Acórdão nº 332/11.2TBPRG.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Janeiro de 2014
Magistrado Responsável | GARCIA CALEJO |
Data da Resolução | 14 de Janeiro de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I- Relatório: 1-1- A Junta de Freguesia de ---, propôs a presente acção com processo ordinário contra a Caixa Geral de Depósitos, SA, pedindo que: a) Se declare que a A. é titular do direito de propriedade sobre os saldos bancários (dinheiro e valores) existentes em nome de AA, testadora melhor identificada nos autos, na Caixa Geral de Depósitos de Peso da Régua e da Rua Barros Lima, no Porto; no Banco Nacional Ultramarino (Caixa Geral de Depósitos), dependência da Praça da Liberdade, no Porto; nos montantes reportados à data do seu óbito, em 16 de Novembro de 2008, por referência às contas nºs: ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, com saldos bancários (em dinheiro e valores) nos valores de 715,00 €, 490567,31 €, 61.736,00€, 34.975 €, entre outros cuja existência se venha apurar até final e posteriores remunerações desde essa data até integral e efectiva entrega à A. de tais saldos bancários; b) Se condene a Ré a reconhecer o pedido formulado em a); c) Se condene a Ré a entregar e restituir à A. os saldos bancários (dinheiro e valores) existentes em nome de AA, testadora melhor identificada nos autos, na Caixa Geral de Depósitos de Peso da Régua e da Rua Barros Lima, no Porto; no Banco Nacional Ultramarino (Caixa Geral de Depósitos), dependência da Praça da Liberdade, no Porto; nos montantes reportados à data do seu óbito, em 16 de Novembro de 2008, por referência às contas nºs.: ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, com saldos bancários (em dinheiro e valores) nos valores de 715,00 €, 490 567,31 €, 61.736,000, 34.975,00 €, entre outros cuja existência se venha apurar até final e posteriores remunerações desde essa data até integral e efectiva entrega à A. de tais saldos bancários, destinando-se este dinheiro e valores a fundo de maneio para cumprimento dos encargos dos legados à A. pela testadora falecida. Fundamenta estes pedidos, em síntese, dizendo que por testamento, BB legou-lhe diversos bens imóveis e saldos bancários, nos termos que se encontram discriminados no artigo 5.° da p.i. Após o óbito de AA, ocorrido a 16.11.2008, e apesar de instada, a R. recusa-se a entregar à A. os saldos bancários (dinheiro e valores) que lhe foram legados pela falecida.
A R. contestou, invocando a incompetência territorial do tribunal. Além disso referiu que apenas foram legados à A. os saldos bancários das contas abertas nas agências da CGD de Peso da Régua e Rua Barros Lima no Porto e do BNU na Praça da Liberdade, que somavam apenas o montante de € 9.237,92, acrescido de 206 acções da EDP. Que de uma das contas não incluídas no legado saiu, em Dezembro de 2009, a quantia de € 116.605,99, em execução de penhora fiscal, e que, no dia 12-04-2010, o testamenteiro levantou a quantia de € 21.439,56. Defende ainda que apenas poderá entregar os valores legados ao testamenteiro, a quem competirá zelar pelo cumprimento dos legados.
A A. replicou, defendendo a improcedência da excepção deduzida.
Após ter sido julgada procedente a excepção de incompetência territorial, os autos foram remetidos às Varas Cíveis de Lisboa.
Em audiência preliminar foi, então, proferido despacho saneador tabelar e seleccionada a matéria de facto assente e elaborada a base instrutória, integrada por um único artigo.
Posteriormente, com base na prova apresentada, A. e R. acordaram em dar como assente o único artigo da base instrutória, e prescindiram da faculdade de produzir alegações em julgamento.
Foi proferida sentença, com a seguinte decisão: “Pelo exposto, julgo a acção totalmente procedente por provada na íntegra e, consequentemente: a) Reconheço o direito de propriedade da autora sobre os SALDOS BANCARIOS (dinheiro e valores) existentes em nome de AA, testadora melhor identificada nos autos, na CAIXA GERAL OE DEPÓSITOS de Peso da Régua (ou Régua) e da Rua Barros Lima, no Porto; no BANCO NACIONAL ULTRAMARINO (Caixa Geral de Depósitos), dependência da Praça da Liberdade, no Porto, nos montantes reportados à data do seu óbito em 16 de Novembro de 2008 por referência às contas números: ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---; b) Condeno a Ré a entregar e restituir à autora os dinheiros e valores existentes nos referidos saldos bancários, nos montantes reportados à data do óbito em 16 de Novembro de 2008, de AA, e posteriores remunerações desde essa data até integral e efectiva entrega à autora”.
1-2- Não se conformando com esta decisão, dela recorreu a R. de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, tendo-se aí proferido a seguinte decisão: “Julga-se procedente a Apelação e, nessa conformidade, revoga-se parcialmente a decisão proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, eliminando-se, na alínea a), da parte decisória, a referência ali efectuada quanto à totalidade dos saldos bancários das contas existentes à data da morte da testadora, uma vez que se consideram dali validamente retirados pela Apelante os valores respeitantes à execução fiscal e ao depósito solicitado pelo testamenteiro. Determina-se, ainda, a eliminação da alínea b) daquela sentença, passando a mesma a ter o seguinte teor: É reconhecido o direito de propriedade da A/Apelada sobre os SALDOS BANCARIOS (dinheiro e valores) existentes em nome de AA, testadora melhor identificada nos autos, na CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS de Peso da Régua (ou Régua) e da Rua Barros Lima, no Porto; no BANCO NACIONAL ULTRAMARINO (Caixa Geral de Depósitos), dependência da Praça da Liberdade, no Porto, nos montantes reportados à data do seu óbito em 16 de Novembro de 2008 por referência às contas números: ---, ---, ---, ---, --- ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, ---, considerando-se validamente dali retiradas pela Apelante as quantias que foram objecto de execução fiscal e aquelas que foram entregues ao testamenteiro CC e que, por tal facto, não devem ser objecto de devolução, por parte da Apelante, à Apelada”.
1-3- Irresignada com este acórdão, dele recorreu a A. para este Supremo Tribunal, recurso que foi admitido como revista e com efeito devolutivo.
A recorrente alegou, tendo das suas alegações retirado as seguintes conclusões: 1ª- A recorrente não impugna, antes aceita, o reconhecimento declarado pelo Tribunal da Relação de Lisboa do direito de propriedade da A./Apelada sobre os SALDOS BANCÁRIOS (dinheiro e valores) existentes em nome de AA, testadora melhor identificada nos autos, na CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS de Peso da Régua (ou Régua) e da Rua Barros Lima, no Porto; no BANCO NACIONAL ULTRAMARINO (Caixa Geral de Depósitos), dependência da Praça da Liberdade, no Porto, nos montantes reportados à data do seu óbito em 16 de Novembro de 2008 por referência ás contas números ---, ---,---,---,---,---, ---, ---, ---, ---, ---, ---,---, ---, ---.
2ª- Porém, a recorrente não se conforma com a decisão proferida: Na parte em que determinou a eliminação na alínea a), da parte decisória da sentença em primeira instância, a referência ali efectuada quanto à totalidade dos saldos bancários das contas existentes à data da morte da testadora, uma vez que se consideraram dali validamente retirados pela Apelante os valores respeitantes à execução fiscal e ao depósito solicitado pelo testamenteiro; e na parte em que ao determinar a eliminação da alínea b) daquela sentença, passou a considerar validamente retiradas pela Apelante dos saldos bancários das contas existentes à data da morte da testadora as quantias que foram objecto de execução fiscal e aquelas que foram entregues ao testamenteiro CC e que, por tal facto, não devem ser objecto de devolução, por parte da Apelante, à Apelada.
3ª- Porquanto, nestas partes, a mesma fez errada interpretação e aplicação do direito ao caso concreto como se vai demonstrar.
4ª- A recorrente, como legatária, sucedeu em bens e valores determinados do património da falecida - artigo 2030°, nºs 1 e 2 do C.C ..
5ª- O que ocorreu por testamento, enquanto acto unilateral e revogável pelo qual uma pessoa dispõe, para depois da morte, de todos os seus bens ou de parte deles, no quadro de sucessão testamentária - artigos 2179°, n° 1 e ss. do C.C ..
6ª- E com a aceitação do legado adquire-se, com retroação à data da abertura da sucessão, um direito de propriedade sobre a coisa legada - STJ, 3.3.1998., CJ/STJ, 1998, to -III.
7ª- Acresce que a nomeação de legatário pode ser sujeita a encargos - artigo 2244° do C.C., o que no caso se verifica.
8ª- Por outro lado, a obrigação de cumprir os encargos, é quanto ao legatário, limitada pelo valor dos objetos legados e dentro das forças do legado - artigos 2071º e 2276º do C.C. - Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 4a Ed., págs. 583 a 587; 9ª- Ora, neste quadro, a entrega do legado deve ser feita no lugar em que a coisa legada se encontrava ao tempo da morte do testador e no prazo de um ano a contar dessa data artigo 2270º do C.C.
10ª- Aqui chegados, importa referir que à data do óbito da testadora, que ocorreu em 16.11.2008. conforme facto provado em 4. da sentença recorrida, não existia qualquer penhora sobre a conta n° --- da Agência da Régua pelo 3° Serviço de Finanças no processo --- para deposito do valor de 116.605,99 €.
11ª- Mais: a efetivação da penhora, assim como o depósito do valor à ordem do processo de execução fiscal referido foram efetuados em desrespeito pelo testamento e pelas obrigações legais que sobre a recorrente impendiam de entregar os valores da dita conta à recorrida, em cumprimento do legado, logo após o óbito, em 16.11.2008., plasmadas nas disposições legais dos artigos 2030°, nºs. 1 e 2 do C.C., 2179°, nº 1 e ss. do C.C., 2244° do C.C., 2071 ° e 2276° do C.C., artigo 2270° do C.C. e Ac. do STJ, 3.3.1998., CJ/STJ, 1998, 1° -III, assim como em Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 4a Ed., págs. 583 a 587; 12ª- Dado que, quer em 26.11.2009. quer em 15.12.2009, e ainda quando a recorrida efectuou o pagamento do valor de 116 605,99 € já...
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