Acórdão nº 367/11.5PTPDL-A.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Outubro de 2013

Magistrado ResponsávelSOUSA FONTE
Data da Resolução30 de Outubro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça 1. Relatório 1.1.

Por sentença de 8 de Agosto de 2011, transitada em julgado no dia 25 de Fevereiro do ano corrente, proferida no processo em epígrafe, do 3º Juízo do Tribunal Judicial de Ponta Delgada, foi AA, nascido em Cabo Verde, no dia 13 de Fevereiro de 1975, filho de BB e de CC e residente, à data dos factos, no Caminho da A… de C…, nº xx, F… de B…, em Ponta Delgada, condenado, como autor material de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3º, nº 1, do DL nº 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de 6 (seis) meses de prisão, a cumprir por dias livres, equivalente a 36 (trinta e seis) períodos sucessivos, correspondentes a outros tantos fins de semana, entre as 9 horas de sábado e as 21 horas de Domingo.

1.2.

Dessa decisão vem o Ministério Público interpor recurso extraordinário de revisão, ao abrigo dos arts. 449°, nº 1, alínea d), 450°, nº 1, alínea a) e 451°, nºs 1 e 2, do CPP, com os fundamentos seguintes (transcrição das conclusões que encerram a motivação): «1. No processo n.° 367/11.5PTPDL do 3º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Ponta Delgada o arguido AA, …, foi julgado na ausência e condenado pela prática no dia 07 de Agosto de 2011, pelas elas 13:15 horas, na Rua do Torreão, na Fajã de Baixo, em Ponta Delgada, ao conduzir o ciclomotor, marca: YAMAHA, com matrícula xx - xx - xx, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p., pelo artigo 3º nº 1 do DL n.° 2/98, de 03 de Janeiro, na pena de 6 (seis) meses de prisão, a cumprir por dias livres, equivalente a 36 (trinta e seis) períodos sucessivos, correspondentes a outros tantos fins de semana, entre as 9 horas de sábado e as 21 horas de Domingo.

2. A sentença proferida no âmbito do processo n.° 367/11.5PTPDL transitou em julgado a 25 de Fevereiro de 2013.

3. Após ter sido notificado pessoalmente daquela condenação, o arguido informou os autos que só nessa altura teve conhecimento que tinha sido julgado e condenado pela prática de tal crime, tendo-se apurado junto da Direção Geral dos Serviços Prisionais, que AA, nascido em 13 de Fevereiro de 1975, em Cabo Verde, filho de BB e de CC, esteve privado da liberdade entre 13 de Fevereiro de 2011 e 24 de Agosto de 2011 no EP de Silves, apenas se tendo ausentado nos dias 06 de Julho de 2011, 22 de Julho de 2011, 23 e 24 de Agosto de 2011 para comparecer em diligências processuais.

4. A descoberta que o arguido se encontrava privado da liberdade no E. P. de Silves na data em que lhe são imputados os factos porque foi condenado no Processo n.° 367/11.5PTPDL é inconciliável com os factos considerados provados na sentença proferida neste processo e da sua oposição resultam sérias e fortes dúvidas sobre a justeza da condenação de AA, devendo ser autorizada a revisão da sentença e determinada a absolvição do arguido».

1.3.

Instruídos os autos com as pertinentes peças processuais, o Senhor Juiz proferiu despacho, nos termos do artº 454º do CPP (fls. 88) em que disse: «… compulsados os autos, verifico que o arguido foi condenado por ter conduzido um ciclomotor no dia 7 de Agosto de 2011 (…).

Efectuadas as necessárias diligências tendentes à identificação do arguido, apurou-se, junto da Direcção Geral dos Serviços Prisionais, que o mesmo esteve privado de liberdade entre 13 de Fevereiro de 2011 e 24 de Agosto de 2011, no E.P. de Silves, apenas se tendo ausentado, para comparecer a diligências processuais, nos dias 6 de Julho de 2011, 22 de Julho de 2011, 23 e 24 de Agosto de 2011 (cfr. fls. 87).

Assim, e sem necessidade de maiores considerandos, afigura-se-nos que o presente pedido de revisão tem sustentação para merecer acolhimento pelo Alto Supremo Tribunal de Justiça, pois o arguido encontrava-se preso no Estabelecimento Prisional de Silves na data dos factos dados como provados no processo sumário nº 367/11.5PTPDL, do 3º Juízo do Tribunal Judicial de Ponta Delgada».

1.4.

Recebido o processo no Supremo Tribunal de Justiça, a Senhora Procuradora-geral Adjunta emitiu o parecer de fls. 93 e segs. em que conclui que «o presente recurso de revisão não é admissível [devendo, antes] na 1.ª instância, ao abrigo do disposto no artigo 380.º do CPP, proceder‑se à correcção, que no caso concreto se imponha ― nomeadamente, cancelamento na sentença dos referidos elementos de identificação, por não pertencentes ao arguido ― procedendo‑se às comunicações necessárias e dando‑se também conhecimento da referida correcção ao recluso AA».

Para tanto, depois de recordar as diligências tendentes à notificação da sentença condenatória ao Arguido, alegou (as notas de rodapé estão inseridas no texto que iremos transcrever): «Em face da manifesta situação de usurpação de identidade, o Magistrado do Ministério Público, em exercício de funções junto do Tribunal Judicial de Ponta Delgada, veio interpor o presente recurso de revisão, ao abrigo das normas dos artigos 449.º, n.º 1, alínea d), 450.º, n.º 1, alínea a), e 451.º, n.ºs 1 e 2, todos do CPP.

II 1.

Dispõe o art. 449.º, n.º 1, al. d), do CPP: … Salvo o devido respeito, no caso dos autos não se suscitam graves dúvidas sobre a justiça da condenação do arguido.

Na verdade, dos autos não resulta que tenha sido condenada, pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal pessoa diversa da que cometeu a infracção.

Efectivamente, dúvidas não existem de que quem foi detido, na sequência de um acidente de viação, foi a pessoa que, em 7 de Agosto de 2011, pelas 13h15, conduzindo o ciclomotor de matrícula xx‑xx‑xx, circulava na Rua do Torreão, Fajã de Baixo, Ponta Delgada.

Tão pouco existem dúvidas de que foi essa pessoa concreta que na altura foi constituída arguido.

E foi essa pessoa física concreta — enquanto arguido no processo — que foi notificada nos termos e para os efeitos do artigo 385.º, n.º 2, do CPP.

Dúvidas igualmente não existem de que os factos integradores do crime de condução de veículo sem habilitação legal foram também imputados àquela pessoa física concreta detida e constituída então arguido no processo.

E só os arguidos podem ser julgados e condenados e não aqueles cujos elementos de identificação, ou parte deles, tenham sido usurpados pelos arguidos, ao falsamente declararem os seus elementos de identificação.

  1. Mas afinal o que se poderia alcançar com o presente recurso de revisão? — Demonstrar que os factos integradores do crime de condução de veículo sem habilitação legal não tinham ocorrido, pelo que a condenação daquele arguido era injusta? Não.

    — Provar que o referido arguido os não cometera, pelo que a sua condenação era injusta? Não.

    — Demonstrar que, apesar de o arguido ser o autor dos factos, existem novos factos susceptíveis de integrarem causa de justificação da ilicitude ou causas de exclusão da culpa, pelo que a condenação do arguido é injusta? Não.

    — Provar que os meios de prova de que o Tribunal se serviu para formular o seu juízo condenatório em relação à pessoa física do arguido foram condicionados pela falsidade dos elementos de identificação fornecidos por aquele, pelo que a condenação do arguido é injusta? Também não.

  2. Da prova de que a pessoa detida, em 7 de Agosto de 2011, e logo constituída arguido, forneceu...

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