Acórdão nº 402/07.1TTCLD.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Outubro de 2013

Magistrado ResponsávelMÁRIO BELO MORGADO
Data da Resolução29 de Outubro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I.

1.1.

AA intentou ação especial para efetivação de direitos emergentes de acidente de trabalho contra BB, Lda., e CC, Companhia de Seguros, S.p.A, todos com os sinais nos autos.

1.2.

Contestaram as rés, sustentando, no fundamental a R. Seguradora e ora recorrente: - O acidente deveu-se a violação pelo sinistrado das regras legais relativas a segurança no trabalho, em termos que configuram, para além disso, um quadro de negligência grosseira.

- A máquina em questão não tinha um mecanismo de imobilização automática do movimento do rolo perante a aproximação de um corpo estranho, concretamente, células fotoelétricas de bloqueio ou encravamento de segurança que impedissem o funcionamento do tapete sem que a gaiola de proteção estivesse firmemente fixada no seu lugar.

  1. Julgada totalmente procedente a ação, foi decidido: a) Declarar o A. afetado de IPP de 66,2845%, com IPATH a partir da data da alta, verificada em 22/01/2008; b) Condenar os Réus a pagarem-lhe, na proporção, respetivamente, de 1,35% e 98,65%: b.1) a pensão anual e vitalícia no valor de € 5.720,38, desde 23/01/2008; paga em 1/14 avos, adiantada e mensalmente, até ao 3º dia de cada mês, e actualizável anualmente nos termos legais; b.2) a indemnização por ITs em dívida, do montante de € 5.150,00, desde 23/01/2008; b.3) o subsídio por elevada incapacidade, pago de uma só vez, no montante de € 4.630,80 , devido desde 23/01/2008; b.4) juros de mora sobre o capital em atraso, à taxa anual de 4% e até integral pagamento; b.5) a quantia global de € 38.073,24 a título de compensação pelas despesas de transporte, médico-medicamentosas e de fisioterapia, acrescida de juros de mora à taxa anual de 4% vencidos desde a citação, e vincendos, até integral pagamento; b.6) os custos de 4 sessões mensais de fisioterapia e de duas consultas anuais de fisiatria, e a fornecerem vitaliciamente ao A., na proporção das respetivas responsabilidades, prestações de natureza médica, incluindo assistência psíquica, quando reconhecida como necessária pelo médico assistente, cirúrgica, farmacêutica, hospitalar e quaisquer outras, seja qual for a sua forma, desde que necessárias e adequadas ao restabelecimento do seu estado de saúde e da capacidade de trabalho ou de ganho e à sua recuperação para a vida ativa.

    1. Declarar que aos já vencidos montantes da pensão anual vitalícia supra fixada há que abater o montante global já pago a título de pensões provisórias.

  2. Interposto recurso de apelação pela R. Seguradora, o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), julgando parcialmente procedente o recurso, decidiu: a) Reduzir a importância mencionada em supra n.º 2, b.5, de € 38.073,24 para € 27 218,04; b) No mais, manter a decisão recorrida.

    4.

    Deste acórdão, agora de revista, recorre de novo a mesma R., sustentando essencialmente, e em síntese, nas conclusões das suas alegações: - Provado que a máquina não tinha um mecanismo de imobilização automática do movimento do rolo perante a aproximação de um corpo estranho, designadamente dispositivo de encravamento de segurança, e que a existência de tal mecanismo, perfeitamente identificado, teria evitado a amputação, claramente se tem de concluir que era possível ter dotado a máquina de tal dispositivo.

    - Foram violadas por parte da R. entidade patronal os arts. 16º, nº 1 e 3, 19º e 31º do DL 50/2005, tendo tal violação sido causal do acidente, pelo que a mesma é responsável pelo sucedido, como resulta do artigo 18°, nº 1, da Lei n° 100/97 (do qual resulta que tal ocorre, sem mais, e independentemente de culpa da empregadora, quando o acidente resultar, em termos de causalidade, de falta de observação de regras sobre segurança).

    - Foi a própria empresa responsável pela higiene e segurança da Ré que, no relatório que efetuou sobre o acidente, declarou a necessidade de "um reforço da prevenção", designadamente com a "criação de um encravamento de segurança que impeça o funcionamento do tapete sem que a gaiola de proteção esteja devidamente fixada firmemente no seu lugar".

    - Ainda que se considere necessário, para a verificação da situação prevista na segunda parte do n° 1 do artigo 18° da Lei n° 100/97, que exista um comportamento culposo da Ré empregadora, no caso concreto tal comportamento existiu, pois há sempre culpa do empregador quando a ausência de um dispositivo de segurança numa máquina de sua propriedade é causal de um acidente ocorrido com um seu subordinado.

    - Não é pelo facto de a Ré empregadora ter contratado uma empresa para assegurar a formação na área de higiene e segurança aos seus trabalhadores que aquela fica exonerada das suas responsabilidades para com os seus trabalhadores (não se pode considerar que - por ter dado formação ao sinistrado, por ter contratado outra empresa para assegurar a formação na área de higiene e segurança e por esta nunca ter alertado para a necessidade de colocar na máquina o dispositivo de interrupção do movimento do rolo - a entidade patronal não é culpada pelas insuficiências da máquina).

    - Consequentemente, nos termos do artigo 37°, n° 2 da Lei n° 100/97, a responsabilidade prevista no citado art. 18º, nº 1, recai sobre a entidade empregadora, sendo a R. seguradora apenas subsidiariamente responsável pelas prestações normais previstas na mesma lei.

    - Ainda que assim não se entenda, sempre se terá de considerar que houve violação das regras de segurança previstas na lei por parte do próprio sinistrado, o qual, apesar de ser trabalhador experiente e com conhecimento dos procedimentos de segurança, aproximou-se da zona de perigo quando a mesma estava desprovida de proteção e em movimento (desrespeitando os procedimentos de segurança que conhecia e que evitariam o acidente, optou, sem justificação, por remover de detritos e pedras acumuladas no transportador com a máquina em movimento), o que implica a descaracterização do acidente, nos termos do art. 7º, n° 1, a), da Lei n° 100/97.

  3. Os R.R. contra-alegaram, pugnando pela improcedência do recurso, afigurando-‑se pertinente destacar os seguintes pontos da argumentação da R. BB, Lda.: - Existia um dispositivo de segurança (gaiola de segurança) que permitia garantir a utilização da máquina numa situação de utilização normal.

    - O facto de não existir um dispositivo de interrupção automática do movimento do rolo da máquina numa situação de manutenção da mesma não consubstancia a violação de normas de segurança.

    - A empresa contratada não lhe deu qualquer determinação para proteger aquela máquina com qualquer outro sistema de segurança, para além da gaiola metálica, pelo que não lhe era possível prever ou antever a possibilidade de introduzir qualquer outro mecanismo, para além do existente.

    - Caso tivessem sido cumpridos todos os procedimentos existentes o acidente não se teria verificado.

  4. O Ex.mº Procurador-Geral-Adjunto pronunciou-se no sentido de ser negada a revista, em parecer a que as partes não responderam.

  5. Inexistindo quaisquer outras de que se deva conhecer oficiosamente (art. 660.º, n.º 2, in fine, do CPC), em face das conclusões das alegações, as questões a decidir são as seguintes:[1] A. - Se estão verificados os requisitos da responsabilidade agravada do empregador, estipulados no art. 18º, nº 1, da Lei n° 100/97, de 13 de setembro (caso em que, nos termos do seu artigo 37°, n° 2, a R. seguradora é apenas subsidiariamente responsável pelas prestações normais previstas na mesma lei).

    A.1.

    - Se a entidade empregadora incorreu nalguma violação das regras de segurança no trabalho que seja causal do acidente em causa.

    A.2.

    - Em caso de resposta negativa à anterior sub-questão, se dos factos provados decorre alguma conduta culposa do empregador que seja causal do acidente.

    B.

    - Se pelo próprio sinistrado houve violação, sem causa justificativa, das condições de segurança estabelecidas pela entidade empregadora ou previstas na lei [o que, a verificar-se, implica a descaracterização do acidente, nos termos do art. 7º, n° 1, a), 2ª parte, da Lei n° 100/97].

  6. Cumpre decidir, sendo aplicável à revista o regime processual anterior àquele que no CPC foi introduzido pelo DL n.º 303/2007, de 24 de agosto (a participação de acidente de trabalho – ocorrido em 2/12/2006 - deu entrada em juízo no dia 7/12/2007, tendo o acórdão recorrido sido proferido em 8 de Maio de 2013) - cfr. art. 7º, nº 1, da Lei nº 41/2013, de 26/6.

    E decidindo.

    II.

  7. A matéria de facto fixada pelas instâncias é a seguinte: 1. À data de 02/12/2006 o A. trabalhava por conta da sociedade DD...

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