Acórdão nº 294/11.6TTFIG.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Março de 2014

Magistrado ResponsávelFERNANDES DA SILVA
Data da Resolução12 de Março de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I.

  1. AA, devidamente identificado, demandou, em Setembro de 2011, no Tribunal do Trabalho da Figueira da Foz, a sociedade «BB – Transportes de Carga e Comércio, S.A.

    », com sede em Vila Nova de Gaia, pedindo, a final, a condenação desta no pagamento da quantia de € 132.534,51, acrescida de juros moratórios, à taxa legal, devidos desde 24.01.2011 e até integral embolso.

    Alegou para o efeito, em síntese, que foi admitido ao serviço da Ré em 15.05.1987, como motorista, desempenhando as funções respectivas nos transportes internacionais rodoviários de mercadorias.

    De acordo com o estabelecido no CCT aplicável, tinha direito a que as refeições lhe fossem pagas à factura, bem como à prestação prevista na cláusula 74.ª, n.º 7, e ainda direito a uma retribuição mensal de 21.200$00, paga a título de ajudas de custo, designada por prémio TIR, a qual, atenta a sua natureza mensal, certa, regular e periódica, se integra na retribuição.

    A isso se junta o acréscimo de 200% do trabalho prestado em dias feriados ou de descanso semanal ou complementar.

    A R. não pagava ao A. as refeições à factura, nem antes das viagens lhe fazia os adiantamentos previstos nesta cláusula, antes inseria um montante variável nos recibos, que calculava ao Km., a título de ajudas de custo, deslocações e depois Cl.ª 47.ª-A.

    Nos vários países da Europa as quatro refeições diárias ascendem a um valor de cerca de € 40,00.

    Mais alegou que entre os anos de 1987 e de Junho de 2004 e até final do contrato tinha direito às retribuições que discrimina nos pontos referidos no artigo 39.º da P.I., e que, conforme carta entregue em mão, e recepcionada pela Ré em 25.11.2010, o A. comunicou-‑lhe a cessação do contrato em 24.01.2011 em virtude de lhe ter sido concedida a pensão antecipada de reforma por velhice, reclamando, agora, todas as quantias emergentes do contrato de trabalho em falta.

    Por fim… Que a partir de Janeiro de 2002, inclusive, e até final, a Ré passou a registar, nos recibos, o total pago pelos dias de descanso passados pelo A. nas viagens ao estrangeiro, por ela determinadas, no Código ou tipo 16 dos Recibos, a título da “Cl.ª 41.ª”.

    Porém, em vez de calcular o valor a pagar por cada dia de descanso trabalhado, a 200% da soma da retribuição base + diut. + CF 74 n.º 7 + Prémio TIR, conforme ao disposto na Cl.ª 41.ª, n.º 1, pagava cada um desses dias apenas pelo valor de 200% da retribuição-base.

    Descontou-lhe ainda a Ré, indevidamente, a quantia destinada à reparação do veículo e multas.

    A Ré contestou, impugnando os valores reclamados pelo A., designadamente quanto aos valores das refeições, maxime quanto à sua contabilização, e aduzindo que desde sempre foi tradicional aplicar um sistema de substituição das cláusulas do CCTV (47.ª-A e 74ª-A) por um sistema de pagamento ao km., o que sucedeu na relação estabelecida e aceite entre as partes.

    A partir de 1999 e até 2007, o sistema de pagamento foi alterado, passando a R. a pagar, em substituição das duas cláusulas (47.ª e 74.ª/7), ajudas de custo, calculadas à viagem, por valores pré-definidos, especificando uma parte no recibo de ajudas de custo e outra no recibo de vencimentos.

    Concluiu alegando que, nesta matéria, o sistema de pagamento por si efectuado foi mais benéfico para o A., pelo que nada lhe deve, a tal título; porém, assim não se entendendo, deverá ser declarada a respectiva nulidade, com restituição de tudo o que foi pago.

    Quanto ao subsídio de Natal, invoca que o mesmo não é calculado com base na cl.ª 74.ª/7, e impugna, no que respeita ao subsídio de férias de 2008 a 2010, a matéria articulada pelo A. quanto ao não recebimento deste com a contabilização da cl.ª 74.ª/7.

    No que concerne ao prémio TIR (ajudas de custo TIR), entende que essas prestações têm natureza não retributiva, já que tal prémio se destina a custear despesas pessoais do trabalhador, sendo que o CCTV aplicável usa a expressão “ajuda de custo”, e por tal razão, não tem de ser paga nas férias, seu subsídio e subsídio de Natal (no qual apenas é computado a retribuição-base e diuturnidades).

    Relativamente ao cálculo do trabalho suplementar, este tem por referencial a retribuição-base e diuturnidades, pelo que impugna o que vem reclamado pelo A., a tal título, o que também faz relativamente aos factos alegados e conclusões retiradas pelo mesmo em sede descanso compensatório.

    No que se refere, por último, aos descontos efectuados e férias não gozadas, invoca que a responsabilidade pelas despesas em questão foi assumida pelo A., que aceitou a dedução no seu vencimento, sendo falso que o A. não tenha gozado férias.

    __ Discutida a causa, foi proferida sentença, que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a R. a pagar ao A. a quantia de 46.493,32 euros, acrescida de juros moratórios vencidos e vincendos, à taxa legal de 4% (Portaria n.º 291/03, de 8.04, e art. 805.º, n.º 2, a) e 806.º do C.C.), a contar de 25-1-11, até integral pagamento.

    No mais, julgou a acção improcedente e dela absolveu a Ré.

    __ 2. Irresignada, a R. impugnou a decisão, apelando para o Tribunal da Relação de Coimbra, o mesmo fazendo o A., subordinadamente.

    Pelo Acórdão prolatado a fls. 771-818, o recurso interposto pela R. foi julgado parcialmente procedente, decidindo-se: a)…que apenas o trabalho prestado em dias de descanso semanal obrigatório e em dias feriados dão lugar ao gozo dos descansos compensatórios previstos na Cl.ª 41.ª, n.º 6, do CCTV, b) relegando para execução de sentença a quantificação dos dias de descanso compensatório a que o autor tem direito pela prestação de trabalho nos dias referidos em a), os quais deverão ser remunerados com uma quantia equivalente à paga pelo trabalho prestado em dia normal de trabalho.

    O recurso subordinado foi também acolhido em parte, nos termos do dispositivo de fls. 817-818, a que nos reportamos.

    É ora a Ré, que, ainda inconformada, deduz a presente Revista, (originalmente interposta enquanto Revista excepcional), cuja motivação remata com esta síntese conclusiva: I – O acórdão recorrido julgou que o subsídio de férias, o subsídio de Natal, o trabalho suplementar e o descanso compensatório não gozado, referentes a período posterior a 1/12/2003, devem ser calculados utilizando todas as componentes remuneratórias e não só a retribuição-base e as diuturnidades; II – Porém, desde 1/12/2003 apenas o vencimento-base e as diuturnidades relevam na contagem das prestações complementares e acessórias, como impõem os arts. 250.º do CT/2003 e 262.º do CT/2009; tal como é jurisprudência segura, retirada do acórdão-‑fundamento e de muitos outros arestos do Supremo Tribunal de Justiça; III – O CCTV aplicável ao sector (entre a Antram e a Festru) não integra qualquer disposição que regule diversamente do Código do Trabalho; IV – O art. 11.º da Lei n.º 99/2003, de 27/8, apenas se aplica à retribuição-base, que não pode ser diminuída por efeito da entrada em vigor do CT; V - Ao negar provimento à apelação, e ao confirmar a sentença da 1.ª Instância, mantendo a condenação da recorrente, (fazendo a contabilização como indicado em I), o acórdão violou os arts. 250.º do CT/2003 e 262.º do CT/2009; e é totalmente oposto ao acórdão-‑fundamento; VI – Pelo que tem de ser revogado e substituído por acórdão que, calculando os subsídios de férias e de Natal apenas sobre o vencimento-base e as diuturnidades desde 1/12/2003, conclua que o trabalhador tinha direito a € 35.624,30 e não a € 42.387,74; VII – Pelo que, tendo ele recebido € 25.908,35, tem um crédito de € 9.715.85 e não de € 16.484.81; VIII – Que deve ser compensado no que a recorrente pagou a mais de € 11.080,57, resultando um saldo a favor desta de € 1.364,72; IX – E calculando a remuneração do trabalho suplementar apenas sobre o vencimento-base e as diuturnidades desde 1/12/2003, conclua que o trabalhador tinha direito a € 24.934,29 e não a € 36.625,42; X – Pelo que, tendo ele recebido € 19.508,76, tem um crédito de € 5.425.53 e não de € 17.116.66: XI – Que deve ser compensado no que a recorrente pagou a mais, já feito o saldo indicado em IX, resultando um saldo do recorrido de apenas € 4.060,81; XII – E que qualquer valor que, eventualmente, deva ser apurado por descanso compensatório não gozado, deverá ser calculado apenas sobre o vencimento-base e diuturnidades.

    XIII – Ainda deve ser revogado o acórdão recorrido no que concerne à decisão sobre a apelação subordinada, sendo substituída por douto acórdão que reconheça o crédito do trabalhador de € 9.715.85 e não de € 16.484.81 a título de subsídio de férias e de Natal; XIV – E o crédito de € 5.425.53 e não de € 17.116.66 a título de trabalho suplementar.

    O recorrido contra-alegou, concluindo, a final, pelo improvimento do recurso, com a manutenção do julgado.

    __ Já neste Supremo Tribunal, a Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta tomou posição, propendendo, no seu proficiente parecer, no sentido da procedência da impugnação deduzida pela R./recorrente.

    Notificado o mesmo às partes, não foi oferecida resposta.

    __ Preparada a decisão, com prévia distribuição do projecto de solução aos Exm.ºs Adjuntos, cumpre analisar, ponderar e decidir.

  2. O objecto do recurso. É pelo acervo conclusivo que se afere e delimita, por via de regra, o objecto e âmbito da impugnação.

    Inexistindo, como no caso, questões de conhecimento oficioso, o ‘thema decidendum’ analisa-se em saber (se e) que elementos remuneratórios integram a noção de ‘retribuição’ para efeitos de cômputo das prestações complementares e acessórias (no caso os subsídios de férias e de Natal, trabalho suplementar e dias de descanso compensatório não gozados) após a entrada em vigor (1.12.2003) do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, e, posteriormente, pela sua revisão (‘Código do Trabalho de 2009’), esta operada pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro.

    __ II.

    Fundamentação 1. – De Facto.

    Vem dada como assente, das Instâncias, a seguinte factualidade: 1.º - A R...

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