Acórdão nº 879/06.2TBSXL.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Março de 2014

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução27 de Março de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo nº 879/06.2TBSXL.L1.S1 7ª Secção Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA e BB instauraram uma acção contra CC, DD e EE, pedindo a declaração de nulidade do contrato de compra e venda celebrado entre seu pai, FF, entretanto falecido, e CC, como vendedores, e DD, como compradora. DD é uma das quatro filhas da primeira ré, apesar de vir referida na escritura como sendo a única filha dos vendedores.

Como fundamento, alegaram que o contrato foi simulado, com o objectivo de os enganar e às demais filhas da primeira ré, “para os retirar da sucessão”.

CC não contestou e juntou uma declaração, a fls. 74, na qual reconheceu tratar-se de uma “venda fingida à minha filha, e ela concordou”, feita quando o seu marido “descobriu que tinha uma doença terminal” e “ficou preocupado com a minha subsistência após a sua morte”, pois “era a única maneira de eu ficar a morar naquela casa”. Disse ainda que a filha “nunca pagou quantia alguma pela casa” e que “é verdade que o fizemos para retirar os meus enteados da sucessão, mas não para os retirar definitivamente, somente enquanto fosse viva”, “só queríamos adiar a partilha (…)”.

Mas contestaram os outros réus, negando ter havido simulação e atribuindo a eventual lapso do notário a afirmação de que a ré contestantes era única filha dos vendedores: “Na verdade, o vendedor FF e a vendedora CC desejaram transmitir onerosamente o prédio dos autos à compradora DD, e tal facto não altera a sua certidão de nascimento”,“Todos os elementos intrínsecos à compra e venda estão contidos na respectiva escritura, as declarações prestadas pelos vendedores e pela compradora, correspondem à verdade e à vontade dos mesmos”. Esclareceram ainda que “Não existe no normativo jurídico português, preceito que restrinja a venda de padrasto a enteado(a)”, “A escritura de compra e venda foi realizada em 1995 e a abertura da sucessão por óbito do vendedor FF verificou-se em 2005, data da sua morte, assim é manifesto que nunca a escritura podia estar ferida de nulidade com base nos argumentos da douta P.I”.

A acção foi julgada procedente, pela sentença de fls. 248, que julgou provada a simulação do contrato e determinou o cancelamento do registo a favor de DD e marido, EE.

Os réus DD e EE recorreram para a Relação. No recurso, invocaram a ilegitimidade dos autores, alegando que, conforme resultava do assento respectivo, o casamento de GG e de CC é posterior (1986) à data da inscrição no registo da aquisição por esta última do direito de propriedade sobre o prédio dos autos (1985), o que significa que o pai dos autores nunca foi proprietário do mesmo, pois era bem próprio de CC. Segundo então alegaram, a intervenção de GG na escritura, correspondente à compra e venda que os autores querem ver declarada nula, deve ser entendida “de acordo com o nº 2 do artigo 1682º-A do C.C., dado tratar-se o imóvel em causa da casa de morada de família”.

A título subsidiário, impugnaram diversos pontos do julgamento de facto, concluindo que deviam ser absolvidos da instância, por ilegitimidade dos autores, ou, e assim se não entendesse, absolvidos do pedido, por não estar provada a simulação.

Com as contra-alegações, os autores juntaram uma cópia de uma“certificacion de matrimonio de FF e CC”com data de 2 de Agosto de 1982 e respectiva tradução) para fazer prova de que“o pai dos AA. e a 1ª R., quando adquiriram o imóvel em causa, estavam casados desde 08 de Julho de 1971 (…) e no regime de comunhão geral de bens” (doc. de fls. 325,) e uma cópia de uma escritura de compra e venda de 21 de Junho de 1985, mediante a qual “FF (…), e mulher, CC (…), casados sob o regime de comunhão geral de bens”, compraram o prédio urbano dos autos A sentença foi revogada pelo acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de fls. 366, que absolveu os réus do pedido e não admitiu os documentos juntos pelos autores, por estes não terem “justificado a apresentação tardia dos documentos, sendo certo que, “de qualquer modo, não tendo sido impugnados os factos dados como assentes relativos ao casamento de FF e CC e à aquisição do imóvel por parte dos apelantes, os documentos em causa só teriam relevância se, por via de recurso subordinado, os apelados tivessem impugnado esses mesmos factos”.

E decidiu desta forma: “Nos presentes autos foi dado como provada a inscrição no registo da aquisição do imóvel dos autos a favor da ré CC, com data de 1985.

Assim, existe uma presunção de titularidade do direito de propriedade sobre o imóvel a favor da ré CC a partir da data da inscrição no registo, presunção essa que não foi afastada.

(…) Assim, de acordo com os factos apurados nos autos e que resultam dos documentos juntos pelos autores com a petição inicial, nomeadamente a fls. 11 e 14, à data da inscrição no registo da aquisição do imóvel pela ré esta não era casada com o pai dos autores, uma vez que o casamento foi celebrado em data posterior à da aquisição referida.

Tendo o casamento sido celebrado sem convenção antenupcial, o regime de bens do casamento é o da comunhão de bens adquiridos, nos termos do art.° 1717° do Código Civil, o que significa que o bem adquirido pela ré CC antes do casamento era próprio dela (art.° 1722° do CC). (…) Não sendo o bem em causa património comum do casal formado por FF e CC, fica afastado, desde logo, o requisito da intenção de enganar terceiros para efeitos de simulação nos termos do art.° 240°, n.° 1, do CC, na medida em que os eventuais terceiros enganados não são os autores, pelo que estes não têm legitimidade substantiva para o exercício do direito invocado de declaração de nulidade.

(…) De qualquer modo, os factos apurados não demonstram que as partes não tenham querido celebrar um contrato de compra e venda a que se refere a escritura pública de fls. 15 e segs. e que se refere em II - 10). (…)” 2. Os autores recorreram para o Supremo Tribunal de Justiça.

Nas alegações, formularam as seguintes conclusões: “1º) Não podem os ora apelantes concordar com o acórdão proferido; 2.º) o mesmo enferma de graves incoerências na aplicação do direito aos factos e não toma posição relativamente ao cerne da questão, ou seja a aferição do direito de propriedade do "de cuius" – FF; 3º) o falecido FF adquiriu em 21 de Junho de 1985, por escritura publica de compra e venda, ainda que subordinada ao regime da compropriedade, por não estar casado com a RR. CC, a propriedade do imóvel em questão.

  1. ) o único silogismo jurídico correcto na aplicação destes factos aos direito vigente é que o "de cuius" FF adquiriu em regime de compropriedade o imóvel que deverá figurar no seu acervo hereditário, tornando assim partes legitimas para a presente acção os AA.

    1. 9 A aplicação dos factos ao direito realizada pelo Tribunal da Relação contraria este silogismo, o que não se pode conceder.

  2. ) Porquanto: Independentemente, do seu estado civil, à data da aquisição, o de cuius, adquiriu a propriedade do imóvel, ainda que no regime de compropriedade, porquanto a presunção sobre o estado civil dos compradores não foi ilidida.

  3. ) E ainda errada a conclusão tomada pelo Tribunal da relação que FF, interveio na escritura de compra e venda a favor da Ré DD, como autorizante.

  4. ) Através da análise do registo predial constatamos a aquisição favor dos RR. DD (sujeito activo) casada com EE, por compra a CC, (casada com FF) e FF; 9º) Com base em tal facto, o Tribunal da Relação deveria ter concluído, unicamente, que "0 de Cuius” FF era titular do imóvel ou de parte deste à data da sua morte.

  5. ) Legitimando desta forma a intervenção processual dos AA. ora apelantes.

  6. ) A justiça quer-se equitativa e material e não formal e abstracta; 12º) O acórdão proferido, na sua subsunção dos factos ao direito, não permite que o AA. ora apelantes, se defendam da excepção de ilegitimidade alegada; Ferindo desta forma o principio constitucional da igualdade de armas e do contraditório.

  7. ) OS litígios não devem ser resolvidos mediante expedientes processuais formais, para que o sentimento seja o da realização da justiça concreta e não o da impunidade.

  8. ) Os ora apelantes, pugnam e reclamam a realização dessa justiça material e concreta.” TERMOS EM QUE E NOS DEMAIS DE DIREITO, DEVE O PRESENTE RECURSO DE REVISTA SER JULGADO PROCEDENTE E EM CONSEQUÊNClA, SER REVOGADO CONCLUINDO-SE COMO NA PRIMEIRA INSTÂNCIA.

    ASSIM FAZENDO-SE A HABITUAL E NECESSÁRIA JUSTIÇA.

    DD e EE contra-alegaram, sustentando confirmação do acórdão recorrido, e apresentaram estas seguintes conclusões: «I. Não se conformando os Recorrentes com o Douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, dele interpuseram o presente Recurso, como sendo de Revista. O recurso de Revista delineia-se como um...

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