Acórdão nº 5528/05.3TCLRS.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Março de 2014

Magistrado ResponsávelTAVARES DE PAIVA
Data da Resolução20 de Março de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I- Relatório AA – Sociedade de Desenvolvimento Habitacional do Infantado SA intentou acção de condenação com processo ordinário contra, Município de Loures, BB e mulher CC ,GDL- Sociedade Distribuidora de Gás Natural de Lisboa SA e BP Portuguesa SA pedindo que : a) Seja anulado o contrato outorgado entre a A. e o R. Município em 1985.09.27 (v. Doc. 2, adiante junto), com fundamento em erro sobre a base do negócio, ou, se assim não se entender, b) Seja declarada a resolução do contrato outorgado entre a A. e o R.

Município em 1985.09.27 (v. Doc. 2, adiante junto), com fundamento na verificação da condição resolutiva. em alteração anormal das circunstâncias ou em incumprimento imputável ao R. Município; Em qualquer dos casos, c) Serem declarados nulos e ineficazes os contratos titulados pelas escrituras de 1991.03.13, de 1991.03.19, de 1996.09.10, de 1997.10.31 e de 2002.06.30, ex vi dos arts. 5o, 53° e 56° do DL 448/91, de 29 de Novembro, dos arts. 20°, 57° e 60° do DL 400/84, de 31 de Dezembro, dos arts. e 49° do DL 555/99, de 16 de Dezembro e dos arts. 271 e 294°do Cód. Civil; d) Os RR serem condenados a restituir à A. os lotes de terreno objecto do contrato outorgado em 1985.09.27 (v. Doe. 2, adiante junto) ou, subsidiariamente e se a restituição não for possível, a pagar-lhe a indemnização correspondente ao valor actual daqueles lotes, a liquidar em execução de sentença; e) Deve ser ordenado ao abrigo do art. 8°/l do Cód. Reg. Predial, o cancelamento do registo de aquisição do prédio descrito na Ia Conservatória do Registo Predial de Loures sob a ficha n.° 283/011085, da freguesia de Loures, a favor da Câmara Municipal de Loures, bem como de todos os registos realizados posteriormente àquele, nomeadamente em prédios destacados ou desanexados do imóvel acima identificado».

A A fundamenta o seu pedido, alegando: Que tem promovido o loteamento e a urbanização da Quinta do Infantado, que abrange vários prédios sitos nas freguesias de Loures e de Frielas, do Município de Loures.

Mais alega que, por escritura de 27/9/1985, doou ao réu Município de Loures, para instalação de equipamentos gerais, vários lotes de terreno, que identifica, com a área total de 33.280 m2.

Alega, também, que, por escritura de 19/3/91, aquele réu cedeu à GDP - Gás de Portugal, SA, em direito de superfície, a título gratuito, uma parcela daqueles terrenos, com a área de 6.000 m2. Que, por escritura de 10/9/1996, o réu Município e os réus BB e mulher, permutaram entre si duas parcelas daqueles terrenos com a área de 13.000 m2 e de 2.000 m2. Que, por escritura de 13/3/1991, o réu Município cedeu em direito de superfície, à ré GDL, a referida parcela de 2.000 m2. Que, por escritura de 31/10/1997, os réus BB e mulher cederam à ré BP, em direito de superfície, uma parcela de terreno com a área de 3.793 m2. Que, por escritura de 30/6/2002, o réu Município deu em permuta aos réus BB e mulher, uma parcela de terreno com a área de 531,11 m2 e uma parcela de terreno com a área de 218,89 m2.

Alega, ainda, que nos aludidos terrenos cedidos pela autora ao réu Município, este não construiu, nem instalou, quaisquer equipamentos gerais de carácter público, sendo que a autora nunca teria efectuado as referidas cedências se soubesse que os terrenos em causa seriam transmitidos a particulares, para serem afectos a fins lucrativos de interesses privados.

A Ré BP Portugal contestou, por excepção, invocando a incompetência material do tribunal Judicial e a caducidade do direito da autora de arguir a eventual anulabilidade do negócio que celebrou com o Município de Loures. Mais alegou que, de todo o modo, a acção deve improceder, mas que, quando assim se não entenda, deve ser julgado procedente o pedido reconvencional que deduziu, reconhecendo-se à ré a propriedade da parcela de terreno com a área de 3.793 m2, por acessão industrial imobiliária.

O Réu, Município de Loures, contestou, concluindo pela improcedência da totalidade dos pedidos.

Os Réus, BB e mulher, contestaram invocando a ineptidão da petição inicial, a incompetência do tribunal em razão da matéria e a caducidade do direito de acção. Mais alegaram que, a não se entender assim, deve, de qualquer modo, improceder a acção.

A autora replicou, concluindo pela improcedência das excepções deduzidas, bem como do pedido reconvencional formulado.

Foi proferido despacho saneador, onde se julgaram improcedentes as excepções da incompetência em razão da matéria, da ineptidão da petição inicial e da caducidade, tendo-se procedido à selecção da matéria de facto relevante considerada assente e da que passou a constituir a base instrutória da causa.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi, após decisão da matéria de facto, proferida sentença, julgando a acção totalmente improcedente.

Inconformada, a autora interpôs recurso de apelação daquela sentença para o Tribunal da Relação de Lisboa que, pelo Acórdão de fls.1330 a 1361, confirmou a sentença recorrida embora com fundamentação diversa da aí expendida.

Novamente inconformada a autora interpôs recurso de revista para este Supremo Tribunal.

Nas suas alegações de recurso a autora formula as seguintes conclusões: A - DA NATUREZA DO CONTRATO la. O contrato titulado pela escritura outorgada, em 1985.09.27, entre o ML e a ora recorrente (v. fls. 25 e segs. dos autos) tem natureza estritamente privada, constituindo uma doação modal, conforme constitui jurisprudência unânime deste Venerando Tribunal (v. Ac STJ de 2013.03.12, Proe. 5097;05.4TVLSB.L 1.S1; Ac. STJ de 2005.09.22, Proc. 0581723; e Ac. STJ de 2001.01.18, Proc. 447/97/A) e foi decidido - e bem - no acórdão recorrido - cfr. texto n. o s 1 a 5 i 2a• A natureza privada do referido contrato foi expressamente reconhecida e decidida no despacho saneador proferido, em 2009.05.15, de fls. 302 a 314 dos autos, já transitado em julgado (v. arts. 613°, 621° e 6220 do CPC) - cfr. texto n.º 3; B - DO INCUMPRIMENTO CONTRATUAL IMPUTÁVEL AO MUNICÍPIO DE LOURES 30• O Ml incumpriu frontalmente o contrato titulado pela escritura de ris. 25 e segs. dos autos ao dar um destino diverso aos lotes em causa - instalações comerciais e industriais e posto de abastecimento de combustíveis - conforme tem constituído Jurisprudência unânime deste Venerando Tribunal (v. Ac. STJ de 2013.03.12, Proc. 5097/05.4TVLSB.L1.S1; Ac. STJ de 2005.09.22, Proc. 0581723, ambos in www.dgs1.pt) e foi decidido no acórdão recorrido, resultando tal incumprimento das seguintes razões principais: a) Na escritura pública outorgada, em 1985.09.27.foi expressamente estipulado o destino dos lotes transmitidos ao ML - "instalação de equipamentos gerais" (v. ponto II) dos FP -, integrando esta estipulação o conteúdo do contrato e constituindo uma obrigação juridicamente vinculante do ML (v. arts. 405. 405 e 762 e segs.

do C. Civil), e "a comprovar a essencialidade, para os doadores, deste destino do terreno doado, aí temos, além do mais que resulta da prova produzida, a sua inclusão expressa na escritura que formalizou a doação" (v. Ac. STJ de 2005.09.22, Proc.0581723, ln www.dgsl.pt); b) Estamos perante uma obrigação do ML Juridicamente vinculante, pois como escreveu Baptista Machado, "um contrato por sua natureza neutral, pode, porém, tornar-se contrato vinculado a um fim, por força de um entendimento das partes sobre o fim a que se destina a prestação de uma delas"(v. Obra Dispersa. Vol. I, pág. 155 e 156); c) O ML, ao dar um destino diverso aos lotes em causa - Instalações comerciais e industriais e posto de abastecimento de combustíveis (v. pontos XVII) e XXI) dos FP -, violou o dever de prestar expressamente estipulado, Incumprindo frontalmente o referido contrato (v. arts, 406 e 762° e segs. do C. Civil); d) O incumprimento do ML sempre resultaria da violação de deveres laferais, livremente impostos e assumidos pelas partes. na escritura celebrada em 1985.09.27 (v. arts., 227°, 334 e 406° do C. Civil; cfr. Pinto Monteiro. RLJ, Ano 134.

p.p. 286 e segs. e Ano 136, p.p. 246 e segs.); e) O incumprimento pelo ML do fim contratualmente estabelecido consubstancia claramente violação do princípio da boa fé (v. arts. 227 e 762 nº/2 do C. Civil) - cfr. texto n.D s 6 a 9; C- DA OBRIGACÃO DE INDEMNIZAR DO ML 4°. Contrariamente ao decidido no douto Acórdão recorrido, o ML está obrigado a indemnizar justamente a ora recorrente, ex vi dos arts. 562° e segs., 798 e segs. e 801 do C. Civil, como tem sido decidido por este Venerando Supremo Tribunal de Justiça, em casos absolutamente paralelos, pois: a) "A consequência desse incumprimento só pode ser a do direito a uma indemnização a favor dos doadores/recorridos, nos termos do nº 2 do artigo 801 do Código Civil ( ... ) e que corresponda à diferença entre o valor do terreno se lhe tivesse sido dado o destino constante da escritura de doação e o valor que passou a ter com o destino que, na realidade, lhe veio 8 ser dado" (v. Ac. STJ de 2005.09.22, Proe. 0581723. in www.dgsj.pt: cfr. Pinto Monteiro. RLJ, Ano 134°, p.p. 286 e segs. e Ano 136°, n." 3943, p.p, 246 e segs.); b) A consequência desse incumprimento culposo, impossibilitando a reposição in natura, só pode ser a do direito a uma indemnização a favor da doadora, aqui recorrida, nos termos do nº2 do art. 801 do CC (que) deve equivaler à quantia, a liquidar em momento ulterior, que resultar da diferença entre o valor do terreno doado se lhe tivesse sido dado, na totalidade, o destino constante da escritura de doação e o valor que passou li ter com o destino que. na realidade. lhe veio a ser dado" (V. Ac. STJ de 2013.03.12, Proc.5097/05.4TVLSB.Ll.Sl, ln www.dgsl.pt) - cfr. texto nºs 10 e 11; No caso sub judice, a indemnização deve ser fixada com base no disposto no art.

801° do C. Civil, conforme se decidiu nos citados Acórdãos deste Venerando Tribunal- cfr. texto nºs 10 e 11; 6°. Contrariamente ao decidido no Acórdão recorrido, é inaplicável ln casu o art.8020 do C. Civil, dado que (I) a ora recorrente não...

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