Acórdão nº 478/05.6TBMGL.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Novembro de 2013

Magistrado ResponsávelSERRA BAPTISTA
Data da Resolução14 de Novembro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA CAMINHOS DE FERRO PORTUGUESES, E. P., veio intentar a presente acção declarativa de condenação, com a forma de processo ordinário, contra os réus AA e mulher BB, pedindo a condenação destes a pagarem-lhe uma indemnização correspondente à quantia global de € 29.786,31, acrescida dos respectivos juros de mora, à taxa legal, contados desde o dia 2 de Abril de 2005 e até efectivo e integral pagamento.

Alegando, para tanto, e em suma: No dia 23 de Julho de 2002, pelas 6 horas e 1 minuto, ao quilómetro 126,510 da Linha da Beira Alta, no sítio de S..., Mangualde, ocorreu um acidente, traduzido no embate entre o seu comboio nº ... e um animal de raça bovina, pertencente e à guarda do réu AA, e que andava à deriva em plena via-férrea.

Tal acidente ocorreu por culpa exclusiva do dito réu AA, que permitiu que o seu animal vagueasse sobre a via-férrea, causando danos, de índole patrimonial, e no montante global do pedido, à autora.

Responsáveis pelo ressarcimento de tais danos são ambos os réus, pois o animal em questão era utilizado no interesse e em proveito comum do casal, que assim deve suportar as consequências do respectivo risco.

Citados regularmente os réus, vieram contestar, tendo alegado, também em síntese: O réu AA impugnou a factualidade alegada na petição, afirmando ser divorciado, e reconhecendo que o animal de raça bovina colhido pelo comboio era seu e da sua ex-esposa, mas alegando que estava prenhe, encontrando-se ainda recolhido numa propriedade vedada em toda a sua extensão, pelo que não poderia dela ter saído sem auxílio humano, mediante tentativa de furto. Assim, sustentando ter tomado todas as precauções e agido diligentemente, o réu considera não ser responsável pelos danos peticionados, que caracteriza como exagerados.

Concluindo, o réu solicita a sua absolvição do pedido.

Por seu turno, a ré BB começou por excepcionar a sua ilegitimidade, sustentando que o animal em causa pertencia exclusivamente ao seu ex-marido, de quem estava já separada há mais de um ano antes da ocorrência do acidente, inexistindo ainda qualquer proveito comum da respectiva utilização. Além disso, esta ré também impugnou a factualidade alegada pela autora na sua petição.

Replicou a autora, afirmando a legitimidade da ré.

Foi proferido despacho saneador, relegando-se para momento ulterior a apreciação da excepção de ilegitimidade invocada.

Seleccionaram-se os factos tidos por assentes e elaborou-se a base instrutória.

Entretanto, e na sequência de requerimento do réu AA, foi ordenada a apensação a esta acção da acção sumária nº 507/07.9TBMGL, do 2º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Mangualde.

Nessa acção, a aí autora “Rede Ferroviária Nacional – Refer, EP” demanda o réu AA, alegando a verificação do mesmo acidente discutido nos autos principais, imputando a responsabilidade pela sua produção ao dito réu.

Alega ainda esta autora que esse acidente lhe causou danos, mais concretamente na infra-estrutura ferroviária cuja gestão lhe está cometida, cuja reparação importou o dispêndio das quantias de € 13.288,56 e € 203,50.

Termina a autora peticionando a condenação do réu no pagamento da indemnização global de € 13.492,07, acrescida dos respectivos juros de mora, à taxa legal, contados desde o dia 20 de Julho de 2005.

Citado na acção apensa, o réu AA contestou, por via de excepção e de impugnação.

Invocou desde logo o réu a excepção de prescrição do direito de crédito peticionado pela autora, suscitando também, muito embora com dúvidas, a questão do abuso de direito de acção.

Impugnou ainda o réu a factualidade alegada na petição, reconhecendo ser proprietário do animal de raça bovina colhido pelo comboio, mas alegando que estava prenhe, encontrando-se ainda recolhido numa propriedade vedada em toda a sua extensão, pelo que não poderia dela ter saído sem auxílio humano, mediante tentativa de furto. Assim, sustentando ter tomado todas as precauções e agido diligentemente, o réu considera não ser responsável pelos danos peticionados, que caracteriza como exagerados.

Concluindo, o réu solicita a sua absolvição do pedido.

Respondeu a autora à contestação, negando a verificação das invocadas excepções, e concluindo como na petição.

Foi proferido despacho saneador, não se apreciando qualquer das excepções invocadas.

Seleccionaram-se os factos assentes e elaborou-se a base instrutória.

Realizado o julgamento, abrangendo ambas as acções, julgou-se a matéria de facto da base instrutória.

Foi proferida a sentença que julgou improcedentes as excepções de ilegitimidade, prescrição e de abuso de direito invocadas nas contestações, parcialmente procedente a acção principal, tendo-se, em consequência, condenado o réu AA no pagamento à autora “Caminhos de Ferro Portugueses, EP” das seguintes quantias: a) Quantia de € 7.914,82 (sete mil e novecentos e catorze euros e oitenta e dois cêntimos), relativa a danos patrimoniais, acrescida dos respectivos juros de mora, contados desde o dia 19-07-2005 e até integral e efectivo pagamento, computados à taxa legal de 4 % ao ano; b) Quantia de € 6.000 (seis mil euros), relativa a danos patrimoniais, acrescida dos respectivos juros de mora, contados desde a data da presente decisão e até integral e efectivo pagamento, computados à taxa legal de 4 % ao ano.

Tendo-se absolvido a ré BB do pedido contra si formulado pela autora “Caminhos de Ferro Portugueses, EP”.

Tendo-se, ainda, julgado parcialmente procedente a acção apensa, e, em conformidade, condenado o réu AA no pagamento à autora “Rede Ferroviária Nacional - Refer, EP” da quantia global de € 13.492,06 (treze mil e quatrocentos e noventa e dois euros e seis cêntimos), relativa a danos patrimoniais, acrescida dos respectivos juros de mora, contados desde o dia 22-07-2005 e até integral e efectivo pagamento, computados à taxa legal de 4 % ao ano.

Inconformado com a decisão, interpôs o R. AA recurso de apelação, pedindo a sua procedência, “com a consequente absolvição do recorrente atenta a ausência de qualquer conduta dolosa” e, “a não ser esse o entendimento de V/ Exas., sempre se entende que deverá ser reapreciada a prova gravada, nos moldes supra expostos e consequentemente ser o quantum indemnizatório atenuado.” A autora REFER, E.P.E. contra-alegou pedindo a improcedência do recurso e a consequente manutenção da decisão recorrida.

Também a CP – Caminhos de Ferro Portugueses, E.P., agora CP – COMBOIOS DE PORTUGAL – E.P.E., veio contra-alegar, pugnando pela improcedência da apelação do réu.

De igual modo inconformada com a decisão, a A. CP – Caminhos de Ferro Portugueses, E.P., agora CP – COMBOIOS DE PORTUGAL – E.P.E., interpôs recurso de apelação, pretendendo a sua parcial revogação e substituição por outra que, fazendo a rigorosa interpretação e aplicação da lei aos factos apurados, condene o recorrido no pedido por si deduzido.

O réu AA e a recorrida REFER, E.P.E., não responderam ao recurso interposto pela CP – Caminhos de Ferro Portugueses, E.P., agora CP – COMBOIOS DE PORTUGAL -E.P.E..

Na Relação, e por acórdão de fls 493 a 514, foram as apelações julgadas improcedentes, mantendo-se o decidido na 1ª instância.

Ainda irresignada veio a recorrente CP pedir revista para este Supremo Tribunal de Justiça, formulando, na sua alegação, as seguintes conclusões: 1ª - Incorrectamente, o Tribunal a quo não considerou provado o concreto prejuízo sofrido pela Recorrente pela imobilização daquele seu veículo ferroviário, nem pelos atrasos, supressões e que computou em 12.024,30 €, em 2.864.16 € e 5.616,59 € e ainda em 1.382,26 €, respectivamente, num total de 21.887,31€; 2ª - Face á matéria de facto provada bem como aos documentos juntos com a Petição Inicial sob os números 4, 8, 9 e 10, ás respostas á Base Instrutória ínsitas nos números 12º e 13º a 16°, e aos depoimentos das testemunhas da Recorrente, mais concretamente o do Sr. … Dr. CC e Sr. DD, havia prova suficiente para que fosse dado como provado que na verdade, a Recorrente sofrera aqueles prejuízos, calculados de acordo com os critérios que utilizou e que se encontram espelhados naqueles mesmos documentos, 3ª - Ambos referiram que desde a data do acidente e até ao dia em que o comboio ficou totalmente apto para reentrar ao serviço, como reentrou, demorou 22 dias e 10 horas, esteve a Recorrente impossibilitada de o utilizar e dele usufruir no normal prosseguimento da sua actividade, como pretendia, o que lhe provocou um prejuízo patrimonial elevadíssimo.

  1. - O período de tempo durante o qual se viu privada do mesmo e que corresponde ao tempo gasto na sua reparação e testes - causou um prejuízo correspondente ao custo suportado pela Recorrente durante esse período, calculado com base no limite mínimo do custo de aquisição/amortização da locomotiva em causa, ou seja, corresponde ao custo de posse do referido material, constituído pelas seguintes parcelas: amortização do capital (preço do bem) e juro do investimento originado pela necessidade de recorrer a empréstimos para pagamento do capital ao fornecedor, tendo ainda em conta o número de anos de vida económica dos bens, o qual não foi possível compensar através da realização de receitas obtidas com a utilização do mesmo.

  2. - O prejuízo sofrido com o dano de imobilização durante os 22 dias e 10 H. ascendem a 21.887,31€ com base nos critérios que sucintamente se referem, e que por resultarem de facto ilícito, vencem juros de mora desde essa data, nos termos da al. b ) do n° 2 do art. 805º do C....

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