Acórdão nº 32/08.0TTCSC.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Janeiro de 2014

Magistrado ResponsávelMÁRIO BELO MORGADO
Data da Resolução15 de Janeiro de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I.

  1. AA instaurou a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra BB - COOPERATIVA DE ENSINO ESPECIAL E SOLIDARIEDADE SOCIAL, CRL, ambas com os sinais nos autos, pedindo que se declare: i) que o contrato celebrado entre as partes é de trabalho; ii) que seja declarada a ilicitude do seu despedimento; iii) e que a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia global de € 61.452,50, a título de danos não patrimoniais, de indemnização em substituição da reintegração, e de créditos emergentes do contrato de trabalho, acrescida de juros legais desde a data do despedimento e até integral pagamento.

    Alegou, em síntese, que entre as partes foi celebrado um contrato de trabalho, tendo a ré procedido ao seu despedimento sem justa causa e sem prévia instauração de procedimento disciplinar.

  2. Na contestação, a R. alega, em suma, que nunca houve qualquer relação laboral entre as partes, mas sim um contrato de prestação de serviço, pugnando, pois, pela improcedência da ação.

  3. Julgada procedente a ação, foi decidido: a) Reconhecer a existência de um contrato de trabalho entre as partes, no qual figura como trabalhadora a autora e como empregadora a ré; b) Declarar a ilicitude do despedimento da autora e condenar a R. a pagar àquela: b. 1) Uma indemnização em substituição da reintegração no valor de € 1.920,00 por cada ano completo ou fração de antiguidade; b. 2) A quantia de € 2.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais sofridos como consequência do despedimento; b. 3) A quantia de € 30.720,00, a título de subsídio de Natal, de férias e respetivo subsídio referentes a todo o período em que o contrato vigorou.

    c) E ainda: c. 1) A quantia de € 13.440,00, a título de diferença salarial decorrente da redução da retribuição operada de Janeiro a Dezembro de 2006; c. 2) A quantia de € 1.552,50, a título de diferença salarial decorrente da redução da retribuição operada em Janeiro de 2007; c. 3) A quantia de € 300,00, a título de trabalho prestado no mês de Fevereiro de 2007.

    d) Condenar a ré a pagar à autora juros de mora contados sobre as quantias supra referidas, com exceção das devidas a título de indemnização, desde a data do despedimento e até integral pagamento, à taxa legal prevista no artigo 559.º, n.º 1, do Código Civil; e) Condenar a ré a pagar à autora juros de mora contados sobre a quantia devida a título de indemnização em substituição da reintegração, a que se alude em b.1), desde a data do trânsito em julgado da sentença e até integral pagamento, à mesma taxa; f) Condenar a ré a pagar à autora juros de mora sobre a quantia devida a título de indemnização por danos morais decorrentes do despedimento, a que se alude na alínea b.2), desde a data da sentença e integral pagamento, à mesma taxa.

  4. Do assim decidido, interpôs a R. a presente revista, per saltum.

  5. A autora contra-alegou, pugnando pela sua improcedência.

  6. O Ex.m.º Procurador-Geral-Adjunto pronunciou-se no sentido de ser concedida a revista, em parecer a que apenas respondeu a A., reiterando as posições sustentadas na alegação de recurso.

  7. Inexistindo quaisquer outras de que se deva conhecer oficiosamente (art. 609.º, n.º 2, in fine, do CPC[1]), em face das conclusões das alegações de recurso, as questões a decidir são as seguintes:[2] a) Se o contrato celebrado entre as partes é um contrato de trabalho (por tempo indeterminado); b) Em caso de resposta afirmativa à questão anterior, qual o valor retributivo a considerar para efeitos indemnizatórios e de créditos laborais.

  8. Cumpre decidir, sendo aplicável à revista o regime processual que no CPC foi introduzido pela Lei 41/2003, de 26 de Junho, nos termos dos arts. 5.º, n.º 1, e 7.º, n.º 1, deste diploma[3].

    E decidindo.

    II.

  9. A sentença recorrida considerou provada a seguinte factualidade (transcrição expurgada de factos e considerações destituídos de qualquer relevância para a decisão): 1. Em data não concretamente apurada do ano 2000, a A. foi admitida ao serviço da R. no Centro de Reabilitação Profissional da BB (CRPC), sito na Rua Quinta dos Frades, n.º1, em Lisboa.

  10. Para exercer as funções inerentes à categoria profissional de Professor de Educação Física.

  11. No âmbito da sua atividade, a A. efetuava a avaliação dos formandos, ministrava ensinamentos de ginástica com vista ao desenvolvimento físico dos formandos, ministrava e demonstrava os exercícios físicos adequados e participava em jogos, organizava e mantinha atualizados os processos dos formandos, efetuava a sua avaliação e participava em reuniões.

  12. A A. é licenciada em educação especial e reabilitação, sendo que as competências nesta licenciatura são expressas pelo domínio de modelos, técnicas e instrumentos de avaliação, prescrição, intervenção, gestão e coordenação de serviços nas áreas de psicomotricidade, atividade motora adaptada, e acessibilidade e autonomia social, desenvolvimento de programas de estimulação, reeducação e terapia psicomotora, condição física, recreação e desporto adaptado, competências sociais, cognitivas, de adaptação de contextos e sistemas.

  13. A Ré era e é subsidiada pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional.

  14. Perante terceiros e perante o IEFP a Ré declarava que as funções exercidas pela A. eram inerentes à categoria de professor de educação física.

  15. Pela prestação da sua atividade, a A. auferiu, desde Janeiro de 2005, a contrapartida monetária de € 20,00 por hora, exercendo a sua atividade 24 horas por semana, auferindo em média a quantia de € 1.920,00 por mês.

  16. A A. prestava a sua atividade em horário articulado entre a A. e a Ré, durante o período compreendido entre as 09h00 e as 17h00, que correspondia ao horário de funcionamento do centro de formação, estando obrigada a cumprir o número de horas semanais acordadas, sem o que lhe seriam as mesmas descontadas na contrapartida monetária mensal, sendo habitual a A. apresentar-se na Ré às 09h00.

  17. A Ré controlava as horas de entrada e saída da A. e demais colaboradores, através de um sistema eletrónico de registo, por forma a que, pudessem ser controladas as horas efetivamente leccionadas e nessa medida ser processada a contrapartida monetária em função das horas dadas.

  18. Em caso de ausência ou atraso, à A. apenas era pago o tempo de atividade efetivamente prestado, sendo feito o correspondente desconto na contrapartida monetária.

  19. Em data não concretamente apurada, foi entregue à A. um documento intitulado “Regulamento interno” contendo diversas regras de funcionamento da Ré, nas suas diversas áreas de formação, com indicação de que o mesmo deveria ser observado pela A., na parte que lhe respeitasse, junto a fls. 16 e segs. e cujo teor se dá por inteiramente reproduzido.

  20. A A. participava com regularidade em reuniões na Ré, reportando a sua atividade a um coordenador de equipa, recebendo algumas indicações do coordenador, designadamente no que toca a problemas específicos dos formandos, por forma a adequar as suas aulas a essas especificidades.

  21. As reuniões de equipa com outros técnicos visavam a avaliação das atividades, a definição de objetivos, existindo reuniões mensais, convocadas pelo coordenador, e reuniões gerais tendo esta como finalidade transmitir informações sobre o funcionamento geral da Ré.

  22. A A. usava nas suas aulas material fornecido pela Ré como colchões, arcos, pranchas, bolas.

  23. A A. gozava férias em Agosto.

  24. A Ré não pagou à A. qualquer contrapartida monetária nesse mês, nem subsídio de férias ou subsídio de Natal.

  25. Em Setembro de 2004, a A. e outros colaboradores da Ré em regime de recibos verdes, beneficiaram de um aumento do custo/hora, o qual foi pago com efeitos retroativos a Janeiro de 2004.

  26. Em 29/10/2004, a A. frequentou um workshop da Ré subordinado ao tema “Remo Indoor”.

  27. Sem que tenham ocorrido alterações no modo como desenvolvia a sua atividade junto da Ré, em Janeiro de 2005, a Ré comunicou à A. que teria de assinar um contrato de “prestação de serviços” por tal ser uma imposição do IEFP condicionante da atribuição de subsídios, tendo as partes subscrito o contrato de prestação de serviços de fls. 139 e cujo teor se dá por reproduzido.

  28. Em Dezembro de 2005, a Ré avisou a A. de que iria reduzir as horas de prestação da atividade para 10 horas semanais a partir de Janeiro de 2006, ao que a A. manifestou a sua discordância, tendo, no entanto, continuado a exercer a sua atividade na Ré, e subscrito, conjuntamente com a Ré, em 02 de Janeiro de 2006, o “contrato de prestação de serviços” junto a...

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