Acórdão nº 16842/04.5TJPRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Maio de 2014
Magistrado Responsável | MARIA CLARA SOTTOMAYOR |
Data da Resolução | 13 de Maio de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na 1.ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório A 12 de Julho 2004, nos Juízos Cíveis do Porto, AA instaurou acção declarativa sob forma sumária contra a BB, CRL pedindo a condenação da ré a eliminar e reparar os defeitos descritos nos artigos 8.º a 102.º da petição inicial, todos do prédio urbano composto de casa de cave, rés-do-chão e andar sito na Rua ..., nºs …, freguesia de ..., concelho do Porto, descrito na Segunda Conservatória do Registo Predial do Porto sob o n.º ....
Para fundamentar a sua pretensão o autor alegou, em síntese, que através de contrato de permuta celebrado a 12 de Julho de 1999 recebeu da ré um prédio que apresenta defeitos, os quais descreve, pretendendo que os mesmos sejam eliminados e reparados.
A ré foi previamente citada a 14 de Julho de 2004 para, querendo, contestar, contestou excepcionando a caducidade da pretensão do autor, por referência à data de celebração da escritura de permuta que situa em 27 de Julho de 1999[1], impugnou alguns dos factos alegados na petição inicial, deduziu incidente de intervenção provocada da sociedade CC, SA, alegada construtora do imóvel dado em permuta ao autor e deduziu pedido reconvencional contra o autor pedindo a condenação deste ao pagamento à ré da quantia de €10.990,08 (Esc. 2.203.313$00), a título dos custos do empreendimento em que se insere o prédio adquirido pelo autor, bem como dos juros moratórios, à taxa máxima legal, desde a data do vencimento da obrigação até integral reembolso.
O autor replicou alegando que teve conhecimento dos defeitos que invocou na petição inicial durante o ano de 2003, que o valor da permuta foi acordado aquando da celebração da escritura de permuta, não podendo a ré alterar unilateralmente o preço do contrato, pugnando assim pela improcedência da reconvenção.
A ré treplicou alegando que caducou o direito do autor por falta de denúncia dos defeitos, com excepção dos referentes à ligação de saneamento, pugnou pela procedência da sua pretensão reconvencional e pediu a condenação do autor como litigante de má fé em multa e indemnização.
Em 04 de Fevereiro de 2005, decidiu-se que o valor da causa era de € 16.605,67 e que por isso o processo seguia a forma ordinária, determinando-se, em consequência, a remessa dos autos às Varas Cíveis da Comarca do Porto.
Em 17 de Maio de 2005, foi proferido despacho a admitir a intervenção acessória da sociedade CC, SA e decidiu-se não admitir a reconvenção deduzida pela ré.
Depois de citada para os termos da causa, a CC, SA apresentou contestação, excepcionando a caducidade do eventual direito de regresso da ré contra si, porquanto, desde a data da entrega do prédio pela chamada à ré – 30-11-1998 – até à data da propositura da acção – 12-07-2004 – decorreram mais de cinco anos, e desde a data em que o autor tomou conhecimento dos invocados defeitos – 8-06-2002 – até 31-10-2003, data invocada pelo autor como sendo aquela em que foram denunciados à ré os defeitos, decorreu mais de um ano, concluindo pela caducidade do direito de denúncia e pela improcedência da acção.
A audiência preliminar foi dispensada e foi elaborado despacho saneador tabelar, no qual foi relegada para final a apreciação e decisão sobre a excepção peremptória da caducidade invocada e procedeu-se à condensação da factualidade considerada relevante para a boa decisão da causa, discriminando-se a factualidade assente da controvertida, esta última a integrar a base instrutória.
Após isso, as partes ofereceram os seus meios de prova, requerendo todas a gravação da audiência final e requerendo o autor a produção de prova pericial.
Foi produzida a prova pericial requerida pelo autor.
Após sete suspensões da instância, por acordo das partes, que totalizaram formalmente cento e oitenta dias, mas que significaram uma paragem do andamento dos autos de cerca de cinco anos, realizou-se a audiência de discussão e julgamento em quatro sessões, a última das quais para responder à matéria de facto vertida na base instrutória.
Foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente por provada e, em consequência, condenou a ré a eliminar e reparar os defeitos a que aludem os itens 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 11º a 14º e 15º a 21º dos factos provados, absolvendo a ré da parte restante do pedido relativa à pretensão de eliminação e reparação dos defeitos a que aludem os pontos 30º e 42º da base instrutória.
Inconformada com esta decisão, a ré interpôs recurso contra a mesma, recurso que foi admitido como de apelação, com subida imediata nos autos e no efeito meramente devolutivo.
Por acórdão datado de 22 de Abril de 2013, o Tribunal da Relação do Porto decidiu declarar totalmente improcedente o recurso e confirmar a sentença recorrida.
Irresignada, a ré interpôs recurso de revista contra o acórdão do Tribunal da Relação, recurso que foi admitido por lhe ser aplicável o Código de Processo Civil anterior ao Decreto-Lei 303/2007, de 24 de Agosto, que admite o direito ao recurso em casos de dupla conformidade.
Na sua alegação de recurso, a ré apresentou as seguintes conclusões: «A Recorrente é uma Cooperativa de Construção e Habitação que visa, através da cooperação e entreajuda dos seus membros a satisfação, sem fins lucrativos, das necessidades habitacionais e ainda o fomento da cultura em geral e, em especial, dos princípios e prática do Cooperativismo e é no âmbito das suas especiais atribuições como Cooperativa de Construção e Habitação, que tem como objecto principal a promoção da construção ou a aquisição de fogos para a habitação dos seus membros, que se integra a transmissão de propriedade efectuada ao Recorrido do prédio em causa na acção.
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Assim, a Recorrente está isenta de custas nos termos da alínea f) do n° 1 do artigo 4º do Regulamento das Custas Processuais.
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A acção deu entrada em juízo a 12-07-2004 tendo a Ré sido citada por carta registada expedida nesse dia e recebida no dia 14-07-2004 pelo que «a denúncia dos defeitos a que aludem os itens 11° a 14°, 15° a 21° dos factos provados» no entender da Ré, aqui Recorrente, foi realizada para além «do prazo legal de garantia de 5 anos».
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Isto porque dado o carácter reptício da declaração de denúncia não sendo esta eficaz não pode produzir os efeitos de impedimento da caducidade, ou seja se a eficácia da declaração se produz posteriormente ao prazo de caducidade não tem o mérito de impedir a caducidade.
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O Tribunal da Relação do Porto concluiu «pelo não conhecimento do recurso no segmento em que a recorrente veio suscitar a questão da caducidade da acção intentada pelo recorrido por ter sido intentada volvidos mais de seis meses sobre a data em que se efectivou a denúncia dos defeitos a que se referem os pontos 3.7 a 3.9 dos fundamentos de facto» do seu acórdão.
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Entende a Recorrente que ao decidir, quanto a esta matéria, da forma que o fez o tribunal recorrido viola com essa decisão o disposto nos artigos 264° e 668°, n° 1 alínea d) do Código de Processo Civil.
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Isto porque o Tribunal de primeira instância se pronunciou sobre o assunto porque a questão foi suscitada e estando em causa a apreciação do conteúdo dessa decisão e exercido o contraditório quanto a ela, tanto em primeira instância como no recurso, entendeu a Relação do Porto sobre ela não se pronunciar.
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Sem prescindir, quanto ao «segmento em que a recorrente veio suscitar a questão da caducidade da acção intentada pelo recorrido por ter sido intentada volvidos mais de seis meses sobre a data em que se efectivou a denúncia dos defeitos a que se referem os pontos 3.7 a 3.9 dos fundamentos de facto» do acórdão da Relação do Porto, ou seja em relação aos defeitos, a que aludem os itens 7º, 8º, 9º dos factos provados na sentença de primeira instância, a sua denúncia ocorreu em 3-11-2003.
I. A acção deu entrada a 12-07-2004, ou seja mais de seis meses após a denúncia.
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Conclui-se assim que o Autor não intentou atempadamente a acção referente a esses defeitos.
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Pela subsunção dos factos nos termos da lei, designadamente os artigos 224° e seguintes e 913° e seguintes do Código Civil, deve proceder por provada a excepção da caducidade e como tal deve a Recorrente ser absolvida de todos os pedidos.
L. A alegação de inconstitucionalidade feita pela Recorrente nas suas alegações perante o Tribunal da Relação do Porto refere-se à diferente interpretação do tribunal quanto ao carácter reptício da declaração de denúncia.
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Sobre esta questão o Tribunal da Relação do Porto não se pronunciou em concreto tendo vagamente referido: «No caso em apreço, não se divisa que a decisão recorrida tenha por qualquer forma afrontado o direito fundamental da recorrente de acesso ao direito. Os presentes autos quer em primeira instância, quer em segunda instância constituem a prova real de que não foi vedado à recorrente o acesso ao direito. Acesso ao direito não significa direito a uma decisão favorável ao postulante, como parece entender a recorrente, mas apenas que a pretensão formulada seja apreciada por um tribunal, imparcial, com todas as garantias de um processo equitativo.» N. Perante a disparidade da solução de direito verificada na mesma sentença onde quanto a uma questão se dá relevo à recepção da denúncia de uns defeitos e se menospreza a recepção da denúncia de outros, entende a Recorrente que existe uma violação do artigo 20° da Constituição da República Portuguesa designadamente quanto ao direito a que a causa seja objecto de decisão mediante processo equitativo.
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A súmula da decisão de primeira instância com a (não) apreciação da questão em causa pelo Tribunal da Relação do Porto viola o disposto no artigo 204° e o n° 2 do artigo 202° da Constituição da República Portuguesa já que incumbe aos tribunais assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, reprimir a violação da legalidade democrática e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados, o que neste caso, no entendimento da Recorrente, não sucedeu.
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