Acórdão nº 971/10.9TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Outubro de 2013

Magistrado ResponsávelFERNANDES DO VALE
Data da Resolução15 de Outubro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc. nº 971/10.9TVLSB.L1.S1[1] (Rel. 130)[2] Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça 1 – “Banco AA S. A.

”, BB, CC, DD, EE, FF, GG, HH, II e JJ interpõem a presente revista do douto acórdão de 18.10.12, da Relação de Lisboa, através do qual, revogando-se a decisão apelada, foram julgadas dotadas de legitimidade as partes da acção declarativa com processo comum e sob a forma ordinária em epígrafe, instaurada, em 27.04.10, no Tribunal Cível da comarca de Lisboa, contra aqueles recorrentes, por KK.

Culminando as respectivas alegações, formularam as seguintes e relevantes conclusões: / A) – Tendo o Tribunal da Relação de Lisboa decidido - e bem - não admitir os documentos juntos nas alegações e nas contra-alegações, devem os mesmos ser desentranhados, uma vez que caso o processo prossiga em 1ª instância – no caso de o presente recurso ser julgado improcedente, o que se admite por mero dever de patrocínio e sem conceder – caberá às partes, se assim o entenderem, proceder à junção dos documentos, nos termos do disposto nos artigos 523° e 524°, n° 2 do CPC, e caberá ao tribunal de 1ª instância admitir ou não a junção dos documentos ao abrigo e nos termos daqueles preceitos; B) – 0 critério de aferição da legitimidade das partes encontra-se claramente plasmado no artigo 26° do CPC: Autores e Réus são partes legítimas se tiverem interesse em demandar e contradizer, sendo titulares do interesse relevante para efeitos de legitimidade os sujeitos da relação material controvertida tal como configurada pelo Autor; C) – Decorre do citado preceito que será apenas pelo exame dos articulados (petição inicial e réplica) e dos documentos juntos pelo Autor que se há-de decidir da excepção dilatória de ilegitimidade; D) – Não podendo deixar de se interpretar o artigo 26° do CPC no sentido de que a configuração dada pelo Autor à relação controvertida resulta não só da matéria factual alegada, mas também do teor dos documentos por ele juntos, ao abrigo do princípio da aquisição processual: se ao abrigo do artigo 659° do CPC o juiz pode considerar os factos exarados em documentos, mesmo que não objecto de alegação, dedução ou afirmação pelas partes, por maioria de razão também o pode e deve fazer para identificar a relação material controvertida tal como configurada pelo Autor; E) – Perante os factos alegados pelo Autor e o teor dos documentos por ele juntos, cabe ao Tribunal determinar qual é efectivamente a causa de pedir e qual o efeito jurídico que o autor visa obter para determinar se as partes indicadas são efectivamente parte da relação controvertida, não bastando que determinada pessoa seja indicada como parte (Autora ou Ré) e/ou que se alegue que determinada pessoa é titular de um certo interesse, ainda que reflexo, para que se possa reconhecer a sua legitimidade, pois, se assim fosse, o conceito de legitimidade e a respectiva excepção de ilegitimidade, ficariam pura e simplesmente esvaziados de conteúdo, ficando comprometido o papel do Tribunal como órgão de soberania encarregue de resolver litígios reais e de administrar a Justiça; F) – Com efeito, ainda que determinados factos possam não ser expressamente alegados pela Autora - in casu, o facto de a Autora ser procuradora da LL, ou o facto de as contas bancárias nº/s … e … serem contas abertas junto do MM - o conhecimento dos mesmos impõe-se ao julgador, como decorrência lógica e necessária dos demais factos que foram expressamente levados ao seu conhecimento, nos termos do artigo 349° e 351° do Código Civil; G) – Foi precisamente este o exercício realizado pelo Tribunal de 1ª instância, na decisão ora revogada pela Relação: analisou toda a matéria factual alegada pela Autora e o teor dos documentos por esta juntos, identificou a causa de pedir (aquisição não autorizada de produtos estruturados) e determinou que, à luz dessa causa de pedir, a Autora e os Réus não eram efectivamente parte da relação controvertida e, por conseguinte, não eram partes legítimas; H) – Cabe ao Tribunal obstar a que a acção prossiga quando a descrição da relação controvertida feita pelo Autor indiciar serem outras, que não as partes por este indicadas, as partes efectivamente titulares da referida relação jurídica, sob pena, nas palavras de Remédio Marques (in "A acção declarativa à luz do Código revisto", 2.a edição, Coimbra, 2009, p. 365), de se obterem "resultados manifestamente incongruentes — que nem estavam na mente de Barbosa de Magalhães - e para manter o interesse prático desta figura como pressuposto processual; I) – Com efeito, qualquer processo que possa seguir o seu curso envolvendo as partes indicadas pela Autora, não vinculando a sociedade LL e o MM, não é susceptível de resolver definitivamente o litígio existente, e, por conseguinte, é um acto inútil, cuja prática é vedada ao Tribunal, nos termos do artigo 137° do CPC; J) Contrariamente ao que entende a decisão recorrida, o Tribunal de 1ª instância não desconsiderou a existência da relação de clientela entre a recorrida e o AA, mas antes afirmou que, paralelamente a essa relação, existe uma relação de clientela entre a LL, de que a recorrida é procuradora, e o MM, tendo sido no âmbito dessa relação de clientela, que constitui a relação controvertida — e não no âmbito da relação de clientela entre a recorrida e o AA —, que os produtos estruturados foram adquiridos; 114. Sendo de acrescentar que resulta dos factos alegados pela Autora e dos documentos juntos (Doc. n° 34 da PI) a sua qualidade de procuradora da LL, pois que de outra maneira não se compreenderia que esta se pudesse arrogar, como o faz, a titularidade e disponibilidade de direitos detidos pela referida LL, ou assinar, em nome e representação da LL, correspondência dirigida ao AA; K) – A Autora intentou a presente acção contra os Réus invocando que estes são responsáveis para com a Autora por alegada aquisição não autorizada de produtos estruturados e alega, para sustentar tal entendimento — e assim configurando a relação controvertida - que: - "A partir de meados de 2004, foram abertas, entre outras, as contas nº/s ... (USD) e n° ... (EUR) em nome da LL … Ltd, sociedade com sede nas Ilhas Virgem Britânicas*9 (artigo 80° da PI); - "Tais contas funcionavam, essencialmente, como contas de mandatária (advogada) da A. por onde passavam fundos respeitantes a processos de clientes, para sua guarda, gestão e posterior entrega." (artigo 81° da PI); - "A sociedade LL nunca foi titular do capital investido nem beneficiária dos dividendos gerados pelos investimentos realizados através de si" (artigo 86° da PI); - A sociedade LL não "actuou como se de verdadeira sociedade se tratasse com objecto, personalidade e capacidade distintos da A., estando apenas ao serviço dos investimentos desta efectuados através do AA* (artigo 87° da PI); - Nunca foi pedida à Autora "qualquer credencial ou outro documento que justificasse a disponibilidade sobre os valores mantidos nas contas tituladas pela LL" (artigo 94° da PI); - "A A. também manteve total disponibilidade sobre os valores depositados ou investidos" (artigo 95° da PI); - Os produtos identificados nos artigos 142° a 182° da PI "foram adquiridos para as contas de valores mobiliários com o n°... (USD) e n° …T (artigo 183° da PI); - "O dinheiro aplicado proveio de contas de depósito à ordem com a mesma numeração" (artigo 184° da PI); - "O dinheiro depositado nessas contas é pertença da A" (artigo 185° da PI); - "A Autora recebia os extractos das contas n° ... (USD) e n° ... (EUR) como se de contas suas se tratasse." (artigo 99° da PI).

L) – E juntou, entre outros, os seguintes documentos: i) Documento n° 34 que integra: - deliberação da LL constituindo KK como procuradora da LL conferindo-lhe poderes e autorizando-a para actuar, movimentar e fechar contas bancárias em qualquer sucursal ou subsidiária do Banco AA, SA, em Portugal ou em qualquer outro país, incluindo, mas não limitado ao AA MM (Cayman) Limited; - certidão de incorporação da sociedade LL; - “declaration of trust” nos termos da qual a NN Limited declara que é titular das acções da LL registadas em seu nome como fiduciário de KK; - estatutos da LL; ii) Documentos nº/s 36 a 41 e 43, 45 a 50 da PI - extractos das contas ... (USD) e n° ... dirigidos a LL dos quais constam todos os movimentos efectuados nas referidas contas, inclusivamente o créditos dos rendimentos resultantes daquelas aplicações financeiras; iii) Docs. nº/s 53, 58, 59, 60 e 61 da PI - 5 cartas dirigidas ao AA assinadas "pela sociedade LL", das quais consta a assinatura da recorrida; M) – Ou seja, dos articulados da recorrida e dos documentos juntos decorre que: i. a LL existe (artigos 80°, 86°, 87°, 94° da PI e doc. n° 34 da PI); ii. a LL é titular das contas n°s ... e n° ... (artigos 80°, 94°, 99° “a contrario” da PI e docs. nº/s 36 a 41 e 43, 45 a 50 da PI); iii. os produtos estruturados - cuja alegada aquisição não autorizada serve de causa de pedir à presente acção - foram adquiridos para as contas n°s ... (USD) e n° ... (artigos 183°, 184° da PI e does. n°s 36 a 41 e 43,45 a 50 da PI); iv. o dinheiro aplicado proveio de contas de depósito à ordem com a mesma numeração (artigo 184° da PI e docs. nº/s 36 a 41 e 43, 45 a 50 da PI); v. A recorrida é "ultimate beneficial owner" (última beneficiária) e procuradora da LL e nessa medida era beneficiária indirecta dos proveitos dos investimentos realizados pela LL, decidia os investimentos a realizar e dava as ordens para o efeito e recebia os extractos das contas tituladas pela LL; N) – Ou seja, os produtos estruturados cuja aquisição a recorrida contesta pertencem não à recorrida, mas à referida sociedade LL, cuja existência a Autora expressamente reconhece na sua PI, de que a recorrida é procuradora e beneficiária (como resulta nomeadamente dos artigos 95° e 104° da PI, bem como do Doc. 34 junto com a mesma), tendo a referida sociedade LL personalidade e capacidade jurídicas distintas da personalidade e capacidade jurídicas da recorrida, sendo...

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