Acórdão nº 530/12.1TBCHV-B.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Maio de 2014

Magistrado ResponsávelFERNANDO BENTO
Data da Resolução29 de Maio de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça RELATÒRIO No 2ª Juízo do Tribunal de Chaves corre termos um processo de inventário, subsequente a divórcio, para partilha dos bens comuns do casal que foi constituído, segundo o regime de comunhão de adquiridos, por AA e BB, desempenhando esta última as funções de cabeça de casal.

Nesse inventário foi relacionado, entre outros bens comuns, um prédio rústico, consignando a cabeça de casal na relação de bens que nesse prédio rústico foi construída uma casa de habitação, sendo o respectivo custo suportado integralmente pela cabeça de casal, com dinheiro proveniente da venda de um apartamento que já possuía quando contraiu casamento com o interessado AA.

Este, porém, reclamou contra a relação de bens apresentada e, concretamente, contra a omissão de relacionação do prédio urbano resultante da incorporação dessa casa de habitação no prédio comum, Assim suscitado o incidente de falta de relacionação de bens, respondeu a cabeça de casal e, produzidas as provas oferecidas, foi proferida decisão, ordenando a relacionação do prédio urbano resultante dessa incorporação como bem comum.

A cabeça de casal apelou para a Relação do Porto mas não obteve êxito de causa; com efeito, apesar de haver alterado a matéria de facto, a Relação manteve a decisão proferida pela 1ª instância, no sentido da relacionação do bem como comum, fundamentalmente por falta de prova da natureza de bem próprio dos valores que custearam a obra de construção.

Novo recurso, desta feita de revista para este STJ, com vista à revogação do acórdão recorrido para que se decida não ser possível qualificar o resultado da obra (casa construída) - qualificado como benfeitoria - como bem comum e se remetam os interessados para os meios processuais comuns.

Rematou a recorrente a sua alegação com a seguinte síntese conclusiva: A- No prédio rústico que constitui a verba n." 15 da relação de bens, prédio esse que constitui um bem comum do extinto casal, foi construída uma casa de habitação, cujo custo final orçou em cerca de € 50.000,00.

B- Na 1ª instância decidiu-se que essa casa constituía um bem comum do ex-casal, e, como tal, deveria ser relacionada, argumentando-se que a cabeça de casal não conseguiu demonstrar que a casa aqui em questão tenha sido edificada com dinheiro próprio seu.

C- O acórdão ora recorrido decidiu que esta casa constituía uma benfeitoria e, porque erigida num prédio rústico comum, a nova realidade assim surgida assumia igualmente e de modo automático a natureza de um bem comum.

D- Efetivamente, aquela construção urbana erigida num terreno rústico, que integra o património comum dos cônjuges, constitui uma mais-valia incorporada nesse terreno, fundindo-se num único prédio, sem possibilidade de autonomização, daí resultando uma nova realidade jurídico-económica, constituindo, por isso, uma benfeitoria.

E- Só que não é a circunstância da construção ser erigida num terreno do património comum dos cônjuges que transforma a nova realidade predial ipso facto num bem igualmente comum F- Decorre linearmente dos arts. 1723º, al. a) e 1726º, nºs 1 e 2 C.Civil que a natureza comum ou própria desta nova individualidade (que assume a natureza urbana, atentos os valores do bem incorporado e do bem incorporante) dependerá de qual seja a parte mais valiosa das prestações -art. 1726º nº 1: bem comum, se a parte mais valiosa, ou seja, de valor mais elevado provier de rendimentos e/ou bens de ambos os cônjuges; de um deles, se essa parte mais valiosa resultar de rendimentos e/ou bens desse cônjuge.

G- Acresce que esta benfeitoria, porque inseparável do prédio incorporado, pode determinar a compensação pelo património comum aos patrimónios próprios dos cônjuges, ou por estes àquele - ns 2 do art. 1726º C.Civil.

H- Devendo ainda, por imperativo processual, ser relacionada como crédito ou débito do património comum -art. 1345º, nº 5 C.Pr.Civil anterior (o aqui aplicável a esta situação).

I- Como, na situação vertente, persiste a dúvida sobre a origem dos rendimentos e/ou bens com que foi construída a referida casa, também ficaria consequentemente por apurar o valor do crédito ou débito a incluir na relação de bens.

J- Ora, perante o teor da decisão proferida no acórdão recorrido não seria possível classificar a benfeitoria: se bem próprio de algum dos cônjuges, se bem comum; nem relacionar o crédito ou débito daí decorrente.

L- Para além de que, ainda face ao teor dessa mesma decisão, esta questão ficaria definitivamente prejudicada e sem possibilidade de poder vir a ser discutida ulteriormente, como decorre do estatuído no art. 1336º, nº 1 C.Pr.Civil.

M- Uma vez que a factualidade apurada não permite formular um juízo com suficiente grau de certeza sobre a proveniência do dinheiro que suportou o custo da construção da casa, ou seja, sobre a questão de saber se estamos perante um bem comum ou bem próprio do ex-cônjuge mulher, devem as partes ser remetidas para os meios comuns para aí poderem decidir, com todas as garantias, as complexas questões atinentes a este assunto.

N – Ao decidir nos termos em que o fez, incorreu o douto acórdão recorrido em erro de omissão, interpretação e/ou aplicação dos preceitos ínsitos nos arts 1722º, 1723º e 1726º C. Civil e 1345º C.Pr. Civil...

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