Acórdão nº 995/10.6TVPRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Novembro de 2013
Magistrado Responsável | SILVA GONÇALVES |
Data da Resolução | 28 de Novembro de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça A “Companhia de Seguros AA, SA”, com sede em Lisboa e delegação na Rua …, …, Piso …, no Porto, intentou nas Varas Cíveis do Porto, a presente acção declarativa de condenação com processo ordinário contra BB, pedindo a condenação deste a pagar-lhe a quantia de € 92.794,00 acrescida de juros vincendos contados desde a citação até integral pagamento.
Para tanto alegou, em síntese, que o proprietário do veículo de matrícula 37-AJ-56 transferiu para si a responsabilidade civil por danos decorrentes da circulação deste veículo, o qual foi interveniente em acidente de viação ocorrido em 20.08.2009; na sequência do acidente os ocupantes do veículo sofreram diversos danos, que a autora foi chamada a indemnizar, por força do contrato de seguro celebrado.
No momento do acidente o AJ era conduzido pelo réu que seguia com excesso de álcool no sangue e por influência desse mesmo álcool, já que aquele condutor veio a acusar uma TAS de 0,76 g/l, não se encontrando por isso em condições de conduzir o veículo com segurança, já que tal situação afectou a sua condução. Conclui assim que tem direito a receber do réu as quantias que despendeu no pagamento das indemnizações.
O réu foi pessoal e regularmente citado e veio contestar pedindo a improcedência da acção.
Para tanto afirmou que aceita a ocorrência do acidente em apreço, mas o mesmo não aconteceu em virtude de condução sob influência do álcool. Contudo, não se recorda sequer de ter efectuado qualquer teste ou ter consentido na recolha de sangue.
Foi dispensada a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador com selecção da matéria de facto e elaboração da base instrutória, contra o qual a autora reclamou e foi, oportunamente, decidido.
Procedeu-se ao julgamento da matéria de facto, com gravação em sistema audio dos depoimentos aí prestados, após o que foi proferida a respectiva decisão sem reclamação.
Por fim proferiu-se sentença que julgou improcedente a acção, absolvendo o réu do pedido.
Inconformada com tal decisão, dela recorreu a autora para a Relação do Porto que, por acórdão de 2013.01.15 (cfr. fls. 267 a 275), julgando a apelação totalmente improcedente, confirmou a sentença recorrida.
Irresignada, recorre agora para este Supremo Tribunal a autora “Companhia de Seguros AA, SA”, revista excepcional admitida ao abrigo do estatuído nos artigos 721.º, n.º 1 e 3 e 721.º -A, n.º 1, alínea c), do C.P. Civil (cfr. fls. 365 a 369), apresentando as seguintes conclusões: 1.
O Douto Acórdão da Veneranda Relação do Porto, de que ora se recorre, está em contradição com outros, já transitados em julgado, proferidos, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, tanto pela Veneranda Relação de Coimbra, como pela de Lisboa, como ainda pelo próprio Venerando Supremo Tribunal de Justiça, não tendo sido proferido qualquer Acórdão de Uniformização de Jurisprudência com ele conforme.
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O Acórdão recorrido, debruçando-se sobre a questão atinente ao direito de regresso da seguradora, nos casos de condução com taxa de álcool no sangue superior à legalmente permitida e no âmbito da aplicação do Decreto-Lei n.° 291/2007 de 21.08, considera que, na esteira da Decisão da 1.ª Instância, não basta o condutor etilizado ter dado causa ao acidente, sendo necessário que esta causa tenha emergido da própria etilização, aplicando consequentemente a posição do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência 6/2002 de 28.05.
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Em sentido diametralmente oposto, o Acórdão proferido em 31.05.2012 pelo Tribunal da Relação de Coimbra, no processo n.º 273/10.OT2AVR, já transitado em julgado, decidiu que, essa mesma questão de direito concernente ao direito de regresso da seguradora, nos casos de condução com taxa de álcool no sangue superior à legalmente permitida e no âmbito da aplicação do Decreto Lei n.º 291/2007, de 21.08, "Dever-se-á, assim, entender, e à laia de remate, que por força da previsão especial do artigo 27°, n.º 1 alínea c), do decreto lei n.º 291/2007 (...), ser ” (…) de concluir, numa interpretação centrada nos elementos literal e histórico (...), que a doutrina do acórdão de uniformização de jurisprudência n°6/2002, caducou".
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Perante a oposição de sentido e contradição manifesta entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento referido, na apreciação jurídica da mesma questão e matéria, no domínio da mesma legislação, como é a subjacente aos presentes autos, atinente ao direito de regresso da seguradora nos casos de condução sob o efeito do álcool e a aplicação e interpretação do art. 27°, n.º l do DL 291/2007 de 21.08 - designadamente quanto a saber se é ou não necessária a verificação e prova do nexo de causalidade entre a verificação do acidente e a condução com taxa de álcool no sangue superior à legalmente permitida - irrefragável se torna harmonizar e uniformizar a jurisprudência, obviando a que sobre matérias semelhantes sejam proferidas, pelas Relações e pelo próprio Supremo Tribunal de Justiça, decisões tão díspares que consubstanciam, na prática, uma aplicação contraditória do direito, visando, antes, trazer certeza ao direito aplicado e afastar a nefasta dispersão jurisprudencial.
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Nesse sentido, encontram-se, in casu, verificados os pressupostos, previstos no art. 721°-A, n.º l alínea c) do C.P.C., para a admissibilidade do presente recurso de revista excepcional.
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E que, salvo melhor opinião, sempre se verificariam também, nos termos da alínea a) do n.º l do citado normativo, atenta ainda a relevância jurídica da questão subjacente em apreciação, e a necessidade de um melhor aplicação do direito.
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O Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21.08 veio entretanto revogar o DL 522/85 de 31.l 2.
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Cumpre analisar a questão fulcral que se coloca decorrente da alteração legislativa: saber se o DL 291/2007, tal como o seu antecessor DL 522/85, exige, para o exercício do direito de regresso da seguradora (que pagou a indemnização), a verificação de nexo de causalidade adequada entre a ocorrência do acidente e a alcoolemia, ou se inversamente é suficiente a demonstração da culpa do segurado e a constatação de que este conduzia com uma TAS superior à legalmente permitida, sem exigência do nexo.
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Importa saber se permanece válida a orientação que decorria do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência.
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