Acórdão nº 6479/09.8TBBRG.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Dezembro de 2013
Magistrado Responsável | ANA PAULA BOULAROT |
Data da Resolução | 18 de Dezembro de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I T, Lda, intentou acção declarativa com processo ordinário contra a Banco X, SA, pedindo a condenação deste a pagar-lhe a quantia de € 37.953,04, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação, bem como nos demais danos que vier a sofrer, a fixar em liquidação de sentença, a titulo de indemnização.
Para tanto alegou, em síntese, ter aderido ao serviço disponibilizado pelo Réu para gestão de contas e realização de operações bancárias através da internet, denominado “BX Net Empresas”, que a mesma publicitava como um serviço seguro e confidencial, sem que lhe tenha sido dado conhecimento do respectivo clausulado, o que determina a nulidade das cláusulas 5.3, 6.1, 6.2, 7.2, 8, 12.2, 12.4, 14, 15 e 17.
No entanto, após ter acedido a esse serviço através da internet no dia 30 de Maio de 2008, foi-lhe retirada da conta a quantia de € 13.000,00 sem a sua autorização através de uma transferência não efectuada por si, supostamente mediante a criação por um terceiro de uma página web falsa e copiada na página de abertura do BX net.
Mais, alega que o Réu, não obstante alertada a tempo, não diligenciou pelo cancelamento dessa transferência, o que determinou que a conta da Autora não estivesse provisionada no momento em que uma sua cliente pretendeu proceder ao desconto de um cheque no valor de € 12.602,00, que a Ré devolveu com a indicação de “falta de provisão” e, em virtude do sucedido, alegou ter ficado responsável pelo pagamento de despesas e comissões no valor de € 277,04, viu debitada indevidamente pelo Réu a quantia de € 26,00 de despesas e imposto de selo, viu a convenção do uso do cheque rescindido por parte do Réu e o seu nome incluído na listagem de utilizadores de cheque que ofereciam risco, para além de ter sido despojada da referida quantia de € 13.000,00.
Alegou, ainda, que devido à conduta do Réu perdeu um importante cliente, que deixou de lhe proporcionar bem-estar económico e lucros, ficou impedida de competir com as empresas suas concorrentes pelo facto do seu nome se encontrar registado no Banco de Portugal e viu o seu bom nome afectado, pretendendo assim a fixação de uma compensação de valor não inferior a € 24.000,00.
Citado o Réu contestou. Em sede de defesa indirecta, deduziu o incidente da incompetência territorial do tribunal e em sede de defesa directa impugnou a generalidade dos factos alegados na petição inicial, nomeadamente no que respeita ao conhecimento por parte da Autora das vantagens do serviço disponibilizado (que é o “BX Net Negócios” e não o “BX Net Empresas”) e do clausulado integral do contrato, que foi lido pelas representantes da Ré de forma pausada e esclarecida e compreendido, refutando assim a invocada nulidade parcial do clausulado.
Por outro lado, alegou que a transferência do montante de € 13.000,00 já havia sido enviada para a SIBS quando a gerente da Autora a alertou, tendo sido infrutíferas todas as diligências efectuadas pelo Réu (que reagiu de imediato e com prontidão) junto da CGD no sentido de obter a devolução dos fundos. Mais, afasta qualquer responsabilidade da sua parte, pois a ser verdade o relatado pela Autora, a conduta fraudulenta e abusiva terá sido praticada por terceiros desconhecidos.
Alegou ainda ter dado instruções em 26 de Novembro de 2008 com vista ao reembolso à Autora da referida quantia, o que não veio a suceder face à recusa desta em subscrever uma minuta necessária para o efeito.
Por fim, impugnou os danos não patrimoniais invocados pela Autora, requereu a suspensão da instância até à conclusão do processo de inquérito que se encontrava pendente na Polícia Judiciária e invocou, ainda, o abuso de direito.
Na réplica a Autora deduziu oposição à excepção de incompetência relativa, abuso de direito e ao pedido de suspensão da instância, reiterando o que havia alegado na Petição Inicial.
Procedeu-se a audiência preliminar, na sequência da qual o Réu veio a fls. 360 declarar que considerava “prejudicada a arguição da incompetência territorial”.
A fls. 363 foi decidido o indeferimento da suspensão da instância requerida pelo Réu.
A final foi produzida sentença na qual se decidiu julgar parcialmente procedente a acção e em consequência condenou o Réu, Banco X, SA, a pagar à Autora a quantia de € 33.303,04, acrescida de juros de mora, às taxas legais em cada momento em vigor nos termos da Portaria nº 597/2005, de 19/07, contados desde a citação até integral pagamento, absolvendo o Réu do demais peticionado.
Inconformada com a decisão dela recorreu o Réu, tendo a Apelação sido julgada improcedente.
Face à dupla conformidade, veio o Réu recorrer de Revista excepcional, a qual foi admitida, tendo concluído da seguinte forma: - Inexistiu da parte do Banco recorrente qualquer quebra de segurança, na criação, manutenção e execução de operações no seu site bxnet.
- Verificou-se quebra de segurança por parte da recorrida no acesso ao referido site, o que, de forma causal, determinou que um terceiro se tenha apropriado das credenciais da mesma recorrida para a realização de operações, via homebanking.
- O Banco recorrente não pode ser responsabilizado, por qualquer intromissão fraudulenta no computador do cliente, o que in casu aconteceu.
- Só responde o recorrente pela intromissão, que possa sofrer o seu site, a partir dos computadores e sistemas informáticos do próprio Banco.
- Ora a recorrida tinha a noção clara da quebra de segurança, por si cometida no dia 30/05/2008, no acesso em causa, de acordo com o teor contratual assinado, violando as normas de procedimento no acesso ao bxnet e também tendo em conta todas as noticias de segurança disponíveis no próprio site e no site institucional do Banco apelante.
- A recorrida tinha a obrigação de não violar tais normas de funcionamento do sistema de homebanking.
- Qualquer presunção de culpa que onerasse o Banco recorrente, se encontra pois, de todo em todo, ilidida.
- A vulnerabilidade verificada, ocorreu aliás confessadamente, no computador da recorrida e não em qualquer sistema informático do próprio Banco recorrente ou por si dominado.
- Não colhe o argumento subsidiário da responsabilidade pelo risco, relativamente ao depósito bancário, precisamente porquanto inexistiu qualquer extravio ou dissipação da quantia depositada na referida conta bancária! - Factualmente ocorreu sim a errada utilização do predito sistema de homebanking, por culpa própria da recorrida, o que permitiu o acesso indevido e movimentação da sua conta bancária.
- Consubstanciando a mesma utilização negligente das prerrogativas operacionais cometidas pelo contrato de homebanking celebrado, sendo a recorrida responsável contratual e legalmente pelos prejuízos por si sofridos, emergentes da autorização da transferência em apreço.
- Não sofrendo aliás a cláusula 6.2 do citado contrato qualquer tipo de nulidade.
- Inexiste qualquer responsabilidade por parte do Banco recorrente na efectivação da transferência em apreço, cuja execução apenas e só se deveu a flagrante quebra de segurança por parte da recorrida.
- De forma clara se percebe a licitude e legitimidade do mesmo Banco recorrente para a devolução do cheque de € 12.602,00 e consequente rescisão da convenção de cheque e inclusão da própria apelada na LUR.
- De forma alguma tal inserção do nome da apelada na referida LUR, consubstancia qualquer ofensa à personalidade moral da mesma recorrida.
- Tal inserção apenas e só espelhava a situação real e factual da ora recorrida perante o próprio Banco recorrente.
- Como tal é a mesma insusceptível, causalmente, de poder produzir os danos não patrimoniais fixados, que além do mais e por mera cautela de patrocínio, se reputam no mínimo, como exagerados.
- Ao arrepio de toda a jurisprudência nacional sobre a matéria.
- 0 que de todo em todo se diga em relação à responsabilização pela pagamento das despesas em causa, no valor de € 303,04.
- A decisão recorrida, violou, por errada interpretação e aplicação as normas constantes dos artigos 192 e 222, ambos do RJ.C.C.G., e artigos 702º, 483º, 484º,496º, 562º, 566º, nº 3 e 799º, todos do c.c Nas contra alegações a Autora pugna pela manutenção do Aresto impugnado.
II Põe-se como problema a resolver no âmbito do presente recurso o de saber se sobre o Réu/Recorrente impende a responsabilidade pela transferência fraudulenta dos fundos da conta da Autora.
As instâncias deram como assentes os seguintes factos: - A autora dedica-se à actividade de importação, exportação e representação de produtos nacionais e internacionais, em especial produtos de limpeza industrial e mobiliário [A) dos factos assentes]; - A ré dedica-se à actividade bancária [B) dos factos assentes]; - Em 20-7-2004, as partes outorgaram um contrato de depósito bancário, com abertura de conta de depósitos à ordem (n.º ...), no Balcão de F, em Y [C) dos factos assentes]; - Desde então e até 30-5-2008, a autora movimentou valores, a crédito e a débito, na sua conta de depósito [D) dos factos assentes]; - Em 20 de Julho de 2004, na agência da ré de F/Y, a autora, representada pelas sócias gerentes A e M, outorgou um contrato denominado BX Directo/BX Net - Contrato de Adesão, que as mesmas sócias assinaram no acto, conforme documento sob o n.º 1 junto com a petição inicial, cujo se teor se tem por reproduzido [E) dos factos assentes]; - Na mesma ocasião, a ré forneceu à autora as chaves de acesso que permitiam a utilização do Serviço BX Directo/BX Net pelas duas sócias gerentes, a referida A e M [F) dos factos assentes]; - A ré informou que o código secreto que indicou, com cinco caracteres numéricos, só era válido para o primeiro acesso, devendo ser alterado para um código secreto pessoal da autora, também com 5 caracteres numéricos, o que esta fez [G) dos factos assentes]; - A autora utilizou o serviço no escritório com regularidade, desde 2004 e até 30-5-2008 [H) dos factos assentes]; - No dia 2-6-2008, ao fim da tarde, numa caixa ATM verificou que tinha sido retirado da aludida...
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