendo o Diretor de Operações de Voo competência disciplinar para aplicar a sanção, deverá esta ser considerada inexistente ou nula, como bem se considerou na douta sentença do Tribunal da 1ª Instância.

Na hipótese que não se concede, de se considerar que o Diretor do Pessoal de Voo tinha competência para aplicar a sanção disciplinar, então a sanção aplicada seria nula, pelas seguintes razões, que o acórdão recorrido desconsiderou: H) A sanção aplicada é nula, porque se verificara a caducidade do procedimento disciplinar, por terem decorrido mais de 60 dias entre o conhecimento dos factos ocorridos no voo de Londres, pelo superior hierárquico com alegada competência disciplinar - o Diretor das Operações de Voo da empresa - o que sucedeu em 18 de Setembro de 2008 e a notificação da nota de culpa ao Autor que ocorreu em 28 de Novembro de 2008, nos termos do disposto no Artº 372º do Código do Trabalho; I) Acresce que, o prazo de caducidade previsto no Artº 372º do Código do Trabalho não foi interrompido, mesmo que se considere que o processo de inquérito prévio ao processo disciplinar se justificava, porque foi ultrapassado o prazo de 30 dias previsto no Artº 412º do Código do Trabalho entre as suspeitas de irregularidades conhecidas pelo superior hierárquico do Autor, em 18 de agosto de 2008 e o início do processo de inquérito, que ocorreu em 23 de setembro de 2008; J) Acresce que, tendo sido aplicada uma única sanção disciplinar a todos os factos constantes da acusação e do relatório final, sem distinguir entre os alegadamente ocorridos no dia 15 de agosto de 2008, e os verificados a 6 de outubro de 2008 e não sendo possível conhecer como foram disciplinarmente avaliados uns e outros, caducado o procedimento disciplinar em relação a uma das alegadas infracções, que deixa de poder ser averiguada terá de se considerar nula a sanção aplicada a final porque é única e indivisível, pois não é legalmente possível distinguir qual a sanção aplicada pela Ré a cada uma das infracções; K) Acresce que, no acórdão recorrido depois de se ter considerado inexistente uma das infracções disciplinares, em que se fundamentara a sanção disciplinar aplicada, por se considerar que o Autor não era responsável pelos factos ocorridos no voo de ... para Lisboa, de 6 de outubro de 2008, sendo a sanção aplicada indivisível, e não se distinguindo a sanção aplicada a cada uma das infracções, impunha o princípio da fiscalização judicial da legalidade a anulação das sanções ilegais, decorrente, por exemplo, do disposto no Artº 172º n° 2º do Código do Processo do Trabalho e ainda o princípio da proporcionalidade da sanção disciplinar às infracções cometidas, que fosse anulada a sanção disciplinar, não se podendo manter a mesma sanção disciplinar, quando desapareceu uma das infracções constantes da acusação, o que implica desrespeito pelo disposto no Artº 367º do Código do Trabalho; L) O acórdão recorrido está ainda eivado de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no Artº 668º nº 1° alínea d) do C.P.C. merecendo assim ser revogado, por não ter apreciado três questões fundamentais, suscitadas pelo ora recorrente na sua alegação de recurso, a saber: 1º a competência do representante da Ré em Londres e da British Aviation Authority para deslocar o avião do estacionamento fora da manga para o estacionamento com manga, que não cabia ao Autor, razão por que se limitou a sugerir que tal fosse feito ; 2º - as consequências da avaria mecânica da escada que estava encostada ao avião e que foi necessário desviar para que o avião saisse do local de estacionamento - e que demorou mais de vinte minutos a resolver - e que foi um facto totalmente imprevisto, que iria sempre atrasar o avião à descolagem, ainda que ele não tivesse saído da posição fora da manga; 3º - que esta avaria da escada, que demorou mais de 20 minutos a ser resolvida, foi omitida pelo representante da Ré em Londres, quando apresentou queixa do autor e que nenhuma referência foi feita a este facto fundamental no relatório do processo disciplinar, havendo clara má-fé da Ré na sua omissão, tendente a responsabilizar abusivamente o Autor pelo atraso na saída do voo.

M) Que o Autor foi sancionado com base no facto constante do relatório do processo disciplinar, quanto ao voo de ... para Lisboa, do dia 6 de outubro de 2008, por não se ter queixado ou participado de um Colega, que por ter adormecido no hotel em ..., terá provocado um atraso na saída da tripulação do hotel para o aeroporto, quando este facto não constava da nota de culpa que lhe foi enviada, não se tendo podido defender dele e havendo portanto violação do princípio básico do contraditório, previsto no Artº 371º do Código do Trabalho, o que determinaria sempre a nulidade da sanção disciplinar aplicada.» 4.

Pugnando pela improcedência do recurso, contra-alegou a Ré, concluindo do seguinte modo: 1. As causas da nulidade da sentença, tipificadas no art.º 668.º n.º 1 do CPC, não abrangem o erro de julgamento, seja de facto ou de direito, designadamente, a não conformação da sentença com o direito...

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