Acórdão nº 7167/08.8TBCSC.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Outubro de 2013

Magistrado ResponsávelTAVARES DE PAIVA
Data da Resolução24 de Outubro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I-Relatório AA, divorciada, residente na Rua ..., lote ...-A, …o andar esquerdo, em Lisboa intentou a presente acção declarativa, sob a forma ordinária de processo, contra, BB, divorciado, residente na Avenida …, n° …, em Cascais; e CC, pessoa colectiva n° …, representado pela sociedade gestora DD, S.A, com sede na Rua ..., n° ..., em Lisboa.

Pediu que pela procedência da acção se declare a nulidade do contrato de permuta celebrado entre o 1o réu e o 2o réu, determinando-se o cancelamento da inscrição de aquisição a favor do último ou, assim não se entendendo, se condene o 1o réu a indemnizá-la no montante correspondente a" Io (um quarto) do preço pelo qual o imóvel foi permutado, equivalente a Euros 1.000.000,00 (um milhão de euros), acrescido de juros vincendos até integral pagamento.

Para tanto, alegou, em síntese, que foi casada com o 1o réu entre 14 de Setembro de 1985 e 15 de Dezembro de 2005, tendo aquele outro, antes desse casamento, adquirido por compra uma metade indivisa de um prédio urbano sito em Cascais, vindo a adquirir, já na vigência do mesmo matrimónio, por escritura pública de compra e venda de 24 de Setembro de 1987, a outra metade indivisa do mesmo bem.

Mais invocou que por escritura pública outorgada no dia 30 de Maio de 2008 o 1° réu celebrou com o 2° réu um contrato de permuta relativo ao referido imóvel, do qual não lhe deu conhecimento e para o qual não obteve o seu consentimento, não tendo, bem assim, manifestado a intenção de reembolsá-la de 74 do valor atribuído ao imóvel.

Alegou que ela e o 1o réu acordaram, na vigência matrimónio entre ambos, em adquirir em comum a metade indivisa do imóvel, não sendo aplicável ao caso, nessa medida, o disposto no art° 1727° do Código Civil.

Por outro lado. invocou que o 1o réu nunca contribuiu para as despesas comuns da família, tendo sido a autora quem desde o inicio sustentava a casa, pagava as escolas dos filhos, empregada doméstica, férias, despesas de saúde e outras, pelo que foi nesse âmbito que ambos os cônjuges concordaram em integrar a metade comum do imóvel no património comum do casal.

Aduziu ainda que sempre actuou convencida que o imóvel objecto da permuta havia integrado esse património comum, o mesmo sucedendo com o 1o réu, já que ambos constituíram hipoteca sobre o mesmo e o integraram na relação de bens comuns a partilhar.

Concluiu que a permuta é nula nos termos do art° 892° do Código Civil e que ainda que assim não se entenda o 1o réu actuou em abuso de direito, violando o acordo entre ambos e defraudando as suas expectativas quanto à natureza jurídica do bem.

Regularmente citados os réus, contestou em primeiro lugar o 2o réu, impugnando parcialmente, por desconhecimento, os factos articulados na petição inicial e pugnando, em sede de direito, pela manifesta improcedência dos pedidos da autora face ao disposto no art° 1727° do Código Civil.

No mais, alegou que a autora adulterou a verdade dos factos, não desconhecendo a manifesta falta de fundamento da sua pretensão. Mais aduziu que apesar desses factos a mesma registou a pendência da acção, obstando a que o réu contestante aliene o prédio, sendo o seu único propósito com a acção bloquear a comercialização do bem para que o 2o réu pressione o 1o réu a negociar com ela a obtenção de vantagens na partilha dos bens comuns do casal.

Concluiu pela improcedência da acção e pela condenação da autora, como litigante de má fé, em multa e indemnização a quantificar em "execução de sentença".

A final foi proferida sentença que decidiu: 1. Julgar totalmente improcedentes os pedidos formulados pela autora e dos mesmos absolver ambos os réus.

  1. Julgar improcedente a imputação de litigância de má fé dirigida pelo 1* réu à autora, absolvendo esta dos pedidos a esse título formulados.

  2. Julgar parcialmente procedente a imputação de litigância de má fé dirigida pelo 2o réu contra a autora, condenando esta no pagamento de uma multa equivalente a 7UC (sete unidades de conta) e na indemnização ao mesmo réu dos honorários que o mesmo venha a suportar pelo seu patrocínio forense na acção, a liquidar nos termos do n° 2 do art° 457° do Código de Processo Civil" A A veio desistir dos pedidos contra os RR , o que foi homologado por decisão transitada em julgado.

A A interpôs, no entanto, recurso de apelação relativamente à sua condenação como litigante de má fé, tendo a 2ª Ré interposto recurso subordinado, no qual fundamentalmente impugnou a resposta dada à matéria de facto doart.21º da Base Instrutória que considerou incorrectamente julgado.

Pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, foi julgado procedente o recurso interposto pelo 2º R e condenou a A a pagar ao R CC a indemnização de € 94.067.80, mantendo em tudo o mais o decidido pela 1ªinstância.

A A não se conformou e interpôs recurso de revista A A nas suas alegações formula as seguintes conclusões: DAS NULIDADES A) salvo o devido e merecido respeito pelo tribunal a quo, o acórdão impugnado não pode deixar de se caracterizar pela falta de cuidado/ponderação que presidiu à sua elaboração, expressa numa "argumentação" inconsistente, por vezes ilógica e (mesmo) contraditória.

B) as decisões judiciais, mesmo as dos tribunais superiores, não têm de ser "tratados" ou textos jurídicos eruditos (como tantas vezes sucede), mas é exigível uma coerência lógica e uma fundamentação cuidada, sob pena de 05 seus destinatários se sentirem desrespeitados e profundamente injustiçados.

C) o acórdão impugnado mostra-se "apenas" assinado por dois Exmos. Desembargadores, pelo que o mesmo é nulo, nos termos do artigo 668° n° 1 al. A) ex vi art. 716º do CPC D) o tribunal a quo ao alterar a resposta ao quesito 21 da b.i., cometeu uma nulidade, por conhecer de questão de que não podia tomar conhecimento. Se o tribunal ad quem, por força da lei, está obrigado a rejeitar o recurso, ou parte do objecto do recurso, e não o faz, está a conhecer de uma questão contra leqem, ou seja a cometer a nulidade processual referida.

E) não tendo o recorrente (aqui recorrido) requerido a apreciação da prova gravada, nem indicado as "passagens da gravação em que se fundava a impugnação, o tribunal. A quo não podia transcrever ex oficio uma parte do depoimento (ou resumo do mesmo) da testemunha EE e retirar daí qualquer ilação probatória.

II Do erro e violação da lei processual no julgamento da matéria de facto (alteração da resposta ao quesito 21 da bi): e da possibilidade do seu conhecimento em sede de revista F) ao alterar o julgamento da matéria de facto ( resposta ao quesito 21) o tribunal a quo errou na apreciação da prova e violou a lei processual, designadamente o disposto no artigo 712.° do cpc.

G) ao apreciar o depoimento da testemunha EE (não o podia fazer) o tribunal a quo retirou uma ilação( que não devia) em clara violação do princípio da livre apreciação da prova, pois em 1° instância o julgador sublinhou de forma expressa a razão pela qual desvalorizou aquele depoimento.

H) Não tendo sido junto aos autos o documento comprovativo da liquidação do financiamento e correspondente extinção da hipoteca, só desrespeitando o princípio da livre apreciação da prova , o tribunal a quo pode ter julgado como provado que o preço a receber da venda do imóvel (€ 2.820.000,00) ia ser destinado a pagar a quantia de € 3.800.000,00 {financiamento hipotecário).

I) a regra da "experiência normal" utilizada pelo tribunal a quo, não é susceptível de se aplicar in casu. Mas ainda que o fosse a mesma não permitia a conclusão de que o remanescente do preço ía ser utilizado para liquidação do financiamento.

J) a prova produzida quanto ao sinal pago ( 4 870.000,00), ao montante do remanescente do preço (€ 2.820.000,00) e ao valor do capital do financiamento (€ 3.8ôq,í»0,ofl), afasta a conclusão tirada pelo tribunal a quo da regra da experiência utilizada. Mesmo que o montante de € 2.820.000,00 se destinasse ao reembolso do financiamento, a verdade é que tal valor não seria suficiente para o distrate da hipoteca e, logo, para o cumprimento do contrato promessa.

K) 0 erro de julgamento na alteração da resposta ao ponto 21 da b.i.é susceptível de censura ew8ede de revista, na medida em que, para além do mais, consubstancia uma violação, um mau uso, do artigo 712.° do cpc.

L) constitui jurisprudência pacifica o entendimento de que o supremo tribunal de justiça pode exercer censura sobre o uso feito pela relação dos poderes que a lei processual lhe faculta no art.6 712° cpc. E na verdade ao modificar a decisão de facto - resposta ao quesito 21 da bi - o tribunal a quo, fez um "mau uso1" ou "uso indevido” dos poderes conferidos pelo art.º 712º do cpc M) O tribunal a quo violou o art.º 712.°, pois, (l) não se socorreu apenas de "elementos fornecidos pelo processo" - socorreu-se, mal, de uma pretensa regra de experiência; (li) os "elementos fornecidos pelo processo" não impunham uma (") decisão diversa (da resposta ao quesito 21); (iii) e a decisão proferida não ê "insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas".

In casu, constitui um imperativo de justiça, censurar a alteração do julgamento da matéria de facto, pois o tribunal a quo não só estava impedido de socorrer-se do depoimento testemunhal em causa e da regra de experiência invocada, como apresentou uma sequência argumentativa e discursiva que não se mostra, com todo o respeito, lógica.

III Do erro e violação da lei processual no julgamento da matéria de facto ao decidir-se pela ekst6ncia de dolo eventual da autora 0} ao decidir, alterando a qualificação da 1o instância, que a autora actuou com "dolo eventual" 0 tribunal a quo errou e violou o disposto no artigo 712.º do cpc.

A alteração da qualificação ficou a dever-se, ao que parece, a desistência do pedido "apenas" apôs a sentença.

Iv do erro na aplicação de lei, quanto ã existência de litigância de má-fé.

P) não existem elementos de facto susceptíveis de fundamentar a imputação de má-fé a autora. Da diferente fundamentação das...

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